D.E. Publicado em 13/03/2012 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, dar parcial provimento aos recursos, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
O Ministério Público Federal, em sede de razões recursais, pleiteia:
Apela a defesa com os seguintes argumentos:
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VOTO
Imputação. Adan Suarez Arteaga foi denunciado pela prática do crime do art. 33 c. c. o art. 40, I, ambos da Lei n. 11.343/06, pois, no dia 18.08.10, no Aeroporto Internacional de Guarulhos (SP), foi preso em flagrante delito quando estava prestes a embarcar em voo com destino a Gotemburgo, na Suécia, com escala em Paris, na França, trazendo consigo, em desacordo com determinação legal/regulamentar, para fins de comércio ou entrega, de qualquer forma, a consumo de terceiros, no exterior, 4.535g (quatro mil, quinhentos e trinta e cinco) gramas - peso bruto - de cocaína, substância entorpecente que causa dependência física e/ou psíquica (fls. 49/51).
Materialidade. Está comprovada a materialidade do delito, conforme decorre dos seguintes elementos de convicção:
Autoria. Comprovada a autoria do delito, pois o acusado foi preso em flagrante, quando pretendia embarcar em voo com destino a Gotemburgo, na Suécia, transportando droga em sua bagagem.
Em sede policial, o acusado permaneceu em silêncio (fls. 5/6).
Em Juízo, o acusado disse que sabia da existência da droga na bagagem, mas não sabia o seu tipo e a quantidade. Afirmou que contraiu um empréstimo de U$ 10.000,00 (dez mil) dólares no Banco União da Bolívia para pagamento de prestações sucessivas até o ano de 2014, mas que parte desta quantia foi subtraída quando saía da agência bancária. Declinou que ficou desesperado com a situação que se agravava e ao buscar consolo com um amigo foi apresentado a um terceiro que lhe ofereceu a proposta de transporte da droga em troca da quantia equivalente a U$ 6.000,00 (seis mil) dólares. Mencionou que resolveu aceitar a proposta, em razão de tal indivíduo lhe ter assegurado que a viagem era segura e que não haveria problemas. Declinou que pouco tempo depois pretendeu desistir, mas foi obrigado a realizar o transporte da droga em razão das ameaças de morte endereçadas ao seu filho (fls. 130/131 e fl. 171, em mídia digital).
Em sede policial, o Agente de Polícia Federal, Thiago Augusto Lerin Vieira, disse que realizava seu trabalho de combate ao tráfico internacional de drogas, no TPS I, no saguão de embarque do voo AF 459, quando abordou o acusado e, ao verificar que o itinerário da viagem correspondia a uma rota de tráfico de drogas solicitou à companhia aérea a bagagem de porão do acusado. Afirmou que a bagagem foi submetida ao equipamento de raio x, momento em que foi constatada a existência de material orgânico em seu interior. Declinou que todos se dirigiram à delegacia, onde a mala foi aberta, encontrando-se nas laterais e na tampa da mesma, placas de resina, contendo substância, que, após teste preliminar, constatou-se ser cocaína (fls. 2/3).
A testemunha Dayane Moreira Gomes afirmou, perante a autoridade policial, que realizava seu trabalho de fiscalização nas bagagens de mão, no TPS 1, quando foi solicitado pelo agente Thiago que estava na companhia do acusado que a mala do acusado fosse colocada no raio x, momento em que se constatou a presença de substância orgânica. Mencionou que todos se dirigiram à delegacia, onde a mala foi aberta e encontrada nas laterais e na tampa, placas de resina contendo substância que, após teste preliminar, constatou-se ser cocaína (fl. 4).
Em Juízo, a testemunha Dayane disse que no momento em que a mala do acusado passou pelo raio x, constatou uma imagem alaranjada e diante do ocorrido acionou seu superior que entrou em contato com a Polícia Federal. Afirmou que acompanhou a abertura da bagagem, sendo encontrado um fundo falso, onde o Agente da Polícia Federal começou a realizar alguns furos e constatou a presença de cocaína. Mencionou que o acusado estava calmo e dizia que a bagagem não era sua (fl. 171, em mídia digital).
A alegação do acusado da ocorrência de coação moral irresistível, não merece prosperar, uma vez que a ameaça com o intuito de exclusão da culpabilidade do réu tem requisitos próprios que devem sem provados a fim de que haja a exclusão da culpabilidade. Destarte, não fora provada a existência da pessoa que fez a ameaça, bem como a existência desta.
Assim, a afirmação do acusado não encontra qualquer respaldo probatório nos autos, não passando de mera alegação, devendo, portanto, ser responsabilizado penalmente.
Comprovada a autoria e a materialidade delitivas, bem como a feição internacional do tráfico de drogas praticado pelo réu, a condenação deve ser mantida.
