D.E. Publicado em 27/01/2012 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, conceder a ordem de "habeas corpus", expedindo-se contramandado de prisão em favor do paciente, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado em favor de Julio Osvaldo Dominguez Dibb, no intuito de obter determinação de recolhimento do mandado de prisão expedido em virtude de decreto condenatório que reconheceu a revelia do Paciente.
Alegam os impetrantes que "embora tenha sido decretada a revelia do Paciente, a sua Defesa participou de todos os atos processuais e se insurgiu contra a revelia, sempre sustentando que o interrogatório do Paciente deveria se realizar por Carta Rogatória, notadamente considerando-se a sua delicada condição de saúde."(fl. 03)
Aduzem que a revelia não é motivo suficiente para justificar a negativa do direito de apelar em liberdade, vez que não foi mencionada sequer uma hipótese prevista no art. 312, do CPP e o paciente respondeu ao processo todo em liberdade.
Por fim ressaltam que os delitos previstos nos arts. 288 e 334, caput, do CP, objeto da condenação, estão prescritos, o que pode ser declarado inclusive em sede de habeas corpus.
O feito originário do writ fora desmembrado em relação ao paciente, do processo nº 2001.6.81.006272-5, razão pela qual determinada sua distribuição por prevenção a este relator (fl. 216).
Com a inicial vieram documentos.
A liminar foi por mim indeferida por decisão de fls. 231/232.
Informações prestadas às fls. 235/236, instruída com documentos.
Em parecer de fls. 293/295, a Procuradoria Regional da República opinou pela concessão da ordem, deferindo-se ao paciente o direito de apelar em liberdade, porquanto não demonstrados os requisitos para a custódia preventiva pelo MMº Juízo "a quo", nos termos do artigo 312 do CPP.
É o relatório.
Em mesa.
VOTO
Descreve a denúncia, em síntese, fatos relativos a organização criminosa supostamente liderada por Roberto Eleutério da Silva, vulgo "Lobão", cujas atividades estariam voltadas para o contrabando e o comércio ilegal de cigarros. O ora paciente seria responsável pela contrafação de cigarros de marca nacional em sua Tabacaria Boqwuerón, os quais seriam posteriormente contrabandeados do Uruguai para o Brasil.
A denúncia foi recebida em 19/03/2003, e seu aditamento em 03/11/2003, tendo sido decretada a revelia do paciente, mas seu defensor constituído, porém, apresentado defesa escrita.
Seguiu-se a instrução com a manutenção da revelia do paciente e a oitiva de testemunhas por meio de cartas rogatórias.
Concluída a instrução, o feito foi sentenciado em 05 de fevereiro de 2010, tendo o paciente sido condenado a oito anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, e a vinte dias-multa, como incurso nas penas dos artigos 288, 334, "caput", 1ª figura, 293, inciso I e § 1º, 299, c.c o art. 69, todos do Código Penal, sendo absolvido da prática do crime tipificado no artigo 278, "caput", do Código Penal.
Por fim, tendo em vista o decreto de revelia, foi vedado ao paciente o recurso em liberdade, sendo expedido mandado de prisão.
Pois bem, alterando o posicionamento adotado quando da análise da liminar, penso que a ordem deve ser concedida.
Isso porque, melhor analisando os fatos, tenho que a simples circunstância de o paciente ter se mantido revel durante o trâmite processual, deixando de comparecer ao ato de interrogatório e à instrução processual, por si só, não conduz à presença de quaisquer dos requisitos para a prisão preventiva, cujos pressupostos legais estão claramente delineados no artigo 312 do Código de Processo Penal, não demonstrados pela autoridade impetrada.
Ademais, o paciente, mesmo revel, foi mantido solto pelo MMº Juízo "a quo" durante todo o decorrer da instrução, não tendo ocorrido qualquer fato novo a justificar o decreto de prisão, que, ressalte-se, foi lastreado tão somente na revelia, sem quaisquer outros fundamentos efetivamente amparados na norma de regência da custódia cautelar, qual seja, o já citado artigo 312 e seguintes do CPP.
Diante dessas razões, resta claro que sua Excelência não fundamentou adequadamente o decreto de prisão, baseado no simples fato da revelia, a qual, porém, não foi sopesada durante a instrução.
Ora, se o móvel da determinação judicial de prisão do paciente foi a revelia, então por qual razão não se decretou a sua prisão em momento anterior?
