Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 13/03/2012
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002265-25.2006.4.03.6117/SP
2006.61.17.002265-4/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELANTE : JOAO AUGUSTO MARINHO
ADVOGADO : MARCUS WILLIAM BERGAMIN (Int.Pessoal)
APELADO : Justica Publica
No. ORIG. : 00022652520064036117 1 Vr JAU/SP

EMENTA

PENAL. PROCESSUAL PENAL. ART. 273, § 1º-B, I, DO CÓDIGO PENAL. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE.
1. Materialidade e autoria delitiva comprovadas.
2. Com relação ao delito do art. 273, § 1º-B, I, do Código Penal, embora não compartilhe do entendimento de aplicar a pena prescrita a outro crime, o que resulta em ofensa ao princípio da legalidade (CR, art. 5º, XXXIX), não houve interposição de recurso pela acusação, sendo inviável a reformatio in pejus nesta instância.
3. Não há qualquer previsão legal de causa de diminuição de pena para o crime do art. 273 do Código Penal ou delitos equiparados.
4. Apelação desprovida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 05 de março de 2012.
Andre Nekatschalow
Desembargador Federal Relator


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002265-25.2006.4.03.6117/SP
2006.61.17.002265-4/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELANTE : JOAO AUGUSTO MARINHO
ADVOGADO : MARCUS WILLIAM BERGAMIN (Int.Pessoal)
APELADO : Justica Publica
No. ORIG. : 00022652520064036117 1 Vr JAU/SP

RELATÓRIO

Trata-se de apelação criminal contra a sentença que condenou João Augusto Marinho a 3 (três) anos de reclusão, regime inicial aberto, e a 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos e corrigido monetariamente até o pagamento, pela prática do delito descrito no art. 273, §1º-B, I, do Código Penal.

A pena privativa de liberdade foi substituída por 2 (duas) restritivas de direitos, sendo a primeira de prestação de serviços à comunidade, em entidade hospitalar ou assistencial a ser designada pelo Juízo das Execuções Penais, e a segunda de prestação pecuniária, equivalente a 1 (um) salário mínimo, a ser destinada a entidade pública ou privada de caráter social indicada na fase de execução da pena (fls. 286/298v.).

A defesa apela com os seguintes argumentos:

a) por economia processual, reitera os termos da manifestação defensiva de fls. 262/284, na qual aduz que o réu trazia medicamentos para consumo próprio, não caracterizando ofensa ao bem jurídico tutelado pela norma penal, de modo a evidenciar a atipicidade da conduta;
b) falta de provas da autoria delitiva constituídas durante a instrução processual, requerendo a absolvição com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal;
c) aplicação analógica e retroativa do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06, para diminuição da pena em 2/3 (dois terços), considerando ter a sentença declarado a inconstitucionalidade do art. 273 do Código Penal no tocante ao quantum da pena privativa de liberdade, impondo a pena da Lei n. 6.368/76 (fls. 262/284 e 330/333).

A acusação ofereceu contrarrazões (fls. 338/341).

O Ilustre Procurador Regional da República, Dr. Elton Venturi, manifestou-se pela anulação da sentença, sustentando ofensa ao princípio da reserva legal (CR, art. 5º, XXXIX) e usurpação da atividade legislativa, por haver o juízo a quo declarado a inconstitucionalidade do preceito sancionador do art. 273, §1º-B, I, do Código Penal e aplicado a pena mínima prevista no art. 12 da Lei de Drogas vigente à época dos fatos (fls. 343/346).

Os autos foram encaminhados à revisão, nos termos regimentais.

É o relatório.


Andre Nekatschalow
Desembargador Federal Relator


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002265-25.2006.4.03.6117/SP
2006.61.17.002265-4/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELANTE : JOAO AUGUSTO MARINHO
ADVOGADO : MARCUS WILLIAM BERGAMIN (Int.Pessoal)
APELADO : Justica Publica
No. ORIG. : 00022652520064036117 1 Vr JAU/SP

VOTO

Imputação. O réu foi denunciado pela prática do crime previsto no art. 273, §1º-B, I, do Código Penal, pois, em 09.09.05, foi surpreendido, pela Polícia Militar Rodoviária, na estrada SP 255, na cidade de Jaú (SP), transportando medicamentos de procedência estrangeira em desacordo com as normas do órgão de vigilância sanitária.

Consta da denúncia que o acusado estava em ônibus interestadual, vindo da cidade de Foz do Iguaçu (PR), e portava em suas vestes ou pertences 1 (uma) cartela com 20 (vinte) comprimidos do medicamento PRAMIL SILDENAFIL de 50mg e 8 (oito) frascos de vidro do medicamento WINSTROL - V, estanozolol 50 mg/ml, ambos sem registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA e de importação proibida (fls. 115/116).

