Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 01/02/2012
HABEAS CORPUS Nº 0029428-22.2011.4.03.0000/SP
2011.03.00.029428-3/SP
RELATORA : Juiza Convocada SILVIA ROCHA
IMPETRANTE : GILSON ROBERTO PEREIRA
PACIENTE : WALDIR CONDE ANTONIO
ADVOGADO : GILSON ROBERTO PEREIRA
IMPETRADO : JUIZO FEDERAL DA 2 VARA CRIMINAL SAO PAULO SP
No. ORIG. : 2008.61.81.004625-8 2P Vr SAO PAULO/SP

EMENTA

PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO. ARTIGO 21, PARÁGRAFO ÚNICO, SEGUNDA FIGURA DA LEI 7.492/86. AÇÃO PENAL. JUSTA CAUSA. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DO BANCO CENTRAL EM ANDAMENTO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. INOCORRÊNCIA. INDEPENDÊNCIA DAS ESFERAS. ORDEM DENEGADA.
1. Habeas Corpus impetrado contra ato de Juiz Federal, que preside a ação penal nº 2008.61.81.004625-8, em que o paciente está sendo processado pela prática do crime tipificado no artigo 21, parágrafo único, da Lei 7.492/86.
2. Não se entrevê, de forma inequívoca, a necessidade de aguardar-se o término do procedimento administrativo para avaliar-se a ocorrência de crime, porquanto a conduta típica consiste no fornecimento de informações falsas em operação de câmbio, assemelhando-se ao delito de falsidade ideológica, e, nessa senda, pode ser detectável pela análise de documentos.
3. Esta detecção resta clara pelo ofício, datado de 02.08.2007, oriundo do Banco Central do Brasil. O que se tem até o momento é a verificação de irregularidades, inclusive com aplicação de penalidade pelo Banco Central à empresa administrada pelo paciente.
4. O habeas corpus configura remédio constitucional de rito célere, em que as alegações devem vir comprovadas por prova pré-constituída, o que não se verifica do conjunto probatório.
5. Considere-se, ainda, a tese consolidada nos tribunais da independência das esferas administrativa e penal, a afastar o pedido de trancamento da ação penal por ausência de término do procedimento instaurado no Banco Central do Brasil.
6. Ordem denegada.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, ACORDAM os integrantes da Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, denegar a ordem de habeas corpus, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte do presente julgado.


São Paulo, 24 de janeiro de 2012.
SILVIA ROCHA
Juíza Federal Convocada


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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HABEAS CORPUS Nº 0029428-22.2011.4.03.0000/SP
2011.03.00.029428-3/SP
RELATORA : Juiza Convocada SILVIA ROCHA
IMPETRANTE : GILSON ROBERTO PEREIRA
PACIENTE : WALDIR CONDE ANTONIO
ADVOGADO : GILSON ROBERTO PEREIRA
IMPETRADO : JUIZO FEDERAL DA 2 VARA CRIMINAL SAO PAULO SP
No. ORIG. : 2008.61.81.004625-8 2P Vr SAO PAULO/SP

RELATÓRIO

A Juíza Federal Convocada Silvia Rocha (Relatora):



Trata-se de Habeas Corpus, com pedido de liminar, impetrado por Gilson Roberto Pereira em favor de WALDIR CONDE ANTONIO, contra ato do Juiz Federal da 2ª Vara Criminal de São Paulo/SP, que preside a ação penal nº 2008.61.81.004625-8.

Consta dos autos que o paciente está sendo processado criminalmente pela prática do crime tipificado no artigo 21, parágrafo único, da Lei 7.492/86, no bojo da ação penal supramencionado.

Sustenta o impetrante haver constrangimento ilegal ao paciente derivado da instauração da ação penal, ao argumento de ausência de justa causa para persecução em juízo porque o procedimento administrativo, a cargo do Banco Central do Brasil, não se encerrou, estando na fase recursal.

