D.E. Publicado em 12/03/2012 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação e, de ofício, destinar a pena de prestação pecuniária à União Federal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:
Trata-se de apelação criminal interposta por ERVEN PAULO MARTINEZ contra sentença que o condenou pela prática do crime descrito no artigo 168-A, §1º, I c.c. o artigo 71, ambos do Código Penal.
Narra a denúncia que o acusado e Paulo Alexandre Ornelas, na qualidade de administradores da empresa "PROFISSIONAIS GRÁFICOS E EDITORA LTDA.", deixaram de recolher, no prazo legal, contribuições destinadas à Previdência Social e que foram descontadas dos salários dos empregados da referida empresa durante os períodos de setembro a dezembro de 1999, resultando na lavratura da Notificação Fiscal de Lançamento de Débito nº 35.634.265-4, no valor de R$29.718,92 (vinte e nove mil, setecentos e dezoito reais e noventa e dois centavos).
A denúncia foi recebida em 27 de outubro de 2005 (fl.27).
Citado por edital e ausente em seu interrogatório, desmembrou-se o feito em relação ao réu Paulo Alexandre Ornelas (fls.179/180)
Após regular instrução, foi proferida sentença (fls.210/218) que julgou procedente a ação penal, condenando o acusado ERVEN PAULO MARTINEZ à pena de 02 (dois) anos, 06 (seis) meses e 10 (dez) dias de reclusão, em regime inicial aberto, e ao pagamento de 14 (quatorze) dias-multa, no valor mínimo.
A pena privativa de liberdade foi substituída por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade a entidade com destinação social designada pelo Juízo das Execuções Penais e multa no valor de cinco salários mínimos.
Inconformado, apela o acusado (fls.237/240), pugnando pelo reconhecimento da prescrição; pela anulação da sentença e de todos os atos praticados após a ausência do corréu, convertendo-se o julgamento em diligência para localizá-lo; pela absolvição, por ser o delito crime material, não tendo sido demonstrado que o apelante utilizou a contribuição não recolhida em proveito próprio, e diante do não exaurimento da via administrativa; por fim, sustenta a inexigibilidade de conduta diversa em razão das dificuldades financeiras enfrentadas pela empresa.
Sendo as razões de apelação ofertadas em segundo grau, a Procuradoria Regional da República apresentou contraminuta e parecer em peça única, no sentido de se negar provimento ao apelo (fls.243/247).
É o relatório.
À revisão.
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VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:
O recurso não prospera.
1. Da prescrição. Observo que não transcorreu o lapso prescricional, com fulcro na pena em concreto, pleiteado pela defesa.
Os fatos ocorreram entre setembro a dezembro de 1999.
A denúncia foi recebida em 27 de outubro de 2005 (fl.27).
O feito foi sentenciado em 08 de dezembro de 2009, aplicando ao réu a pena-base de 02 (dois) anos e 02 (dois) meses de reclusão.
Pelo disposto no artigo 109, IV do Código Penal, considerando-se que houve o trânsito em julgado para a acusação, o delito em comento prescreve em 08 (oito) anos, lapso este não atingido. Logo, sem fundamento a alegação da defesa.
2. Da nulidade. Não prospera o pedido de anulação da sentença e de todos os atos praticados após a ausência do corréu Paulo Alexandre Ornelas.
Nos termos do artigo 366 do Código de Processo Penal, o corréu foi citado por edital e, ausente em seu interrogatório, determinou-se a suspensão do curso do processo e do prazo prescricional, bem como o desmembramento do feito em relação a ele, para que sua responsabilidade fosse apurada oportunamente.
Tal procedimento encontra guarida nos ditames legais, adotado justamente para evitar prejuízo em relação à instrução probatória do apelante, primando pela celeridade processual.
Em pesquisa realizada no âmbito do sistema desta Corte, verifica-se que o corréu também não foi localizado no processo desmembrado, sendo decretada a extinção de sua punibilidade por conta da prescrição da pretensão punitiva.
Dessa forma, atender ao pleito da defesa, para se converter o julgamento em diligência a fim de localizar o corréu apenas acarretaria uma inútil procrastinação do feito, razão pela qual é rejeitado.
