D.E. Publicado em 08/05/2012 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a matéria preliminar arguida e, no mérito, dar provimento ao recurso da Justiça Pública e da Advocacia-Geral da União para reformar a r.sentença recorrida e condenar Pedro Rodovalho Marcondes Chaves Neto, como incurso no artigo 22, caput, da Lei nº 7.492/86, e no art. 299, do Código Penal, na forma do art. 69, do mesmo diploma, às penas de 06 (seis) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 600 (seiscentos) dias-multa com a fixação do regime semi-aberto para o cumprimento inicial da pena corporal imposta e decretar a perda do valor de US$ 3.000.000.00 (três milhões de dólares, produto do crime de evasão de divisas, em favor da União Federal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
Trago a presente Apelação Criminal novamente a julgamento por essa Colenda Quinta Turma, em face da determinação promanada da Sexta Turma do Egrégio Superior Tribunal de Justiça em Habeas Corpus nº 100.129/SP, de relatoria da Ministra Jane Silva que, em sessão de julgamento realizada em 05 de agosto de 2008, por unanimidade, concedeu a ordem para anular o julgamento da apelação unicamente no que toca a Pedro Rodovalho Marcondes Chaves Neto, permanecendo válido e eficaz com relação aos demais corréus, restando ainda prejudicado o pedido de redução de penas.
O V. Acórdão proferido na ação de habeas corpus veio redigido nos seguintes termos:
"PROCESSUAL PENAL - HABEAS CORPUS - EVASÃO DE DIVISAS - FALSIDADE IDEOLÓGICA - AJUIZAMENTO CONCOMITANTE DE OUTRA AÇÃO PENAL PELO CRIME DE OPERAÇÃO INDEVIDA DE ATIVIDADE FINANCEIRA - RECONHECIMENTO PELO MAGISTRADO SINGULAR DE CONEXÃO -JULGAMENTO CONJUNTO DAS CAUSAS - ABSOLVIÇÃO EM 1ª INSTÂNCIA - TRÂNSITO EM JULGADO DA DECISÃO QUANTO AO ÚLTIMO DELITO - APELAÇÃO DA ACUSAÇÃO QUE ABARCOU APENAS OS DEMAIS - ARQUIVAMENTO DA SEGUNDA AÇÃO PENAL - PEDIDO DE APENSAMENTO DEDUZIDO EM CONTRA-RAZÕES RECURSAIS DEFENSIVAS - EXISTÊNCIA DE PROVAS NOS OUTROS AUTOS QUE APROVEITASSEM À DEFESA - REQUERIMENTO NÃO EXAMINADO - OFENSA ÀS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO, COROLÁRIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL - NULIDADE FLAGRANTE - REDUÇÃO DAS PENAS - PEDIDO PREJUDICADO - ORDEM CONCEDIDA.
1. Sendo duas as ações penais ajuizadas contra o agente e havendo reconhecimento judicial de que ambas seriam conexas, circunstância que resultou, inclusive, em alegações finais e sentenças absolutórias prolatadas conjuntamente, procede o pedido defensivo de apensamento dos feitos para supedanear o julgamento da apelação da acusação interposta em apenas uma das ações.
2. Cabia à Corte de 2º Grau, caso entendesse inviável o pedido em questão, afastá-lo expressamente, motivando-se em dados concretos do processo, mas não se limitar a afirmar serem compatíveis ambas as acusações.
3. Patente o prejuízo suportado pela defesa, eis que potenciais provas utilizadas pelo Juízo singular para estear a sentença absolutória deixaram de ser analisadas pelo Tribunal de origem ao prolatar acórdão condenatório.
4. Ordem concedida para anular o julgamento da apelação unicamente no que toca ao paciente, permanecendo o acórdão válido e eficaz com relação aos demais co-réus. Prejudicado o pedido de redução das penas".
É o relatório.
Dispensada a revisão.
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VOTO
Por primeiro, esclareço que foi procedido o apensamento da ação penal nº 1999.61.81.007353-2 à presente ação e submetidas à análise por parte desse relator, apenas em relação a Pedro Rodovalho Marcondes Chaves Neto, em atendimento ao pleito requerido pela defesa em contrarrazões recursais e ao determinado pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça, ações que serviram de supedâneo ao julgamento ora realizado.
A Justiça Pública denunciou JOSÉ EDUARDO CORREA TEIXEIRA FERRAZ, FÁBIO MONTEIRO DE BARROS FILHO e PEDRO RODOVALHO MARCONDES CHAVES NETO, como incursos no artigo 22, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86 e artigos 171 e 299, c.c. o artigo 29, todos do Código Penal, nos seguintes termos:
"O Ministério Público Federal, pela Procuradora da República signatária, no âmbito de suas atribuições constitucionais e legais, vem, à presença de V. Excia, oferecer DENÚNCIA contra FÁBIO MONTEIRO DE BARROS FILHO, JOSÉ EDUARDO CORREA TEIXEIRA FERRAZ e PEDRO RODOVALHO MARCONDES CHAVES NETO, qualificados nos autos (fls. 08, 760, 1443 e 2184), pelos motivos que, a seguir, passa a expor.
Os fatos adiante narrados têm origem em representação criminal, inaugurada perante este Órgão Ministerial, instruída, inicialmente, por documentos obtidos a partir da quebra de sigilo bancário judicialmente determinada neste feito, assim como no Processo de n° 1.99945000470 (IPL 01.070/94), instaurado perante a Justiça Federal de Brasília (fls. 229), pelos quais apuraram-se os seguintes fatos:
1. Em data de 26.07.1993, a empresa CONTREC - Comércio, Importação e Exportação Ltda., firmou, junto ao Banco de Brasília S/A, o contrato de câmbio de n° 93/000951, no valor de US$ 3.000.000,00 (três milhões de dólares), equivalente, à época, a CR$ 201.525.000.000,00 (duzentos e vinte e cinco bilhões, novecentos e sete milhões de cruzeiros) (fls.256/259 e 279/284).
2. A liquidação do referido contrato foi feita em 26.7.93, pela própria CONTREC (fls. 285/286), a partir de um aporte financeiro proveniente da empresa Cartola Distribuidora de Transportes e Bebidas Ltda. (fls. 108,188,256,257), no valor supra referido, mediante a emissão do cheque n°403.251 - BICBANCO, em favor da CONTREC, que veio a ser depositado no Banco Noroeste, em sua conta corrente n° 503963, Ag. 110 (fls.235 a 244). Com este recurso, a CONTREC, na mesma data, quitou a operação de câmbio no BRB (Banco de Brasília S.A.), mediante débito em sua conta corrente (fls. 260), por meio do cheque administrativo n° 903.789 (fls. 263).
3. Logo no dia seguinte, em data de 27.7.93, a Construtora Incal S.A. enviou à CONTREC, por intermédio do Banco Cidade S/A, conta-corrente n° 40982-90, em São Paulo, uma ordem de pagamento no valor de CR$ 225.907.000.000.00. representando, à época, U$3.297.527,29 (três milhões de dólares) (fls. 108,121,196,273/278,). O documento consubstanciado às fls. 271 comprova o recebimento do crédito pela CONTREC, através da conta-corrente n° 006718-68, Ag. 008, de que é titular junto ao Banco Cidade, em Brasília, segundo a ordem de pagamento de n° 057781.
4. Na mesma data, em 27.7.93, a CONTREC, pretendendo devolver à empresa Cartola os recursos emprestados, comprou o cheque administrativo n° 712274, no Banco Cidade de Brasília, no valor de CR$ 204.890.467.500,00 (fls. 245,256), que foi, a final, depositado na conta-corrente de n° 14.51120-6, pertencente à Cartola, junto ao BICBANCO, em Brasília, cobrindo o saldo devedor existente a partir do empréstimo desta empresa à CONTREC no valor de CR$ 201.525.000.000,00, em 26.7.93 (fls. 246,247).
Com efeito, analisados pela Receita Federal os extratos bancários de 27.7.93, relativos às contas correntes da CONTREC junto ao BICBANCO (fls. 231), foram nelas localizados débitos e créditos, que uma vez somados correspondem a este exato valor.
5. Pela análise da documentação bancária, submetida à apreciação e conclusão do Banco Central do Brasil, apurou-se que foi realizada uma transferência triangular ao exterior de recursos pertencentes à Construtora Incal, acobertada por um suposto contrato de câmbio firmado pela CONTREC, o qual, ao que tudo indica, foi inteiramente simulado. Ocorre que referido contrato, juntamente com as correspondentes declaração e guias de importação, que, por sua vez, mencionam a aquisição (supostamente superfaturada) de livros técnicos, em transação com a empresa Manaus Trading Corporation, sediada em Miami, E.U.A. (287/288), prestou-se, em verdade, para desaguar, em contas estrangeiras, uma enorme quantidade de recursos provenientes de empresas brasileiras, dentre as quais Construtora Incal S.A.
6. De outro lado, releva destacar flagrante divergência quanto à declarada finalidade da transferência à CONTREC do referido numerário por parte dos representantes legais da Construtora Incal S.A. e quanto à operação que formalmente foi realizada. Tal se constata, comparando-se a documentação comprovante do contrato de câmbio firmado pela CONTREC com os depoimentos já prestados por Fábio Monteiro de Barros e Pedro Rodovalho em sede policial, no bojo do supra mencionado IPL n° OL070/94/SR/DF.
De fato, às fls. 6, pode-se inferir, a partir das declarações prestadas pelo próprio FÁBIO MONTEIRO DE BARROS FILHO, Diretor Presidente da Construtora Incal S.A ., que, em data de 27.7.93, a Construtora efetuou, por meio do Banco Cidade S.A, onde era titular da conta corrente de n° 40.982-90, junto à Agência Central, em São Paulo/SP, uma ordem de pagamento de n° 216.258, no valor de CR$ 225.907.000.000,00, em favor da empresa CONTREC - Comércio, Importação e Exportação Ltda.(fls. 274,277).
7. Referida transferência fora liquidada através da agência de Brasília, código 008-6, e teria se dado em razão de um contrato de gestão financeira com aplicação em reais na INTERNATIONAL REAL ESTATE INVESTMENTS COMPANY S/A, sediada no Panamá e representada pelo Sr. PEDRO RODOVALHO MARCONDES CHAVES NETO (fls.63), sendo aquele valor parte de um total de investimento no valor de CR$ 333.383.972.060,00 na mesma Instituição Financeira.
Por objeto, teria o referido contrato de gestão "investimentos no estrangeiro, no setor imobiliário de construção", assertiva esta que não corresponde ao objeto do "instrumento particular de gestão de investimentos" de fls. 21 e seus aditivos.
8. Iniciado procedimento fiscal junto à "CONSTRUTORA IKAL" (fls. 332/339), constatou-se que tal empresa, improcedentemente, contabilizou a operação com a "CONTREC" realizada no dia 27.07.93, como "INVESTIMENTOS NO EXTERIOR", como se houvera sido com a empresa "INTERNATIONAL REAL STATE COMPANY S.A:\ sediada no Panamá.
Para justificar o lançamento contábil assim efetuado, apresentou, em sede policial, recibo firmado por PEDRO RODOVALHO MARCONDES CHAVES NETO, no qual declara falsamente que entregou, àquela Companhia estrangeira, o valor de Cr$ 225.907.000.000,00, quando, em verdade, o beneficiário desses recursos foi a empresa "CONTREC", de Brasília (DF).
9. Não obstante tratar-se de um vultoso empreendimento, estranhamente Fábio Monteiro de Barros Filho registrou desconhecer a pessoa de sua empresa que teria tratado sobre o investimento dos U$ 3.297.527,29 com Pedro Rodovalho, e, assim, também, a razão de a operação haver-se processado através da empresa CONTREC, "da qual nunca ouviu falar". Por fim, embora asseverando a realização pela Construtora Incal daquele investimento junto à empresa panamenha, com a correspondente transferência do apontado numerário, afirmou não saber quais os meios utilizados para a saída destes recursos ao exterior, consignando que sua empresa fez investimentos com base no referido contrato de gestão durante o ano de 1992 (???).
10. Em verdade, soam inteiramente inverídicas as assertivas supra registradas, vez que, a qualquer homem de bom senso e discernimento mediano custaria a crer que o principal responsável legal de uma Construtora, qual seja, o seu Diretor Presidente, desconhecesse a remetente e destinatária de US$ 3.297.527,29. saídos de seus cofres, por meio de Ordem de Pagamento. Tampouco é de se admitir que ignorasse a forma como o dinheiro de sua empresa saiu do país, tanto mais em se tratando de tão significativo pagamento!
11. A respeito, cumpre consignar-se que a Construtora Incal S.A - posteriormente denominada Construtora Ikal Ltda. - foi destinatária dos recursos repassados pelo Tribunal Regional do Trabalho, e constituída quando da construção do fórum trabalhista em São Paulo, tão logo havia sido celebrada a contratação da Incal Incorporações S.A .
12. Incontestável, ainda que, se alguma empresa realiza investimentos no exterior, certamente deve fazê-lo com o conhecimento e autorização do Banco Central do Brasil, de forma nominal e oficialmente documentada, bem como nos estritos moldes das regras financeiras existentes para investimentos no exterior por pessoa jurídica (fls. 314/331), de nada valendo os registros contábeis ou documentos particulares que mantenha em seus arquivos. De outro lado, não se justifica que, pretendendo remeter dinheiro ao exterior, com destino certo e conhecido das autoridades, se utilizasse de interposta pessoa - que afirma sequer conhecer - para fazê-lo, omitindo, no contrato de câmbio o nome da empresa que efetivamente enviou o numerário ao exterior.
13. Os documentos de fls. 12 e fls. 14 não endossam a justificativa apresentada, no sentido de que houve expressa solicitação pela própria International Real Estate Investments Company para que o referido valor fosse enviado através de uma ordem de pagamento à CONTREC. Esta solicitação, tão-somente, mencionada naqueles registros (de 96/97), não legitimaria simplesmente que milhões de dólares, objeto de um suposto contrato de gestão financeira entre empresas sediadas, uma no Brasil e outra no exterior, fossem remetidos por meio de terceira pessoa, através de contrato de câmbio (para fins de importação), firmado apenas em nome desta última.
14. O depoimento de PEDRO RODOVALHO MARCONDES CHAVES NETO, também em sede policial, registra, num primeiro momento, seu desconhecimento, como aparente representante e procurador da International Real Estate Investments Company S/A, sediada no Panamá, com relação aos documentos bancários relativos à transferência de CR$ 225.907.000.000,00, por parte da Construtora Incal, através do Banco Cidade para a empresa CONTREC - Comércio, Importação e Exportação Ltda.
Por outro lado, incidindo em flagrante contradição e demonstrando visível conluio na prática de remessa das divisas ao exterior, assevera que emitiu os documentos de fls. 14,15, a pedido de FÁBIO MONTEIRO DE BARROS "para que confirmasse a solicitação de transferência de valores para a CONTREC".