Prescrição. A pena-base fixada na sentença é de 3 (três) anos de reclusão pelo cometimento do crime do art. 273, §1º-B, I, do Código Penal. Sem recurso da acusação (fl. 310), essa é a pena a ser considerada para fins de prescrição, cujo prazo é de 8 (oito) anos, a teor do inciso IV do art. 109 do Código Penal.

Entre a data do fato (09.09.05, fl. 115) e o recebimento da denúncia (28.10.09, fl. 117), passaram-se 4 (quatro) anos, 1 (um) mês e 19 (dezenove) dias.

Entre a data do recebimento da denúncia (28.10.09, fl. 117) e a data da sentença (28.03.11, fl. 309), transcorreu o período 1 (um) ano e 5 (cinco) meses. A partir da sentença condenatória, à míngua de outro marco interruptivo do prazo prescricional, a prescrição está prevista para ocorrer em 27.03.19.

Conclui-se, portanto, que não está prescrita a pretensão punitiva estatal com base na pena in concreto.

Materialidade. A materialidade do delito encontra-se satisfatoriamente provada pelos seguintes elementos de convicção:

a) auto de exibição e apreensão de 1 (uma) cartela com 20 (vinte) comprimidos do remédio PRAMIL SILDENAFIL de 50mg e 8 (oito) frascos de vidro contendo a medicação WINSTROL - V, estanozolol 50mg/ml (fl. 6);

b) laudo do Instituto Adolfo Lutz indicando que o medicamento WINSTROL - V, com a substância estanozolol, integra a lista de substâncias anabolizantes, não foi produzido no Brasil e não está registrado na ANVISA, e o medicamento PRAMIL SILDENAFIL 50mg contém a mesma substância ativa do VIAGRA, sob proteção do regime de patentes no Brasil (fls. 07/08);

c) laudo do Núcleo de Criminalística do Setor Técnico-Científico da Polícia Federal atestando que o remédio WINSTROL V é de origem estrangeira e não possui registro na ANVISA (fls. 85/86);

d) ofício da ANVISA esclarecendo "que os medicamentos WINSTROL V e PRAMIL SILDENAFIL não possuem registro na ANVISA e, portanto, segundo a legislação em vigor, não poderão ser importados para as finalidades de comércio, indústria ou consumo direto" (fl. 65).

Autoria. Está devidamente comprovada a autoria do delito.

Conforme boletim de ocorrência da Delegacia de Polícia Civil de Jaú, em 09.09.05, foram apreendidos os medicamentos WINSTROL-V e PRAMIL em poder do acusado, que "alegou que adquiriu no Paraguai e que era para uso próprio, pagando cerca de noventa reais cada frasco" (fls. 4/5).

Ouvido na fase policial, o réu assumiu a posse da medicação e afirmou que se destinava a uso pessoal, declarando ter pago R$ 90,00 (noventa reais) pelos remédios, comprados numa farmácia em Foz do Iguaçu, mas não possuía a nota fiscal (fl. 32).

Em novas declarações colhidas na fase inquisitiva, João Augusto Marinho relatou, mais uma vez, uso exclusivo da medicação apreendida, para aumento de massa muscular, esclarecendo tê-la adquirido no Paraguai, na Ciudad Del Este, pagando R$ 90,00 (noventa reais) por frasco de WINSTROL-V (fl. 45).

Intimado, o réu não compareceu ao interrogatório judicial, decretando-se a revelia (fls. 213/213v. e 216).

Antonio Santos da Silva, Policial Militar Rodoviário, declarou ter realizado vistoria de ônibus originário de Foz do Iguaçu, com destino a Ribeirão Preto, tendo encontrado a medicação na bolsa do réu, no seu assento, esclarecendo que o acusado disse que o medicamento era para uso próprio e havia sido adquirido na Ciudad Del Este (fls. 38/39, 193 e mídia à fl. 194).

Alberto Borges Pinheiro, Policial Militar Rodoviário, confirmou o fato, relatando que foram encontrados medicamentos nos pertences de um jovem de Ribeirão Preto, acrescendo ao seu depoimento, em juízo, que o investigado comentou que levaria "os comprimidos para o pessoal da musculação" (fls. 37, 236 e mídia à fl. 237).

A defesa indicou as testemunhas arroladas pela acusação (fl. 177), mas o Juízo a quo declarou precluso o direito de apresentação do respectivo rol (fl. 178).

Do conjunto probatório amealhado, evidencia-se a autoria do delito, tendo o acusado, durante a investigação criminal, confessado a aquisição dos medicamentos no Paraguai, o que restou corroborado pelo depoimento dos policiais responsáveis pela fiscalização e apreensão dos remédios.

Não procede a alegação da defesa de falta de provas constituídas durante a instrução processual, visto terem sido as testemunhas de acusação regularmente ouvidas sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, confirmando os indícios de autoria obtidos no inquérito policial (fl. 193 e 236).