3. Da materialidade do delito. Diversos documentos, constantes do apenso, comprovam a materialidade delitiva, que restou incontroversa: notificação fiscal de lançamento do débito (fl.04), discriminativos do débito (fls.07/08), relatório fiscal da infração (fls.16/17), folhas de pagamento da empresa (fls.24/29) e representação fiscal para fins penais (fls.01/02).
Embora alegue a defesa que, diante do não exaurimento da via administrativa, não se configuraria o delito, certo é que o exaurimento é condição de procedibilidade apenas com relação aos crimes contra a ordem tributária.
No caso dos autos, o inquérito policial foi instaurado para apuração da eventual prática do delito previsto no artigo 168-A, do Código Penal, que não constitui crime contra a ordem tributária. Trata-se de crime omissivo, cuja consumação ocorre quando o agente deixa de recolher na época própria, as contribuições descontadas dos empregados.
Uma vez que basta a omissão para a consumação é prescindível o esgotamento da via administrativa. (Precedentes: RHC 17.018, STJ, Rel. Min. Arnaldo Esteves de Lima, 5ª Turma, DJ. 20.06.2005; HC 21994, TRF/3ª Região, Rel. Des. Fed. Cecilia Mello, 2ª Turma, DJ 29.09.2006).
Entrementes, o Superior Tribunal de Justiça, em 24 de junho de 2008, decidiu, no HC nº 96.348/BA, de relatoria da Ministra Laurita Vaz, que:
De fato, recentemente, o Supremo Tribunal Federal, no Agravo Regimental no Inquérito nº 2.537-2, decidiu que:
Da leitura da ementa acima transcrita poder-se-ia entender que referida Corte teria alterado o anterior posicionamento sobre o tema.
Contudo, a tese da necessidade de prévio exaurimento da via administrativa como condição de procedibilidade da ação penal no delito de apropriação indébita previdenciária não foi sustentada no referido julgamento, conforme trecho das notas taquigráficas da Sessão de Julgamento do Tribunal Pleno, ocorrida em 10 de março de 2008, que ora transcrevo:
De toda sorte, no caso específico, tratava-se de fato praticado por ex-prefeito e ex-gestor de Órgão Público municipal, e em relação ao qual o próprio Instituto Nacional da Seguridade Social - INSS informou estar SUSPENSA A EXIGIBILIDADE do crédito tributário em sede de procedimento administrativo.
Ademais, da leitura das notas taquigráficas depreende-se que, embora não constasse nos autos o motivo exato de tal suspensão, foi considerada pelos E. Ministros a possibilidade de retenção indevida, ou seja, de que o desconto da contribuição teria ocorrido por erro do empregador, de sorte que o valor não deveria, mesmo, ser recolhido ao INSS, mas devolvido aos segurados, o que estaria sendo discutido administrativamente, impedindo a entrega do numerário a quem de direito e afastando o crime de apropriação indébita.
4. Da autoria. A autoria do delito restou plenamente comprovada nos autos.
O apelante, tanto na fase indiciária (fl.20), quanto na judicial (fls.51/52), embora negue ter conhecimento dos débitos sobre os quais versam os autos, relata que, juntamente com o corréu, possuía poder deliberativo na empresa, administrando-a:
A ficha cadastral da empresa na Junta Comercial, de fls.18/23, atesta que em 19/03/1999 houve a alteração da titularidade, retirando-se os antigos sócios, com a admissão do apelante e do corréu como sócios.
As testemunhas de defesa (fls. 94/100 e 164) nada souberam informar quanto a quem gerenciava a empresa.
A tentativa do apelante de fugir da responsabilidade penal, atribuindo a autoria do delito inteiramente ao corréu não prospera. Isto porque a alegação de que o corréu teria retirado, na calada da noite, maquinário da empresa, inviabilizando o funcionamento desta, foi suscitada apenas em grau de recurso; em nenhum momento o apelante, em seus interrogatórios, aludiu a tais fatos, não tendo sido comprovados nos autos.
Todos esses fatos demonstram que o apelante possuía amplos poderes como administrador, inclusive para efetuar o repasse das contribuições previdenciárias, não se eximindo, pois, da culpabilidade do delito em tela.