Em consequência, requer a concessão da liminar para reformar a decisão da autoridade impetrada que determinou a citação do paciente na ação penal, recolhendo-se o mandado expedido. Ao final, o trancamento da ação penal.

Requisitadas informações à autoridade impetrada (fls. 84), foram prestadas às fls. 86/87, com os documentos de fls. 88/96.

A liminar foi indeferida às fls. 98/100.

Parecer da Procuradoria Regional da República pela denegação da ordem às fls. 102/104.

É o relatório.

Apresento o feito em mesa.



VOTO

A Juíza Federal Convocada Silvia Rocha (Relatora):



Não vislumbro constrangimento ilegal sanável por esta via.

Reclama o impetrante pela ausência de justa causa para a ação penal, ao entendimento da necessidade do término do procedimento administrativo perante o Banco Central do Brasil, para verificar a viabilidade de iniciar-se ação penal contra o paciente, dando-o como incurso no artigo 21, parágrafo único, da Lei 7.492/86, in verbis:


Art. 21. Atribuir-se, ou atribuir a terceiro, falsa identidade, para realização de operação de câmbio.
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
Parágrafo único - Incorre na mesma pena quem, para o mesmo fim, sonega informação que devia prestar ou presta informação falsa.

A denúncia narra a seguinte conduta, imputada ao paciente:


"(...)
Consta do incluso Inquérito Policial nº 0075/2008-11 e dos procedimentos administrativos em apenso (autos nº 12466.004819/2005-71 da Alfândega do Porto do Rio de Janeiro/RJ e Peças Informativas 1.34.001.000162/2008-60, oriundas de Procedimento do BACEN) que, no período compreendido entre agosto de 2003 a outubro de 2003, WALDIR ANTONIO CONDE, por intermédio de sua empresa VITROTEC VIDROS DE SEGURANÇA LTDA ... inseriu em contratos de câmbio informações falsas, porquanto deu como origem de tais contratos exportações que efetivamente não ocorreram, fazendo entrar dinheiro no país sem a respectiva saída das mercadorias. Agindo assim, praticou, em tese, o crime previsto no artigo 21, parágrafo único da Lei 7.492/86."

Por outro lado, a decisão impugnada, de recebimento da denúncia, relata:


"(...)
II - Da denúncia oferecida
6. Na trilha cognitiva cabível no presente momento processual, é possível se verificar que a exordial expõe de maneira satisfatória o fato delituoso, com todas as suas circunstâncias, bem assim a qualificação dos acusados e a classificação do crime, em conformidade com as disposições do art. 41 do Código de Processo Penal brasileiro, estando ausentes as hipóteses de rejeição previstas no art. 395 do mesmo Código.
7. Por outro lado, cumpre observar que há justa causa para a ação penal, posto que a denúncia vem embasada em inquérito policial, onde foram colhidas as provas da existência do fato que constitui crime em tese e indícios de autoria (fumus boni juris), a justificar o oferecimento da denúncia.
8. Ante o exposto, RECEBO a denúncia de fls. 175-180, com relação aos demais fatos não alcançados pela prescrição, formulada em desfavor de Waldir Conde Antonio, que deverá ser citado para responder à acusação, por escrito, no prazo de 10 dias, nos termos dos arts. 396 e 396-A do Código de Processo Penal brasileiro."

Depreende-se da exordial acusatória a imputação ao paciente de inserção falsa de informações em contratos de câmbio.

O crime do artigo 21, parágrafo único, segunda figura, da Lei 7.492/86 assemelha-se ao delito de falsidade ideológica, previsto no Código Penal. É a lição do e. jurista Rodolfo Tigre Maia, in Dos Crimes Contra o Sistema Financeiro Nacional - Anotações à Lei Federal n. 7.492/86, 1ª edição, p. 131:

"A segunda modalidade, realizada quando o sujeito ativo "presta informação falsa", é similar a variante de "inserir ou fazer inserir" preconizada no falso ideológico, sendo que, aqui, o autor cria uma informação fictícia ou altera de qualquer modo o conteúdo da informação verdadeira, tornando-a inverídica, e fornece-a quando da realização de uma operação de câmbio. De se ressaltar que a informação deve possuir relevância jurídica e sua alteração deve ser potencialmente lesiva."