Assim, se aquela situação fática não serviu de fundamento à custódia cautelar durante a instrução, parece-me evidente que também não poderia servi-lo após a sentença, se nenhum fato novo ocorreu a justificá-la.
Nesse sentido, a E. Procuradoria Regional da República assim também se manifestou, verbis:
"[...] Entretanto, a magistrada de primeiro grau limitou-se a fazer referência à revelia, sem indicar qual das hipóteses do artigo 312 do Código de Processo Penal entendia estar configurada, não se cogitando, portanto, de prisão preventiva. Ademais, compulsando os autos, vê-se que JULIO OSVALDO DOMINGUEZ DIBB respondeu ao processo em liberdade e a r. sentença condenatória não reconheceu a existência de qualquer fato novo que, alterando a situação fática verificada no curso do processo, pudesse justificar a prisão processual do paciente.
Assim, verifica-se que o fundamento em que se assenta a r. sentença para a imposição da custódia cautelar ao ora paciente não é apto a justificar referida medida constritiva, que exige a indicação de circunstâncias concretas que demonstrem a presença dos requisitos ensejadores da medida, não sendo suficiente para tanto a referência ao fato de ter sido decretada sua revelia".
Sobre o tema, colaciono os seguintes precedentes:
[...] RÉU QUE PERMANECEU SOLTO DURANTE TODA A INSTRUÇÃO CRIMINAL. SENTENÇA CONDENATÓRIA. NEGATIVA DO DIREITO DE APELAR EM LIBERDADE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO. ORDEM PARCIALMENTE CONHECIDA E, NESSA EXTENSÃO, PARCIALMENTE CONCEDIDA7. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que o réu que respondeu solto ao processo deve aguardar em liberdade o julgamento do seu recurso de apelação, salvo se presentes, demonstradamente, os motivos legais que determinam a decretação da prisão preventiva. (HC 200801699356 HC - HABEAS CORPUS - 112469 Relator(a) ARNALDO ESTEVES LIMA Sigla do órgão STJ Órgão julgador QUINTA TURMA Fonte DJE DATA:08/03/2010) - grifo nosso.
PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. SENTENÇA CONDENATÓRIA. DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE NEGADO. REVELIA. AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ORDEM CONCEDIDA. 1. Sentença condenatória fixou pena de 10 meses e 20 dias de reclusão, em regime inicial aberto. Expressa menção à inexistência de agravantes ou atenuantes e que a culpabilidade do paciente se mostrava dentro da normalidade. Indeferido direito de apelar em liberdade e determinada a prisão. 2. Réu respondeu solto ao processo. 3. Art. 594 do Código de Processo Penal foi revogado pela Lei nº 11.719/2008. 4. Art. 597 do Código de Processo Penal prevê que a apelação de sentença condenatória terá efeito suspensivo. 5. Súmula 347 do Superior Tribunal de Justiça: "O conhecimento de recurso de apelação do réu independe de sua prisão." 6. Segregação do paciente, ainda que revel, somente se justificaria se presentes os requisitos da prisão preventiva. Não indicada qual das hipóteses do artigo 312 do Código de Processo Penal estaria configurada. Ausência de motivação da prisão na sentença. 7. Revelia, por si só, não autoriza a imposição dessa condição e nem justifica a ordem de expedição do mandado de prisão. Necessidade de fundamentação adequada. Precedentes do STF e STJ. 8. Impossibilidade de subsistir o comando de prisão em face do paciente e não há razão para manutenção da disposição da sentença em relação ao direito de recorrer em liberdade. Constrangimento ilegal configurado. 9. Ordem concedida para tornar definitiva a liminar deferida. (HC 201103000093710 HC - HABEAS CORPUS - 45307 Relator(a) DESEMBARGADORA FEDERAL RAMZA TARTUCE Sigla do órgão TRF3 Órgão julgador QUINTA TURMA Fonte DJF3 CJ1 DATA:30/05/2011 PÁGINA: 643) - grifo nosso.
PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. SENTENÇA CONDENATÓRIA. DIREITO DE APELAR EM LIBERDADE NEGADO EM RAZÃO DA REVELIA. INSURGÊNCIA CONTRA A CONDENAÇÃO: DESCABIMENTO DA ANÁLISE NA VIA ESTREITA DO WRIT. [...] 3. O simples fato da revelia durante o processo criminal, em especial do réu citado por edital, por si só, não pode fundamentar decreto de prisão cautelar ou justificar a negativa do direito de apelar em liberdade, pois o fato de não terem sido localizados para citação não pode ensejar a presunção de que houve ocultação deliberada dos pacientes em detrimento da Justiça. Precedentes do Supremo Tribunal Federal. 4. Estando pacificado na jurisprudência que tem direito de apelar em liberdade o réu que permaneceu solto durante toda a instrução criminal e, considerando que os pacientes permaneceram soltos durante toda a instrução, ocasião em que já eram revéis e, não obstante, não lhes foi decretada a prisão preventiva, e considerando ainda a inexistência de qualquer fato novo, é de se reconhecer constrangimento ilegal na decisão que negou aos paciente o direito de apelar em liberdade. (HC 200703000354800 HC - HABEAS CORPUS - 27541 Relator(a) JUIZ CONVOCADO MÁRCIO MESQUITA Sigla do órgão TRF3 Órgão julgador PRIMEIRA TURMA Fonte DJU DATA:10/07/2007 PÁGINA: 487) - grifo nosso.
Outrossim, esses fundamentos, por si só, já seriam suficientes à concessão da ordem.
Não obstante, há ainda de ser considerado o fato de que, relativamente aos crimes tipificados nos artigos 288 e 334 do Código Penal, tudo está a indicar que ocorreu a prescrição retroativa da pretensão punitiva estatal, tal como arguido pela defesa.
Com efeito, de acordo com a cópia da r. sentença condenatória "a quo", juntada a estes autos às fls. 223/229, o paciente foi condenado a dois anos de reclusão em relação a cada um dos crimes supracitados (artigos 288 e 334 do Código Penal), totalizando quatro anos de reclusão, além de mais quatro anos de reclusão pelo crime do artigo 293, inciso I e § 1º, do Código Penal, todos em concurso material, totalizando as reprimendas finais de oito anos de reclusão e vinte dias-multa.
Ocorre, porém, que, à luz do artigo 119 do Código Penal, para o efeito de prescrição, deve ser desconsiderada a soma das penas, analisando-se cada reprimenda individualmente, cumprindo-se, com isso, o princípio constitucional da individualização da pena.
E, in casu, quanto aos crimes dos artigos 288 e 334 do Código Penal, o paciente foi condenado, a cada um deles, a dois anos de reclusão, sem que tenha havido recurso por parte da acusação, pois, segundo as informações constantes dos autos (fls. 221/222), somente o paciente teria apelado a esta C. Corte, tendo a r. sentença, pois, transitado em julgado para o "parquet" (cf. fl. 166), a ensejar o prazo prescricional de quatro anos para aqueles dois delitos.
Assim, ao menos a princípio - já que a matéria deverá ser melhor analisada em seu contexto amplo quando do julgamento da apelação -, parece-me que a prescrição retroativa quanto àqueles dois delitos provavelmente ocorreu, porquanto entre a data do recebimento da denúncia, em 19/03/2003, e de seu aditamento em 03/11/2003, e a publicação da r. sentença condenatória, em 05 de fevereiro de 2010, ultrapassaram-se mais de quatro anos.
Não obstante, considerando o grande lapso temporal ultrapassado entre aqueles dois marcos interruptivos, tenho que a ocorrência de eventuais causas suspensivas da prescrição devem ser analisadas no bojo do feito principal, quando do julgamento da apelação, sendo temerário, pois, concluir-se, nesta via, pela extinção da punibilidade do paciente em relação àqueles delitos, sem o conhecimento amplo de todos os fatos ocorridos após a citação, mesmo porque há notícias de que foi expedida carta rogatória para a citação do paciente, sem elementos nos autos, porém, acerca do tempo de seu cumprimento, período este suspensivo da prescrição, nos termos do disposto no artigo 368 do CPP.
Outrossim, considerando a probabilidade de alteração substancial no quantum total de cumprimento da pena em razão da provável prescrição retroativa parcial, que, se reconhecida nos termos supra, conduziria à subsistência de apenas quatro anos de reclusão a serem cumpridos pelo paciente, parece-me claro que o quadro fático apresentado certamente possibilitaria a fixação de reprimendas e regime de cumprimento de pena menos gravosos, a revelar o constrangimento ilegal apontado pelo impetrante.
Portanto, diante todos esses elementos fáticos apresentados, tenho que a ordem deve ser concedida, a fim de assegurar ao paciente aguardar em liberdade o trânsito em julgado da r. sentença condenatória.
Ante o exposto, concedo a ordem, expedindo-se contramandado de prisão em favor do paciente.
É como voto.
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Data e Hora: | 09/01/2012 13:31:28 |