Estado de necessidade. Tráfico. Inadmissibilidade. Para que se reconheça que o réu agiu em estado de necessidade exculpante ou justificante, à míngua de comprovação cabal do preenchimento dos requisitos do art. 24 do Código Penal para o reconhecimento dessa excludente de ilicitude ou de culpabilidade, sendo ônus da defesa fazê-lo, nos termos do art. 156 do Código de Processo Penal:
Do caso dos autos. Não comprovou a defesa, sendo seu ônus fazê-lo (art. 156 do CPP), que o apelante enfrentava a existência de ameaça atual a direito próprio ou alheio, o que, desde logo, impossibilita o reconhecimento do estado de necessidade, exculpante ou justificante.
Ainda que houvesse eventual situação de perigo atual que afligisse o réu, a conduta criminosa não era inevitável, sendo-lhe exigível comportamento conforme o direito.
Não se caracterizou, pois, a ocorrência de causa supralegal de exclusão de culpabilidade, inaplicável, pelas mesmas razões, a causa de diminuição de pena prevista no art. 24, § 2º, do Código Penal, bem como as circunstâncias atenuantes elencadas no art. 65, III, "a" e "c", do mesmo diploma legal.
Tráfico. Direito de apelar em liberdade. O direito de apelar em liberdade para os delitos da Lei n. 11.343/06 é excepcional, desafiando fundamentação própria, não havendo ilegalidade em manter a prisão do réu que nessa condição respondeu a ação penal:
Do caso dos autos. Não prospera o pleito da defesa para que o réu responda ao processo em liberdade, porquanto esteve preso durante todo o processo, tendo salientado o Juiz a quo que permaneciam presentes os motivos da cautelaridade da prisão quando da prolação da sentença, a qual devia ser mantida.
Dosimetria. Na sentença, o Juízo a quo, com fundamento no art. 42 da Lei n. 11.343/06 e no art. 59 do Código Penal, fixou a pena-base acima do mínimo legal, em 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de reclusão.
Ausentes circunstâncias agravantes, a pena foi reduzida para 6 (seis) anos de reclusão, em virtude da confissão.
Em razão da transnacionalidade, a pena foi majorada em 1/6 (um sexto) para 7 (sete) anos de reclusão.
Aplicou a causa de diminuição do § 4°, do art. 33, da Lei n. 11.343/2006, reduzindo a pena em 1/3 (um terço), para 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão.
No tocante à pena de multa, aplicando os mesmos critérios e fundamentos utilizados para a pena privativa de liberdade, tornou-a definitiva em 466 (quatrocentos e sessenta e seis) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente, em razão da condição econômica do réu.
Determinou o cumprimento da pena no regime inicial fechado.
Considerou incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos e determinou que o réu não poderá apelar em liberdade.
A acusação pleiteia a inaplicabilidade da causa de diminuição do § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06 ou, alternativamente, a sua aplicação no patamar mínimo de 1/6 (um sexto), o afastamento da atenuante da confissão e a aplicação da causa de aumento do art. 40, I, da Lei n. 11.343/06 no seu patamar máximo.
A defesa, por sua vez, recorre da dosimetria da pena, requerendo a fixação da pena-base no mínimo legal, o afastamento do art. 40, I, da Lei n. 11.343/06, a aplicação do § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06 em seu máximo legal, o estabelecimento do regime inicial do cumprimento da pena no semiaberto ou aberto, a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos e o afastamento da aplicação da pena de multa.
Os recursos merecem, em parte, prosperar.
Fixo a pena-base 1/6 (um sexto) acima do mínimo legal, em 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa, considerando a natureza do entorpecente (cocaína) e a sua quantidade (1.369g).
Ausentes circunstâncias agravantes.
O reconhecimento da atenuante genérica do art. 65, III, d, do Código Penal merece ser mantido. O réu confessou a autoria delitiva e o Juízo a quo fundamentou a condenação na versão apresentada judicialmente. São irrelevantes os motivos pelos quais o agente teria sido levado a confessar o delito perante a autoridade para fazer jus à incidência da atenuante genérica (STJ, HC n. 159.854, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 15.06.10; HC n. 117.764, Rel. Min. Og Fernandes, j. 11.05.10; HC n. 46.858, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 13.11.07; HC n. 79.381, Rel. Min. Nilson Naves, j. 23.10.07).
Reconhecida a confissão espontânea do acusado, diminuo a pena-base de 1/6 (um sexto), respeitado o limite da Súmula n. 231 do Superior Tribunal de Justiça, para 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa.
Alguns precedentes do Supremo Tribunal Federal admitem que a natureza e a quantidade de entorpecente sirvam para graduar a causa de diminuição do § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06 (STF, HC n. 106.762, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 21.06.11; HC n. 104.195, Rel. Min. Luiz Fux, j. 26.04.11), reconhecendo ademais plena liberdade ou discricionariedade judicial (STF, HC n. 94.440, Rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 03.05.11; RHC n. 106.719, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 01.03.11). Não obstante, há precedentes também no sentido de que considerar essas circunstâncias do delito seria proibido bis in idem (STF, HC n. 108.264, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 21.06.11; HC n. 106.313, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 15.03.11). Assim, embora repute admissível apreciar tais circunstâncias com certa dose de discricionariedade (trata-se de disposição específica), convém que além delas sejam consideradas outras peculiaridades do caso concreto, à vista das provas dos autos, para resolver sobre a aplicabilidade e a gradação dessa causa de diminuição.
