Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 27/01/2012
HABEAS CORPUS Nº 0035997-39.2011.4.03.0000/SP
2011.03.00.035997-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal LUIZ STEFANINI
IMPETRANTE : MARCELO EDUARDO INOCENCIO
PACIENTE : JOSE ROBERTO FERNANDES DE MIRANDA
ADVOGADO : MARCELO EDUARDO INOCENCIO e outro
IMPETRADO : JUIZO FEDERAL DA 2 VARA DE GUARULHOS > 19ªSSJ > SP
CO-REU : LUCIANO ALFREDO VIANNA DO RIO
: MARCELO DOS SANTOS
No. ORIG. : 00063242620014036119 2 Vr GUARULHOS/SP

EMENTA

HABEAS CORPUS - ARTIGOS 168-A E 168 DO CÓDIGO PENAL - INÉPCIA DA DENÚNCIA - PRESENÇA DE INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA - INICIAL ACUSATÓRIA NARRA OS FATOS DE FORMA CLARA E OBJETIVA - CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA POSSIBILITADOS - PRESCRIÇÃO AFASTADA - ORDEM DENEGADA
1. Denúncia regular, preenche todas as exigências do artigo 41 do Código de Processo Penal, os fatos estão narrados de forma clara e objetiva, possibilitando ao paciente o exercício do contraditório e da ampla defesa.
2. Há justa causa para o prosseguimento da ação penal, pois há indícios sérios de que o paciente, na condição de contador, teria se apropriado dos valores a ele depositados em sua conta bancária pessoal (pessoa física), deixando de recolher durante vários anos as contribuições previdenciárias dos trabalhadores da sociedade empresária Geomix Indústria, Comércio e Representação Ltda., além de iludir fraudulentamente os seus gestores.
3. Não há falar-se em prescrição, pois o tipo do artigo 168-A possui pena máxima de cinco anos, e o do artigo 168 de quatro anos, porém, majorada de 1/3 (um terço) quando o delito tiver sido praticado em razão de ofício, emprego ou profissão (§ 1º, inciso III), a ensejar prazo prescricional, para ambos os crimes, de doze anos, lapso temporal este não ultrapassado entre a data dos fatos (agosto/1997 a maio/2000) e o r. despacho de recebimento da denúncia, em 30 de julho de 2009 (fl. 14).
4. Denegada a ordem.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, denegar a ordem de "habeas corpus", nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 16 de janeiro de 2012.
LUIZ STEFANINI
Desembargador Federal


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HABEAS CORPUS Nº 0035997-39.2011.4.03.0000/SP
2011.03.00.035997-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal LUIZ STEFANINI
IMPETRANTE : MARCELO EDUARDO INOCENCIO
PACIENTE : JOSE ROBERTO FERNANDES DE MIRANDA
ADVOGADO : MARCELO EDUARDO INOCENCIO e outro
IMPETRADO : JUIZO FEDERAL DA 2 VARA DE GUARULHOS > 19ªSSJ > SP
CO-REU : LUCIANO ALFREDO VIANNA DO RIO
: MARCELO DOS SANTOS
No. ORIG. : 00063242620014036119 2 Vr GUARULHOS/SP

RELATÓRIO

Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado em favor de José Roberto Fernandes de Miranda, em face do MMº Juízo da 2ª Vara Federal de Guarulhos/SP, que recebeu a denúncia em desfavor do paciente pela prática, em tese, dos crimes tipificados no artigos 168-A, c.c o art. 71, e art. 168, ambos c.c o art. 70, todos do Código Penal.

O impetrante aduz, em síntese, a inépcia da denúncia, pois o paciente, na condição de simples contador da empresa devedora das contribuições previdenciárias, jamais poderia estar no pólo passivo de ação penal pela prática de crime de apropriação indébita previdenciária, já que não era o responsável tributário e, portanto, estava juridicamente desobrigado ao repasse das contribuições ao Fisco, que caberia aos responsáveis legais pela empresa.

Alega, ademais, a ocorrência de prescrição, porquanto os fatos datam de maio de 2000, enquanto a denúncia foi recebida apenas em julho de 2009, quando passados mais de nove anos.

Requer, outrossim, a concessão da liminar, a fim de que se determine a imediata suspensão do processo, e, ao final, o trancamento da ação penal originária.

Com a inicial vieram documentos.

A liminar foi por mim indeferida por decisão de fls. 38 e verso.

Informações às fls. 41/42.

Em parecer de fls. 64/65, a Procuradoria Regional da República opinou pela denegação da ordem.

É o relatório.

Em mesa.


