Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 11/01/2012
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000322-12.2002.4.03.6117/SP
2002.61.17.000322-8/SP
RELATORA : Desembargadora Federal VESNA KOLMAR
APELANTE : ROBERTO CESAR DAVANTEL
ADVOGADO : MARIA ILDA PERGENTINO DA SILVA e outro
APELADO : Justica Publica

EMENTA

PENAL. FALSO TESTEMUNHO. ABSOLVIÇÃO. APELAÇÃO PROVIDA.
1. Condenado à pena de 1 (um) ano de reclusão, em regime inicial aberto, e 10 (dez) dias-multa, cada qual no valor mínimo legal, pela prática do delito previsto no artigo 342, caput, do Código Penal.
2. Não restou demonstrado que o acusado agiu com o intuito de falsear a verdade nos autos da reclamação trabalhista.
3. Mostra-se frágil o conjunto probatório produzido, na medida em que os depoimentos das testemunhas são contraditórios, não podendo, portanto, subsidiar decreto condenatório.
4. Apelação a que se dá provimento. Absolvição, com fulcro no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação de Roberto César Davantel para absolvê-lo, com fulcro no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 13 de dezembro de 2011.
Vesna Kolmar
Desembargadora Federal Relatora


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000322-12.2002.4.03.6117/SP
2002.61.17.000322-8/SP
RELATORA : Desembargadora Federal VESNA KOLMAR
APELANTE : ROBERTO CESAR DAVANTEL
ADVOGADO : MARIA ILDA PERGENTINO DA SILVA e outro
APELADO : Justica Publica

RELATÓRIO

A EXCELENTÍSSIMA SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL VESNA KOLMAR: Trata-se de Apelação Criminal interposta por Roberto César Davantel contra a r. sentença de fls. 279/284, proferida pelo MM. Juiz Federal da 1ª Vara Federal de Jaú, Dr. Rodrigo Zacharias, que o condenou à pena de 1 (um) ano de reclusão, em regime inicial aberto, e 10 (dez) dias-multa, cada qual no valor mínimo legal, pela prática do delito previsto no artigo 342, caput, do Código Penal.


Nos termos do artigo 44 do Código Penal, a pena privativa de liberdade foi substituída por uma restritiva de direitos, consistente na prestação de serviços à comunidade.


Nas razões de recurso (fls. 291/296), preliminarmente, alega inépcia da denúncia, sustentando que os fatos que lhe foram imputados não são juridicamente relevantes, já que a reclamação trabalhista foi julgada improcedente.


No mérito, pleiteia a absolvição ao argumento de que:


a) não restou comprovado o dolo em mentir na audiência trabalhista;


b) não há provas suficientes para a condenação.


O Ministério Público Federal nas contra-razões (fls. 304/307) pugnou pelo não provimento do recurso.


A Procuradoria Regional da República, por sua ilustre representante, Dra. Luiza Cristina Fonseca Frischeisen, opinou pelo provimento do recurso de apelação, reformando-se a sentença, a fim de absolver o réu Roberto César Davantel (fls. 309/320).


É o relatório.


À revisão.


Vesna Kolmar
Desembargadora Federal Relatora


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000322-12.2002.4.03.6117/SP
2002.61.17.000322-8/SP
RELATORA : Desembargadora Federal VESNA KOLMAR
APELANTE : ROBERTO CESAR DAVANTEL
ADVOGADO : MARIA ILDA PERGENTINO DA SILVA e outro
APELADO : Justica Publica

VOTO

A EXCELENTÍSSIMA SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL VESNA KOLMAR:


Roberto César Davantel foi denunciado como incurso nas sanções do artigo 342 do Código Penal.