Estranhamente, ainda, não obstante sua condição de suposto procurador daquela instituição financeira, não soube precisar quais os negócios ou interesses operados pela International Real Estate Investments Company S/A, supondo que a transferência daqueles valores teria ocorrido para o fim de a CONTREC vir a participar do aumento de seu capital (com valores da Incal ???), quando bem sabe que o contrato de gestão financeira prevê o envio de recursos pela Incal à Administradora panamenha, para que esta efetuasse aplicações no mercado de capitais no exterior (cf. fls. 21). De outro lado, afirma, em contradição, que a Instituição Financeira nenhum relacionamento comercial possuía com a CONTREC, não sabendo porque foi destinatária dos valores transferidos pela Construtora Incal, nem tampouco quem determinou a emissão da ordem de pagamento correspondente.
Ante o relatado, depreende-se, de pronto, latentes divergências entre os depoimentos preliminares de FÁBIO e PEDRO RODOVALHO, em especial, no tocante à finalidade da remessa financeira.
15. Em verdade, o alegado investimento feito pela Construtora Incal junto àquela Instituição não foi comprovado por nenhum documento hábil, além do mencionado contrato de câmbio, que, a princípio -firmado para fins de importação - tomou possível o envio, ou melhor, o típico desvio de divisas brasileiras ao exterior.
16. É inegável que PEDRO RODOVALHO possuía efetivo conhecimento da mencionada transferência daqueles valores, não sendo de aceitar-se que, na qualidade de aparente representante da Instituição no Brasil e em qualquer parte do mundo (fls. 63), ignorasse qualquer relacionamento comercial ou financeiro supostamente existente entre esta e a CONTREC, envolvendo a Construtora Incal S.A., principalmente depois de remeter-lhe tão significativos valores.
Registre-se, ademais, que, uma vez atendendo a pedido de FÁBIO MONTEIRO DE BARROS - justamente à época em que foi inquirido em sede policial - no sentido de expedir documento asseverando que a Instituição, de fato, solicitou a transferência daquela vultosa quantia - no mínimo, revela que tinha conhecimento quanto à triangulação na remessa do dinheiro ao exterior (fls. 14 e 18).
Mas, mesmo desconhecendo o real motivo deste envio, é fato que assentiu voluntária e conscientemente à solicitação de FÁBIO MONTEIRO DE BARROS, na formulação de uma declaração ideologicamente falsa, três anos após a realização da remessa daqueles recursos.
17. Somaram-se, portanto, para mais esta prática criminosa, consistente na falsa declaração quanto à solicitação, por parte da Instituição Financeira, para que a Incal lhe enviasse o valor daquela aplicação, por meio de uma ordem de pagamento à CONTREC, além de mencionar-se que os recursos se destinavam a investimentos no exterior.
18. Fato é que a remessa de valores ao exterior, pela Incal, a título de investimentos, de nenhuma forma, foi efetuada pelas vias legais e normas cambiais a que estão sujeitas as pessoas físicas e jurídicas que operem atividades financeiras, e, muito menos, mediante a expressa autorização por parte do Banco Central.
Com efeito, a documentação acostada às fls. 314 a 331, exibe Circulares expedidas pelo Banco Central de atendimento obrigatório por parte das pessoas jurídicas e instituições financeiras que pretendam realizar investimentos no estrangeiro.
A partir delas, extrai-se, claramente, que a Incal jamais poderia investir no exterior através de contrato câmbio voltado para operação de importação, remetendo, por meio dele, o correspondente "pagamento". Ademais, à época em que a remessa foi efetuada, qualquer investimento acima de um (l) milhão de dólares necessitaria, para ser efetivado, de autorização prévia por parte do Banco Central.
Portanto, a violação de tais normas, com as conseqüentes implicações penais, deveu-se em razão de a Incal haver se utilizado de mecanismos inteiramente inadequados para realizar investimentos no exterior, não celebrando os contratos financeiros necessários, com os correspondentes registros e a competente autorização junto àquele Órgão Fiscalizador.
19. Por fim, cumpre ressaltar que nenhum documento existe, no sentido de que referida quantia efetivamente ingressou nos cofres da Instituição panamenha, o que, inclusive, seria impossível, considerando-se que, segundo apurado pela INTERPOL, a companhia não existe fisicamente, apenas constando de registros!
Neste sentido, concluiu a INTERPOL, em diligência realizada no exterior, que a REAL ESTATE INVESTMENTS COMPANY S.A NÃO REALIZA OPERAÇÕES COMERCIAIS NO PANAMÁ, NÃO EXISTE FISICAMENTE, SOMENTE ESTÁ REGISTRADA (cf fls 83)
Não é de se crer, pois, que o investimento aparentemente encaminhado, apenas virtual ou contabilmente, a uma Instituição Financeira fantasma, seria aplicado no ramo de construção imobiliária, segundo afirmado pelo Representante da Incal.
20. O conluio entre FÁBIO MONTEIRO e PEDRO RODOVALHO vem igualmente atestado pelo cruzamento de informações obtido a partir de rastreamento bancário efetuado pelo Banco Central.
Segundo "proposta de abertura de conta-corrente de pessoa jurídica", junto ao Banco Itaú S.A ., datada de 15.4.92, FÁBIO MONTEIRO DE BARROS FILHO consta como responsável no País pela INTERNATIONAL REAL ESTATE INVESTMENTS COMPANY S.A. , inclusive para movimentar sua conta bancária de não residente no país (CC-5). Os registros na mesma conta demonstram, ainda, que, FÁBIO, nela efetuou um depósito de CR$ 1.200.000.000,00.
Disto, depreende-se, igualmente, a falsidade ideológica dos documentos que indicam ser PEDRO RODOVALHO MARCONDES CHAVES NETO o procurador ou o representante legal daquela financeira em qualquer parte do mundo, desde 1992.
Quanto ao mais, pode-se, no mínimo, concluir-se pela estreita relação econômico-fínanceira entre ambos, que se aproveitaram da referida Instituição, como fachada, para a remessa dissimulada de divisas ao exterior, à revelia de toda a legislação regente da espécie.
21. Inafastável, ainda, a conclusão acerca da efetiva participação de JOSÉ EDUARDO CORRÊA TEIXEIRA FERRAZ, no tocante à remessa fraudulenta de dinheiro para fora do país, assim como na falsidade ideológica supra referida.
É que, na qualidade de sócio-gerente, Diretor Vice-Presidente e Diretor Financeiro da então Construtora Incal S.A. (fls. 19,21,22), e, nesta condição, sabedor dos pagamentos recebidos e efetuados pela empresa, certamente tinha conhecimento do destino do capital e lucros da Construtora, bem como da documentação comprovante de sua remessa a terceiros, mormente em se tratando de U$S 3.297.527,29.
Ademais, ao lado de Fábio Monteiro de Barros Filho e Pedro Rodovalho Marcondes Chaves Neto, além de subscrever os contratos de gestão e demais instrumentos particulares constantes dos autos, inclusive para fins de aplicação financeira junto à "International Real Estate Investiments Company", igualmente foi responsável pela remessa do referido numerário à "CONTREC", razão pela qual a conclusão acerca de seu pleno conhecimento e participação nas condutas delituosas ora descritas.
Em suma, os autos reúnem elementos fortemente indicativos de uma operação financeira triangular, realizada em conluio para facilitar a saída simulada de recursos pertencentes à Construtora Incal S.A, podendo-se notar, a partir dos documentos e depoimentos previamente colhidos, uma engenhosa tentativa para ocultar a real origem dos recursos, inclusive com o envolvimento inicial da empresa "Cartola Distribuidora de Transportes e Bebidas Ltda.".
22. O laudo contábil de fls. 85 e seguintes registra a realização de toda a movimentação financeira ora descrita, que resultou no envio camuflado, pela Construtora Incal, de mais de três milhões de dólares ao exterior (fls. 108 e anexos), inclusive em período coincidente com a remuneração que sabidamente vinha recebendo por parte do Tribunal Regional do Trabalho.
A partir deste documento, infere-se que a CONTREC prestou-se à condição de empresa "laranja", para a remessa ilegal de milhões de dólares ao estrangeiro, em favor de diversas empresas, utilizando-se, para tanto, do expediente de contratos de câmbio, para fins de importação, os quais acabaram por servir de manto para disfarçar e legitimar os envios efetuados, sem a identificação dos reais emitentes dos recursos nacionais, consoante largamente apurado no IP n° 1.99945000470 (DF).
23. Os documentos de fls. 170, 279/313 emitidos pelo BACEN registram a informação de que a referida operação de câmbio de n° 93/000951 realizada pela CONTREC, com recursos provenientes da Construtora Incal S.A., teve por objeto uma IMPORTAÇÃO de livros, em transação com a empresa "MANAUS TRADING CORPORATION", sediada em Miami, nos Estados Unidos da América. Nada, portanto, que ver com operação de investimentos em empresa panamenha, no ramo de construção imobiliária!!!
24. De outro lado, inafastável a conclusão de que o Banco Central do Brasil foi induzido em erro, tanto pelos representantes da Incal, quanto pelos da CONTREC, visto que levado a crer que, de fato, se realizava um contrato de câmbio para efetiva importação de mercadorias, quando, em verdade, por intermédio deste, divisas brasileiras pertencentes a terceiros foram transferidas para fora do território nacional. Assim é que a operação bancária serviu como expediente escuso e engenhoso, com aparência de legalidade, representando, na prática, artifício financeiro para viabilizar vultosa evasão de moeda, sem expressa autorização e conhecimento por parte da Autarquia.
Uma vez utilizando-se, artificiosamente, de um Órgão oficial e único legitimado a permitir este tipo de operação, ludibriando-o, para o fim de obterem vantagem ilícita em proveito próprio, incidiram os referidos representantes na figura típica do estelionato, camuflado pela roupagem de uma regular operação financeira, cuja real natureza o próprio Banco Central trouxe à evidência.
Releva notar-se que a conduta supra descrita não se resumiu ao ato de não declarar a saída de moeda ou divisas ao exterior, tal como expresso no artigo 22, parágrafo único, da Lei 7.492/86. Mas o Banco Central foi enganosamente envolvido na operação de câmbio, para endossar oficialmente a remessa ao estrangeiro de recursos pertencentes à Incal, por meio de interposta pessoa.
25. Relatados os fatos, com base na documentação que acompanha a presente, tem-se por certo que FÁBIO MONTEIRO DE BARROS FILHO e JOSÉ EDUARDO FERRAZ, representantes legais da CONSTRUTORA INCAL S.A., pré-ajustados e com unidade de desígnios remeteram, em dólares, U$ 3.297.527,29 ao exterior , com a sutil e ardilosa colaboração de PEDRO RODOVALHO MARCONDES CHAVES NETO, e por intermédio da empresa denominada CONTREC - Comércio, Importação e Exportação Ltda., sem nenhuma autorização do Banco Central, além de desatenderem a outros requisitos exigidos pela Consolidação das Normas Cambiais a que estão submetidas as pessoas físicas e jurídicas, sejam ou não instituições financeiras.
26. Efetivamente, os representantes legais da CONSTRUTORA Incal S.A. não se utilizaram do mecanismo adequado para realizar investimentos no exterior, sendo indispensável que possuíssem o competente contrato financeiro registrado perante aquele Órgão, além de sua autorização para remeterem ao exterior quantias acima de um milhão de dólares. Foi, portanto, visivelmente ilegal e dissimulado, o procedimento adotado pelos dirigentes da Incal, no sentido de investirem capital brasileiro em suposta empresa sediada no estrangeiro, remetendo ao exterior, por interposta pessoa, pagamentos fundados em operação de importação.
Para tanto, primeiramente, forjaram documentação ideologicamente inidônea, que consubstancia declarações de pedidos de remessa e de investimentos inexistentes, além de identificar, como procurador e representante legal, no exterior e no Brasil, de Instituição Financeira estrangeira ( fisicamente inexistente), pessoa diversa daquela mencionada como seu verdadeiro representante legal, em documento bancário, que a revela como sendo o próprio representante da INCAL, Fábio Monteiro de Barros. Este, atuando, efetivamente, como procurador daquela Instituição no Brasil, movimenta livremente sua conta (de empresa não-residente), certamente para ter facilitado o escoamento ao exterior de aportes de capital da Construtora Incal S.A.
Em segundo, utilizaram-se de expediente fraudulento, consistente na realização de contrato de câmbio simulado, em nome da CONTREC, firmado "para o fim de importação de mercadorias", quando, em verdade, a remessa dos U$3.000.000,00, pelos representantes da Incal, teve finalidade inteiramente diversa daquela documentada pela empresa CONTREC.
Por fim, valeram-se dos serviços e procedimentos autorizados pelo Banco Central, induzindo-o em erro ao endossar operação de câmbio fraudulento em proveito da "Incal" e de seus representantes legais.
Diante do exposto, o Ministério Público Federal denuncia FÁBIO MONTEIRO DE BARROS FILHO, JOSÉ EDUARDO FERRAZ, e PEDRO RODOVALHO MARCONDES CHAVES NETO, como incursos nas penas do parágrafo único do artigo 22 da Lei 7492/86 e dos artigos 171 e 299, c/c artigo 29 do Código Penal, em concurso material, requerendo a instauração da competente ação penal, com citação e interrogatório dos requeridos, processando-se o feito nos seus demais termos, até final condenação, ouvindo-se as testemunhas abaixo arroladas".
Esclareço que na ação penal sob nº 1999.61.81.007353-2 constante do apenso, Pedro Rodovalho Marcondes Chaves Neto foi denunciado como incurso no art. 16 da Lei nº 7.492/86 e absolvido da acusação, decisão que transitou em julgado sem recurso interposto pela acusação.
Naqueles autos, a denúncia veio ofertada nos seguintes termos:
"Em 13 de maio de 1992, os representantes legais da Construtora Ikal Ltda. assinaram um contrato de 'gestão de investimentos e outras avenças' com a empresa 'INTERNATIONAL REAL STATE INVESTIMENTS COMPANY S.A, sociedade constituída na cidade (SIC) do Panamá sob escritura nº 7.691, de 06 de agosto de 1981, estando a mesma representada pelo denunciado, o qual figura na qualidade de procurador da citada sociedade.
Consoante o avençado, a aludida construtora repassa valores à 'INTERNATIONAL REAL STATE', com o objetivo de que esta aplique os valores em 'operações com títulos e valores mobiliários realizadas em bolsas de valores, ou em operações com mercadorias realizadas em bolsas de mercadorias, sempre em mercados internacionais à vista, a termo e a futuro'. O prazo de duração do contrato expirará apenas em 31.01.2000.
As vultosas operações de captação de recursos, implementadas por aditivos contratuais celebrados pelo denunciado e pelos representantes legais da 'CONSTRUTORA INCAL S.A', atual 'CONSTRUTORA IKAL LTDA,', encontram-se demonstradas por meio de inúmeros recibos também firmados pelo acusado (fls. 192/208)
Impende observar que, conforme informação prestada pelo Banco Central às fls. 324, a empresa 'INTERNATIONAL REAL STATE INVESTIMENTS COMPANY S.A' não possui autorização, junto a aquela autarquia, para funcionar, estando, deste modo, legalmente impedida de efetuar captação de recursos para aplicação no mercado financeiro, seja interno, seja externo.
Assim, resta claro que, sem a devida autorização, a indigitada sociedade operou na captação, intermediação e gestão de recursos colhidos de terceiro, caracterizando a prática de atividades típicas de instituição financeira.