VOTO

A ordem há de ser denegada.

Ao paciente estão sendo imputados os crimes tipificados nos artigos 168-A e 168 do Código Penal, porque, na condição de proprietário do ESCRITÓRIO DE CONTABILIDADE SÃO LUIZ e contador da empresa GEOMIX INDÚSTRIA, COMÉRCIO E REPRESENTAÇÃO LTDA., teria dela recebido os valores para o recolhimento das contribuições previdenciárias retidas dos salários dos empregados nos períodos de agosto/1997 a dezembro/1998 (inclusive o 13º salário) e de fevereiro/1999 a maio/2000, deixando, porém, de repassá-las ao INSS, apropriando-se do capital daquela sociedade empresária.

Descreve, ainda, a denúncia, que: "Durante as investigações policiais, em 10 de setembro de 2001, JOSE ROBERTO confirmou ao i. Delegado de Polícia Civil os desvios de recursos financeiros entregues pela empresa GEOMIX, mas negou participação na prática ilícita. Afirmou que o funcionário LUCIANO figurava como responsável pelo escritório em razão da incompatibilidade do cargo de Delegado de Polícia por ele exercido com a atividade contábil, e que MARCELO era o caixa do escritório há dez anos, cuidando diretamente da parte financeira. Admitiu ainda que a empresa GEOMIX depositava os valores referentes aos pagamentos de tributos em sua conta bancária pessoal (fls. 178/181)" - grifo nosso.

Cita, ademais, a inicial acusatória que "os indícios de autoria ainda se confirmam na medida em que os depoimentos dos funcionários do ESCRITÓRIO SÃO LUIZ apontam-nos como responsáveis pela prática criminosa (fls. 172/177, 182, 183, e fls. 315 e 316/317 dos autos nº 201.61.19.006326-3)".

Outrossim, da simples leitura da denúncia verifica-se que ela é regular, preenche todas as exigências do artigo 41 do Código de Processo Penal, os fatos estão narrados de forma clara e objetiva, possibilitando ao paciente o exercício do contraditório e da ampla defesa.

Com efeito, é cediço que quando não emerge cristalina e estreme de dúvidas a ausência de justa causa para a ação penal, não há falar-se em seu trancamento, já que as dúvidas somente poderão ser esclarecidas no curso de regular instrução criminal.

Esse é o entendimento pacífico de nossos Tribunais. Vejamos:


RECURSO EM HABEAS CORPUS. ROUBO CIRCUNSTANCIADO. COAUTORIA. PEÇA INAUGURAL QUE ATENDE AOS REQUISITOS LEGAIS EXIGIDOS. INICIAL ACUSATÓRIA QUE DESCREVE CRIME EM TESE. AMPLA DEFESA GARANTIDA. INÉPCIA NÃO EVIDENCIADA. 1. Não pode ser acoimada de inepta a denúncia formulada em obediência aos requisitos traçados no art. 41 do CPP, descrevendo perfeitamente os fatos típicos imputados, crimes em tese, com todas as suas circunstâncias, atribuindo-os ao paciente, terminando por classificá-los, ao indicar os ilícitos supostamente infringidos. 2. Se a vestibular acusatória narra em que consistiu a ação criminosa do paciente e dos demais agentes nos delitos em que lhes incursionou, permitindo o exercício da ampla defesa, é inviável acolher-se a pretensão de invalidade da peça vestibular. [...] (STJ - HC 200802689290 HC - HABEAS CORPUS - 122728 Relator(a) JORGE MUSSI QUINTA TURMA Fonte DJE DATA:30/11/2009) - grifei.


PENAL - APELAÇÃO CRIMINAL - ROUBO PRATICADO CONTRA A ECT- ART. 157 DO CP - DENUNCIA - PREENCHIDOS OS REQUISITOS DO ARTIGO 41 DO CPP - GARANTIDA A AMPLA DEFESA E O CONTRADITÓRIO - PRELIMINAR REJEITADA - AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVAS COMPROVADAS - ARTIGO 59 DO CP - CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS - REGIME PRISIONAL INICIAL - FECHADO - RECURSO DO RÉU IMPROVIDO - RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PROVIDO. 1. Preliminarmente, verifico que constam da denúncia todos os requisitos previstos do artigo 41 do Código de Processo Penal, não havendo que se falar em sua inépcia. 2. Por outro lado, a inépcia da denúncia só deverá ser decretada, se ausentes os requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal, ou houver alguma restrição ao contraditório e à ampla defesa. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. Preliminar rejeitada (TRF3 - ACR 200403990055702 ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 16446 Relator(a) JUIZA RAMZA TARTUCE Órgão julgador QUINTA TURMA Fonte DJU DATA:20/09/2005 PÁGINA: 347) - grifei.