Consta da exordial que:


"No dia 05 de novembro de 2001, perante o Juízo da 2ª Vara do Trabalho de Jaú, ROBERTO CÉSAR DAVANTEL fez afirmação falsa como testemunha na Reclamação Trabalhista nº 2234-01, movida por Roni Celso Guidini em relação a G. Dias Construtora Ltda.
Com efeito, em audiência da referida ação ROBERTO CÉSAR DAVANTEL asseverou que "o reclamante começou a trabalhar em abril/99" e que "não sabe quem contratou o reclamante, mas que deve ter sido alguém da empresa" (fls. 06).
Entretanto, o próprio reclamante declarou, naquela ocasião, que "foi contratado pelo Sr. ROBERTO CÉSAR DAVANTEL" (fls. 05).
Inquirido na Polícia Federal, o denunciado ditou versões contraditórias e evasivas, destituídas, aliás, de amparo probatório (Termo de Declarações às fls. 41/42).
Orlando Souza da Silva Filho foi ouvido pela Autoridade Policial, consignando que Roberto César Davantel prestava serviços para a empresa G. Dias Construtora Ltda. como empreiteiro, fornecendo mão-de-obra de servente e pedreiro. Esclareceu que "Roni trabalhava para a empreiteira de Roberto César Davantel, na ocasião em que esta prestava serviço para a construtora G. Dias" (fls. 38/39).
Também inquirido pelo Delegado de Polícia, Marcelo de Oliveira afirmou que Roni Celso Guidini "prestava serviços na empresa através da pessoa de Roberto César Davantel". Asseverou que Roni era funcionário de Davantel, que era subempreiteiro de obras, mas que, posteriormente, Roni foi contratado pela construtora G. Dias como pedreiro (fls. 144).
Assim, a afirmação feita pelo ora denunciado se desconcerta com a verdade do fato referido em seu depoimento constante dos autos da Reclamação Trabalhista."

Proposta a suspensão condicional do processo, nos termos do artigo 89 da Lei nº 9.099/95, o acusado a recusou, razão pela qual determinou-se o prosseguimento do feito (fls. 240-verso).


Do exame dos autos, verifica-se que foi julgada improcedente a reclamação trabalhista ajuizada por Roni Celso Guidini contra a G. Dias Construtora Ltda., tendo o MM. Juiz do Trabalho Substituto da 2ª Vara do Trabalho de Jaú reconhecido a prática do crime de falso testemunho, nos seguintes termos (fls. 36/39):


"... afigura-se relevante consignar que em depoimento pessoal o reclamante declarou que fora contratado em 09/04/1999 pelo Sr. Roberto César Davantel (fls. 10). Curiosamente, essa pessoa foi inquirida como testemunha do reclamante e iniciou seu depoimento declarando que o reclamante começou a trabalhar em abril de 1999, mas, em seguida, afirmou que não sabia quem havia contratado o reclamante, arrematando que "deve ter sido alguém da empresa". Nesse aspecto, restou patente a prática do crime de falso testemunho, por calar a verdade, posto que pouco antes o reclamante havia confessado que fora contratado por aquela testemunha, confirmando parcialmente o declinado em defesa às fls. 16."

Diante disso, instaurou-se a presente ação penal, que culminou na condenação do acusado.


Razão assiste ao apelante.


O reclamante Roni Celso Guidini, em seu depoimento perante a 2ª Vara do Trabalho de Jaú, declarou que (fls. 08):


"... começou a trabalhar para a reclamada em 09/04/99; que, foi contratado pelo Sr. Roberto César Davantel que era mestre de obras da reclamada (...), que, o seu horário de trabalho era fiscalizado pelo Dr. Roberto César Davantel e pelo Sr. Orlando Souza e Silva; que, no final do expediente retornava com este último."

Todavia, em sede policial, apresentou versão diversa, afirmando que (fls. 56/58):


"(...) o declarante trabalhou na empresa G. DIAS CONSTRUTORA LTDA de 09/04/1999 até aproximadamente 30/07/2001, sendo que para arrumar este emprego o declarante estava passando perto de uma obra que estava sendo realizada no supermercado COPERBARRA, localizado em Barra Bonita/SP, vindo a conversar com a pessoa de ROBERTO CÉSAR DAVANTEL, perguntando se havia emprego; QUE ROBERTO falou para o declarante ir ao escritório da empresa na rua Vinifrida, em número que não se lembra, mas certo que em Barra Bonita/SP, onde deveria conversar com AFONSO CELSO GONÇALVES DIAS, o que foi feito pelo declarante, acabando por arrumar o emprego..."

