D.E. Publicado em 16/01/2012 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, ACORDAM os integrantes da Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação para diminuir a pena base para o mínimo legal, mantendo no mais a sentença, restando a pena definitiva em 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 14 (quatorze) dias-multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, determinando-se, ainda, a expedição de mandado de prisão após o trânsito em julgado, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte do presente julgado.
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RELATÓRIO
A Juíza Federal Convocada Silvia Rocha (Relatora):
O Ministério Público Federal ofereceu, em 05/11/2003, denúncia em desfavor de SANDRA REGINA PAIM em razão da prática dos crimes tipificados no artigo 231, §§2º e 3º (duas vezes), ambos c.c. o artigo 69 do Código Penal.
A denúncia narra o seguinte:
A denúncia foi recebida em 11/11/2003 (fl. 114).
Processado o feito, sobreveio sentença, proferida e publicada 17/06/2004 (fls. 194/210), que condenou a ré SANDRA REGINA PAIM, como incursa no artigo 231, caput e §3º (duas vezes), na forma do artigo 71, c.c. artigo 231, caput e §3º, na forma do artigo 14, II, e artigo 69, todos do Código Penal, à pena de 5 (cinco) anos e 3 (três) meses de reclusão, em regime inicial semi-aberto, e 45 (quarenta e cinco) dias multa no valor de 1/10 (um décimo) do salário mínimo vigente à época do pagamento.
A defesa apela (fls. 218/221). Pleiteia a absolvição da ré, com fundamento no artigo 386, III, do Código Penal, ao argumento de que inexiste provas de ter a ré influenciado na decisão das vítimas de irem a Espanha trabalhar como prostitutas, bem como de que tenha lucrado com a ida das vítimas àquele país. Subsidiariamente, requer o perdão judicial, por se tratar de pessoa trabalhadora, primária, ter endereço fixo e ser mãe de família, ou, ainda, a diminuição da pena para o mínimo legal.
Com contrarrazões do Ministério Público Federal (fls. 225/231).
O Ministério Público Federal, em parecer da lavra Procuradora Regional da República Jovenilha Gomes do Nascimento, opinou pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
À revisão.
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VOTO
A Juíza Federal Convocada Silvia Rocha (Relatora):
A apelante SANDRA REGINA PAIM foi denunciada como incursa nas penas do artigo 231, §§ 2º e 3º (duas vezes), c.c. o artigo 69, ambos do Código Penal.
Entretanto, a ré foi condenada à pena do artigo 231, caput e §3º (duas vezes), c.c. o artigo 71 do Código Penal em concurso material (artigo 69 do Código Penal) com o artigo 231, caput e §3º (uma vez), c.c. artigo 14 II e parágrafo único, do Código Penal.
A redação do artigo 231 do Código Penal, anterior à Lei 11.106/2005, vigente à época dos fatos, tinha o seguinte teor:
1. Da materialidade e da autoria quanto ao crime consumado.
Inicialmente, esclareço que a materialidade delitiva deve ser analisada relativamente à cada vítima mencionada na denúncia e conjugando-se o caput do artigo 231 com o seu §3º do Código Penal, consoante a condenação imposta na sentença.
Assim, tenho que o objeto material do delito consiste na promoção (ser a causa geradora) ou facilitação (tornar algo acessível, sem necessidade de grandes esforços) de saída de mulher do território nacional para exercer a prostituição no estrangeiro visando o lucro.
Feita esta análise e considerando os elementos constantes dos autos, verifico estar suficientemente demonstrada a materialidade do crime de tráfico de mulheres relativamente às vítimas Estácia Maria Rodrigues e Érika Gomes, uma vez cada, bem como a autoria de SANDRA REGINA PAIM.
Com efeito, a partir dos depoimentos testemunhais, é inconteste que tais mulheres foram exercer a prostituição no estrangeiro, in casu, na Espanha, por intermédio de terceira pessoa, no caso SANDRA, que facilitou a empreitada.
Confiram-se, primeiramente, os depoimentos judiciais de Estácia e Érika sobre como foi providenciada a sua viagem para Espanha:
Vê-se, por conseguinte, que foi SANDRA quem indicou às vítimas o contato que as levou a Espanha, o qual também as orientou acerca da emissão dos passaportes, bem como lhes forneceu dinheiro para as despesas.
Da leitura dos depoimentos, observa-se que a ré SANDRA participou ativamente das negociações juntamente com o espanhol, servindo, inclusive, como tradutora para as vítimas.
Além disso, a vítima Érika aduz que SANDRA recebia mil dólares por mulher que conseguia mandar para a Espanha.
De outro lado, a ré nega ter intermediado a ida das vítimas para a Europa, o que, entretanto, não condiz com as demais provas dos autos. O interrogatório de SANDRA confirma que, de fato, ela possuía contato com pessoas na Espanha, na mesma cidade para a qual as vítimas Érika e Estácia foram enviadas, qual seja, Castellon della Plana. Veja o seu teor:
É patente, portanto, que SANDRA praticou os atos executórios do crime tipificado no artigo 231 do Código Penal, pois apresentou as vítimas Érika e Estácia aos donos do clube espanhol, onde iriam exercer a prostituição, e levou-as à Polícia Federal para tirar passaportes, tal como orientado pelo dono do clube espanhol.
