D.E. Publicado em 30/01/2012 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação e, ex officio, reduzir o percentual da causa de aumento de pena derivada da transnacionalidade do tráfico para 1/3 (um terço), fixando a pena definitivamente em 6 (seis) anos, 9 (nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e o pagamento de 690 (seiscentos e noventa) dias-multa, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:
Trata-se de apelação criminal interposta por SANDRA BRIGANTINI, atualmente sob custódia na Penitenciária Feminina de Campinas/SP, contra sentença de fls. 180/186, que condenou a ré à pena de 7 (sete) anos e 9 (nove) meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado, e ao pagamento de 777 (setecentos e setenta e sete) dias-multa, no valor unitário de 1/30 do salário mínimo vigente à época dos fatos, por infração ao artigo 33, caput, c/c o artigo 40, inciso I, ambos da Lei nº 11.343/06.
Consta da denúncia (fls. 44/45) que, no dia 04 de março de 2009, na Rodovia Assis Chateaubriand, km. 337, município de Santópolis do Aguapei/SP, policiais militares abordaram um ônibus proveniente de Londrina/PR com destino a Araçatuba/SP. Após começarem a vistoriar as bagagens, notaram que uma das passageiras, a ré Sandra, aparentava sinais de nervosismo, razão pela qual foi retirada do veículo, constatando-se que transportava 1.015 g. (um mil e quinze gramas) de cocaína, em forma de tablete amarrado junto à sua perna esquerda, debaixo de sua saia.
A denúncia expôs ainda que, na Delegacia, a acusada confessou que comprara a droga em Salto do Guiará/Paraguai; que teria embarcado dois dias antes na cidade de Birigui/SP com destino a Londrina/PR onde tomou outro ônibus com destino a Salto do Guairá onde, na Rodoviária local, pagou cinco mil reais em dinheiro a uma mulher que ali a esperava e lhe entregou a droga, afirmando ainda que recebera o dinheiro para a compra de uma pessoa em Birigui, de quem não tem informações, a qual lhe pagaria a quantia de mil reais pelo trabalho.
Inconformada, a ré apelou. Nas razões de fls. 216/222, requer a reforma da sentença para que seja absolvida, sob a alegação de que agiu mediante coação moral irresistível exercida por um credor de seu falecido marido, que a obrigara a ir apanhar a droga.
Caso não alcance a absolvição, requer a aplicação, na dosimetria da pena, da atenuante genérica da confissão espontânea.
Contrarrazões às fls. 233/245, pela manutenção da sentença.
Em seu parecer, a Procuradoria Regional da República opinou seja negado provimento à apelação (fls. 243/245).
É o relatório.
À revisão.
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VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:
A absolvição pretendida pela apelante é inviável, tendo em vista que os elementos dos autos permitem atribuir-lhe seguramente a prática do delito previsto no artigo 33, caput, c/c o artigo 40, inciso I, da Lei 11.343/06.
A materialidade delitiva está consubstanciada pelo auto de apreensão (fl. 14), laudo de constatação (fl. 16) e laudo de Exame Toxicológico (fls. 22/23), segundo o qual os testes realizados nas amostras da substância apreendida foram positivos para cocaína, no peso de 1.015 g. (hum mil e quinze gramas).
Tampouco restam dúvidas acerca da autoria.
A ré foi presa em flagrante, na posse da droga trazida do Paraguai. Ao ser ouvida na fase inquisitorial, confessou detalhadamente a prática do crime. Confira-se trechos de suas declarações:
Tais declarações estão em consonância com os depoimentos das testemunhas de acusação que em juízo, segundo a sentença, foram uníssonas em relatar os fatos tais como descritos na denúncia e no auto de prisão em flagrante
O interrogatório judicial da ré foi realizado pelo sistema de áudio e vídeo. Segundo consta da sentença, em Juízo a ré modificou essa versão, dizendo que na verdade, foi pegar a droga no Paraguai para quitar uma dívida de seu ex-companheiro, falecido, com o traficante "Nelson" (carta de fl. 94/95 e interrogatório registrados em arquivo eletrônico audiovisual e preservado em mídia digital- fl. 158 e 162)"
A defesa, com base no interrogatório judicial da acusada, requer a absolvição, afirmando que praticou o crime sob coação moral irresistível do traficante, ao qual seu marido falecido devia dinheiro, de forma que tal fato justifica a absolvição, pois exclui a culpabilidade.
Não há como acolher a alegação da ré, de que teria sido vítima de coação exercida pelo indivíduo de nome "Nelson".
É certo que parte dos delitos são praticados tendo como causa coação moral que levam os autores a realizar condutas tipificadas no Código Penal de forma não espontânea, mediante ameaças irresistíveis provocados por terceiras pessoas, e que justificam a absolvição pela ausência de dolo ou exclusão da tipicidade ou de ilicitude, de forma que decorre a necessidade de se apreciar cuidadosamente os fatos para verificar o dolo, elemento subjetivo, a fim de solucionar a questão da forma mais adequada, prevista na Lei Penal.
Sabe-se também que o ônus da prova incumbe a quem a alega, e que a coação física ou moral, para ser aceita como excludente de culpabilidade, deve ser irresistível, inevitável e insuperável, devendo estar devidamente comprovada, por elementos concretos, a ocorrência de um perigo atual de dano grave e injusto não provocado por vontade própria ou que de outro modo o agente não poderia evitar, bem como a inexigibilidade de agir de forma diversa à exigida em lei, sob pena de tornar corriqueira a aplicação dessa excludente.