Em juízo, alterou novamente sua versão dos fatos, alegando (fls. 260):


"Trabalhei como pedreiro para a G. Dias. Certo dia passei em frente a uma obra na COOPERBARRA, quando soube da possibilidade de emprego. Roberto se apresentou como mestre de obras e pediu que eu fosse até o escritório da G. Dias em Barra Bonita. Acertei o emprego e comecei a trabalhar.
(...)
Fui contratado por Afonso, o qual assinou o registro pela G. Dias na minha carteira profissional. Os documentos para registro foram entregues a Orlando. Não sei dizer se Roberto era empreiteiro."

Por sua vez, Orlando Souza da Silva Filho, em sede policial, declarou (fls. 41/42):


"(...) QUE ROBERTO CÉSAR DAVANTEL prestava serviços para a empresa como empreiteiro, sendo que quando do início do serviço de RONI o mesmo já prestava serviço para a empresa; QUE a empreiteira de ROBERTO prestava serviço fornecendo mão-de-obra de servente e pedreiro para a construtora G. DIAS, não sabendo por quanto tempo esse tipo de serviço foi fornecido; QUE, RONI trabalhava para a empreiteira de ROBERTO CÉSAR DAVANTEL, na ocasião em que esta prestava serviço para a construtora G. DIAS, não se recordando por quanto tempo se deu esse serviço.
(...)
QUE normalmente a contratação dos empregados fica a cargo do próprio AFONSO, já tendo ocorrido do próprio depoente ter indicado algum empregado."

Em juízo, Orlando afirmou que (fls. 258):


"Trabalhei na G. Dias por quatro anos. Atualmente sou sócio. Sei que Roberto e Roni trabalharam juntos. Roberto era empreiteiro e Roni era pedreiro. Salvo engano Roni foi contratado pela empreiteira de Roberto. Não me lembro bem disso. Depois que Roberto deixou de prestar serviços para a G. Dias Roni foi contratado pela empresa. Não me recordo por quanto tempo Roni trabalhou com Roberto. Não sei dizer quem da G. Dias contratou posteriormente Roni (...)."

Marcelo de Oliveira, em sede policial, declarou que (fls. 147):


"(...) Conhece a pessoa de RONI CELSO GUIDINI, o qual prestava serviços na empresa, através da pessoa de ROBERTO CÉSAR DAVANTEL. Posteriormente, RONI foi contratado pela empresa G. DIAS na função de pedreiro (...). Tem conhecimento que ROBERTO CÉSAR DAVANTEL era sub-empreiteiro de obras, mas pelo que sabe não era sócio da empresa G. DIAS (...). Pelo que sabe também, ROBERTO contratava os seus próprios funcionários os quais prestavam serviços em diversas obras, mas não tinha poder para contratar os funcionários da empresa. A pessoa que contratou o declarante foi AFONSO CELSO GONÇALVES DIAS, proprietário da empresa G. DIAS."

Em juízo, Marcelo afirmou que (fls. 259):


"Trabalho na G. Dias há cerca de nove anos. Conheço Roni Celso Guidini e Roberto César Davantel. Roni trabalhava como pedreiro. Roberto foi nosso encarregado (...). Roberto era sub-empreiteiro das obras. Roberto tinha pessoas que trabalhava pra ele, mas não sei dizer se os havia contratado. Roberto que acertou o meu serviço. Depois de muito tempo fui contratado pela G. Dias. Trabalhei uma época sem registro. Não tenho como afirmar se nesse período sem registro eu era funcionário de Roberto ou da G. Dias. Trabalhávamos todos juntos (...)."

De todo o constante dos autos, depreende-se que não foram produzidas provas suficientes a embasar a condenação, devendo ser aplicado, in casu, o princípio in dubio pro reo.


Isso porque não restou demonstrado que o acusado agiu com o intuito de falsear a verdade nos autos da reclamação trabalhista. De fato, o réu Roberto César Davantel, tanto em sede policial quanto em juízo, manteve a mesma versão dos fatos no sentido de que era mestre de obras na G. Dias Construtora e que "não sabe quem contratou Roni para trabalhar naquela empresa" (fls. 44/45 e 240).


Além disso, mostra-se frágil o conjunto probatório produzido, na medida em que os depoimentos das testemunhas são contraditórios, não podendo, portanto, subsidiar decreto condenatório.


