Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 02/03/2012
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0004570-57.2001.4.03.6181/SP
2001.61.81.004570-3/SP
RELATOR : Desembargador Federal LUIZ STEFANINI
APELANTE : CELIA ROCHA NUNES GIL
: MARCIA ROCHA NUNES
: SANDRA ROCHA NUNES
: TERESINHA DO CARMO ARAUJO
ADVOGADO : PATRICIA TOMMASI e outro
APELANTE : Justica Publica
NÃO OFERECIDA DENÚNCIA : MARIA DO CARMO LOMBARDI
: ANTONIA PERES MARCAL falecido
: CANDIDA NEVES GIL
: MARIA CECILIA DOS SANTOS
APELADO : OS MESMOS

EMENTA

PENAL - ESTELIONATO CONTRA O MINISTÉRIO DA FEZENDA - CONCESSÃO DE BENEFÍCIOS FRAUDULENTOS - RÉS SERVIDORAS DO ÓRGÃO - INSTITUIDORES FICTÍCIOS DE PARENTES - MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO - COMPROVAÇÃO - DOSIMETRIA DA PENA - CIRCUNSTÂNCIAS DO ART. 59 DO CÓDIGO PENAL - PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL - PENA MAJORADA - INDIVIDUALIZAÇÃO DAS CONDUTAS - AUMENTO PELA CONTINUIDADE DELITIVA - INCIDÊNCIA DO § 3º, DO ART. 171, DO CÓDIGO PENAL - REGIME INICIAL SEMIABERTO DE CUMPRIMENTO DE PENA PARA AS RÉS SERVIDORAS - REGIME INICIAL ABERTO DE CUMPRIMENTO DE PENA PARA AS DEMAIS CORRÉS - PARCIAL PROVIMENTO DOS RECURSOS - IMPROVIMENTO DOS RECURSOS EM RELAÇÃO A UMA DAS RÉS.
1.- As rés, na qualidade de servidoras do Ministério da Fazenda, foram responsáveis pela inclusão de falsos beneficiários nos cadastros do órgão e por concessões fraudulentas de benefícios em prejuízo da entidade.
2.- A materialidade do crime está comprovada pela documentação obtida no procedimento administrativo e valores constantes da folha de pagamentos que demonstram a fraude. Autoria comprovada por depoimentos harmônicos colhidos nos autos.
3.- Os valores irregularmente pagos pelo Ministério eram repartidos entre os beneficiários do esquema fraudulento que tinham ciência da prática criminosa.
4.- Circunstâncias do artigo 59 do Código Penal desfavoráveis às rés, a justificar fixação da pena-base acima do mínimo legal, no tocante à individualização das condutas em relação à culpabilidade, reprovabilidade, censurabilidade, proporcionalidade ao dano causado, razoabilidade, efetiva punibilidade, repressão e prevenção do crime.
5.- Acertado aumento pela continuidade delitiva em razão do número de benefícios irregularmente concedidos e incidência do aumento previsto no § 3º, do art. 171, do Código Penal.
6.- Regime inicial semiaberto para as rés servidoras do órgão e regime inicial aberto para as demais.
7.- Parcial provimento dos recursos. Improvimento dos recursos em relação a uma das rés.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, em relação a Teresinha do Carmo Araújo, dar parcial provimento ao recurso da defesa, apenas para estabelecer o regime semiaberto de cumprimento de pena privativa de liberdade, mantida, no mais, a sentença e negar provimento ao recurso do Ministério Público Federal; em relação a Célia Rocha Nunes Gil, dar parcial provimento ao recurso da defesa, apenas para estabelecer o regime semiaberto de cumprimento da pena privativa de liberdade e dar parcial provimento ao recurso do Ministério Público Federal, para reformar a pena e fixá-la em 5 (cinco) anos e 4 (quatro) meses de reclusão em regime inicial semiaberto e 266 (duzentos e sessenta e seis) dias-multa à razão unitária da sentença; em relação a Márcia Rocha Nunes, negar provimento a ambos os recursos e manter a sentença; em relação a Sandra Rocha Nunes, dar parcial provimento ao recurso da defesa, apenas para estabelecer o regime inicial aberto de cumprimento de pena e dar parcial provimento ao recurso ministerial, para reformar a pena e fixá-la em 2 (dois) anos, 7 (sete) meses e 3 (três) dias de reclusão, em regime inicial aberto e 112 (cento e doze) dias-multa, mantida, no mais a r. sentença de primeiro grau, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 13 de fevereiro de 2012.
LUIZ STEFANINI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0004570-57.2001.4.03.6181/SP
2001.61.81.004570-3/SP
RELATOR : Desembargador Federal LUIZ STEFANINI
APELANTE : CELIA ROCHA NUNES GIL
: MARCIA ROCHA NUNES
: SANDRA ROCHA NUNES
: TERESINHA DO CARMO ARAUJO
ADVOGADO : PATRICIA TOMMASI e outro
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APELADO : OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de Apelações Criminais interpostas pelo Ministério Público Federal e por Teresinha do Carmo Araújo, Célia Rocha Nunes Gil, Marcia Rocha Nunes e Sandra Rocha Nunes contra a r. sentença (fls. 3486/3505) que, julgando procedente a denúncia, condenou as rés como incursas no art. 171, § 3º, c.c. art. 29, do Código Penal, porquanto foram elas responsáveis por concessões fraudulentas de benefícios em prejuízo do Ministério da Fazenda.