PENAL. PROCESSUAL. ESTELIONATO. TRANCAMENTO. FATOS CONTRADITÓRIOS. "HABEAS CORPUS". RECURSO. 1.- Havendo controvérsia, há que se prosseguir com a ação penal. O Habeas Corpus não serve para trancar o processo quando se tem que adentrar em revolvimento de provas. 2.-Recurso conhecido mas improvido". (STJ., Rel. Min. Edson Vidigal, DJU 6/6/94, p. 14.283)


No mesmo sentido aponta a doutrina, como vemos na lição de Mirabete in "Processo Penal", 2ª ed. Atlas. P. 690:


"Também somente se justifica a concessão do "Habeas Corpus" por falta de justa causa para a ação penal quando ela é evidente, ou seja, quando a ilegalidade é evidenciada pela simples exposição dos fatos com o reconhecimento de que há imputação de fato atípico ou da ausência de qualquer elemento indiciário que fundamente a acusação. É possível verificar-se perfunctoriamente os elementos em que se sustenta a denúncia ou a queixa, para reconhecimento da fumaça do bom direito, mínimo demonstrador da existência do crime e da autoria, mas não se pode, pela via do "mandamus", trancar a ação penal por falta de justa causa quando seu reconhecimento exigir um exame aprofundado e valorativo da prova dos autos".


No caso dos autos, porém, há justa causa para o prosseguimento da ação penal, pois há indícios sérios de que o paciente, na condição de contador da empresa supracitada, teria se apropriado dos valores a ele depositados em sua conta bancária pessoal (pessoa física), deixando de recolher durante vários anos as contribuições previdenciárias dos trabalhadores daquela sociedade empresária, além de iludir fraudulentamente os seus gestores.

Nesse sentido, transcrevo o depoimento da testemunha Luis César Salles Perna, um dos sócios da GEOMIX:


"[...] J: Quem cuidava dos pagamentos dos tributos e contribuições previdenciárias da empresa?

D: Escritório São Luiz.

J: Como eram feitos esses pagamentos através do escritório?

D: Eles nos apresentavam um valor mensal e a gente mandava o dinheiro para a conta do Dr. José Roberto Fernandes de Miranda; ele era o dono do escritório e a direção era de Luciano Alfredo Vianna do Rio.

[...]

J: O senhor sabe como ele fazia depois com esse dinheiro?

D: Era um esquema, eles tinham uma agência da Nossa Caixa/Nosso Banco debaixo do escritório de contabilidade deles e ele nos passava os valores no último dia de vencimento e nossa empresa era em Guararema, a gente fazia uma transferência para José Roberto que ficava encarregado de pagar na agência que ficava embaixo do escritório dele".


Portanto, dúvidas não há acerca dos sérios indícios existentes em desfavor do paciente, não havendo que se cogitar em trancamento da ação penal.

Ademais, conforme já delineado em sede de liminar, tenho que não procedem os argumentos defensivos quanto à ilegitimidade passiva do paciente para a ação penal, pois a responsabilidade pelo recolhimento dos tributos e contribuições apesar de, em regra, competir aos gestores sociais, nada impede sejam atribuídos, no dia a dia das empresas, a diretores, gerentes ou até mesmo a terceiros que eventualmente participem de alguma forma da administração ou com ela simplesmente contribuam, como é o caso dos contadores, sendo certo que, no caso em questão, demonstrado está, ao menos nesta via sumária de cognição, que ao escritório do paciente competia o recolhimento dos tributos e contribuições da empresa GEOMIX INDÚSTRIA, COMÉRCIO E REPRESENTAÇÃO LTDA.

Por fim, não vislumbro procedência na alegação de prescrição, pois o tipo do artigo 168-A possui pena máxima de cinco anos, e o do artigo 168 de quatro anos, porém, majorada de 1/3 (um terço) quando o delito tiver sido praticado em razão de ofício, emprego ou profissão (§ 1º, inciso III), a ensejar prazo prescricional, para ambos os crimes, de doze anos, lapso temporal este não ultrapassado entre a data dos fatos (agosto/1997 a maio/2000) e o r. despacho de recebimento da denúncia, em 30 de julho de 2009 (fl. 14).

Ante o exposto, denego a ordem.

É como voto.


LUIZ STEFANINI
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): LUIZ DE LIMA STEFANINI:10055
Nº de Série do Certificado: 47D97696E22F60E3
Data e Hora: 09/01/2012 13:31:22