Não há elementos de que o réu se dedique a atividades criminosas ou integre organização criminosa, não bastando, para essa ilação, que sua conduta contribua para as finalidades ilícitas de grupos criminosos. Preenchidos os requisitos legais, mantenho a aplicação do § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06, todavia, reduzo a pena de 1/6 (um sexto), em vez do 1/3 (um terço) aplicado na sentença, para 4 (quatro) anos e 2 (dois) meses de reclusão e 416 (quatrocentos e dezesseis) dias-multa.
A internacionalidade do delito de tráfico de drogas exsurge das circunstâncias fáticas e dos elementos coligidos, como as passagens aéreas em nome do acusado, a tentativa de envio da droga ao exterior, e de o réu ter sido preso no Aeroporto Internacional de Guarulhos (SP) prestes a embarcar em voo para Gotemburgo, na Suécia, trazendo consigo, em sua bagagem, significativa quantidade de cocaína (1.369g), tudo a denotar a feição transnacional do tráfico de entorpecentes.
A causa de aumento pela transnacionalidade do delito deve elevar a pena de 1/6 (um sexto), o que resulta em 4 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão e 485 (quatrocentos e oitenta e cinco) dias-multa. O aumento da pena pela internacionalidade do crime não deve ultrapassar o mínimo legal, pois restou configurada de forma ordinária, não se evidenciando no caso dos autos circunstâncias do delito que reclamassem o recrudescimento da majorante em questão.
Sem outras atenuantes, agravantes, causas de diminuição ou de aumento, torno a pena definitiva de Adan Suarez Arteaga em 4 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão e 485 (quatrocentos e oitenta e cinco) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente à época dos fatos.
Quanto à pena pecuniária, eventual afastamento deve ser pleiteada ao Juízo das Execuções Penais, porquanto àquele competente a apreciação desse pedido.
No tocante à expulsão do réu, esta poderá ocorrer mesmo que esteja sendo processado ou haja condenação, conforme se extrai do artigo 67 da Lei 6815/90 e do artigo 3º do Decreto 98.691/90 que trata da expulsão do condenado por tráfico de entorpecentes:
Manifesta-se o Parquet Federal em sede de contrarrazões, no seguinte sentido:
Tráfico. Substituição. O Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade da vedação à conversão das penas privativas de liberdade em restritivas de direitos contida no § 4º do art. 33 e no art. 44 da Lei n. 11.343/06 (STF, Pleno, HC n. 97256, Rel. Min. Ayres Britto, j. 01.09.10), de modo que, nos delitos de tráfico transnacional de entorpecentes cumpre resolver sobre a substituição à luz do disposto no art. 44 do Código Penal.
Do caso dos autos. Adan Suarez Arteaga não preenche o requisito objetivo do art. 44, I do Código Penal, porquanto condenado a pena superior ao quantum estabelecido no mencionado dispositivo legal para obtenção do benefício pleiteado, bem como a grande potencialidade e efeitos maléficos da droga trazida pelo recorrente (cocaína) são circunstâncias suficientes a revelar que ele não cumpre também os requisitos subjetivos previstos nos artigos 59 e 44, inciso III, ambos do Código Penal, de maneira que, também por essa razão, não faz jus à pretendida substituição.
Assim, rejeito o pleito da defesa quanto à substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos em face da expressa vedação legal e mormente por se mostrar inadequada a medida para os fins de repressão e prevenção do ilícito praticado pelo acusado.
Tráfico. Regime inicial fechado. Admissibilidade. É possível fixar o regime inicial fechado no delito de tráfico internacional de entorpecentes, ainda que a pena seja inferior a quatro anos, desde que haja circunstâncias judiciais desfavoráveis ou fatos concretos a justificar a decisão:
Do caso dos autos. Considerando as circunstâncias do caso, bem como a pena privativa de liberdade aqui aplicada, cabível o regime inicial fechado para o cumprimento de pena, o que não impede, cumpridos os requisitos legais, que futuro pedido de verificação do tempo de cárcere para progressão a regime menos gravoso seja apreciado pelo Juízo das Execuções Penais, a quem compete o acompanhamento da execução da pena.
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO aos recursos para reduzir a pena-base e aplicar a causa de diminuição do § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06 no patamar mínimo de 1/6 (um sexto), tornando a pena definitiva de Adan Suarez Arteaga em 4 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão, regime inicial fechado, e 485 (quatrocentos e oitenta e cinco) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente à época dos fatos. No mais, fica mantida a sentença.
É o voto.
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Data e Hora: | 07/03/2012 13:39:34 |