Assim, não entrevejo, de forma inequívoca, a necessidade de aguardar-se o término do procedimento administrativo para avaliar-se a ocorrência de crime, porquanto a conduta típica consiste no fornecimento de informações falsas em operação de câmbio e, nessa senda, pode ser detectável pela análise de documentos.

Aliás, esta detecção resta clara pelo ofício de fls. 52/54, datado de 02.08.2007, oriundo do Banco Central do Brasil, apontando irregularidade em negociação efetivada pela empresa Vitrotec Vidros de Segurança Ltda., consistente em declarar informações falsas em contratos de câmbios, celebrados no Mercado de Câmbio de Taxas Livres, a título de recebimento de exportação, no montante de USD 3.922.049,72 (três milhões, novecentos e vinte e dois mil, quarenta e nove dólares americanos e setenta e dois centavos). Segundo o apurado, as exportações indicadas em despachos aduaneiros não ocorreram.

Posteriormente, em 14.05.2009, o Banco Central do Brasil informou que a defesa administrativa apresentada por Vitrotec Vidros de Segurança Ltda. foi considerada improcedente e decidiu pela aplicação de multa à pessoa jurídica (fls. 34/35).

Destarte, o que se tem até o momento é a verificação de irregularidades, inclusive com aplicação de penalidade pelo Banco Central à empresa administrada pelo paciente.

O habeas corpus configura remédio constitucional de rito célere, em que as alegações devem vir comprovadas por prova pré-constituída, o que não se verifica do conjunto probatório.

Por derradeiro, considere-se a tese consolidada nos tribunais da independência das esferas administrativa e penal, a afastar o pedido de trancamento da ação penal por ausência de término do procedimento instaurado no Banco Central do Brasil. Nesse sentido:


