Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 11/05/2012
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0009618-79.2006.4.03.6000/MS
2006.60.00.009618-1/MS
RELATORA : Juiza Convocada SILVIA ROCHA
APELANTE : MARILIN GORDON ACOSTA reu preso
ADVOGADO : ANTONIO EZEQUIEL INACIO BARBOSA (Int.Pessoal)
: ANNE ELISABETH NUNES DE OLIVEIRA (Int.Pessoal)
APELANTE : Justica Publica
APELADO : OS MESMOS

EMENTA

PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS. ÔNUS DA PROVA. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE. QUANTIDADE DA DROGA. DIMINUIÇÃO DO ARTIGO 33, §4º DA LEI 11.343/2006: NÃO CARACTERIZADA. PERDIMENTO DOS VALORES APREENDIDOS.
1. Apelação criminal interposta pela acusação e defesa contra a sentença que o condenou a ré à pena de 3 anos e 6 meses de reclusão, em regime inicial fechado, e ao pagamento de 58 dias-multa, no valor unitário mínimo, como incursa no artigo 12, caput, c.c. o artigo 18, I, da Lei nº 6.368/76.
2. A materialidade e a autoria delitivas encontram-se demonstradas pelas provas produzidas nos autos, sob o crivo do contraditório e ampla defesa.
3. Dispõe o artigo 156 do Código de Processo Penal que "a prova da alegação incumbirá a quem a fizer". Dessa forma, em regra, cabe à Acusação demonstrar a imputação contida na denúncia, ao passo que, compete à Defesa a prova de excludentes e dirimentes. No entanto, a defesa não comprovou que desconhecia a existência da droga, não bastando a mera alegação, se desprovida de outros elementos comprobatórios.
4. Pena-base acima do mínimo legal. A quantidade da droga apreendida - 6.580 gramas de cocaína - é capaz de promover o estabelecimento da pena acima do mínimo.
5. O objeto jurídico tutelado no crime de tráfico de entorpecente é a saúde pública e, portanto, quanto maior a quantidade da droga traficada maior o potencial lesivo e o perigo de dano à saúde pública, a justificar uma maior reprovabilidade da conduta empreendida pela acusada e, conseqüentemente, a elevação da pena-base por ocasião da análise das circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal.
6. Causa de diminuição do artigo 33, §4º, da Lei nº 11.343/2006. Não preenchimento dos requisitos necessários para a minoração da pena.
7. Prejudicado pedido de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, pois a pena já foi integralmente cumprida.
8. Correta a imposição da pena de perda do dinheiro, por ser proveito do crime, sendo o perdimento um dos efeitos automáticos da sentença condenatória, nos termos do artigo 243, parágrafo único, da C.F., artigos 62 e 63 da Lei 11.343/06 e artigo 91, II do Código Penal.
9. Prejudicada apelação do MPF que questiona regime de cumprimento da pena à vista da informação de que já foi integralmente cumprida.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima indicadas, ACORDAM os integrantes da Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da Terceira Região, por unanimidade, conhecer em parte da apelação da defesa e, na parte conhecida, negar-lhe provimento, bem como julgar prejudicada a apelação do Ministério Público Federal, nos termos do voto da Relatora e na conformidade da minuta de julgamento, que ficam fazendo parte deste julgado.


São Paulo, 20 de março de 2012.
SILVIA ROCHA
Juíza Federal Convocada


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0009618-79.2006.4.03.6000/MS
2006.60.00.009618-1/MS
RELATORA : Juiza Convocada SILVIA ROCHA
APELANTE : MARILIN GORDON ACOSTA reu preso
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: ANNE ELISABETH NUNES DE OLIVEIRA (Int.Pessoal)
APELANTE : Justica Publica
APELADO : OS MESMOS

RELATÓRIO

A Juíza Federal Convocada SILVIA ROCHA (Relatora):


O Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul, em 27.11.2006, ofereceu denúncia contra MARILIN GORDON ACOSTA, peruana, nascida em 06.11.1970, como incursa no artigo 12, caput, c.c. o artigo 18, I, da Lei nº 6.368/76, perante a Vara Criminal da Comarca de Miranda/MS, nos termos do artigo 27 da Lei n. 6.368/76.