Com efeito, como bem asseverou o Ministério Público Federal em seu parecer:


"Depreende-se dos depoimentos acima transcritos que não há consenso acerca das circunstâncias sobre as quais versam a presente ação penal. Ademais, além dos depoimentos prestados pelas testemunhas serem contraditórios, não foi juntado aos autos qualquer elemento que comprove os fatos inicialmente narrados na exordial acusatória, uma vez que não restou demonstrada a existência do suposto contrato de trabalho realizado pelo ora apelante com Roni Celso Guidini, bem como a função exercida pelo réu na empresa "G. Dias Construtora Ltda".
O réu ROBERTO CÉSAR DAVANTEL, por sua vez, manteve a mesma versão apresentada nos autos da Reclamação Trabalhista em comento, no sentido de que "era mestre de obras na Construtora G. Dias" e que "não sabe quem contratou Roni para trabalhar naquela empresa" (fls. 44/45 e 240/240v).
Não há nos autos nada que comprove que o réu, ora apelante, tenha efetivamente contratado o então reclamante Roni Celso Guidini, o que, de fato comprovaria a falsidade das afirmações prestadas em juízo. Outrossim, ao contrário do esposado na r. sentença condenatória, não se verifica nos autos nenhum elemento que demonstre, sem sombra de dúvidas, a relação existente entre o ora apelante e a empresa em comento, bem como a sua verdadeira profissão à época dos fatos.
Como cediço, o delito de falso testemunho é classificado pela doutrina como crime instantâneo, formal e próprio. Por tratar-se de crime formal, temos que sua consumação se dá no instante do depoimento em que a testemunha mente, ao fazer afirmação falsa, negando a verdade, ou, ainda, ao calar a verdade, independente do resultado do processo em que tenha se verificado o falso. Dessa forma, basta a demonstração da potencialidade lesiva dos depoimentos nos autos para que se verifique o enquadramento do delito ao tipo do art. 342 do Código Penal.
Contudo, conforme se pode aferir pelo exposto acima, nenhuma das situações parecem ter ocorrido no caso em testilha, não restando demonstrado, portanto, a potencialidade lesiva do depoimento prestado pelo ora apelante ROBERTO CÉSAR DAVANTEL perante a Justiça do Trabalho.
Nesse sentido, é importante observar que o dolo, ou seja, a vontade livre de fazer falsa afirmação, negar ou calar a verdade, não restou sobejamente comprovado nos autos, razão pela qual a r. sentença condenatória deve ser reformada, a fim de que o réu ROBERTO CÉSAR DAVANTEL seja absolvido do crime que lhe é imputado.
(...)
Dessa forma, a mera contradição verificada em depoimento prestado na justiça trabalhista a respeito de determinado fato dificilmente justifica deduzir, sem provas concretas, que esteja o réu ROBERTO CÉSAR DAVANTEL, livre e conscientemente, falseando a verdade.
Outrossim, a declaração em nada influiu na decisão da lide, tendo em vista que a reclamação trabalhista havia sido ajuizada em face da empresa "G. Dias Construtora Ltda", não restando comprovado qualquer vínculo existente entre o acusado e a empresa em comento ou, ainda, entre este e o então reclamante Roni Celso Guidini. Assim, se não há possibilidade de prejuízo tampouco potencialidade ofensiva, inexiste o crime de falso testemunho.
(...)
Assim, ausente a comprovação do dolo, não é possível a condenação, pois em vigor o princípio in dubio pro reo."

A propósito, a jurisprudência:


"PENAL. FALSO TESTEMUNHO. - Imputação de delito de falso testemunho em depoimento prestado em reclamação trabalhista. Inexistência de elementos suficientes a uma condenação. Sentença de absolvição mantida. - Recurso desprovido."
(TRF 3ª Região - Apelação Criminal 25963 - Processo: 200361200030221. Órgão Julgador: 5ª Turma. Relator: Des. Peixoto Junior. Data da Decisão: 10/03/2008. Por unanimidade - DJU: 23/04/2008 Página: 263)

Por esses fundamentos, dou provimento à apelação de Roberto César Davantel para absolvê-lo, com fulcro no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal.


É o voto.


Vesna Kolmar
Desembargadora Federal Relatora


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): VESNA KOLMAR:10060
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Data e Hora: 21/09/2011 17:14:57