Dessa forma, tem-se que o denunciado, de forma livre e consciente, na qualidade de procurador da empresa 'INTERNATIONAL REAL STATE INVESTIMENTS COMPANY S.A , concorreu para que, sem a devida autorização, instituição financeira operasse, praticando, assim, a conduta tipificada no art. 16 da Lei 7.492/86 (fls. 2/4)". (fls.802 do apenso).
Feita a necessária transcrição, verifica-se que a denúncia ofertada pelo Ministério Público Federal, dentre outros fatos, narra que os acusados FÁBIO MONTEIRO DE BARROS FILHO e JOSÉ EDUARDO CORRÊA TEIXEIRA FERRAZ, representantes legais da CONSTRUTORA INCAL S.A., pré-ajustados e com unidade de desígnios, teriam remetido ao exterior U$ 3.000.000,00 (CR$ 201.525.000.000,00), com a colaboração de PEDRO RODOVALHO MARCONDES CHAVES NETO e por intermédio da empresa denominada CONTREC - Comércio, Importação e Exportação Ltda., sem nenhuma autorização do Banco Central, bem como em desatendimento a outros requisitos exigidos pela Consolidação das Normas Cambiais a que estão submetidas as pessoas físicas e jurídicas, sejam ou não instituições financeiras.
Para a realização da remessa ilegal de divisas, a CONTREC firmou um contrato simulado de câmbio para fins de importação de mercadorias, respeitante à compra de livros técnicos superfaturados, justamente para permitir fossem os recursos enviados para o exterior, sendo que o valor da operação, no dia seguinte ao daquele em que foi firmado o contrato de câmbio, veio a ser repassado à CONTREC pela Construtora Incal, através de uma ordem de pagamento, no valor de U$ 3.297.527,29, através do Banco Cidade S/A, conta corrente nº 40982-90, em São Paulo, em data de 27.7.93.
Para justificar a transferência de valores da Construtora Incal para a CONTREC, seus representantes legais buscaram vincular essa operação a um contrato de gestão financeira com aplicação em reais na INTERNATIONAL REAL ESTATE INVESTMENTS COMPANY S/A, sediada no Panamá e representada pelo Sr. PEDRO RODOVALHO MARCONDES CHAVES NETO, que consubstanciaria, em suma, investimentos no estrangeiro no setor imobiliário da construção, o que não estaria a corresponder ao instrumento contratual apresentado para tanto.
A remessa de valores à CONTREC, ocorrida no dia 27.07.93, foi contabilizada, inadvertidamente, pela Construtora IKAL como investimentos no exterior com a empresa INTERNATIONAL REAL ESTATE INVESTMENTS COMPANY S/A, sendo que, para justificar esse lançamento contábil, PEDRO RODOVALHO MARCONDES CHAVES NETO declarou falsamente ter entregue o valor de CR$ 225.907.000.000,00 à essa companhia estrangeira, quando em verdade, o beneficiário dos recursos foi a CONTREC, isto três anos após a realização da remessa daqueles recursos para o exterior.
A Construtora Incal S.A. - posteriormente denominada Construtora Ikal Ltda- ., foi destinatária dos recursos repassados pelo Tribunal Regional do Trabalho e constituída quando da construção do fórum trabalhista em São Paulo, tão logo havia sido celebrada a contratação da Incal Incorporações S.A.
Narra a exordial acusatória que os apelados forjaram documentação ideologicamente inidônea, consubstanciada nas declarações de pedidos de remessa e de investimentos inexistentes, além de identificar como procurador e representante legal, no exterior e no Brasil, de Instituição Financeira estrangeira (fisicamente inexistente), pessoa diversa daquela mencionada como seu verdadeiro representante legal, em documento bancário, que a revela como sendo o próprio representante da Incal, Fábio Monteiro de Barros.
Ainda os acusados utilizaram-se de expediente fraudulento, consistente na realização de contrato de câmbio simulado, em nome da CONTREC, firmado para o fim de importação de mercadorias, quando, em verdade, a remessa dos U$ 3.000.000,00, pelos representantes da Incal, teve finalidade inteiramente diversa daquela documentada pela empresa CONTREC.
A conduta penalmente punível prevista no 'caput' do artigo 22 da Lei nº 7.492/86 assim está expressa : "Efetuar operação de câmbio não autorizada, com o fim de promover evasão de divisas do País" e indubitavelmente, os atos teriam sido praticados com o fim de viabilizar a operação de câmbio, visando a remessa ilegal de valores para o exterior através de operações de câmbio desautorizadas, efetuadas com o especial fim de agir de promover a evasão de divisas".
Em relação ao crime de falsidade ideológica, dispõe o artigo 299, 'in verbis' :"Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante."
Os fatos vieram minuciosamente descritos na denúncia, tornando-a apta ao desencadeamento da ação penal, conforme dispõe o art. 41 do Código de Processo Penal, propiciando ao réu Pedro o regular exercício da defesa.
Passo ao exame das razões recursais apresentadas pelo Ministério Público Federal em relação a Pedro Rodovalho Marcondes Chaves Neto, lembrando que o "parquet" sustenta que os elementos de convicção existentes nos autos autorizam a condenação do réu no tocante aos crimes de evasão de divisas e falsidade ideológica, estando correta a absolvição no tocante ao crime de estelionato, tendo em vista tratar-se de crime-meio para os demais, restando, portanto, por eles absorvido, aplicando-se o princípio da consunção.
Alega a Justiça Pública que, ao contrário do sustentado na r. sentença absolutória, a utilização de cópias não autenticadas, em virtude de terem sido extraídas por autoridade que possui fé pública possuem validade como prova e estão alicerçadas por provas documentais e testemunhais que demonstram sobejamente as condutas narradas na denúncia e imputadas ao apelado, expressas tanto na remessa ilegal de valores ao exterior e ocorrência de falsidade ideológica como mecanismo para alcançar a efetivação da transferência ilegal de vultosos valores ao estrangeiro.
Nesse sentido, destaca que a prova produzida demonstra que o contrato de câmbio nº 93/000951 foi realizado com base em aquisição simulada de mercadorias oriundas do exterior, havendo prova concreta de que os valores enviados para o exterior para o suposto pagamento deste contrato foram remetidos de forma ilegal, além de que, posteriormente, houve a falsificação ideológica de documentos para o fim de ocultar a evasão de divisas.
No mesmo sentido foi a manifestação da Advocacia-Geral da União, na qualidade de assistente da acusação (fls. 2086/2104).
Foram apresentadas as contra-razões recursais pelo apelado Pedro Rodovalho Marcondes Chaves Neto.
Alega, em síntese, a defesa que o recorrido não possui personalidade condizente com a práticas ilícitas. Argúi preliminar de inépcia da denúncia, considerando a inobservância dos requisitos legais previstos no art. 41 do Código de Processo Penal.
No mérito, sustenta a manutenção do decreto absolutório. Afirma que a Real Estate Investments é uma sociedade offshore e que nessa qualidade tinha por instrumento legítimo a realização de determinadas operações mercantis legais, sob o ponto de vista do direito brasileiro, destacando que a prova dos autos é no sentido da regularidade na constituição da Real Estate e, mais ainda, da função desempenhada pelo acusado nessa instituição.
Alega, outrossim, que a Real Estate Investments Company S/A e a Construtora Incal S.A mantinham entre si uma chamada sociedade em conta de participação, de forma absolutamente legal.
Destaca que o fato de o apelado ser procurador da empresa panamenha International Real Estate Investments Company S. A. não tem o condão de responsabilizá-lo penalmente, já que como mandatário atuava por conta e ordem do representado, sendo a sua função transformar instruções verbais, marcadas por uma relação de confiança, em assinaturas sobre papel.
Defende, no mais, a total ausência de provas para a sua condenação pelo crime de evasão de divisas, destacando que, tanto é assim que a própria Receita Federal concluiu que, embora a Incal tivesse contabilizado os recursos como investimentos no exterior, não houve efetivamente tal remessa, mas, tão-somente aporte financeiro para a empresa CONTREC, aqui no Brasil, daí ter a fiscalização autuado a Incal por exclusão indevida, na apuração do lucro real, de investimentos no exterior, que aqui foram aplicados, entre eles os recursos transferidos à Contrec.
Assevera que, na qualidade de um dos procuradores da offshore panamenha International Real Estate, cumpria ordens dessa instituição, atuando em nome e no interesse dela e que sequer tinha conhecimento de quem eram os verdadeiros proprietários da sociedade, tampouco as relações comerciais que mantinham.
Sustenta não comprovado o dolo específico exigido para o crime de evasão de divisas, bem como não haver prova do crime que, em tese, estaria consubstanciado em falsas declarações, tampouco se poderia presumir fossem falsas, não estando caracterizado o tipo penal previsto no art. 299, do Código Penal.
Por outro lado, ainda que caracterizada estivesse a apontada falsidade ideológica, sustenta não haver qualquer indício de que conhecesse esse caráter, tornando aplicável o disposto no art. 17 do Código Penal.
E ainda que estivesse o delito de evasão de divisas comprovado, a única conclusão possível quanto aos documentos supostamente falsos é de que teriam sido expedidos como forma de garantir o exaurimento daquele delito com a consecução da vantagem ilícita antes almejada, a resultar aplicável o princípio da consunção.
Por fim, requereu o apensamento do feito nº 1999.61.81.007353-2 que culminou com decisão absolutória transitada em julgado e que fosse a decisão apreciada pelo Tribunal, no tocante aos reflexos incidentes na ação penal que tramitou para a elucidação dos supostos crimes de evasão de divisas, estelionato e falsidade ideológica, uma vez que estariam os fatos imbricados, àquela ação penal que apurou suposto crime de fazer operar, sem autorização, instituição financeira, conduta pela qual foi o acusado definitivamente absolvido.
Pugnou, por fim, alternativamente à nulidade da condenação em segunda instância, pela redução da pena, uma vez que o acórdão considerou as ações penais em andamento para exasperação da pena-base acima do mínimo legal, circunstância insuficiente para autorizar majoração.
Passo, então, ao exame das razões recursais.
Afasto a arguição de inépcia da denúncia que vem minuciosamente detalhada, inclusive com relação ao apelado como representante da empresa de investimentos, o que possibilitou a sua ampla defesa e contraditório.
A respeito, trago à colação:
" O crime previsto no art. 22 da Lei nº 7.492/86 configura, na melhor exegese, crime comum, sujeitando todo o agente que efetue operação de câmbio não autorizada, para fins de evasão de divisas do País. Não é inepta a denúncia que descreve fatos que, em tese, apresentam a feição do crime de operação ilegal de câmbio e oferece condições plenas para exercício de defesa. (...)". (STJ RHC 8256/SC Rel.min. Vicente Leal, DJ 7/6/99 PÁG.131).
Assim, rejeito a preliminar.
DA UTILIZAÇÃO DE CÓPIAS NÃO AUTENTICADAS E DA APTIDÃO PROBATÓRIA.
A denúncia teve por suporte documentos obtidos a partir da quebra de sigilo bancário autorizada judicialmente e estão autenticadas por funcionário público, no exercício de suas atribuições, não exigindo a autenticação prevista no art. 232, par. único, do Código de Processo Penal, considerando a presunção juris tantum de autenticidade.
A respeito do tema, preleciona Julio Fabbrini Mirabete que "os documentos públicos têm a seu favor a presunção juris tantum de autenticidade. Não se pode, assim negar-se valor a tal prova sem que haja prova de que não é autêntico. O documento particular é autêntico quando reconhecido por oficial público, quando aceito ou reconhecido por quem possa prejudicar e quando provado por exame pericial. Havendo dúvidas quanto à autenticidade do documento particular, deve ser ele submetido a exame pericial.Mesmo no silêncio da lei, como a autenticidade do documento público goza de presunção meramente relativa, nada impede que possam ser eles também submetidos ao incidente de falsidade (arts.145 e segs)".
(in Código de Processo Penal Interpretado, 6ª ed. ed.Atlas, pág.312).
O mesmo se aplica ao coletado após o recebimento da denúncia, quando outros documentos foram juntados aos autos, relativos ao pedido de quebra de sigilo bancário, cópias simples das principais peças do laudo pericial nº 43.315/INS, e extratos bancários das empresas Construtora Incal, encaminhados ao Ministério Público Federal pelo Departamento de Polícia Federal em Brasília (fls. 404/610). Em se tratando de cópias encaminhadas pelo Departamento da Polícia Federal em Brasília, ainda que não autenticadas, aplicável é o disposto no art. 24 da Lei nº 10.522, de 19/07/02, que dispensa as pessoas jurídicas de direito público de autenticarem as cópias reprográficas de quaisquer documentos apresentados em juízo.
Também as cópias não autenticadas hão de ser válidas, dado que a defesa não as impugnou, no momento oportuno, tampouco as inquinou de falsas, a desencadear incidente de falsidade, sendo que tal documentação foi produzida sob o crivo do necessário contraditório.
A respeito, calham os seguintes julgados:
"PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS (E.C. Nº 22/99). CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA E ECONÔMICA E CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO. CERCEAMENTO DE DEFESA. DISPENSA DE TESTEMUNHAS. AUTENTICAÇÃO DE DOCUMENTOS. DOSIMETRIA DA RESPOSTA PENAL.
I e II - omissis.
III - A Receita Federal pode remeter ao Ministério Público cópias não autenticadas em tabelionato, mas atestadas na própria repartição, tudo isto, com intuito de propiciar eventual ação penal.
IV a VI - omissis ".
(STJ, HC 10762/RS, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 16.12.1999, DJ 14.02.2000 p. 54)
"PENAL. HABEAS CORPUS. DOCUMENTAÇÃO. AUSÊNCIA DE AUTENTICAÇÃO. IRRELEVÂNCIA NO PARTICULAR - DEMONSTRADO QUE OS DOCUMENTOS JUNTADOS COM A INICIAL DA IMPETRAÇÃO SÃO CÓPIAS DAS PEÇAS DO INQUÉRITO E QUE NÃO FOI, EM MOMENTO ALGUM, ARGUIDA A SUA INAUTENTICIDADE, MESMO PORQUE AS INFORMAÇÕES PRESTADAS PELA AUTORIDADE COATORA CONTÉM DADOS QUE CONFIRMAM AQUELES ELEMENTOS, DESCABE RECUSAR O WRIT, POR MERO FORMALISMO, QUE CEDE DIANTE DA NATUREZA DO INSTRUMENTO CONSTITUCIONAL.
- RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO"
(STJ, Classe: RESP - RECURSO ESPECIAL - 114139 Processo: 199600736588 UF: PR Órgão Julgador: SEXTA TURMA Data da decisão: 11/03/1997 Documento: STJ000154009 Fonte DJ DATA:22/04/1997 PÁGINA:14485 RSTJ VOL.:00098 PÁGINA:433 Relator(a) WILLIAM PATTERSON).
"PENAL - PROCESSUAL PENAL - CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA (ARTIGO 1º, INCISO I, DA LEI 8.137/90) - PRELIMINARES DE NULIDADE - PROVA ILÍCITA QUE SERVE DE AMPARO À INICIAL - DOCUMENTOS NÃO AUTENTICADOS - PRELIMINARES REJEITADAS - MÉRITO - AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVAS PROVADAS - EXTRATOS BANCÁRIOS NÃO RECONHECIDOS COMO ÚNICO ELEMENTO DE PROVA - RECLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA PARA A FIGURA DO INCISO I DO ARTIGO 2º DA LEI 8.137/90 - CRIME MATERIAL - IMPOSSIBILIDADE - REDUÇÃO DO MONTANTE DA PENA RELATIVAMENTE À CONTINUIDADE DELITIVA (ARTIGO 71 DO CPB) - CONDENAÇÃO MANTIDA - SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.