Logo, conclui-se que SANDRA REGINA PAIM facilitou a saída de mulher do território nacional para exercer a prostituição no estrangeiro visando o lucro, incidindo, dessa forma, no artigo 213, caput e §3º, do Código Penal, na sua redação original.
2. Da materialidade e da autoria quanto ao crime tentado.
O magistrado a quo condenou a ré SANDRA também pelo crime do artigo 231, caput e §3º, do Código Penal, na modalidade tentada (art. 14, II), relativamente à vítima Érika Gomes.
A condenação deve ser mantida.
Os depoimentos de Érika, em certos momentos, demonstram imprecisão, contudo, a versão de que a ré SANDRA a teria procurado novamente, após seu retorno da Espanha, para lá voltar foi apresentada tanto em sede inquisitorial, como em juízo:
Assim, diante da afirmação veemente da vítima Érika de que teve contato com SANDRA, mesmo após ter retornado da Espanha, quando foi convidada novamente a ir para Europa, o que não ocorreu unicamente porque o dinheiro que seria utilizado para o custeio de sua passagem foi furtado, dá ensejo à manutenção da condenação por tentativa de tráfico de mulheres com obtenção de lucro.
Desta feita, restam comprovadas a materialidade delitiva e a autoria do crime disposto no artigo 213, caput e §3º, do Código Penal, na sua redação original, na forma do artigo 14, II, do mesmo código.
3. Da dosimetria da pena.
A defesa pleiteia a aplicação do perdão judicial. Porém, tenho que o instituto não é cabível ao crime ora em análise.
Como ensina Guilherme de Souza Nucci, ao comentar o artigo 107, IX, do Código Penal, perdão judicial "é a clemência do Estado para determinadas situações expressamente previstas em lei, quando não se aplica a pena prevista para determinados crimes, ao serem preenchidos certos requisitos objetivos e subjetivos que envolvem a infração penal. Trata-se de uma autêntica escusa absolutória, que não pode ser recusada pelo réu." (in Código Penal Comentado. 9ª ed. São Paulo: RT, 2008. p. 552.)
Assim, o crime do artigo 231 do Código Penal não prevê nenhuma hipótese de perdão judicial, de modo que o pedido é descabido.
3.1. Dos crimes consumados.
A sentença fixou a pena base em 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 30 (trinta) dias multa no valor de 1/10 (um décimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos.
Entretanto, verifico da leitura do decisum, que as circunstâncias judiciais consideradas para a fixação da pena base acima do mínimo legal constituem elementos do próprio tipo penal, não se podendo levar em conta, sob pena de bis in idem.
Sendo assim, é suficiente a pena base de 3 (três) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, pois não há elementos nos autos passíveis de se aferir a situação financeira da ré.
Não há agravantes e atenuantes.
Na terceira fase, não há causas de diminuição da pena, mas apenas a causa de aumento decorrente da continuidade delitiva, visto que o crime foi cometido duas vezes (contra Érika e Estácia), nos termos do artigo 71 do Código Penal, o que enseja o aumento de 1/6, pelo que a pena resta definitiva em 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 11 (onze) dias multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos.
3.2 Do crime tentado.
A sentença fixou a pena base em 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 30 (trinta) dias multa no valor de 1/10 (um décimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos.
Entretanto, verifico da leitura do decisum, que as circunstâncias judiciais consideradas para a fixação da pena base acima do mínimo legal constituem elementos do próprio tipo penal, não se podendo levar em conta, sob pena de bis in idem.
Sendo assim, é suficiente a pena base de 3 (três) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, pois não há elementos nos autos passíveis de se aferir a situação financeira da ré.
Não há agravantes e atenuantes.
Na terceira fase, não há causas de aumento de pena, mas apenas a causa de diminuição em razão da tentativa, consoante artigo 14, II, do Código Penal, o que enseja a diminuição de 2/3 da pena, pelo que resta definitiva em 1 (um) ano de reclusão e 3 (três) dias multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos.
4. Do concurso material.
Considerando que os crimes consumados praticados contra Érika e Estácia ocorreram em momento consideravelmente anterior (cerca de 1 ano) ao delito tentado, é de ser reconhecido o concurso material, não sendo possível considerar a tentativa como continuidade dos delitos consumados.
Desse modo, nos termos do artigo 69 do Código Penal, as penas de ambos os crimes devem ser somadas, perfazendo um total de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 14 (quatorze) dias-multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos.
Impossibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, em razão do quantum da pena.
Fica mantido o regime inicial semi-aberto para o cumprimento da pena, tal como fixado na sentença.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação para diminuir a pena base para o mínimo legal, mantendo no mais a sentença, restando a pena definitiva em 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 14 (quatorze) dias-multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos.
Após o trânsito em julgado, expeça-se mandado de prisão.
É o voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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