D.E. Publicado em 26/01/2012 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso do ministério público federal, rejeitar a preliminar argüida na apelação da ré e dar-lhe parcial provimento tão-somente para reduzir a pena de multa, destinando, de ofício, a prestação pecuniária à União, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
O Exmo. Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI:
Trata-se de apelação criminal interposta pelo Ministério Público Federal pela ré SONIA MARIA GARDE contra a sentença que julgou parcialmente procedente a denúncia para condená-la pela prática do crime descrito no artigo 171, "caput" e §3º do Código Penal.
Narra a denúncia que em 03 de julho de 1996 SONIA MARIA GARDE e Simone de Cássia Monachesi, em conluio e com unidade de desígnios, mediante fraude, obtiveram vantagem ilícita para si, em prejuízo da Caixa Econômica Federal, já que Simone efetuou saque irregular de sua conta vinculada ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) no valor de R$7.774,12 (sete e mil, setecentos e setenta e quatro reais e doze centavos) na Agência Campos Elíseos, localizada na Avenida Saudade, 1397, em Ribeirão Preto, utilizando-se da falsa justificativa de "demissão sem justa causa", inserida no sistema por SONIA, a qual se valeu das facilidades proporcionadas pelo cargo de encarregada do setor de liberação de Autorização de Pagamento do FGTS.
A denúncia foi recebida em 03/02/2004 (fl.256/257).
Após regular instrução, foi proferida sentença (fls.551/583) que julgou parcialmente procedente a denúncia para absolver a ré Simone de Cássia Monachesi com fulcro no artigo 386, VI do Código de Processo Penal, e condenou SONIA MARIA GARDE como incursa no artigo 171, "caput", §3º do Código Penal à pena de 04 (quatro) anos e 120 (cento e vinte) dias-multa, no valor unitário de 01 (um) salário mínimo, substituída a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos consistentes em prestação pecuniária no valor de ½ (meio) salário mínimo, totalizando 48 (quarenta e oito) salários mínimos, a instituição filantrópica a ser determinada pelo Juízo da Execução.
O Ministério Público Federal insurge-se contra a sentença proferida, pugnando pela condenação da corré Simone nos termos da denúncia, por entender demonstrado o elemento subjetivo (fls.597/605).
Inconformada, apela também a ré (610/622), pleiteando:
1) Preliminarmente, a nulidade da sentença por vício formal em razão de não haver pronunciamento acerca da produção de provas por meio ilícito;
2) Quanto ao mérito, pleiteia:
a) A absolvição por ausência da materialidade delitiva;
b) A absolvição ante a inexistência de provas da autoria, não sendo possível embasar a condenação apenas em procedimento administrativo feito pela empresa vítima ou em inquérito policial;
c) A diminuição da pena-base fixada;
d) A adequação da pena de multa ao patamar estipulado para a pena privativa de liberdade;
e) A redução do valor do dia-multa, e
f) Regime de cumprimento e substituição da pena mais benéficos.
Contra-razões do Ministério Público Federal às fls.624/633, pela manutenção da sentença guerreada.
Apresentadas as contrarrazões da corré Simone de Cássia Monachesi pela manutenção da sentença que a absolveu (fls.638/642).
Parecer da Procuradoria Regional da República (fls.677/682), no sentido de ser provido o recurso da acusação, desprovendo-se o apelo da defesa.
É o relatório.
À revisão
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VOTO
A Exma. Juíza Federal Convocada RAQUEL PERRINI:
1. Da nulidade. Inicialmente, a apelante SONIA MARIA GARDE requer o reconhecimento da nulidade da sentença por vício formal, em razão de não haver pronunciamento acerca da produção de provas por meio ilícito.
Observo, todavia, que a decisão guerreada não se absteve de emitir pronunciamento acerca da nulidade suscitada. Embora sucintamente, manifestou-se (fl.571):
Conforme bem salientado, a condenação baseia-se em elementos outros, sobre os quais se discorrerá na seqüência, que se originam da produção de provas independentes da quebra do sigilo bancário.
De fato, a condenação baseia-se em provas idôneas, tendo desconsiderado a quebra do sigilo bancário da apelante, cujos dados são irrelevantes para que se teça um juízo condenatório ou absolutório da ré, frente aos demais elementos probatórios, de origem lícita, amealhados nos autos.
Ademais, eventual vício ocorrido no citado procedimento administrativo não macula as provas produzidas nesta demanda, uma vez que o Juízo "a quo" sequer se utilizou dos citados informes para formar sua convicção. É dizer: as informações indicadas pela defesa não foram consideradas meio de prova para fundamentar a condenação.