Narra a inicial que, em 04.05.2006, em fiscalização de rotina no posto da Polícia Rodoviária Federal denominado Guaicurus, na BR262, km 605, no município de Miranda/MS, policiais rodoviários federais prenderam em flagrante a acusada que estava dentro de ônibus da viação Andorinha que fazia o itinerário Corumbá/Campo Grande, por estar transportando 6.580 gramas de cocaína, acondicionados no interior de diversos tubos de PVC, utilizados como molduras de quadros artesanais.

A denúncia foi recebida em 27.09.2006 (fls. 101/102).

Tendo em vista o advento da Lei n. 11.343, de 23.08.2006, bem do disposto no artigo 70 da referida lei, que tornou exclusiva a competência da Justiça Federal para processar e julgar os crimes de tráfico transnacional de entorpecentes, o Juízo de Direito da 2ª Vara da Comarca de Miranda/MS determinou a remessa dos autos à Justiça Federal de Campo Grande/MS (fl. 111).

Distribuídos os autos ao Juízo Federal da 5ª Vara de Campo Grande/MS, o Ministério Público Federal ratificou a denúncia ofertada pelo parquet estadual e os atos processuais já praticados (fls. 124/125).

Após regular instrução, sobreveio sentença (fls. 158/174), publicada em 16.01.2007, condenando MARILIN GORDON ACOSTA à pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e ao pagamento de 58 (cinqüenta e oito) dias-multa, no valor unitário mínimo, como incursa no artigo 12, caput, c.c. o artigo 18, inciso I, da Lei nº 6.368/76. Foi ainda decretado o perdimento do numerário apreendido em seu poder.

A defesa apresentou embargos de declaração alegando contradição no cálculo da pena privativa de liberdade (fls. 200/201), tendo o magistrado a quo acolhido os embargos para fazer constar que a pena é de 3 (três) anos, 4 (quatro) meses e 25 (vinte e cinco) dias de reclusão, no regime inicial fechado, e 57 (cinqüenta e sete) dias-multa, sendo a sentença publicada em 05.02.2007 (fls. 203/205).

Apela o Ministério Público Federal, postulando a fixação do regime integral fechado para o cumprimento da pena (fls. 190/197).

Contrarrazões da ré às fls. 216/220 pelo desprovimento do recurso da acusação.

Recurso da ré MARILIN pretendendo o édito absolutório por não ter consciência da prática do ilícito, pois não sabia que transportava droga, mas apenas tapetes que havia adquirido na Bolívia para revenda no Brasil, o que acarretaria sua absolvição por ausência de dolo. Subsidiariamente, pede a redução da pena-base, pois a quantidade da droga apreendida não se revela excepcional e porque a sentença não foi devidamente fundamentada. Postula ainda a aplicação da causa de diminuição da pena do artigo 33, §4º da Lei 11.343/06 no patamar máximo de 2/3, bem como a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. Por fim, alega o descabimento do perdimento dos valores apreendidos com a apelante (fls. 172/173).

Contrarrazões do Parquet pugnando o desprovimento do recurso da defesa (fls. 232/246).

Consta dos autos a expedição de guia de execução provisória na data de 08.03.2007 (fl. 248).

Parecer ministerial pelo desprovimento das apelações (fls. 246/260).

É o relatório.

Junte-se o extrato de andamento processual da Vara das Execuções Criminais de Campo Grande/MS.

À revisão.


SILVIA ROCHA
Juíza Federal Convocada


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0009618-79.2006.4.03.6000/MS
2006.60.00.009618-1/MS
RELATORA : Juiza Convocada SILVIA ROCHA
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APELADO : OS MESMOS

VOTO

A Juíza Federal Convocada Silvia Rocha (Relatora):



I - DO RECURSO DA DEFESA


1. Da materialidade e da autoria delitivas: a materialidade e a autoria delitivas encontram-se demonstradas pelas provas produzidas nos autos, sob o crivo do contraditório e ampla defesa.