A reprodução de documento, sem autenticação, tem a mesma força probante do original se aquele contra quem foi produzido não alega a sua falsidade, sendo despicienda a mera impugnação sob o aspecto formal, da falta de autenticação. Precedente desta Egrégia Turma.
9. Preliminares de nulidade rejeitadas".
(TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO Classe: ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 12823, Processo: 200203990119525 UF: SP Órgão Julgador: QUINTA TURMA Data da decisão: 24/06/2003 Documento: TRF300073509 Fonte DJU DATA:12/08/2003 PÁGINA: 627 Des. Federal RAMZA TARTUCE)
"PROCESSUAL PENAL - HABEAS CORPUS - TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL - AUTENTICAÇÃO DE DOCUMENTO - ART. 232 CPP - PRESCRIÇÃO
I - INCABÍVEL O TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL VIA HABEAS CORPUS, SE A DENÚNCIA DESCREVE FATO TIPICO E NÃO HA DUVIDA QUANTO A PARTICIPAÇÃO DA DENUNCIADA.
II - A EXIGÊNCIA DE AUTENTICAÇÃO, CONSTANTE DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 232 DO CPP, NÃO SE APLICA ÀS CÓPIAS OFICIALMENTE ENCAMINHADAS POR FUNCIONÁRIO PÚBLICO NO EXERCÍCIO DE SUAS ATRIBUIÇÕES (PRESUNÇÃO "JURIS TANTUM" DE AUTENTICIDADE).
III - A PRESCRIÇÃO ALEGADA SOMENTE PODERÁ SER OBJETO DE APRECIAÇÃO NO CURSO DA AÇÃO PENAL.
IV - ORDEM DENEGADA."
(TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO Classe: HC - HABEAS CORPUS Processo: 9502004906 UF: RJ Órgão Julgador: SEGUNDA TURMA Data da decisão: 03/05/1995 Documento: TRF200033981 Fonte DJ DATA:12/09/1995 Relator(a) JUIZ CARREIRA ALVIM).
À luz dos entendimentos supra, válidas são as cópias dos documentos não autenticadas, constantes dos autos.
DO CRIME DE EVASÃO DE DIVISAS PREVISTO NO ARTIGO 22 DA LEI Nº 7.492/86.
Nos termos do artigo 22, da Lei nº 7.492, de 16 de junho de 1986, constitui crime, sujeito à pena de reclusão de 2 (dois) a 6 (seis) anos e multa, "efetuar operação de câmbio não autorizada, com o fim de promover evasão de divisas do País", incorrendo na mesma pena, nos termos do parágrafo único do aludido dispositivo legal "quem, a qualquer título, promove, sem autorização legal, a saída de moeda ou divisa para o exterior, ou nele mantiver depósitos não declarados à repartição federal competente".
Conforme destacado no voto da eminente Desembargadora Federal Suzana Camargo, "o parágrafo prevê duas modalidades absolutamente autônomas de ilícitos. A primeira envolve a remessa ilegal de divisas para o exterior. O tipo objetivo neste caso incrimina a ação de promover, qual seja realizar, efetuar ou por em execução, não importando a modalidade de operação utilizada, a saída de moeda ou divisa, desautorizada para o exterior. O crime, por seu turno, é material, tendo por resultado consumativo a efetiva saída da moeda ou divisa do país, o que ocorre quando são ultrapassadas as fronteiras do território nacional.
Dessa forma, resta hialino que o crime de evasão de divisas, na modalidade efetuar operação de câmbio não autorizada, com o fim de promover a evasão de divisas do País, tem como tipo objetivo incriminar a efetivação de operações de câmbio desautorizadas, quando efetuadas com o especial fim de agir de promover evasão de divisas. Por evasão entenda-se a saída clandestina do país e por divisa qualquer valor comercial sobre o estrangeiro que permita a efetuação de pagamentos na forma de compensação. O tipo objetivo incrimina a ação de promover, qual seja realizar, efetuar ou pôr em execução, não importando a modalidade de operação utilizada (a qualquer título) a saída de moeda (numerário nacional ou estrangeiro) ou divisa (ouro, cheques sacados contra praças no exterior, créditos etc) desautorizada, para o exterior. (Maia, Rodolfo Tigre, in Dos crimes contra o SFN, p. 132 e ss.).
O crime, por sua vez, se consuma com a concretização da operação de câmbio, independentemente da fuga de divisas.
O objeto material são a moeda, a divisa e os depósitos não declarados. O que se pretende evitar é que o dinheiro estrangeiro, as divisas, saiam do país ou deixem de nele ingressar. Trata-se de uma política de defesa dos interesses nacionais, visando à aquisição de moeda ou divisa estrangeira, para os efeitos de comércio internacional.
É que, segundo o escólio de Manoel Pedro Pimentel, o Brasil precisa ter moeda ou divisa estrangeiras, para atender aos seus compromissos de pagamento das importações, da execução dos contratos de câmbio que tenham outras finalidades, e ainda para o pagamento da divida externa, equilibrando o balanço de pagamentos. Por isso tornou privativo do Banco Central o direito de guardar moedas e divisas estrangeiras, administrando, com exclusividade, as operações de seu ingresso ou de sua saída do território nacional, compreendida esta expressão no seu verdadeiro sentido do Direito Internacional. (in Crimes contra o Sistema Financeiro, RT, São Paulo, 1987, p. 159)".
O artigo 22 da Lei nº 7.492, de 1986, determina serem ilícitas as seguintes condutas:
(1) Evasão de divisas por meio de operação de câmbio não autorizada - quando irregulares a operação efetuada, ou a instituição intermediadora;
(2) Evasão de divisas, por qualquer outro meio e finalidade, em desacordo com as disposições legais - quando não atendido o requisito de operar mediante instituição financeira autorizada pelo Banco Central; e
(3) Manutenção de depósito não declarado no exterior - quando contas bancárias fora do Brasil, criadas ou alimentadas por evasões.
A denúncia aponta que FÁBIO MONTEIRO DE BARROS FILHO e JOSÉ EDUARDO CORRÊA TEIXEIRA FERRAZ, representantes legais da CONSTRUTORA INCAL S.A., pré-ajustados e com unidade de desígnios, teriam remetido ao exterior U$ 3.000.000,00 (CR$ 201.525.000.000,00), com a colaboração de PEDRO RODOVALHO MARCONDES CHAVES NETO e por intermédio da empresa denominada CONTREC - Comércio, importação e Exportação Ltda., sem autorização do Banco Central, bem como em desatendimento a outros requisitos exigidos pela Consolidação das Normas Cambiais a que estão submetidas as pessoas físicas e jurídicas, sejam ou não instituições financeiras.
Nesse passo, não obstante a ação penal em exame nessa apelação possuir vínculo de conexão entre os crimes de evasão de divisas, falsidade ideológica e o crime de fazer operar instituição financeira sem autorização pelo qual o apelado foi definitivamente absolvido por insuficiência de provas, esse último aspecto em nada interfere na apreciação das provas referentes àqueles outros, uma vez que a evasão compreende a remessa ilegal de valores ao exterior, fazendo uso de pessoa que não tem autorização para o mercado de câmbio, independentemente de ser instituição financeira como definido no art. 25 da Lei nº 7492/86, ou seja, o que importa para a configuração do tipo é o desatendimento da consolidação das normas cambiais a que são submetidas as pessoas físicas e jurídicas, sejam ou não instituições financeiras.
No caso dos autos, apurou-se que os acusados se utilizaram de mecanismos espúrios para a remessa de valores ao exterior, forjando documentação derivada de operação de câmbio irregular para 'maquiar' a transferência de valores.
Apurou-se que a empresa Panamenha Real State não existe fisicamente apenas constando de registros. Não obstante a absolvição definitiva do apelado por insuficiência de provas quanto ao delito de "operar instituição financeira, entendo por comprovados os crimes de evasão de divisas e falsidade ideológica que no caso se afiguram independentes.
Com efeito, é ônus do Ministério Público demonstrar minimamente que o autor do crime inscrito no art. 16 da Lei nº 7.492/86 é dirigente de instituição financeira, o que entendeu o MM. Juiz não restar provado naqueles autos em apenso (sentença de fls. 802 e segs.), a ensejar a aplicação do princípio in dubio pro reo.
Porém, nesta ação apurou-se a realização de operação de câmbio com o fim de evasão de divisas em desobediência à consolidação das normas cambiais a que são submetidas as pessoas físicas e jurídicas, sejam ou não instituições financeiras. Houve utilização de mecanismos inadequados para a remessa de valores ao exterior forjando-se documentação ideologicamente inidônea para transferências de vultosos recursos, fatos que se consumaram sem a influência de tratar-se ou não de instituição financeira.
Nesse aspecto, os crimes de evasão de divisas e falsidade ideológica não pressupõem que o agente seja administrador de instituição financeira e, portanto, são compatíveis as suas comprovações com a não comprovação da conduta classificada no art. 16 da Lei nº 7492/86. Em suma, aqueles prescindem uns dos outros. Os crimes de evasão de divisas e falsidade ideológica não são eminentemente próprios de gestão formal de instituição financeira, não há concurso aparente de normas, tampouco concurso formal, em incompatibilidade de comprovação entre um e outro. Na evasão, geralmente as operações são realizadas por meio clandestino, eximindo-se do controle estatal em violação ao bem jurídico tutelado de preservação da exação fiscal.
Para melhor compreensão da independência dos tipos penais, impende consignar que equipara-se a instituição financeira a pessoa natural que exerça qualquer das atividades referidas no art. 1º da Lei nº 7492/86, ou seja, que tenha como atividade principal ou acessória a captação, intermediação ou aplicação de recursos em moeda nacional ou estrangeira ou a custódia de valores mobiliários.O delito de evasão de divisas, da maneira como a lei prevê, pode ser cometido por qualquer pessoa, bastando, para tanto, que retire divisas daquilo que entendido como reservas cambiais nacionais, afastando-se do controle do Banco Central, não se inserindo nas regras do art. 25 da Lei 7492/86, onde assinala expressamente as condutas e os agentes subsumíveis nos paradigmas da lei.
Há nos autos a devida comprovação dos fatos articulados na denúncia.
Consta do laudo pericial realizado pelo Instituto Nacional de Criminalística, cuja cópia encontra-se acostada às fls. 488/601, a saber :
"Outro fato que merece consideração é o recurso significativo enviado de São Paulo/SP, em 27/07/93, pela empresa CONSTRUTORA INCAL, via banco Cidade S/A, para a empresa Contrec Com. Imp. E Exp. Ltda., no valor equivalente a US$ 3.297.527,29, que foi utilizado na transferência para conta-garantia nº 14.051120-6, de titularidade de Cartola Distr. Transp. Bebidas Ltda." (fls. 524).
Noticia, outrossim, que referida operação foi irregularmente contabilizada pela Construtora Incal como 'investimentos no exterior, no setor imobiliário de construção', realizados com a empresa 'INTERNATIONAL REAL ESTATE INVESTMENTS'.
A empresa panamenha aparece como intermediadora na remessa, sendo que o apelado Pedro Rodovalho, visando dar legalidade à apontada evasão efetivada apresentou na fase extrajudicial um recibo considerado ideologicamente falso, forjado três anos após a realização da suposta remessa ilegal, afirmando que entregara aquele numerário à International Real Estate e que assinara os aditivos contratuais entre a Construtora Incal e a International, tudo a pedido de Fábio Monteiro.
O Relatório do Banco Central do Brasil, decorrente da análise da movimentação bancária da CONTREC Com. Imp. Exp. Ltda e outros, cuja cópia encontra-se acostada às fls. 653/662 aponta o desenrolar da operação nº 93/000951, a saber :
"a) Liquidação - mediante débito em conta-corrente no BRB, em 26.07.93, com recursos do cheque administrativo nº 903789, de Cr$ 201.525.000.000,00, em 26.07.93, adquirido pela CONTREC junto ao Banco Noroeste - fls. 46 e 136 do pt. Original;
b) Origem dos recursos :
b.1) em 26.07,93, a Cartola transferiu Cr$ 201.525.000.000,00 da conta garantida número 14.051120-6 para a sua conta-corrente número 14.050838-1, ambas no BICBANCO, gerando saldo devedor na primeira - fls. 786 e 787;
b.2) nessa mesma data, a cartola emitiu o cheque número 403251, de Cr$ 201.525.000.000,00, contra a conta-corrente número 14.050836-1, BICBANCO, que foi depositado na conta-corrente da CONTREC no Banco Noroeste. Esses recursos foram utilizados na forma descrita no item 'a' retro - fls. 786;
c) Quitação - o saldo devedor apresentado na conta garantida, citado no item 'b.1', acima, foi coberto em 27.07.93, da seguinte forma :
c.1) em 27.07.93, a Construtora Incal enviou de São Paulo uma ordem de pagamento de Cr$ 225.907.000.000,00 para a CONTREC, por intermédio do Banco Cidade S. A . - fls. 116 e 637/638;
c.2) nessa data, a CONTREC comprou o cheque ordem de pagamento número 712274 no Banco Cidade, no valor de Cr$ 204.890.467.500,00, que foi depositado na sua conta corrente número 14.51105, no BICBANCO e em seguida, mediante 'autorização para debitar em conta-corrente', transferiu essa importância para a conta garantida número 14.051120-6, da Cartola, também no BICBANCO, cobrindo o saldo devedor citado no item 'b.1', acima - fls. 116, 215, 787 e 794."
Toda a documentação constante dos autos revela que a Construtora Incal, na pessoa de seus administradores, foi a responsável pelo pagamento do contrato de câmbio 93/000951, sendo que a empresa CARTOLA, como em diversas outras operações envolvendo a empresa CONTREC, serviu apenas para tentar disfarçar a origem do dinheiro, pagando inicialmente pelo contrato, mas, em seguida, recebendo em moeda nacional o valor equivalente aos dólares americanos adquiridos, e a CONTREC ficou responsável pela falsa importação que permitiu a elaboração do contrato de câmbio.
Provada pois, a existência de um falso contrato de exportação para justificar a remessa de US$ 3.000.000,00, além de que os apelados Fábio Monteiro e José Eduardo contaram com a participação efetiva do apelado Pedro Rodovalho para a realização da remessa.
Conforme muito bem pontuado pelo Ministério Público Federal, a declaração de importação que fundamentou o contrato de câmbio nº 93/000951 não correspondia às mercadorias efetivamente importadas, a não ser que os livros ali mencionados pesassem menos que 5 (cinco) folhas de papel,o que demonstra que foi uma simples simulação para encobrir a operação de câmbio montada em seguida.
Os laudos confirmam a materialidade dos delitos.