Não procede, pois, a ocorrência de nulidade no feito, visto que não se funda a condenação em prova ilícita, sequer em provas dela derivadas, visto que o magistrado a quo acertadamente não as considerou.
Estando a sentença guerreada devidamente fundamentada quanto à questão, inexistindo qualquer vício que a macule, rejeito a preliminar arguida.
2. Da materialidade. A materialidade foi demonstrada através do comprovante de pagamento do FGTS em favor de Simone de Cássia Monachesi (fl.17) e pela cópia do termo de rescisão (fl.20), que demonstra que o término do contrato de trabalho se deu em função de pedido de demissão, que não autoriza o saque das quantias vinculadas a sua conta vinculada ao FGTS, nos termos do artigo 20 da lei 8036/90.
3. Do apelo ministerial. O Ministério Público Federal pleiteia a reforma da sentença de primeiro grau para condenar Simone de Cássia Monachesi.
Todavia, como bem reconhecido na sentença guerreada, não se comprovou nos autos que tenha a apelada atuado com dolo.
Ouvida em Juízo (fls.361/362), a denunciada Simone relatou que, por indicação de colegas de trabalho, manteve contato telefônico com um despachante chamado Alexandre, passando-lhe os dados de sua carteira de trabalho, o qual informou o valor a ser soerguido e explicou que o saque seria possível na agência de Ribeirão Preto, orientando-a a se dirigir ao balcão de atendimento de FGTS levando a CTPS. Procedeu conforme instruída, depositando a Alexandre o valor de R$500,00 pelo serviço. Não examinou, por não entender, o motivo lançado na autorização para saque do FGTS. Soube das irregularidades somente quando foi intimada a prestar depoimento na Polícia Federal.
Não ficou demonstrado que Simone tinha conhecimento das hipóteses em que poderia efetuar o levantamento do fundo de garantia, tampouco da fraude perpetrada, sobretudo porque dirigiu-se à agência da Caixa Econômica Federal, sendo atendida por funcionários da instituição que a informaram que tinha direito ao levantamento, desconhecendo, portanto, que o saque estava sendo feito contrariamente à previsão legal.
Diante do exposto, não restou plenamente configurado que a apelante tenha procedido tendo ciência da ilicitude do fato. Ante o princípio do in dúbio pro reo, imperiosa a manutenção de sua absolvição.
4. Da autoria. Alega a defesa que não é possível embasar a condenação apenas em procedimento administrativo feito pela empresa vítima ou em inquérito policial.
Hodiernamente, no âmbito do processo penal, o julgador deve motivar sua decisão nas provas colhidas durante a instrução judicial, sendo-lhe vedado proferir decisão baseada unicamente em prova indiciária.
Mas no caso em tela, observa-se que a condenação baseou-se em todo o conjunto probatório, consistente não só nos elementos colhidos na fase indiciária, mas também em provas produzidas ou reiteradas em juízo, como prova documental (ofício de fl.426, termo de rescisão original de fl.485), oitiva das rés e prova testemunhal (fls.460 e 461).
Dessa forma, as provas apóiam-se nos elementos apurados no decorrer da instrução.
Pleiteia também a defesa a absolvição ante a inexistência de provas da autoria, mas esta restou inconteste.
A apelante (fls.383/384) negou a prática delitiva, asseverando que se limitara a adotar os procedimentos usuais nas hipóteses de saques do FGTS. A versão apresentada pela ré em Juízo no sentido de que possivelmente a fraude teria sido perpetrada por uma quadrilha que falsificava os termos de rescisão para neles alterar o motivo da demissão, não sendo possível à apelante perceber a falsidade do documento, restou isolada do conjunto probatório, carecendo de credibilidade.
De acordo com o comprovante de pagamento do FGTS (fl.17), a liberação para saque foi autorizada pela servidora ora apelante.
O Relatório da Apuração Sumária da CEF de fls.115/121 concluiu pela participação da acusada no saque fraudulento do FGTS. Colaciono excertos do referido procedimento:
As declarações extrajudiciais de Rogério Aparecido Felix (fl. 220) , Edson Previato (fls.206/207) e Alexandre Antônio Chionchio (fls.208/209), bem como as de Marcelo Chierci Lopes (fls.406/410) prestadas nos autos da Ação Penal nº 97.0307733-1, acostadas por cópias a estes autos por determinação judicial (fl.402) são uníssonas em apontar a ré como autora do crime descrito na peça acusatória.