Marilin foi abordada por policiais, em 04.05.2006, trazendo consigo 60 (sessenta) tapetes artesanais, cujas molduras feitas em tubos de PVC traziam cocaína em seu interior, o que ensejou sua prisão em flagrante por tráfico de drogas.

O Laudo de Constatação de fls. 13/14 e o Laudo de Exame Químico-Toxicológico de fls. 68/70 atestam ser cocaína a substância encontrada com a apelante, no montante líquido de 6.580 g (seis quilos, quinhentos e oitenta gramas).

A conduta imputada à apelante, de trazer consigo droga ilícita, para fins de comércio ou entrega, de qualquer forma, a consumo de terceiros é corroborada pelos depoimentos das testemunhas comuns, que confirmaram ter encontrado cocaína com na bagagem da acusada (fls. 108, 133 e 137).


Ao ser inquirida na fase policial, a acusada MARILIN alegou que não tinha ciência do transporte da droga, acreditando que trazia tapetes artesanais que havia adquirido em La Paz/Bolívia para revenda em São Paulo/SP. Aduziu ainda que escolheu os pergaminhos antes de serem embrulhados, tendo-os recebidos posteriormente já embalados (fl. 10). Interrogada judicialmente, confirmou o interrogatório prestado na fase policial (fls. 100 e 135).

Não procede a alegação.

Constata-se do auto de prisão em flagrante que a acusada, quando questionada pelos policiais, negou que possuía algum pertence no bagageiro externo do ônibus, afirmando posteriormente que estava levando pergaminhos para amigas que moravam em São Paulo (fl. 8).

Como bem ressaltado pelo magistrado a quo em sua sentença:


Como bem argumentou a acusação, em alegações finais, qualquer pessoa perceberia que havia alguma coisa errada com os tapetes, porque apresentavam peso extra de aproximadamente 6.580 gramas (fls. 145/149).
Outrossim, conforme depoimento da testemunha Fabio em Juízo (fl. 140), a ré, quando abordada pela polícia inicialmente disse que não tinha bagagem, sendo que posteriormente admitiu que trazia alguns presentes para amigas.
No que toca ao destino dos referidos tapetes, no auto de prisão em flagrante, a ré afirmou que os venderia em São Paulo, pelo preço de trinta reais cada um, numa feira de bolivianos no bairro do Brás (fl. 10).
Todavia, à testemunha Fábio, a ré afirmou que pretendia presentear amigas com os referidos tapetes (fls. 140), e à testemunha Valter, disse que os venderia o Brasil (fls. 109).
De qualquer sorte, a ré não arrolou testemunhas que pudessem confirmar suas versões, seja a dos presentes, seja a dos negócios.
O que se evidencia dos autos é que a ré foi surpreendida por policiais transportando tapetes contendo 6.580 gramas de cocaína, peso que naturalmente a faria perceber a existência da droga.
Ademais, a ré é pessoa experiente, nascida em 1970, trabalha como comerciante e disse que já esteve outra vez no Brasil para vender mercadorias em São Paulo (fls. 10/11), de forma que não pode ser considerada ingênua.
Portanto, afasto o argumento da defesa e reconheço a presença de provas suficientes de autoria, pois a ré sabia da existência da droga. (fls. 163/164).

Com efeito, verifica-se o depoimento da testemunha de acusação prestado em Juízo, sob o crivo do contraditório, que a acusada negou possuir bagagem no bagageiro do ônibus, alegando em seguida estar levando "alguns presente para suas amigas em São Paulo":


Que inicialmente, Marilin disse-lhe que não havia bagagem no bagageiro do ônibus, logo em seguida, Marilin admitiu que estava levando alguns presentes para suas amigas em São Paulo, mas que era pouca coisa. Assim, a testemunha e seu colega Passoni resolveram proceder a uma fiscalização na bagagem de Marilin e constataram que a mesma estava levando 60 tapetes artesanais de lã. Que examinaram os tapetes e verificaram que nas extremidades dos mesmos haviam um tubo de PVC. Desta forma, furaram o PVC e encontraram dentro do tubo cocaína (que era pó puro). Que eram 60 tapetes cada um com dois tubos de PVC e em todos eles havia cocaína. (depoimento da testemunha comum Fabio de Araújo Macedo, fl. 137)