Ainda, acerca da apontada fraude nas importações, tem-se o relatório de fls. 1364/1354, a saber :
"EM DILIGÊNCIAS À EMPRESA CONTREC E ACESSO A SEUS DOCUMENTOS VERIFICAMOS QUE FORAM DESEMBARAÇADAS 10 (DEZ) DECLARAÇÕES DE IMPORTAÇÕES NO ANO DE 1993 COM VALOR TOTAL DE US$ 13.774.211,00 (TREZE MILHÕES E SETECENTOS E SETENTA E QUATRO MIL E DUZENTOS E ONZE DÓLARES), TODAS REFERENTES A LITERATURAS TÉCNICAS PARA COMPUTADOR E ÁLBUNS PARA COLORIR, NUM TOTAL DE 75.957 (SETENTA E CINCO MIL E NOVECENTOS E CINQÜENTA E SETE) UNIDADES, SENDO QUE NÃO SE CONCRETIZOU O DESEMBARAÇO ADUANEIRO DA PENÚLTIMA DECLARAÇÃO DE IMPORTAÇÃO - DI DESTA SÉRIE, POIS, EM TEMPO OS AUDITORES FISCAIS DA ALFÂNDEGA, DESCONFIANDO DAQUELAS IMPORTAÇÕES, DESCOBRIRAM QUE NO INTERIOR DE UMA CAIXA A SER DESEMBARAÇADA CONTINHA PISOS CERÂMICOS MARCA MÔNICA, FABRICADAS NA ITÁLIA, ENCOBERTAS POR UM PUNHADO DE LIVRETOS DIVERSOS.
CONSTATAMOS, AINDA, QUE NÃO HÁ REGISTRO DE ENTRADA OU ESTOQUE DE LITERATURA TÉCNICA/ÁLBUNS PARA COLORIR, A NÃO SER NA QUANTIDADE IRRISÓRIA DE 1355 (HUM MIL E TREZENTOS E CINQÜENTA E CINCO) UNIDADES, VER FLS. 378 A 383 E 337 A 343 DO PROCESSO. EXISTE, SOMENTE, A EMISSÃO DE NOTAS FISCAIS DE VENDA DE PEQUENA PARTE DE LITERATURAS TÉCNICAS - VER FLS 384 A 388, EMBORA APENAS UMA VENDA TENHA SE EFETIVADO DE FATO, COMO PODE SER VISTO EM FLS. 396 A 407 DOS AUTOS.
REFORÇANDO, AINDA MAIS, O PARÁGRAFO ANTERIOR QUE DIZ SOBRE FRAUDES NAS IMPORTAÇÕES, BUSCAMOS INVESTIGAR SE AQUELAS DIS DESEMBARAÇADAS PELOS AFTN EDUARDO AFONSO DO RAMO E RENATO ISIDORO FELIZ DE SOUZA HAVIAM SIDO FRAUDADAS, À EXCEÇÃO DA DI DESEMBARAÇADA PELO AFTN CNÉIO LUCIUS SOUZA, CUJA ENTRADA CONSTA DOS REGISTROS DA EMPRESA CONTREC, NO INTUITO DE CONSEGUIR PROVAS MATERIAIS DE TAL FRAUDE. DEPOIS DE MUITAS DILIGÊNCIAS DE ZONA SECUNDÁRIA, ENCONTRAMOS NA EMPRESA DAN HEBERT S/A UMA NOTA FISCAL EMITIDA POR ESSA EMPRESA, TRANSFERINDO CERÂMICA IMPORTADA PARA UMA DE SUAS OBRAS, SENDO ESTRANHO O FATO DE ESTAR A REFERIDA NOTA FISCAL CANCELADA MESMO COM O CANHOTO DE RECEBIMENTO DE MERCADORIA ASSINADO (FLS. 445) TENDO O DIRETOR ADMINISTRATIVO DA EMPRESA AFIRMADO TRATAR-SE DE ERRO NA EMISSÃO DA MESMA, E QUE NUNCA COMPRARAM CERÂMICAS IMPORTADAS (FLS. 444) MAS A ATA DA REUNIÃO (FLS. 446) DA EMPRESA MOSTRA A PREOCUPAÇÃO NA EMISSÃO DE NOTAS FISCAIS, ONDE ESCREVERAM:
"SE APARECER NOTA DA OBRA 23 NO NOME DE DAN HEBERT S/A O ENCARREGADO DO DPTO. DE COMPRAS SERÁ MULTADO SE NÃO TIVER UMA EXPLICAÇÃO COERENTE."
NA EMPRESA CONSTRUSHOPPING MATERIAIS PARA CONSTRUÇÃO LTDA, ENCONTRAMOS UM LOTE DE 20 (VINTE) CAIXAS DE PISOS CERÂMICOS, MARCA MÔNICA, FABRICADOS NA ITÁLIA, COM PESO APROXIMADO DE 600 QUILOS, IGUAIS ÀS APREENDIDAS NA ALFÂNDEGA DE BRASÍLIA, TENDO COMO IMPORTADORA A EMPRESA CONTREC, SENDO QUE O SÓCIO DA CONSTRUSHOPPING DECLAROU (FLS. 454) QUE AQUELES PISOS CERÂMICOS PERTENCIAM AO SR. CARLOS GIOTTO, SÓCIO DA CONTREC, E QUE SÓ ESTAVAM GUARDADOS NAQUELE RECINTO A PEDIDO DO SR. CARLOS GIOTTO. CREMOS, ASSIM, ESTAR FECHADA A QUESTÃO DA FRAUDE NAS IMPORTAÇÕES LIBERADAS PELOS AFTN ACIMA CITADOS, COM A EXCEÇÃO FEITA.
AINDA MAIS, PORQUE NÃO CONSTA NOS REGISTROS DA SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL NENHUMA IMPORTAÇÃO DE CERÂMICA FEITA PELA EMPRESA CONTREC (FLS. 477 A 479 E 745 A 747), BEM COMO NÃO SE ENCONTROU EM SUA CONTABILIDADE AQUISIÇÃO, NO MERCADO INTERNO, DAS DITAS CERÂMICAS.
ALGUMAS DAS DIS DA CONTREC JUNTADAS AO PROCESSO TEM DIFERENÇAS EXPRESSIVAS DE PESO E DIVERGÊNCIA NA DESCRIÇÃO DAS MERCADORIAS, COMPARANDO-AS COM AS GUIAS DE IMPORTAÇÃO. FORAM ACEITOS ADITIVOS ÀS GUIAS DE IMPORTAÇÃO SEM VALIDADE, POIS, FORAM EMITIDOS APÓS O DESEMBARAÇO DA MERCADORIA."
As provas documentais carreadas aos autos demonstram, à saciedade, em primeiro lugar, que o contrato de câmbio nº 93/000951, que teria por objeto a 'importação de livros técnicos', apresentou inúmeras 'irregularidades', seja nas mercadorias declaradas, seu conteúdo, peso, como nas guias de importação, no mais, consideradas inválidas, tudo a denotar que não se tratava de uma regular aquisição de livros técnicos importados, mas sim uma operação visando possibilitar o envio de dinheiro para o exterior.
Em segundo lugar, não há uma prova nos autos, que ateste a existência de qualquer operação autorizada pelo Banco Central entre a empresa Incal e a empresa panamenha, no sentido de remessa de valores para aplicação no mercado mobiliário internacional. Nesse sentido, somente a declaração prestada por Pedro Rodovalho, tida como ideologicamente falsa.
Portanto, demonstrado restou a acusação contida na exordial acusatória, no sentido de evidenciar que as operações relativas ao contrato de câmbio realizado sob nº 93/000951 foi fraudulento, por não ter ficado comprovada a apontada aquisição de 'livros técnicos', nos moldes acima elencados, operação essa que, na realidade, envolveu a empresa CONTREC, a empresa CARTOLA e a CONSTRUTORA INCAL e, em momento algum, a empresa panamenha INTERNATIONAL REAL ESTATE.
Também, em momento algum, restou demonstrado que houve remessa regular e lícita de dinheiro pela empresa Incal à empresa panamenha, que tenha tido por fim qualquer aplicação no mercado mobiliário.
Restou comprovada nos autos a ocorrência de uma verdadeira triangulação financeira efetivada entre a Construtora Incal, a empresa Contrec e a empresa Cartola, com remessa ilegal de divisas ao exterior, mediante simulação de contrato de importação, tendo como beneficiários, dentre outros, o apelado.
Portanto, demonstrada restou a acusação no sentido de que a declaração de importação, que fundamentou o contrato de câmbio nº 93/000951, não correspondia às mercadorias efetivamente importadas, mas que, na realidade, foi esse contrato realizado com base em aquisição simulada de mercadorias oriundas do exterior, havendo prova de que os valores enviados para o suposto pagamento deste contrato foram remetidos de forma ilegal.
Também demonstrado ficou que o contrato de câmbio 93/000951, realizado pela empresa CONTREC, serviu apenas para encobrir a remessa ilegal de divisas para o exterior.
A documentação carreada aos autos bem comprova a materialidade delitiva.
No que diz com a autoria está comprovada nos autos em relação a Pedro Rodovalho tanto pelas provas documentais como testemunhais.
Veja-se os depoimentos que destaco:
JOSÉ RICARDO BITENCOURT NORONHA (FLS. 1527/1531)
" QUE JOSÉ EDUARDO FÁBIO E COSTA FERREIRA, BEM COMO PEDRO RODOVALHO CHAVES NETO FORJARAM A CRIAÇÃO DE DOCUMENTOS CONTRATUAIS ENTRE A IKAL E A EMPRESA "INTERNACIONAL REAL ESTATE INVESTIMENT COMPANY", EMPRESA COM SEDE NO PANAMÁ, VISANDO A JUSTIFICAR DESPESAS FEITAS COM OUTRA FINALIDADES DESCONHECIDAS PELO DEPOENTE; QUE ACREDITA QUE ESSA EMPRESA TENHA SIDO REALMENTE CONSTITUÍDA NO PANAMÁ, SENDO PEDRO RODOVALHO O SEU PROCURADOR; (g.n)
JOSÉ RICARDO BITTENCOURT NORONHA (fls. 1608/1620)
"Não sabe se alguma empresa de MONTEIRO DE BARROS investiu recursos na INTERNATIONAL REAL ESTATE INVESTMENTS COMPANY S/A, sabendo apenas que numa ocasião foram feitos contratos com datas retroativas entre uma das empresas do GRUPO MONTEIRO DE BARROS com a INTERNATIONAL. Isso foi feito em papéis bastante antigos que tinham o timbre da INTERNATIONAL. Porém, a convicção do depoente e de outros funcionários é de que esse investimento nunca existiu, pois mesmo antes da indisponibilidade de bens a empresa passava por dificuldades muito grandes com fornecedores e bancos, e até com os salários dos funcionários, sendo que seria fácil honrá-los se houvesse os recursos aplicados no exterior" (g.n).
REGIS MINCHETTI (fls. 1522/1526)
"que os cheques destinados à compra de dólares eram contabilizados como investimentos no exterior, supostamente dirigidos à empresa Real State Investiments S.A, localizada, segundo contrato firmado por Fábio, no Panamá; que, essa empresa tinha como procurador Pedro Rodovalho Chaves Neto, que acredita o depoente ser sócio de Fábio na empresa Norvas, que, por sua vez, é sócia da empresa Enser, ao que se sabe mantida atualmente por Fábio, como sócio oculto, em sociedade com capital italiano, no Bom Retiro; que, quando os cheques destinavam-se a serem contabilizados como "investimentos no exterior", o depoente extraía cópias, em cujos versos fazia constar "contratos de gestão"; que supõe que a contabilização era feita dessa forma para possibilitar o recolhimento de menos tributos, além de dar suposta destinação aos recursos que eram usados principalmente nas compras de dólares; que essa empresa não gerava custos para o Grupo Monteiro de Barros "(g.n);
REGIS MINCHETTI (fls. 1600/1607)
" Nas cópias dos cheques, no verso, era escrito "CONTRATO DE GESTÃO". Esse procedimento depois foi mudado, colocando-se nominalmente à própria construtora, que depois endossava. O depoente não tinha muito acesso ao Setor de Contabilidade, mas pode afirmar que os cheques referidos eram contabilizados como "CONTRATO DE GESTÃO". Não sabe com quem era esse "CONTRATO DE GESTÃO". Não sabe se o "CONTRATO DE GESTÃO" era com a empresa INTERNATIONAL REAL ESTATE INVESTMENTS COMPANY. Já ouviu falar desta empresa no trabalho do depoente; (..) Que Conheceu PEDRO RODOVALHO há vinte anos. Parece que ele era procurador da empresa INTERNATIONAL REAL ESTATE INVESTMENTS COMPANY. O depoente não considera PEDRO RODOVALHO uma pessoa idônea, pois o mesmo na década de setenta falsificou a assinatura do depoente como avaliador patrimonial de uma das empresas do Grupo Bombril. O depoente não alertou FÁBIO MONTEIRO sobre isso porque achou que não deveria misturar. (....)José Eduardo, Fábio e Pedro Rodovalho forjaram a criação de documentos contratuais entre a Incal e a empresa panamenha "Internacional Real Estate Investiment Company", visando a justificar despesas feitas com outras finalidades desconhecidas pelo depoente, operações essas que 'coincidiam com o repasse das verbas públicas oriundas da construção do Fórum Trabalhista.