A respeito, confira-se alguns Acórdãos:
No caso, a defesa não se desincumbiu de provar a alegada coação, tendo em vista a ausência de provas da existência do suposto coator (Nelson), calcada exclusivamente no relato da apelante ao afirmar que essa pessoa lhe prometera impingir mal injusto e grave (sua morte ou a de seus familiares), caso não praticasse o delito.
Também não foram arroladas testemunhas que confirmassem essa versão, ou ainda que a apelante possuísse um companheiro já falecido que fosse usuário de drogas.
Por outro lado, caso houvesse provas da referida coação, não se poderia qualificá-la como irresistível a justificar a exclusão de culpabilidade, haja vista o fato de a ré ter tido a oportunidade de desistir da empreitada criminosa, relatando a suposta coação aos policiais que abordaram-na e que decerto lhe dariam a devida proteção. Assim, se ameaça houve, não foi atual, direta, inevitável ou irresistível.
Ademais, a palavra da ré não é merecedora de nenhum crédito, pois se contradisse nas ocasiões em que foi ouvida.
Consoante bem ressaltado nas contrarrazões:
Dessa forma, tem-se que o conjunto probatório carreado aos autos autoriza a conclusão segura de que a ré, na qualidade de "mula", levada pela perspectiva de lucro fácil, habilitou-se, voluntaria e conscientemente, para transportar drogas de um país a outro, razão pela qual mantenho a condenação.
DOSIMETRIA DA PENA:
Mantenho a pena-base como fixada, no mínimo legal (cinco anos de reclusão).
Na segunda fase da fixação da pena, a sentença reconheceu expressamente a atenuante da confissão, conforme se observa às fls. 184. Ocorre, porém, que, na mesma etapa, o MM. Juiz acertadamente também reconheceu a incidência da agravante prevista no artigo 61, I, do CP, tendo em vista a comprovação de que a ré é reincidente ( conforme consta da certidão de objeto e pé de fl. 55).
O artigo 67 do CP dispõe:
Referido dispositivo não determina que a compensação de circunstâncias atenuantes e agravantes se proceda uma por uma, conferindo ao Juiz discricionariedade para avaliar a importância jurídica de cada uma delas, procurando aproximar-se do limite indicado pelas circunstâncias preponderantes.
Assim sendo, correta a decisão do Juiz ao entender que a reincidência deveria figurar como circunstância preponderante, elevando a pena em um sexto.
Nesse sentido, confira-se os seguintes julgados:
Portanto, na segunda fase da fixação da pena, mantenho o acréscimo de um sexto à pena-base, que totaliza cinco anos e dez meses de reclusão.
Na terceira etapa, correta a majoração da pena pela aplicação da causa especial de aumento prevista no inciso I, do artigo 40, da Lei 11.343/06, tendo em vista a comprovação da transnacionalidade do tráfico, já que a droga proveio do Paraguai e foi introduzida no Brasil.
Quanto ao patamar eleito pelo Juiz ao aplicar essa causa de aumento de pena, observo que foi fixado em um terço sem a devida e suficiente fundamentação, deixando de indicar circunstâncias concretas que justificassem o aumento acima do mínimo legal, além das próprias elementares do tipo, em contrariedade com o preconizado pelo artigo 93, IX, da Constituição Federal, no sentido de que todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário deverão ser fundamentados.
Por outro lado, as causas de aumento devem ser calculadas pelas circunstâncias da própria causa, e não às do crime. Ademais, o artigo 40 da Lei 11.343/06 elenca em seus incisos um conjunto de causas de aumento de pena, estabelecendo o quantum variável de 1/3 a 2/3, de forma que, na incidência de apenas um inciso, não se justifica a elevação do acréscimo.
Portanto, neste ponto, penso ser razoável a exasperação da pena no mínimo legal (um sexto), considerando-se a natureza e quantidade da droga, a distância a ser percorrida, a rota planejada por mais de um continente e a forma de transporte, não estando evidenciadas outras circunstâncias que justifiquem o agravamento da causa de aumento.
Assim sendo, ex officio, reduzo o patamar dessa causa de aumento para um sexto, de forma que a pena da ré, anteriormente fixada em cinco anos e dez meses de reclusão, com esse acréscimo, resta fixada definitivamente em 6 (seis) anos, 9 (nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, mantido o regime inicial fechado para o cumprimento.
A pena de multa, dosada nas mesmas proporções, é fixada em 690 (seiscentos e noventa) dia-multa.
Também deixo de aplicar o benefício previsto no parágrafo 4º do artigo 33 da lei de drogas, e a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, considerando que a apelante é reincidente e a quantidade da pena.
Ademais, ainda que assim não fosse, a substituição não se mostra como medida social recomendável, diante do estímulo para a prática do tráfico de drogas, crime que causa grave lesão ao bem jurídico tutelado (saúde pública), não se mostrando como medida social recomendável e suficiente para a prevenção e repressão do delito.
Por fim, eventual ilegalidade na prisão em flagrante da ré, em virtude de não ter sido submetida a uma revista por policial feminina para a entrega da droga aos policias, ou conduzida a um local no qual pudesse retirar a droga de seu corpo sem que fosse observada, ainda que comprovado, poderia configurar eventual vício na prisão em flagrante que, contudo, restou superado pela prisão preventiva e a decorrente da condenação, devendo-se ressaltar que, caso haja provas suficientes, poderá a apelante demandar a responsabilização do Estado por eventual constrangimento ao qual foi submetida.
Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO e, EX OFFICIO, reduzo o percentual da causa de aumento de pena derivada da transnacionalidade do tráfico para um terço, fixando a pena definitivamente em 6 (seis) anos, 9 (nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e pagamento de (seiscentos e noventa) dia-multa.
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