Acrescente-se que a acusada apresentou versões contraditórias acerca do destino dos tapetes artesanais, ora afirmando que seriam presente para amigas, ora para revenda em São Paulo:

Que seu intuito seria vendê-los em São Paulo/SP a preço de trinta reais cada um, em feira de bolivianos no bairro do Brás, nessa cidade paulista (interrogatório da acusada, fl. 10)
Que segundo a acusada o motivo de sua viagem para o Brasil é que faria compra em São Paulo, e que o produto transportado teria sido adquirido em La Paz, Bolívia, e que seria revendido no Brasil. (depoimento judicial da testemunha Valter Passoni Junior, fl. 108)
Que Marilin (...) alegou que apenas havia comprado os tapetes na Bolívia para presentear umas amigas. (depoimento da testemunha Fabio de Araújo Macedo, fl. 137)

Dessa forma, não é crível a alegação da acusada de que desconhecia que transportava cocaína.

Dispõe o artigo 156 do Código de Processo Penal que "a prova da alegação incumbirá a quem a fizer". Dessa forma, em regra, cabe à Acusação demonstrar a imputação contida na denúncia, ao passo que, compete à Defesa a prova de excludentes e dirimentes.

Marilin alegou não ter consciência da prática do ilícito, pois não sabia que transportava droga, o que acarretaria sua absolvição por ausência de dolo.

No entanto, a defesa não comprovou que desconhecia a existência da droga, não bastando a mera alegação, se desprovida de outros elementos comprobatórios.

Demonstradas materialidade e autoria delitivas, irretocável a condenação proferida em primeiro grau.

Procedo à análise da pena.


2. Da dosimetria da pena. No tocante à dosimetria da pena, verifico que tanto a acusação quanto a defesa insurgiram-se quanto à r. sentença.

Examino primeiramente o requerido pela defesa, uma vez que o pleito do MPF cinge-se ao regime de cumprimento de pena.

A pena foi fixada na sentença de fls.203/205 da seguinte maneira: a pena-base foi fixada em 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 58 (cinquenta e oito) dias-multa, nos termos do artigo 12 da Lei 6.368/76, considerada a culpabilidade excessiva e a expressiva quantidade da droga.

Ausentes atenuantes e agravantes.

Na terceira fase da dosimetria da pena, presente a causa de diminuição do artigo 33, §4º da Lei 11.343/06, a pena foi reduzida em 1/6 (um sexto), resultando em 2 (dois) anos e 11 (onze) meses de reclusão e 48 (quarenta e oito) dias-multa.

Presente a causa de aumento da pena da internacionalidade delitiva, foi majorada em 1/6 (um sexto), nos termos do artigo 40, inciso I, da Lei n. 11.343/06, resultando em 3 (três) anos e 4 (quatro) meses de reclusão e 56 (cinquenta e seis) dias-multa, no valor unitário mínimo vigente ao tempo dos fatos, devidamente corrigido, tendo em vista a situação econômica da ré.

Foi fixado ainda o regime fechado para o início do cumprimento da pena.


2.1. Da pena-base. A pena-base foi fixada em 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 58 (cinquenta e oito), tendo o magistrado a quo fundamentado na quantidade da droga apreendida.

Na primeira etapa da dosimetria da pena, insurge-se a apelante contra a fixação da pena-base acima do mínimo legal, sob a alegação de que a quantidade da droga não se revela excepcional e porque a sentença não foi devidamente fundamentada. Contudo, sem razão a defesa, pois a quantidade de cocaína - 6.580 gramas peso líquido (fls. 69) - é capaz de promover o estabelecimento da pena acima do mínimo.