JOSÉ IVAN GUIMARÃES LOBATO (fls 1317-1319)
"Inquirida, respondeu: que presidiu um inquérito policial em Brasília, apurando fatos praticados por uma empresa cujo nome não recorda, de propriedade de Carlos Gioto Figueiredo Santoro e sua mulher, Mirte Santoro, empresa essa de fachada que chamou a atenção pois fazia importações de grande monta escapando a sua real capacidade financeira; que os fatos apurados são relativos a julho/93; que, devido ao grande aporte de recursos, foi motivada a quebra de sigilo desta empresa onde foi constatado uma operação de câmbio suportada com aporte feito pela empresa Incal, no valor aproximado de U$ 4.500.000,00 (quatro milhões e quinhentos mil dólares); que foi ouvido o proprietário da Incal, Fábio Monteiro de Barros Filho; que este não soube explicar a motivação do aporte financeiro que teria feito através da empresa Real State Investiment Company LTDA, sediada no Panamá, sem entretanto apresentar documentação comprobatória, muito menos a razão de ter feito esse investimento via empresa de Carlos Gioto; que na seqüência das investigações, buscou-se identificar os proprietários e os responsáveis pela empresa Real State Investiment Company Ltda., inclusive utilizando-se da Interpol, quando então foi identificado o seu representante no Brasil justamente o Dr. Pedro Rodovalho Marcondes Chaves Neto, que confirmou ser efetivamente o representante da Real State no Brasil para todos os fins; que, quando das investigações via Interpol, foi constatado que a empresa Real State só existia de direito, não havendo sede física apropriada para uma empresa do porte alegado; que também ficou constatado que Pedro Rodovalho só passou a ser procurador da Real State, sediada no Panamá, considerado Paraíso Fiscal salvo engano a partir de janeiro/95 e a operação de aporte na conta da empresa de Carlos Gioto, feita pela Incal, teria ocorrido em julho/93, justamente para dar suporte à operação de câmbio realizada por Carlo Figueiredo Santoro; que a verificação da época que Pedro Rodovalho foi constituído procurador da Real State foi através de busca em cartório na cidade do Panamá, constatando-se que o documento foi passado em janeiro/95, procuração esta que foi devidamente registrada no Cartório de São Paulo; que Pedro Rodovalho não soube explicar porque foi repassado o dinheiro para a conta da empresa de Carlos Gioto e que esses recursos foram utilizados para operação de câmbio irregular referente à importação também irregular; que não foi constatado em momento algum que a empresa Real State tenha recebido os dólares da operação; que alegada importação seria referente a livros, mas que certa feita a Receita Federal, desconfiando da operação, pois não havia necessidade de guia de importação para livros didáticos, abriram os volumes e foi constatado que dentro dos mesmo havia cerâmica e livros ultrapassados de literatura inglesa; que também chamou a atenção os preços exorbitantes pois, como exemplo um livro de Inglês importado por U$ 400 (quatrocentos dólares); que Fábio Monteiro de Barros tentou justificar que a quantia de dólares continuava investida na Real State, mas em nenhum momento apresentou documento comprobatório dessa situação; que o Pedro Rodovalho não soube declarar os donos da Real State apenas ter sustentado ter recebido instruções da Real State e repassá-las a Fábio Monteiro no sentido de que fosse feito um depósito em determinada conta cujo titular desconhecia, muito menos se tratava da empresa de Carlos Gioto; que se recorda que Pedro Rodovalho apresentou contratos de gestão financeira com a Real State inclusive discrepantes com o objeto dos contratos pois o aporte foi muito superior com o que alegadamente havia sido pactuado; lembra que à época que presidiu o inquérito começaram a sair notícia na imprensa sobre possível irregularidade na construção do TRT de São Paulo envolvendo a empresa Inkal (mesma empresa Incal), razão pela qual quando deixou a presidência do feito consignou em seu relatório parcial a necessidade de as diligências serem aprofundadas nesse sentido, vislumbrando uma possível vinculação do aporte feito na empresa de Carlos Gioto; neste relatório parcial, sugeriu também o depoente, salvo engano, que fossem feitas gestões junto ao Banco Central no sentido de confirmar ou não, documentalmente, se a Real State era autorizada por aquela autarquia a captar recurso no Brasil, embora de fato já conhecesse a circunstância de que a empresa não tinha autorização; que nas operações de câmbio comandadas pela Contrec houve a participação de diversas empresas, destacando a Tartuci, Cartola, Dan Herbert, uma escola de Inglês cujo nome não se recorda e outras. Dada a palavra ao Procurador da República, ele perguntou e obteve as seguintes respostas: que, após a pergunta feita pelo Exmo. Procurador da República, lembrou o depoente que a empresa sobre a qual recaiu inicialmente as investigações tratava-se da Contrec-Comércio Importação e Exportação LTDA".
Resta, assim demonstrado, pelas provas testemunhais, que houve operação de câmbio suportada com aporte feito pela empresa Incal, no valor aproximado de U$ 4.500.000,00 (quatro milhões e quinhentos mil dólares), sendo que, ouvido Fábio Monteiro de Barros Filho, este não soube explicar a motivação do aporte financeiro que teria feito através da empresa Real State Investiment Company LTDA, tampouco apresentou documentação comprobatória.
Segundo o relato da testemunha acima referida, Pedro Rodovalho só teria passado a ser procurador da Real State, formalmente, a partir de janeiro/95 e a operação de aporte na conta da empresa de Carlos Gioto, feita pela Incal, teria ocorrido em julho/93, justamente para dar suporte à operação de câmbio realizada por Carlo Figueiredo Santoro, o que denota que antes dos documentos apresentados Pedro Rodovalho já atuava possibilitando a evasão de divisas. Pedro Rodovalho não soube explicar porque foi repassado o dinheiro para a conta da empresa de Carlos Gioto e que esses recursos foram utilizados para operação de câmbio irregular referente à importação também irregular; não tendo, ademais, restado constatado que a empresa Real State tenha recebido os dólares da operação.Informou a testemunha que Fábio Monteiro de Barros tentou justificar que a quantia de dólares continuava investida na Real State, mas em nenhum momento apresentou documento comprobatório dessa situação, bem como que Pedro Rodovalho não soube declinar quem seriam os donos da Real State, apesar de ter sustentado haver recebido instruções, em confiança, da Real State e de repassá-las a Fábio Monteiro, no sentido de que fosse feito um depósito em determinada conta, cujo titular desconhecia, muito menos que se tratava da empresa de Carlos Gioto.
Disse lembrar que Pedro Rodovalho apresentou contratos de gestão financeira com a Real State, inclusive discrepantes com o objeto dos contratos, pois o aporte foi muito superior ao que alegadamente havia sido pactuado.
As declarações do apelado Pedro Rodovalho, na polícia e em Juízo, também confirmam a sua responsabilidade pelo crime de evasão de divisas, bem como que Fábio Monteiro de Barros Filho também era procurador da empresa panamenha, a saber :
"Ao lhe serem exibidos os documentos bancários relativos à transferência de Cr$ 225.907.000.000,00 (...) da conta nº 40982-90, junto ao banco Cidade, titulada por CONSTRUTORA INCAL para a empresa CONTREC, o interrogando afirma desconhecê-los e se houve ordens neste sentido, elas foram dadas por escrito (....) na verdade o interrogado não tem nenhum documento que comprove a solicitação ou a ordem formal repassada à CONSTRUTORA INCAL (....) mesmo sendo o procurador da INTERNATIONAL REAL ESTATE com sede no panamá, o interrogando não sabe precisar quais negócios ou interesses que esta tinha com a CONTREC (...) não foi o interrogando quem passou a conta da CONTREC para a CONSTRUTORA INCAL fazer a transferência de valores, nem tampouco sabe quem a indicou (....) que expediu os documentos cujas cópias se acham acostadas a fls. 1451/1452 dos autos, ora exibidas, a pedido do Dr. FÁBIO MONTEIRO DE BARROS FILHO para que confirmasse a solicitação de transferências de valores para a CONTREC."
" O interrogando confirma que era e ainda é procurador da empresa sediada no Panamá, denominada INTERNATIONAL REAL ESTATE INVESTMENTSCOMPANY S/A. Além do interrogando, tem conhecimento de que FABIO MONTEIRO DE BARROS FILHO também era procurador da referida empresa. Desde que o interrogando assumiu como procurador, FABIO também o era. Desconhece a existência de outros eventuais procuradores. O interrogando esclarece que o objetivo da empresa INTERNATIONAL REAL ESTATE INVESTIMENTS COMPANY S/A não era de captar recursos para investimentos no exterior. O objetivo da mesma era de participar da concorrência para a construção do FÓRUM TRABALHISTA de São Paulo/SP. Quer esclarecer que o artigo 300 da Lei das S/A manteve em vigor alguns artigos do Decreto-Lei 2627, entre os quais o artigo cujo número não se recorda, que autoriza a participação de empresas estrangeiras em sociedades brasileiras independentemente de autorização governamental. Existe interpretação pacífica de que a participação também pode ocorrer em outro tipo societário, valendo dar como exemplo a FORD e GENERAL MOTORS, que antes eram S/A e atualmente LTDA. Também quer que fique esclarecido que o artigo 325 do Código Comercial, ao prever a constituição de uma sociedade regular, mas sem personalidade jurídica, no caso sociedade em conta de participação, também admite que seja uma empresa estrangeira a participante deste tipo de sociedade. No caso, pela mesma interpretação de que possa ela participar de uma sociedade do tipo LTDA. Cabe esclarecer que o Código Comercial admite que o sócio oculto, que nada tem de ilegal, faça parte da sociedade apenas através de contrato verbal. Feitas estas considerações, o interrogando esclarece que a empresa INTERNATIONAL REAL ESTATE INVESTMENTS COMPANY S/A era sócia oculta da CONSTRUTORA INCAL, não se recordando se também o era da empresa do mesmo grupo denominada MONTEIRO DE BARROS CONSTRUÇÕES. A formalização dessa sociedade em conta de participação ocorreu através do instrumento mencionado na denúncia, denominado "instrumento particular de gestão de investimentos e outras avenças", constante à fls. 25/28, seguido dos aditamentos de fls. 29/34. Confirma que as assinaturas constantes dos referidos documentos, aparentemente uma delas, que se refere ao representante da INTERNATIONAL REAL ESTATE INVESTMENTS COMPANY S/A, é do interrogando. O objetivo, portanto, era de participar da concorrência do FÓRUM TRABALHISTA e do empreendimento. Esclarece que ela efetivamente participou da concorrência e do empreendimento como sócia oculta. Aqui quer ressaltar que o termo "oculta" é no sentido técnico-jurídico, e não no sentido pejorativo. Perguntado pelo Juízo se a empresa INERNATIONAL participou com recursos para fazer parte da sociedade com a INCAL, o interrogando esclarece que, na realidade, pelo fato de o Dr. FÁBIO MONTEIRO ter estado prestes a expandir seus negócios no exterior, mas sem experiência para isto, fez o inverso no que se refere à sociedade com a INTERNATIONAL, ou seja, a CONSTRUTORA INCAL passou a ser sócia oculta, no Panamá, da empresa INTERNATIONAL. Quer esclarecer que o Panamá, país com o qual o Brasil mantêm relações diplomáticas, prevê em sua legislação a criação de empresas denominadas "off shore", que não podem operar no próprio Panamá, mas apenas constituídas lá. Este detalhe é importante porque há uma afirmação de um delegado nestes autos dizendo que a empresa INTERNATIONAL não tinha localização física no Panamá. Isto seria admissível, pois se assim ocorresse estaria sendo infringida a lei daquele país. O interrogando não tem condições de informar quem são os proprietários das ações nominativas ou ao portador da empresa INTERNATIONAL, sabendo apenas que os representantes legais, ou seja diretores, são ou eram os advogados panamenhos que nomearam o interrogando como um dos procuradores no Brasil. Não tem condições de afirmar se as ações da INTERNATIONAL eram ao portador, caso em que seria impossível saber quem eram seus detentores. Também quer esclarecer que, tanto essa empresa não se dedicava, pelo que sabe, à captação de recursos, que o termo "real state" significa negócios imobiliários, conforme uma revista panamenha que ora exibe e que será oportunamente juntada aos autos. Perguntado pelo Juízo a razão de constar à fls. 25 que a INTERNATIONAL "tem experiência na gestão de investimentos no âmbito internacional, nos mercados financeiro e de capitais e, em especial, na aplicação de recursos em bolsas de valores e de mercadorias, nos mercados à vista, à termo e à futuro", o interrogando esclarece que é muito comum nos Estados Unidos e na Europa os empreendimentos imobiliário se revestirem de forma de sociedades anônimas com ações cotadas em bolsa, sendo que isto explica a mencionada experiência acima aludida. Em relação à experiência na área financeira, a mesma é necessária porque muitas dessas sociedade com propósitos imobiliários lançam no mercado debêntures e outros títulos para obter o financiamento do projeto. Em relação à experiência em bolsa de mercadorias, é pelo fato de que muitos dos insumos das construções, ou seja, as "commodities" (usando a expressão inglesa), poderem ser cotadas em bolsa de mercadorias. Quanto ao fato especifico dos autos, tem apenas condições de esclarecer que recebeu uma instrução dos diretores da INTERNATIONAL no Panamá para que determinasse à INCAL que transferisse uma importância em moeda nacional à uma empresa brasileira, no caso a CONTREC. Com a mudança de moeda, não se recorda atualmente do montante desse valor. Houve várias determinações desse tipo, para transferência de moeda nacional da INCAL para outras empresas também com sede no Brasil, não se recordando de detalhes acerca disso. Assim, o interrogando pode assegurar que, por seu intermédio, nunca houve qualquer remessa de divisas para o exterior, seja fisicamente, seja de outro modo. Ao contrário, o interrogando realizou, não se lembrando se uma ou mais vezes, como procurador da INTERNATIONAL, contratos de mútuo com a INCAL, onde entraram recursos do exterior para a INCAL em razão desses contratos. Quer salientar que, por não se tratarem de instituições financeiras, não há nenhuma proibição relativamente a estes empréstimos. Esclarece que não era de sua conta saber do motivo de ter sido determinado que a INCAL transferisse os recursos mencionados na denúncia para a CONTREC, pois a INTERNATIONAL poderia perfeitamente ter negócios com outras empresas e não somente com a INCAL. O interrogando deseja acrescentar que somente deu ordens legitimas no exercício da procuração que lhe foi outorgada, tanto que fez uma confirmação por escrito à Receita Federal de que efetivamente determinou verbalmente à INCAL que transferisse recursos para a CONTREC, o que confirma a boa fé do interrogando, pois se fosse uma operação legitima o interrogando poderia não confirmar essa determinação verbal a que se referiu. Além deste processo, responde a um outro que corre em Brasília, também relacionado à empresa INTERNATIONAL, pois a Receita Federal entendeu que o interrogando teria praticado desobediência quando deixou de fornecer informações sobre negócios da referida empresa, amparado pelo dever de sigilo profissional. Na presente data ficou sabendo que nesta 1ª Vara há outro processo contra o interrogando, também relacionado à empresa INTERNATIONAL".
Comprovadas, pois, a autoria, materialidade e dolo pelo crime de evasão de divisas, inclusive no tocante ao apelado Pedro Rodovalho.