5. Do dolo. Verifico, também, o dolo na conduta do denunciado, consubstanciado na vontade livre e consciente no sentido de deixar de repassar as contribuições. A conduta descrita no artigo 168-A, caput, do Código Penal é "deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no prazo e forma legal ou convencional".
Pela dicção legal, trata-se crime omissivo próprio (omissivo puro), que se consuma com a mera transgressão da norma ("deixar de repassar/recolher"), independentemente do resultado da conduta do agente ou qualquer outro efeito distinto da omissão em si mesma (v.g., auferir proveito patrimonial pessoal). Não se exige o dolo específico, consistente na vontade livre e consciente de ter a coisa para si (animus rem sibi habendi)
Daí ser lícito concluir que o elemento subjetivo do tipo descrito no artigo 168-A do Código Penal é o dolo genérico, assim entendido a vontade livre e consciente de descontar contribuição previdenciária da folha de salário dos empregados e deixar de repassar os valores à Previdência Social, não sendo necessário demonstrar que o apelante utilizou as contribuições não recolhidas em proveito próprio.
Esse entendimento encontra amparo na jurisprudência do E. Supremo Tribunal Federal:
5. Da inexigibilidade de conduta diversa. Melhor sorte não assiste ao apelante ao alegar a inexigibilidade de conduta diversa como causa supralegal de exclusão da punibilidade em razão de dificuldades financeiras. Para que caracterizem a excludente, essas aperturas devem ser de tal ordem que coloquem em risco a própria existência do negócio, uma vez que apenas a impossibilidade financeira devidamente comprovada nos autos poderia justificar a omissão nos recolhimentos.
Deve, ainda, ser esporádica, momentânea, e não uma situação habitual, sendo que a empresa deve utilizar todos os meios legalmente possíveis para tentar saldar sua dívida para com a Previdência.
Contudo, a defesa não se desincumbiu do ônus de provar o quanto alegado, nos termos do artigo 156, primeira parte, do Código de Processo Penal.
Embora o réu tenha sustentado que a empresa enfrentava problemas financeiros, não foi trazida aos autos a documentação comprobatória de que as dificuldades financeiras vivenciadas pela empresa, à época, tenham sido diferentes daquelas comuns a qualquer atividade de risco de modo a caracterizar a inexigibilidade de conduta diversa.
Anoto que o bem jurídico protegido é o patrimônio público, o patrimônio dos cidadãos que compõem o Sistema Previdenciário, não se admitindo o uso de dinheiro destinado ao custeio da Previdência Social como escusa para eventual dificuldade financeira do particular.
Comprovadas a materialidade e a autoria delitiva e ausente causa legal excludente de culpabilidade, a manutenção da condenação pela prática do crime descrito no artigo 168-A,§1º,inciso I, do Código Penal é de rigor.
6. Da dosimetria. A pena-base foi acertadamente fixada em 02 (dois) anos e 02 (dois) meses de reclusão, por lhe serem desfavoráveis as circunstâncias do artigo 59 do Código Penal, em especial as conseqüências do crime, que causaram prejuízo aos cofres públicos, no valor não atualizado de R$29.718,92 (vinte e nove mil, setecentos e dezoito reais e noventa e dois centavos).
A reprimenda corporal foi acrescida em 1/6 (um sexto), em virtude do reconhecimento da continuidade delitiva do artigo 71 do Código Penal, perfazendo 02 (dois) anos, 06 (seis) meses e 10 (dez) dias de reclusão, em regime inicial aberto, e ao pagamento de 14 (quatorze) dias-multa, no valor mínimo.
Mantenho o regime inicial, a pena pecuniária e o valor dos dias-multa, bem como a substituição da pena privativa de liberdade, nos termos fixados pela sentença, exceto quanto à destinação da pena de prestação pecuniária, que deve ser destinada à União Federal, de acordo com o entendimento desta Turma.
Posto isso, NEGO PROVIMENTO à apelação e DE OFÍCIO, destino a pena de prestação pecuniária à União Federal.
É o voto.
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Data e Hora: | 02/03/2012 16:10:34 |