Teresinha do Carmo Araújo foi condenada ao cumprimento das penas de 5 (cinco) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, em regime inicial fechado e 226 (duzentos e sessenta e seis) dias-multa, no valor de um trigésimo do salário mínimo vigente;

Célia Rocha Nunes Gil foi condenada ao cumprimento das penas de 4 (quatro) anos, 5 (cinco) meses e 10 (dez) dias de reclusão, em regime inicial fechado e 213 (duzentos e treze) dias-multa, no valor de um trigésimo do salário mínimo vigente;

Márcia Rocha Nunes foi condenada ao cumprimento das penas de 2 (dois) anos, 7 (sete) meses e 3 (três) dias de reclusão, em regime inicial aberto e 112 (cento e doze) dias-multa, no valor de um trigésimo do salário mínimo vigente;

Sandra Rocha Nunes foi condenada ao cumprimento das penas de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de reclusão, em regime inicial fechado e 13 (treze) dias-multa, no valor de um trigésimo do salário mínimo vigente;

Para as acusadas Márcia e Sandra as penas privativas de liberdade foram substituídas por prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor de um salário mínimo a entidade pública indicada pelo MM. Juízo das Execuções.

Em razões recursais (fls. 3521/3534), pleiteia o Ministério Público Federal a majoração da pena imposta às rés, em face das circunstâncias previstas no art. 59 do Código Penal, pugnando pela majoração das penas-bases e da porcentagem decorrente da cotinuidade delitiva, em face da grande quantidade de benefícios fraudados.

Alega que a culpabilidade das rés se apresenta de forma acentuada, os motivos do crime são ganância extrema e inescrupulosa, os antecedentes da ré Terezinha lhe são desfavoráveis, as consequências do crime resultaram em prejuízo de R$ 2.500.000 (dois milhões e quinhentos mil) reais aos cofres públicos, a autorizar a exacerbação da pena para nível substancialmente maior do que o fixado na sentença, não olvidando o aspecto de retribuição da pena, salientado tratar-se de crime instantâneo com efeitos permanentes.

Em razões recursais (fls. 3550/3563), Teresinha do Carmo Araujo alega excesso na dosimetria da pena estabelecida em três vezes o mínimo legal na primeira fase.

Aduz, para tanto, que a Magistrada considerou inquéritos em curso que apuram fatos semelhantes aos dos presentes autos, sem que houvessem condenações transitadas em julgado, o que não serviria à majoração da pena, a violar o princípio da presunção de inocência, considerando ainda a personalidade da ré frente à reiteração de ações semelhantes às dos autos.

Alega que houve bis in idem nos fundamentos do estabelecimento da pena.