Ainda em relação a esse além da prova documental e testemunhal há o depoimento do próprio Fábio Monteiro na polícia, onde esclarece o depósito da quantia de mais de três milhões de dólares na conta da CONTREC, sendo que, em Juízo, afirmou categoricamente que referida transferência se deu por conta da empresa International Real Estate Investments. Na polícia, afirmou, ainda, que José Eduardo Corrêa Teixeira, na qualidade de Diretor Superintendente da empresa seria a pessoa que teria mantido as tratativas com Pedro Rodovalho acerca da transferência dos valores em questão. É o que deflui do depoimento a seguir transcrito :
"QUE, reconhece o declarante ser o responsável máximo pela CONSTRUTORA IKAL LTDA, sendo que em 1993 a empresa tinha a denominação CONSTRUTORA INCAL S/A; QUE, da mesma forma, confirma que em 1993 a empresa CONSTRUTORA INCAL S/A era titular da conta-corrente nº 40.982-90, junto ao BANCO CIDADE S/A, agência Central em São Paulo/SP; QUE, também reconhece o débito levado a efeito na referida conta na data de 27.07.93, no valor de CR$ 225.907.000.000,00 (duzentos e vinte e cinco bilhões, novecentos e sete milhões de cruzeiros), referente a emissão de Ordem de Pagamento, tendo como beneficiária a empresa CONTREC - COMÉRCIO IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO LTDA, a ser liquidada através da agência Brasília, código 008-6; QUE, a transferência de tais recursos se deu em razão de um contrato de gestão financeira com aplicação em reais na INTERNATIONAL REAL ESTATE INVESTIMENTS COMPANY S/A, sediada em Panamá e representada pelo senhor PEDRO RODOVALHO MARCONDES CHAVES NETO, como parte de um total de investimento no valor de CR$ 333.383.972.060,00 (trezentos e trinta e três bilhões, trezentos e oitenta e três milhões, novecentos e setenta e dois mil e sessenta cruzeiros); QUE, o contrato de gestão firmado com a referida entidade, tinha por objeto investimentos no estrangeiro, no setor imobiliário, como parte de uma estratégia para um articulação com as empresas internacionais do mercado imobiliário de construção; QUE, não sabe informar o declarante, qual a pessoa que tratou diretamente com o senhor PEDRO RODOVALHO de transferência nos termos em que se processou, nem tampouco sabe informar se à época foi questionado a razão do investimento se operar através da empresa CONTREC - COMÉRCIO, IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO LTDA, da qual nunca ouviu falar; QUE, o declarante não sabe informar qual a mecânica jurídica utilizada pela INTERNATIONAL REAL STATE para captar recursos no Brasil, sabendo apenas informar que os seus investimentos feitos através da mesma, foram em moeda nacional, tudo de acordo com o contrato de gestão financeira mantido com a mesma, logo , não sabe informar os meios utilizados para a saída dos recursos para o exterior, nem tampouco se tal procedimento foi comunicado ao BANCO CENTRAL DO BRASIL; QUE, pode garantir que os valores destinados à INTERNATIONAL REAL STATE conforme solicitação de seu representante - PEDRO RODOVALHO MARCONDES CHAVES NETO foi devidamente contabilizado, consoante demonstra a razão analítico da CONSTRUTORA INCAL LTDA; QUE, compromete-se neste ato a apresentar à Autoridade Policial cópia do contrato de gestão financeira mantido com a INTERNATIONAL REAL STATE COMPANY, através do representante do Brasil, bem como o extrato da posição de seus investimentos atuais junto a referida entidade; QUE, na verdade, não sabe precisar se a INTERNATIONAL REAL STATE detém a autorização de quem de direito para operar no mercado interno, até porque o investimento que o declarante ou sua empresa faz, é no exterior; QUE, embora não possa precisar as datas, acredita que o declarante que sua empresa fez investimentos com base em contrato de gestão já referido durante o ano de 1992 e assim, compromete-se também em apresentar planilha demonstrativa de todos os investimentos feitos até a presente data, incluindo-se aí os resgates; QUE, também compromete-se em apresentar à Autoridade Policial demonstrativo contábil dos demais investimentos que totalizaram a importância consignada no recibo firmado em 02.08.93 pela INTERNATIONAL REAL STATE, cuja cópia apresenta neste ato; QUE, a respeito da transferência ora em questão, já foi instado pela Receita Federal, tendo na ocasião, apresentado os devidos esclarecimentos àquele órgão, consoante correspondência que neste ato apresenta cópia; QUE, como disse anteriormente, não conhece a empresa CONTREC - COM. IMP. EXP. LTDA e nunca ouviu falar da pessoa de CARLOS GIOTTO FIGUEIREDO SANTORO; QUE, da mesma forma, não conhece a empresa CARTOLA DISTRIBUIDORA, TRANSPORTADORA DE BEBIDAS REGIONAL LTDA; QUE, tem conhecimento da empresa W.V. TARTUCE CONSTRUÇÕES, através da imprensa, porém, não sabe quem é o seu responsável, deduzindo apenas que seja ligado ao Deputado Federal TARTUCE; QUE, como disse, não sabe precisar qual a pessoa que manteve as tratativas com PEDRO RODOVALE referente a transferência dos valores em questão, podendo ter sido o senhor JOSÉ EDUARDO CORREIA TEIXEIRA FERRAZ que à época era Diretor Superintendente da empresa, acreditando, entretanto, que os procedimentos de preenchimento do documento de fls. 2018 do APENSO X, terem partido de sua pessoa; QUE, tem conhecimento que a INTERNATIONAL REAL STATE INVESTIMENTS COMPANY S/A funciona na cidade de São Paulo/SP, em local que não sabe precisar, porém, compromete-se em informar posteriormente à Autoridade Policial."
Ainda que em Juízo tenha alegado desconhecer a operação de importação feita pela empresa CONTREC e que a única operação realizada teria sido com a International Real State Investments Company S/A, por outro lado declarou que : "Houve uma transferência desse valor para CONTREC, por conta e ordem da INTERNATIONAL REAL STATE INVESTMENTS COMPANY S/A, não se recordando se foi no dia posterior. Ela, portanto, determinou o pagamento à CONTREC, não sabendo a que título foi (fls. 789/790).
A cópia da procuração por instrumento público firmada entre a International Real Estate Investments Company S.A e o apelado Pedro Rodovalho Marcondes Chaves Neto, devidamente traduzida e que se encontra acostada às fls. 455/461 revela que os poderes a ele conferidos foram amplos, inclusive no sentido de : realizar e praticar quantos outros poderes e faculdades forem necessários ou convenientes para a consecução dos fins e objetos da sociedade, mesmo que não tenham sido especificados aqui, já que o propósito desta procuração é o de que a pessoa a favor de quem seja conferida possa realizar para e em nome da sociedade tudo o que a sociedade poderia fazer e praticar diretamente dentro de seu objeto social.
Portanto, pelos elementos probatórios coletados aos autos, seja a prova documental como a testemunhal, verifica-se que o tipo penal inserto no artigo 22 da Lei 7.492/86 restou devidamente caracterizado em relação ao acusado Pedro.
Assim, é de ser julgada procedente a ação penal para o fim de condenar Pedro como incurso no artigo 22 da Lei nº 7.492/86.
Passo, agora, à dosimetria da pena.
DA APLICAÇÃO DAS PENAS
DO ART. 22. PAR. ÚNICO, DA LEI Nº 7.492/86
PEDRO RODOVALHO MARCONDES CHAVES NETO
Tomando-se em consideração as circunstâncias judiciais elencadas no artigo 59 do Código Penal, tenho por dever ser fixada acima do mínimo legal. O réu é tecnicamente primário, porém as demais circunstâncias judiciais lhe são desfavoráveis. É alto o grau de culpabilidade e reprovabilidade da conduta, considerando o modus operandi, consubstanciado em operação altamente esquematizada e especializada, burlando normas financeiras editadas pelo Banco Central para regular depósitos, transferências e investimentos no exterior.
O objetivo precípuo da lei de crimes contra o sistema financeiro nacional é viabilizar a política econômica do governo e desenvolvimento econômico do país também sob o foco do fluxo de recursos monetários do exterior, zelando pela estabilidade e credibilidade do sistema financeiro, com especial atenção ao mercado de câmbio e a arrecadação tributária, potencialmente prejudicados com a evasão de moedas e divisas e com depósitos não declarados feitos no exterior.
As conseqüências do crime foram graves para o sistema financeiro nacional, considerando os altíssimos valores objeto de evasão (aproximadamente US$ 3.000.000,00).
O crime de evasão de divisas tem carga de prejuízo extremamente relevante no país, afetando as reservas nacionais e a soberania econômico-financeira. Os valores de grandes vulto evadidos promovem descontrole no mercado interno financeiro com reflexos internacionais. O crime desiquilibra a higidez do sistema, sendo graves suas consequências.
Assim, considerando que "a primariedade e bons antecedentes não obrigam a fixação da pena no mínimo legal", consoante tem reconhecido com reiteração a jurisprudência de nossos Tribunais, nos termos do artigo 59 do Código Penal, e considerando as circunstâncias judiciais que lhe são desfavoráveis, nos moldes supracitados, há de ser a pena-base fixada acima do mínimo legal, ou seja, em 04 (quatro) anos de reclusão, no que tange ao crime tipificado no artigo 22, parágrafo único, da Lei n. 7.492/86, sendo que resulta fixada em definitivo nesse patamar, tendo em vista a inexistência de atenuantes e agravantes, causas de diminuição ou de aumento. Quanto à sanção pecuniária, pelos motivos acima expostos e, atendendo à situação econômica do apelante, entendo deva ser fixada em 300 dias-multa, no valor unitário de R$ 1.000,00.
DO ARTIGO 299 DO CÓDIGO PENAL
A exordial acusatória aponta, ainda, que os apelados, dentre eles Pedro Rodovalho, teriam forjado documentação ideologicamente inidônea, consubstanciada nas declarações de pedidos de remessa de CR$ 225.907.000.000,00, aplicado na International Real Estate Investments Company SA fosse enviado através de uma ordem de pagamento para a Contrec Comércio Importação e Exportação Ltda. (fls. 420/421), investimentos esses inexistentes, além de identificar como procurador e representante legal, no exterior e no Brasil, de instituição financeira estrangeira (fisicamente inexistente), pessoa diversa daquela mencionada como seu verdadeiro representante legal, em documento bancário, que a revela como sendo o próprio representante da Incal, Fábio Monteiro de Barros.
Assim é que, consta da denúncia que os apelados forjaram documentação ideologicamente inidônea, consubstanciada nas declarações de pedidos de remessa e de investimentos inexistentes, além de identificar, como procurador e representante legal, no exterior e no Brasil, de Instituição Financeira estrangeira (fisicamente inexistente), pessoa diversa daquela mencionada como seu verdadeiro representante legal, em documento bancário, a revelar como sendo o próprio representante da Incal, Fábio Monteiro de Barros.
Quanto a esse crime a sentença absolutória também está a merecer reforma, não havendo que se falar, ademais na aplicação do princípio da consunção, nos moldes formulados pela defesa de Pedro Rodovalho.
O princípio da consunção se dá quando um tipo afasta outro porque consome ou exaure o seu conteúdo proibitivo, ou seja, o fato posterior resulta consumido pelo delito prévio, ou, ainda, no caso de fato típico acompanhante, que é o que tem lugar quando um resultado eventual já está abarcado pelo desvalor que da conduta faz outro tipo legal e, por fim, quando uma tipicidade é acompanhada de um eventual resultado que é insignificante diante da magnitude do injusto principal (cf. Eugenio Raúl Zaffaroni e José Henrique Pierangeli. Manual de Direito Penal Brasileiro, Parte Geral, RT, São Paulo, 1997, p. 738).
Verifico que o delito de falsidade ideológica serviu para encobrir a evasão de divisas, tratando-se de crimes autônomos.
No tocante à aplicação do disposto no art. 17, do Código Penal, nos moldes formulados pela defesa do apelado Pedro Rodovalho, verifica-se, do mesmo modo, não ser caso de incidência. Dispõe a norma que:
"Não se pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime.".
É que pela leitura do dispositivo legal em comento depreende-se que o chamado crime impossível caracteriza-se em duas situações específicas e distintas, quais sejam, quando o meio empregado pelo agente para a perpetração do crime é absolutamente ineficaz ou, ainda, por absoluta impropriedade do objeto, sendo de todo necessário que em qualquer das duas circunstâncias o meio seja inteiramente ineficaz, posto que, do contrário, em sendo relativa, haverá tentativa punível.
Com efeito, não há se falar em ineficácia absoluta do meio ou mesmo impossibilidade absoluta do objeto, posto que o conteúdo dos documentos, no contexto probatório já enunciado, denota que não correspondia à realidade, mas tinha por fim, simplesmente, encobrir a remessa ilegal de divisas feita para o exterior, sendo que a perpetração desse crime teve por desiderato, justamente, ocultar a prática delitiva ocorrida anos anteriormente.
Portanto, merece provimento o recurso ministerial, para o fim de também condenar Pedro pela prática do crime de falsidade ideológica.
DA APLICAÇÃO DAS PENAS
DO ART. 299 do CÓDIGO PENAL
PEDRO RODOVALHO MARCONDES CHAVES NETO
Tomando-se em consideração as circunstâncias judiciais elencadas no artigo 59 do Código Penal, verifica-se que a pena-base por infração ao artigo 299, do Código Penal não pode ser fixada no mínimo legal. É que, embora deflua dos autos ser PEDRO RODOVALHO MARCONDES CHAVES NETO tecnicamente primário, as circunstâncias judiciais lhe são desfavoráveis e justificadoras de uma maior reprimenda, como é o caso, v.g., da sua culpabilidade, assim como os motivos e circunstâncias do crime.
Ora, constata-se maior grau de culpabilidade no que concerne à conduta do apelante, sendo, assim, digna de maior reprovabilidade e censurabilidade, também no que se refere aos motivos do crime, como forma de dar suporte de legalidade para uma operação fraudulenta.
As circunstâncias do crime, o modus operandi, revelando a intensidade do dolo em providenciar declarações, decorridos vários anos após a evasão de divisas, tudo isso com o fim de encobrir a operação.
Assim, considerando que "a primariedade e bons antecedentes não obrigam a fixação da pena no mínimo legal", consoante tem reconhecido com reiteração a jurisprudência de nossos Tribunais, entendo que, no caso em apreço, nos termos do artigo 59 do Código Penal, e considerando as circunstâncias judiciais que lhe são desfavoráveis, nos moldes supracitados, há de ser a pena-base fixada acima do mínimo legal, ou seja, em 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão, no que tange ao crime tipificado no artigo 299, do Código Penal, sendo que resulta fixada em definitivo nesse patamar, tendo em vista a inexistência de atenuantes e agravantes, causas de diminuição ou de aumento. Quanto à sanção pecuniária, pelos motivos acima expostos e, atendendo à situação econômica do apelado, entendo deva ser fixada em 300 dias-multa, no valor unitário de R$ 1.000,00.
DA SOMA DAS PENAS
Somadas as penas dos crimes de evasão de divisas e falsidade ideológica, em concurso material, no tocante ao apelado PEDRO RODOVALHO MARCONDES CHAVES NETO restam fixadas em definitivo no montante de 06 (seis) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 600 dias-multa, penas privativas de liberdade essas que devem ser cumpridas inicialmente no regime inicial semi-aberto, a teor do que dispõe o art. 11 da Lei de Execução Penal, a saber :
"Art. 111. Quando houver condenação por mais de um crime, no mesmo processo ou em processos distintos, a determinação do regime de cumprimento será feita pelo resultado da soma ou unificação das penas, observada, quando for o caso, a detração ou remição."
DO PERDIMENTO DE BENS
Diante de todo o que já foi exposto, verifica-se, de forma clara que os valores remetidos ilegalmente para o exterior, constituem produto de crime, pelo que, nos termos do artigo 91, II, b, do Código Penal, imperiosa é a decretação de seu perdimento, pois, de outra sorte, a evasão de divisas ocorrida na situação em tela, que representa justamente o produto do crime, continuaria a beneficiar os condenados.
Assim, decreto a pena de perdimento do valor de US$ 3.000.000,00 (três milhões dólares), objeto do contrato ilegal de câmbio de n° 93/000951, em favor da União Federal, devendo, por conseguinte, o Estado Brasileiro promover os meios próprios tendentes à recuperação desse montante.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar arguida e, no mérito, dou provimento ao recurso da Justiça Pública e da Advocacia-Geral da União para, reformar a r. sentença recorrida e condenar Pedro Rodovalho Marcondes Chaves Neto, como incurso no artigo 22, caput, da Lei n. 7.492/86, e no art. 299, do Código Penal, na forma do art. 69, do mesmo diploma, às penas de 06 (seis) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 600 dias-multa com a fixação do regime semi-aberto para o cumprimento inicial da pena corporal imposta. Decreto a perda do valor de US$ 3.000.000,00 (três milhões dólares), produto do crime de evasão de divisas, em favor da União Federal.
É como voto.
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VOTO PRELIMINAR
Preambularmente, destaco questão preliminar de prescrição ventilada pela defesa em petição de fls. 3860/3870 e acolhida pelo Ministério Público Federal em Parecer de fls. 3904/3906.