Também não se sustenta a alegação de aquisição da medicação para uso próprio em farmácia localizada na cidade de Foz do Iguaçu (PR) de modo a afastar a tipicidade da conduta.

No primeiro relato dos fatos perante a Autoridade Policial, o acusado aduziu ter adquirido os medicamentos no território nacional (fl. 32). Contudo, a vedação da comercialização e a falta de registro no órgão competente afastam tal possibilidade, tendo o réu, em novo depoimento da fase inquisitorial, afirmado a aquisição dos produtos no Paraguai (fl. 45), o que restou corroborado pela prova testemunhal e laudos técnicos que atestam a origem estrangeira.

Por outro lado, a posse de 8 (oito) frascos de 30mL de WINSTROL-V (fl. 83), juntamente com a cartela de comprimidos de PRAMIL, contraria o argumento de destinação pessoal dos remédios, conforme observou o Juízo de 1º grau:


Em resumo, há quatro elementos essenciais que desmentem a versão da mera importação para uso próprio: 1) a potência de tais medicamentos; 2) o número elevado (8) de medicamentos; 3) a testemunha Alberto Borges Pinheiro que, não obstante o tempo da abordagem, lembrou-se que o réu, um jovem de Ribeirão Preto, comentara que levava o medicamento para o "pessoal da musculação"; 4) foi importado também o Plasmil, sem relação direta com a prática de musculação.(fl. 289)

Ademais, o delito se consuma com a mera importação do medicamento sem o necessário registro no órgão de vigilância sanitária, independentemente da destinação pretendida. Ressalte-se que apenas a conduta ter em depósito exige o especial fim de agir, para vender, conforme descrição do tipo penal no art. 273, §1º c. c. §1º-B, I, do Código Penal:


Art. 273. (...)
§1º Nas mesmas penas incorre quem importa, vende, expõe à venda, tem em depósito para vender ou, de qualquer forma, distribui ou entrega a consumo o produto falsificado, corrompido, adulterado ou alterado.
(...)
§1º-B. Está sujeito às penas deste artigo quem pratica as ações prevista no §1º. em relação aos produtos em qualquer das seguintes condições:
I - sem registro, quando exigível, no órgão de vigilância sanitária competente;
(...)

Considerando, assim, a tipicidade da conduta e a existência de provas suficientes da autoria, deve ser mantida a condenação.

Dosimetria. A sentença fixou a pena-base do delito equiparado à falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais (CP, art. 273, §1º- B, I) servindo-se da pena prescrita ao crime de tráfico do art. 12 da Lei n. 6.368/76, fixando-a no seu mínimo legal de 3 (três) anos de reclusão, a qual tornou definitiva à míngua de atenuantes, agravantes, causas de diminuição ou de aumento de pena.

Estabeleceu a pena de multa em 10 (dez) dias-multa, no valor unitário equivalente a 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época do fato e corrigido monetariamente pelos índices oficiais quando do pagamento.

Determinou o regime inicial aberto e substituiu a pena privativa de liberdade por 2 (duas) restritivas de direitos, sendo a primeira de prestação de serviços à comunidade, em entidade hospitalar ou assistencial a ser designada pelo Juízo das Execuções Penais, e a segunda de prestação pecuniária, equivalente a 1 (um) salário mínimo, a ser destinada a entidade pública ou privada de caráter social indicada na fase de execução da pena.

Como visto, a pena-base do delito do art. 273, §1º-B, I, do Código Penal foi fixada em 3 (três) anos de reclusão (correspondente ao delito do art. 12 da Lei n. 6.368/76), considerando-se excessiva aquela prescrita para próprio crime. Embora não compartilhe do entendimento de aplicar a pena prescrita a outro crime, o que resulta em ofensa ao princípio da legalidade (CR, art. 5º, XXXIX), na espécie, não houve interposição de recurso da acusação. Ao contrário, o próprio Parquet pleiteou, no 1º grau de jurisdição, a aplicação da pena da nova lei de drogas, sendo, assim, inviável a reformatio in pejus nesta instância.

Ademais, não há falar em nulidade da sentença por ofensa ao princípio da reserva legal: trata-se, a meu sentir, de error in judicando não de error in procedendo.

Em suas razões recursais, a defesa pleiteia a redução da pena em 2/3 (dois terços) com a incidência da causa de diminuição do §4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06.

Não assiste razão à defesa.

Não há qualquer previsão legal de causa de diminuição de pena do crime do art. 273 do Código Penal ou delitos equiparados, sendo vedado ao julgador inovar no ordenamento jurídico para atribuir ao réu benefício não concedido pelo legislador, ressaltando-se que a redução de pena pleiteada tem aplicação tão somente aos delitos definidos no caput e §1º do art. 33 da Lei n. 11.343/06, não merecendo reparo a dosimetria da pena.

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação.

É o voto.


Andre Nekatschalow
Desembargador Federal Relator


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Data e Hora: 07/03/2012 13:39:13