Confira-se o depoimento da testemunha Marcelo Chierici Lopes:
A alegação da ré no sentido de que não teria concorrido para a empreitada criminosa não prospera. O conjunto probatório é firme no sentido de que a denunciada era a responsável pelo setor de FGTS, competente paraa conferência de documentos apresentados e ulterior autorização para o levantamento do saldo existente.
A argüição de que foi vítima de outros funcionários que se utilizavam de sua senha sem que a mesma soubesse, não prospera, não tendo sido demonstrada nos autos. E não se olvide que a senha é pessoal e intransferível, cabendo ao servidor que a delegou a terceiros a responsabilidade pelos atos praticados sob sua égide.
Além disso, a tese defensiva no sentido de que o termo de rescisão contratual, diverso do termo constante dos autos, era apresentado com o campo referente à causa da rescisão falsificado, cuja falsidade não era passível de ser percebida pela apelante, ficando arquivado na instituição, também não procede. Oficiou-se à Caixa Econômica Federal, a qual informou que o original estava em poder da empresa (fl.426); esta, por sua vez, apresentou referido documento (fl.485), onde consta expressamente pedido de demissão como motivo da extinção do contrato de trabalho.
Os elementos coligidos aos autos indicam, à saciedade, que a acusada tinha plena ciência acerca da ilicitude de seu comportamento consistente na fraude empregada com o intuito de obter, para si ou para outrem, vantagem indevida em detrimento de entidade de direito público, haja vista o extenso rol de ações penais similares, que indica a contumácia na prática delitiva, não havendo que se falar em atipicidade fática por ausência de dolo.
Comprovadas a materialidade e autoria delitivas, a manutenção da sentença condenatória é de rigor.
5. Da dosimetria. A pena-base foi corretamente fixada acima do patamar mínimo ante a personalidade e conduta social da acusada voltada para a prática de delitos, consoante se verifica do elevado número de ações penais que a ré possui, culpabilidade intensa da acusada que coordenava o setor de FGTS e abusou da confiança que lhe fora conferida por uma empresa pública federal para perpetrar o crime.
Anoto, em complemento, que a apelante possui em seu desfavor sentença condenatória transitada em julgado, pela mesma prática delitiva narrada na denúncia, proferida nos autos do processo nº 2001.61.02.002267-5, 4ª Vara Federal de Ribeirão Preto/SP (fl.525).
Desta forma, a pena privativa de liberdade foi bem dosada, justificada a majoração da pena-base acima do mínimo legal em 02 (dois) anos, resultando em 03 (três) anos de reclusão, à vista da conduta social pouco recomendável da ré e de sua personalidade voltada para a habitualidade delitiva.
Por conta do disposto no §3º do artigo 171 do Código Penal, foi acrescida a pena em 1/3, resultando em 04 (quatro) anos de reclusão, que considero suficiente para a repressão e prevenção do crime.
Estabelecido o regime inicial aberto para o cumprimento da sanção corporal, nos termos do artigo 33, §2º do Código Penal, carece de interesse a defesa ao pleitear a fixação de regime mais benéfico.
Razão assiste à defesa ao requerer a adequação da pena de multa, estipulada em 120 (cento e vinte) dias-multa, ao patamar estipulado para a pena privativa de liberdade.
A fim de preservar a parametricidade entre as penas cominadas, acresço a pena-base de 10 (dez) dias-multa ao triplo, resultando em 30 (trinta) dias-multa. Acrescendo-se 1/3 por conta da causa de aumento prevista no artigo 171, §3º do Código Penal, torno definitiva a pena de multa em 40 (quarenta) dias-multa.
No tocante ao valor do dia-multa, considerou-se a situação econômica da acusada, bancária aposentada, e as vantagens indevidas que cobrava para autorizar o saque fraudulento do FGTS, sendo fixado em 01 (um) salário mínimo vigente ao tempo da infração penal, atualizado monetariamente, devendo ser mantido.
Pelas mesmas razões, acertadamente, foi substituída a pena privativa de liberdade da apelante por duas penas restritivas de direitos, consistentes em duas penas de prestação pecuniária no valor de ½ (meio) salário mínimo mensal que, consoante entendimento desta C. Turma, deve ser destinada, de ofício, à União Federal.
Com tais considerações, NEGO PROVIMENTO ao recurso do Ministério Público Federal e REJEITO a preliminar argüida na apelação da ré, à qual DOU PARCIAL PROVIMENTO tão-somente para reduzir a pena de multa imposta para 40 (quarenta) dias-multa e, DE OFÍCIO, destino a prestação pecuniária à União, mantendo-se, no mais, a sentença recorrida.
É o voto.
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Data e Hora: | 09/01/2012 18:33:23 |