Saliente-se que o objeto jurídico tutelado no crime de tráfico de entorpecente é a saúde pública e, portanto, quanto maior a quantidade da droga traficada maior o potencial lesivo e o perigo de dano à saúde pública, a justificar uma maior reprovabilidade da conduta empreendida pela acusada e, conseqüentemente, a elevação da pena-base por ocasião da análise das circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal.

Nesse sentido é a orientação do Superior Tribunal de Justiça e desta Primeira Turma:

...Na avaliação das circunstâncias legais para fixação da pena, em se tratando de tráfico de entorpecentes, devem influir decisivamente a espécie e a quantidade da droga. O tipo de entorpecente é dado que indica o grau de nocividade para a saúde pública, correlato ao indicador das conseqüências do crime; a quantidade, quase sempre, aponta para o grau de envolvimento do infrator com o odioso comércio, indicando a medida de sua personalidade perigosa e voltada para a prática criminosa...
STJ - 5a Turma HC 18940-RJ, Relator Min. José Arnaldo da Fonseca, 5ª Turma, DJ 22.04.02, pg.225

Acrescente-se que o aumento de 6 meses operada na sentença, diante da situação concreta, é moderado.

Dessa forma, à míngua de recurso da acusação quanto ao ponto, é de ser mantida a pena-base em 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 58 (cinqüenta e oito) dias-multa.


2.2. Da causa de diminuição do artigo 33, §4º, da Lei nº 11.343/2006. Pretende a defesa a aplicação da causa de diminuição no patamar máximo de 2/3 (dois terços).

A nova lei de drogas instituiu causa de diminuição de pena para o "traficante de primeira viagem", - denominação do Professor Guilherme de Souza Nucci - no artigo 33, §4º, in verbis:


"Nos delitos definidos no caput e §1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa"

De acordo com o dispositivo em comento, é necessário o preenchimento simultâneo de todos os requisitos: a) primariedade, b) boa antecedência, c) não dedicação a atividades criminosas e d) não integração de organização criminosa, para a obtenção da redução da pena.

Na hipótese em tela, o réu não preenche os requisitos legais, pois há elementos que permitem concluir que ele dedicava-se à atividade criminosa.

Embora reconhecidamente primária e de bons antecedentes, como lançado na sentença, o requisito da não dedicação a atividades criminosas restou desatendido.

Depreende-se do interrogatório que a acusado dispôs-se a empreender viagem de longa distância de Lima/Peru até La Paz/Bolívia, onde adquiriu a droga, passando por Santa Cruz, Porto Quijarro e Corumbá/MS, onde embarcou no ônibus para Campo Grande/MS e depois pretendia vir a São Paulo.

É possível afirmar, da análise do interrogatório, que as circunstâncias de acondicionamento da droga apreendida, o tempo despendido à viagem desde a origem até o destino, que houve efetiva e deliberada dedicação à atividade criminosa.

Nesse toar, Marilin não faz jus à diminuição da pena do artigo 33, §4º, da Lei nº 11.343/2006.

No entanto, à míngua de recurso da acusação quanto ao ponto, é de se manter a causa de diminuição no patamar estabelecido na sentença, sob pena de reformatio in pejus.


2.3. Da substituição da pena reclusiva por restritivas de direito: O pedido de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos encontra-se prejudicado, pois a pena já foi integralmente cumprida, tendo em vista que a ré foi presa em flagrante em 04.05.2006; a pena foi mantida em 3 (três) anos e 4 (quatro) meses de reclusão; e a Acusação insurgiu-se apenas em relação ao regime prisional de cumprimento da pena.


3. Do pedido de devolução dos valores apreendidos. Não procede o pedido.

O MM. Juiz a quo decretou o perdimento em favor da União do numerário apreendido em poder da ré, no montante de quatrocentos e um dólares americanos e de sessenta e seis reais, por entender que se trata de parte ou todo o pagamento pelo transporte da droga (fl. 168 e 173).

Nos termos do artigo 62 da Lei n° 11.343/06, a pena de perdimento incide sobre os instrumentos e objetos utilizados para a prática dos crimes definidos naquela lei. Com relação aos valores apreendidos, o artigo 63 da Lei nº 11.343/06 dispõe acerca do seu perdimento.