Alega a Defesa a prescrição in abstrato e extinção da punibilidade do crime imputado a Pedro Rodovalho Marcondes Chaves Neto, denunciado como incurso no art. 22, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86 e art. 299 do Código Penal, cujas penas previstas operam prescrição, em 12 anos e 8 anos, respectivamente, contrariamente ao que consta do Parecer Ministerial como sendo de 16 anos para o crime de evasão de divisas.
Para tanto, aduz que a denúncia foi recebida em 25 de fevereiro de 2000 e os acusados foram absolvidos pelo MM. Juízo da 1ª Vara Federal Criminal, o que ensejou o apelo interposto pelo Ministério Público Federal. Tal contagem em abstrato não leva em consideração a existência de causas de interrupção da prescrição.
A apelação foi levada a julgamento por essa Corte, sendo que a sentença foi reformada para condenar os três apelados. No entanto, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça concedeu habeas corpus para anular o julgamento, no que toca a Rodovalho Marcondes Chaves Neto, com a determinação de renovação do julgamento por essa C. 5ª Turma, após o apensamento aos autos da ação penal 19996181007353-2.
Assevera a Defesa que, decorridos mais de 12 (doze) anos do recebimento da denúncia, e aplicando a contagem do tempo em abstrato, ou seja, sem interrupção, estaria extinta da punibilidade, a teor do art. 61 do Código de Processo Penal.
Pondera ainda, que não há se cogitar da aplicação do art. 117, § 1º, do Código Penal para considerar como marco interruptivo da prescrição o acórdão proferido por esta Colenda Turma em relação aos corréus, cujo processo foi desmembrado deste por se tratar de situações processuais diversas.
Nesse passo, tece considerações sobre ato nulo, tratado como se nunca houvesse existido, não produzindo qualquer efeito, ademais, em prejuízo do réu, especialmente porque não deu causa à nulidade reconhecida.
No mais, alega contrariedade da prova acusatória e licitude das operações levadas a efeito pelo acusado, ao afirmar que não houve evasão de divisas, porque estas nunca saíram do Brasil, o que foi entendido pela Receita Federal, bem como que não houve falsificação de contratos por parte do apelante.
Feitas essas breves considerações, coloco em destaque a questão da prescrição da pretensão punitiva estatal e tenho por não ocorrida.
E isto porque a hipótese dos autos enseja a aplicação do art. 117, § 1º, segunda parte, do Código Penal, verbis:
"(...) nos crimes conexos, que sejam objeto do mesmo processo, estende-se aos demais a interrupção relativa a qualquer deles".
Dispõe a norma, a comunicabilidade das causas interruptivas da prescrição. Excetuadas as condições de cunho personalíssimo (reincidência e prisão), as causas interruptivas estendem-se a todos os autores do delito e o mesmo ocorre no caso de concurso de crime, quando ocorre conexão, desde que sejam eles objeto do mesmo processo. Assim, por exemplo, estende-se também ao réu absolvido a interrupção do prazo prescricional provocada pela condenação do correu.
O entendimento encontra acolhida na jurisprudência. Por oportuno, cito:
"APELAÇÃO CRIMINAL - (...) PRESCRIÇÃO - COMUNICABILIDADE DAS CAUSAS INTERRUPTIVAS - RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
(...)
6. Condenado o apelante à 12 (doze) anos de reclusão e sopesando em seu favor a menoridade relativa, pois contava com 19 anos de idade à época dos fatos, o prazo prescricional é de uma causa interruptiva da prescrição em oito anos, em se tratando de crime pratica em concurso de agentes, sobrevindo em relação a um deles, a contagem será interrompida para todos. Se não houve decurso de tempo superior a oito anos entre os marcos interruptivos, resta afastada a prescrição (g.n.).
7. Recurso conhecido e não provido para manter a sentença que condenou o réu nas sanções do art. 121, § 2, I, do Código Penal, à pena definitiva de 12 (doze) anos de reclusão a ser cumprida em regime inicial fechado".
(TJDFT - APR 28406, Rel. Desembargador Roberval Casemiro Belinati, 2ª Turma Criminal, DJE 4/11/2009, PÁG 245).
Andréa Martins Tourinho e Cristiane Muller Dantas destacam que são causas interruptivas da prescrição retroativa (art. 117, CP): a data da publicação da sentença condenatória, seja no momento da publicação da sentença condenatória ou na data do julgamento em sessão, já em 2ª instância; o prazo anterior ao recebimento da denúncia ou queixa, ou seu aditamento; a sentença absolutória com recurso da acusação; sentença condenatória anulada; e a comunicabilidade nos casos de concurso de agentes, salvo o caso da reincidência e o início ou continuação do cumprimento da pena (Jus Navegandi). Assim, a interrupção do prazo prescricional ocorreu por ocasião do julgamento da apelação pela C. Quinta Turma desta Corte, em acórdão exarado em 16 de maio de 2005 e publicado no Diário de Justiça da União, na data de 7 de junho de 2005, quando restou interrompido o curso do prazo prescricional, em virtude do provimento do apelo da acusação e condenação dos réus em segunda instância. Nota-se que não foi o acórdão confirmatório de condenação (o que não acarretaria interrupção do prazo prescricional, consoante sólidos entendimentos jurisprudenciais) e, sim, decisão que modificou sentença absolutória, daí incidir a referida interrupção em aplicação à norma do artigo 117, § 1º, segunda parte.
Ao contrário do que afirma a defesa, há conexão nos autos, tanto que objeto de pedido de reconhecimento por ela própria que o alegou em sede de contrarrazões recursais fato que, inclusive, originou o habeas corpus julgado no Egrégio Superior Tribunal de Justiça, o que findou no acatamento de nulidade em razão de cerceamento de defesa.
O acórdão promanado daquela Corte pela Sexta Turma: Habeas Corpus nº 100.129/SP, de relatoria da Ministra Jane Silva, em sessão de julgamento realizada em 05 de agosto de 2008, por unanimidade, concedeu a ordem para anular o julgamento da apelação unicamente no que toca a Pedro Rodovalho Marcondes Chaves Neto, permanecendo válido e eficaz com relação aos demais corréus, restando ainda prejudicado o pedido de redução de penas.
A validade e eficácia da decisão em relação aos demais corréus decidida pela Corte Superior, mais reforça o caráter decisório que lastreia a interrupção do prazo prescricional para os corréus estendido a Pedro Rodovalho.
O V. Acórdão proferido na ação de habeas corpus veio redigido nos seguintes termos:
"PROCESSUAL PENAL - HABEAS CORPUS - EVASÃO DE DIVISAS - FALSIDADE IDEOLÓGICA - AJUIZAMENTO CONCOMITANTE DE OUTRA AÇÃO PENAL PELO CRIME DE OPERAÇÃO INDEVIDA DE ATIVIDADE FINANCEIRA - RECONHECIMENTO PELO MAGISTRADO SINGULAR DE CONEXÃO -JULGAMENTO CONJUNTO DAS CAUSAS - ABSOLVIÇÃO EM 1ª INSTÂNCIA - TRÂNSITO EM JULGADO DA DECISÃO QUANTO AO ÚLTIMO DELITO - APELAÇÃO DA ACUSAÇÃO QUE ABARCOU APENAS OS DEMAIS - ARQUIVAMENTO DA SEGUNDA AÇÃO PENAL - PEDIDO DE APENSAMENTO DEDUZIDO EM CONTRA-RAZÕES RECURSAIS DEFENSIVAS - EXISTÊNCIA DE PROVAS NOS OUTROS AUTOS QUE APROVEITASSEM À DEFESA - REQUERIMENTO NÃO EXAMINADO - OFENSA ÀS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO, COROLÁRIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL - NULIDADE FLAGRANTE - REDUÇÃO DAS PENAS - PEDIDO PREJUDICADO - ORDEM CONCEDIDA.
1. Sendo duas as ações penais ajuizadas contra o agente e havendo reconhecimento judicial de que ambas seriam conexas, circunstância que resultou, inclusive, em alegações finais e sentenças absolutórias prolatadas conjuntamente, procede o pedido defensivo de apensamento dos feitos para supedanear o julgamento da apelação da acusação interposta em apenas uma das ações.
2. Cabia à Corte de 2º Grau, caso entendesse inviável o pedido em questão, afastá-lo expressamente, motivando-se em dados concretos do processo, mas não se limitar a afirmar serem compatíveis ambas as acusações.
3. Patente o prejuízo suportado pela defesa, eis que potenciais provas utilizadas pelo Juízo singular para estear a sentença absolutória deixaram de ser analisadas pelo Tribunal de origem ao prolatar acórdão condenatório.
4. Ordem concedida para anular o julgamento da apelação unicamente no que toca ao paciente, permanecendo o acórdão válido e eficaz com relação aos demais co-réus. Prejudicado o pedido de redução das penas".
Consigne-se que a própria defesa alegou a conexão, não lhe valendo a assertiva de se tratar de processos distintos. Tanto não o é que, a partir das alegações defensivas, os autos que estavam desmembrados restaram apensados para reflexão em conjunto de todo o processado e garantia ao princípio da ampla defesa, o que foi determinado por esse relator, tendo sido objeto de reflexão por ocasião do exame do mérito do recurso que trago em voto pertinente ao caso, se superada essa questão preliminar.
Destaco que o pedido defensivo não pode valer para uma pretensão (que gerou o reconhecimento da nulidade) e não valer para outra (desencadeamento da prescrição em razão da conexão), sob pena de se infringir coerência e racionalidade.
Assim, resultando o acórdão válido e eficaz em relação aos demais corréus determinação esta objeto do julgamento do habeas corpus por parte do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, produz efeitos para todos inclusive para o apelante Pedro Rodovalho, ainda que anulado somente em relação a ele.
O raciocínio, ainda que não trazido pela Defesa mas instigante no bojo da tese apresentada, de que a anulação teria o efeito radicular de desfazer a conexão anteriormente existente em razão do desmembramento fazendo desaparecer a interrupção, também não aqui não tem hospedagem. A anulação desconstituiu o julgamento e não o seu lastro de materialidade. Assim, quanto aos demais réus, posto que ainda pendem recursos, persistem hígidos os liames comunicativos estabelecidos pela conexão e seus efeitos interruptivos.
Por outro visor, os fundamentos da indestrutibilidade do elo interruptivo residem não somente na norma prevista no art. 117, do Código Penal, mas também no substrato do instituto da prescrição que diz respeito à inércia do Estado, bem como ao fato de que o acórdão anulado é suscetível de gerar efeitos, a exemplo da reformatio in pejus indireta que limita o alcance da pena estabelecida no acórdão anulado quando do segundo julgamento.
Quanto a tais fundamentos, no caso dos autos, por primeiro, a inércia do Estado não ocorreu. Ao oposto, o feito em relação a Pedro Rodovalho foi objeto de apreciação e julgamento por parte da 5ª Turma e ainda do provimento jurisdicional advindo do Egrégio Superior de Justiça, ao analisar o alegado cerceamento de defesa instado pelos nobres defensores.
No segundo ponto, há diferença entre atos nulos e inexistentes.
Segundo preleciona Julio Fabbrini Mirabete, no ato inexistente há falta de elemento que o direito considera essencial, ou seja, em que ele existe de fato e, sem elemento essencial ele inexiste de jure. É um 'não ato'. (Processo Penal, ed. Atlas, fls.592, 1998).
Já a nulidade decretada pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça decorreu de reconhecimento de efetivo prejuízo à defesa que ensejou a anulabilidade do ato somente em relação a Pedro Rodovalho, não atingindo os demais réus, permanecendo, para esses, intacto o acórdão condenatório e imbricados os efeitos processuais.
Em resumo, feitas essas necessárias ponderações, considerando-se que a defesa alega a prescrição da pretensão punitiva estatal pela pena em abstrato, esclareço a contagem dos prazos:
Os fatos ocorreram em 1993.
A denúncia foi recebida em 25 de fevereiro de 2000 (fls. 284/285).
A sessão de julgamento da apelação criminal de relatoria da eminente Desembargadora Federal Suzana Camargo data de 16 de maio de 2005 (prazo interruptivo).
A respeito, veja-se:
"PENAL. PRESCRIÇÃO. CRIME FALIMENTAR. CONDENAÇÃO. INTERRUPÇÃO.
1. A CONDENAÇÃO EM SEGUNDO GRAU, POR FORÇA DE RECURSO DA ACUSAÇÃO, INTERROMPE A PRESCRIÇÃO NA DATA DO JULGAMENTO. O LEGISLADOR, COMO PROCLAMADO PELO STF UTILIZA-SE DA EXPRESSÃO "SENTENÇA CONDENATÓRIA" (ART. 117, IV, DO CP) NO SENTIDO DE "DECISÃO", NÃO HAVENDO, PORTANTO, DIFERENÇA ONTOLÓGICA ENTRE "ACÓRDÃO CONDENATÓRIO" E "SENTENÇA CONDENATÓRIA", PORQUE AMBOS ESTEREOTIPAM UMA "DECISÃO".
2. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO (LETRA "C"). (RESP 117081 - SP, 6ª Turma, Rel. Min. Fernando Gonçalves, j. 24/06/1997, D.J.U. de 18/08/1997, p. 37922).
"PENAL. CONDENAÇÃO EM SEGUNDO GRAU. ACÓRDÃO EMBARGAVEL. - INTERRUPÇÃO. REITERADA JURISPRUDÊNCIA DOS TRIBUNAIS SOBRE INTERROMPER-SE A PRESCRIÇÃO NA DATA DA PROCLAMAÇÃO DO JULGAMENTO CONDENATÓRIO EM GRAU RECURSAL, AINDA QUE TOMADO POR MAIORIA DE VOTOS". (RESP 36850 - SP, 5ª Turma, Rel. Min. José Dantas, j. 22/09/1993, D.J.U. de 04/10/1993, p. 20565, RSTJ 56/334).
"PRESCRIÇÃO . INTERRUPÇÃO. ACÓRDÃO EMBARGÁVEL PROFERIDO EM GRAU DE APELAÇÃO. SE O ACÓRDÃO, RELATIVO A APELAÇÃO, FOR CONDENATÓRIO, OU SEJA, AQUELE QUE, PELA PRIMEIRA VEZ, IMPÔS A PENA, OU AGRAVOU-A, CONSTITUI "DECISÃO CONDENATÓRIA RECORRÍVEL" (ART. 117, IV, DO CP) E , AINDA QUE EMBARGÁVEL, TEM EFEITO INTERRUPTIVO DA PRESCRIÇÃO (...)".
(RHC 2206 - RJ, 5ª Turma, Rel. Min. Assis Toledo, j. 07/10/1992, D.J.U. de 26/10/1992, p. 19063).
Passo, então, à contagem dos prazos:
Prazos prescricionais para pena em abstrato: crime do art. 22, § único, da Lei 7.492/86 - (pena máxima em abstrato 6 anos) prescrição em 12 anos, crime do art. 299 do Código Penal - (pena máxima em abstrato 3 anos - para documento particular) - prescrição em 8 anos.
Verifica-se que o lapso temporal não foi ultrapassado entre os marcos interruptivos, tanto para um como para o outro crime .
Assim, tenho por não ocorrente a prescrição, questão que ora submeto à análise dos meus pares, para, uma vez resolvida, passar-se ou não ao exame do mérito da apelação criminal interposta por Pedro Rodovalho Marcondes Chaves Neto.
É como voto, em preliminar destacada.
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