CRIMINAL. RHC. CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL. LEI 7.492/86. ART. 6º E 22. EFETUAR OPERAÇÃO DE CÂMBIO NÃO-AUTORIZADA E INDUZIR EM ERRO REPARTIÇÃO PÚBLICA POR SONEGAR INFORMAÇÃO DA R. OPERAÇÃO. TRANCAMENTO DA AÇÃO. INÉPCIA DA DENÚNCIA. DEFICIÊNCIA DA PEÇA E PREJUÍZO À DEFESA NÃO-DEMONSTRADOS. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA NÃO EVIDENCIADA. TIPICIDADE. MATÉRIA DECIDIDA NA ESFERA ADMINISTRATIVA. INDEPENDÊNCIA DAS INSTÂNCIAS. RECURSO DESPROVIDO. (omissis) VI. A declaração de nulidade do procedimento administrativo - que não caracterizou ausência de responsabilidade, não implica no reconhecimento da inexistência de fato típico, tendo em vista a independência das instâncias administrativa, civil e penal. (omissis) VIII. Recurso desprovido.
STJ. RHC 9281. Relator Min. Gilson Dipp. DJ 30.10.2000.
HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. BANCO CENTRAL. REMESSA IRREGULAR DE DINHEIRO PARA O EXTERIOR. CONDUTA TÍPICA. INDEPENDÊNCIA DAS INSTÂNCIAS ADMINISTRATIVA E PENAL. INÉPCIA DA DENÚNCIA NÃO CARACTERIZADA. EXTINÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. DECADÊNCIA. FALTA DE JUSTA CAUSA. MATERIALIDADE DO DELITO DE SONEGAÇÃO FISCAL NÃO CARACTERIZADA. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA. 1. Os pacientes foram denunciados pela suposta prática de delitos contra a ordem tributária e contra o sistema financeiro nacional, uma vez que empresa da qual eram sócios-gerentes teria remetido valores ao exterior a título de pagamento de serviços turísticos sem o recolhimento de Imposto de Renda Retido na Fonte, entre os períodos de agosto de 1995 e maio de 1996. 2. A existência de procedimento administrativo do Banco Central instaurado para apurar a ocorrência de remessa irregular de dinheiro para o exterior, que caracterizaria a prática do crime de evasão de divisas, não é obstáculo para a propositura de ação penal pelo Ministério Público Federal, principalmente se constatada a ocorrência de conduta típica pelos ora Pacientes, observando-se a independência das instâncias administrativa e penal na apuração deste tipo de delito.
TRF - 3ª Região. HC 1778. Relator Des. Federal Cotrim Guimarães. DJU 02.06.2006.
APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL. ARTIGO 17, CAPUT, DA LEI Nº 7.492/86. CONCESSÃO DE EMPRÉSTIMO A EMPRESA COLIGADA. AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVAS COMPROVADAS. INESCUSÁVEL O DESCONHECIMENTO DA VEDAÇÃO PRESCRITA PELO TIPO PENAL. INDEPENDÊNCIA ENTRE AS ESFERAS PENAL E ADMINISTRATIVA. O CRIME É DE MERA CONDUTA E PRESCINDE DE RESULTADO DANOSO. INAPLICÁVEL O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APELAÇÃO MINISTERIAL PROVIDA. - Apelação ministerial e dos réus contra sentença pela qual os réus Cláudio, Toufik, Ralph Barki, Luiz Carlos e Andrés foram absolvidos, com fundamento no art. 386, incs. II e III, do CPP, da imputação do art. 17, caput, da Lei nº 7.492/86, c.c. o art. 71 do CP e Sony e Ralph Levy foram condenados à pena de 02 anos e 04 meses de reclusão, em regime aberto, e ao pagamento de 11 dias-multa, como incursos no art. 17, caput, da Lei nº 7.492/86, c.c. o art. 71 do CP. Segregação substituída por uma pena restritiva de direitos. - Materialidade delitiva comprovada pelos processos administrativos do Banco Central. - A autoria restou provada. (omissis). Eram os administradores, os quais tinham o dever de zelar pela regularidade das ações realizadas pelas empresas, assim como seria inescusável o desconhecimento da vedação imposta pelo artigo 17 da Lei nº 7.492/86. - As alegações de que o Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional arquivou um dos processos administrativos instaurados por ausência de dolo são imprósperas. Não houve negativa do fato nem da autoria. O outro processo que diz respeito aos empréstimos vedados de quantias mais expressivas não foi arquivado. - As esferas penal e administrativa são independentes. O Judiciário não fica vinculado à decisão da autoridade administrativa. - A conduta praticada foi típica. O art. 17 da Lei nº 7.492/86 define que o delito se configura com a realização da conduta de conceder ou receber empréstimo, independentemente do valor. A regra visa a proteger as instituições financeiras ou equiparadas da disponibilidade de recursos para agentes privilegiados e impedir a decomposição patrimonial da empresa que é parte do Sistema Financeiro Nacional. - O crime do art. 17 da Lei nº 4.792/86 é de mera conduta e não exige resultado danoso. - Inaplicável o princípio da insignificância, pois os valores correspondentes aos empréstimos equivaliam, em 30.06.95, à quantia de R$ 2.396.166,99. - O fato de as operações terem sido regularizadas posteriormente não exclui a ilicitude da conduta. (omissis)
TRF - 3ª Região. ACR 14354. Relator Des. André Nabarrete. DJU 13.09.2005.

Ante o exposto, denego a ordem.

É o voto.


SILVIA ROCHA
Juíza Federal Convocada


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): SILVIA MARIA ROCHA:10081
Nº de Série do Certificado: 22EBE77A1F0654D1
Data e Hora: 26/01/2012 12:57:30