Tais normas estão em consonância com o disposto no parágrafo único do artigo 243 da Constituição, que prevê o confisco de todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes.

Restando comprovado que tais valores foram apreendidos em decorrência do crime de tráfico internacional de drogas, a pena de perdimento é efeito automático da sentença, ressalvado apenas o interesse do lesado ou de terceiro de boa-fé, nos termos do artigo 91, II, do Código Penal.

Em outras palavras, correta a imposição da pena de perda do dinheiro, por ser proveito do crime, sendo o perdimento um dos efeitos automáticos da sentença condenatória, nos termos do artigo 243, parágrafo único, da C.F., artigos 62 e 63 da Lei 11.343/06 e artigo 91, II do Código Penal.

Nesse sentido já decidiu a Primeira Seção deste Tribunal:

PENAL - PROCESSO PENAL - EMBARGOS INFRINGENTES - CRIME DE TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES - PENA DE PERDIMENTO - NEXO DE INSTRUMENTALIDADE - USO HABITUAL DO BEM PARA A PRÁTICA DO CRIME - DESNECESSIDADE - INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DOS ARTIGOS 46 E SEGUINTES DA LEI 10.409/02 - EMBARGOS REJEITADOS - ACÓRDÃO INTEGRALMENTE MANTIDO. 1. A interpretação a ser empregada não pode ser restritiva, visto que não há elementos que permitam entrever que o legislador disse mais do que, efetivamente, pretendia. A interpretação do artigo 46, § 6º, e, do artigo 48, deve ser feita de forma literal, exatamente conforme fixada na Lei 10.409/02. A matriz constitucional desses dispositivos está no parágrafo único do artigo 243 da Constituição Federal. 2. O texto constitucional não exige o uso habitual do bem apreendido, para que seja possível a aplicação da pena de perdimento. Tampouco o legislador ordinário faz tal exigência. Ele exige apenas o "nexo de instrumentalidade" entre os bens apreendidos e a consecução dos crimes definidos na Lei de Tóxicos. Aqueles devem ser instrumentos para a execução de tais delitos. 3. Nexo de instrumentalidade e habitualidade são realidades completamente distintas, e como tal devem ser tratadas. Basta que o bem tenha sido utilizado uma única vez para a consecução de crime definido na Lei de Tóxicos, para que já se possa impor ao criminoso o seu perdimento. 4. Essa interpretação é a que está em sintonia com a Constituição, a qual, em diversas passagens, deixou claro o repúdio do Constituinte de 1988 em relação ao crime de tráfico ilícito de entorpecentes. O artigo 5º, incisos XLIII e LI, e, também o artigo 243, são indicativos dessa severidade com a qual o legislador de 1988 encarou a questão do tráfico ilícito de entorpecentes. 5. Em virtude do comando que irradia do texto constitucional, é que a interpretação do artigo 46, § 6º, e, artigo 48, deve ser feita de forma literal. 6. Não é necessário que o entorpecente esteja oculto ou acondicionado dentro do veículo para que ocorra o seu perdimento. Basta que o agente tenha dele se utilizado para transportar a droga até a empresa que a remeteria ao exterior, como restou consignado no voto vencedor. 7. Embargos desprovidos. Acórdão integralmente mantido.
TRF-3a Região - 1a Seção - EInf 2003.61.81.007102-4 - Rel. Des.Fed. Ramza Tartuce - DJU 27/07/2007 p. 394

III - DO RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL


A insurgência manifestada na apelação da acusação cinge-se ao regime prisional de cumprimento de pena, fixado pelo juiz de primeira instância em inicial fechado.

Como visto no item 2.3 acima, a pena foi integralmente cumprida, razão pela qual o pedido resta prejudicada a apelação do Ministério Público Federal.


IV - DA CONCLUSÃO


Por estas razões, conheço em parte da apelação da defesa e, na parte conhecida, nego-lhe provimento, bem como julgo prejudicada a apelação do Ministério Público Federal.

É como voto.



SILVIA ROCHA
Juíza Federal Convocada


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