Pondera que houve desconsideração da confissão espontânea no cômputo da reprimenda expressamente utilizada na sentença para a condenação.

Alega ainda participação de menor importância, pleiteando regime inicial semiaberto, por não ser reincidente.

Intenta, por fim, a diminuição da pena de multa na proporção da pena corporal.

Em razões recursais (fls. 3619/3630), Célia Rocha Nunes Gil, Márcia Rocha Nunes e Sandra Rocha Nunes pleiteiam absolvição, ou, se assim não entendido, a fixação da pena de Célia Rocha no mínimo legal por se tratar de ré primária, considerando-se a atenuante de confissão espontânea com conversão da pena corporal em penas restritivas de direitos e o reconhecimento da prescrição retroativa em relação ao delito imputado a Sandra Rocha Nunes.

Foram oferecidas contrarrazões de ambas as partes.

Parecer da lavra da ilustre Procuradora da República Denise Neves Abade, opina pelo provimento do recurso do Ministério Público Federal e improvimento dos apelos interpostos pelas rés, reformando-se a sentença para majorar as penas a elas impostas (fls. 3642/3656).

É o relatório.

À revisão.


LUIZ STEFANINI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0004570-57.2001.4.03.6181/SP
2001.61.81.004570-3/SP
RELATOR : Desembargador Federal LUIZ STEFANINI
APELANTE : CELIA ROCHA NUNES GIL
: MARCIA ROCHA NUNES
: SANDRA ROCHA NUNES
: TERESINHA DO CARMO ARAUJO
ADVOGADO : PATRICIA TOMMASI e outro
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: CANDIDA NEVES GIL
: MARIA CECILIA DOS SANTOS
APELADO : OS MESMOS

VOTO

Consta da denúncia, em síntese, que as acusadas Célia Rocha Nunes Gil, Teresinha do Carmo Araújo e a falecida Verônica Otília Vieira de Souza, aproveitando-se dos cargos que desempenhavam no Ministério da Fazenda, foram responsáveis pela concessão de aposentadorias fraudulentas, em benefício de diversas pessoas, dentre as quais, as rés Márcia Rocha Nunes e Sandra Rocha Nunes e as pessoas de Cândida Neves Gil e Antônia Perez Marçal.

As pensões eram obtidas com base em instituidores fictícios, que não possuíam qualquer vínculo com as pessoas beneficiadas, mediante a ação dolosa das rés servidoras, responsáveis pela implementação dos benefícios nas folhas de pagamento do Ministério da Fazenda.

Célia Rocha Nunes Gil confessou ter sido responsável, em concurso com a falecida Verônica e com a denunciada Teresinha, pelo agenciamento de pessoas para serem colocadas na folha de pagamento do Ministério da Fazenda, com elas dividindo os valores ilicitamente recebidos.

Teresinha confessou que fazia parte do "esquema" de inclusão de falsos beneficiários nos cadastros do Ministério da Fazenda.

Com o decorrer das apurações, restou comprovada a fraude pelos inúmeros extratos bancários e as transações entre elas, visando divisão dos valores recebidos.

Arrola a denúncia os benefícios fraudulentos, a seguir:


1. Benefício fraudulento em nome de Márcia Nunes Marccalian, cuja data da inclusão é de 12/11/1996, no período de novembro de 1996 a maio de 2001 que acarretou o recebimento irregular de R$ 438.000,00 (quatrocentos e trinta e oito mil) reais.

Apurou-se que o benefício foi, em verdade, destinado a Márcia Rocha Nunes, irmã de Célia. Márcia confessou que o dinheiro da pensão era depositado em conta aberta no Banco do Brasil e que, mensalmente, realizava a divisão dos valores, mediante transferências para as contas de Célia, Teresinha e a falecida Verônica. Márcia confessou que recebia mensalmente os holerites das pensões em seu nome. Os fatos foram confessados por Célia Rocha Nunes Gil.

Restou comprovado que Márcia, em concurso e unidade de desígnios com Teresinha, Célia e a falecida Verônica, obteve benefício de todas elas, durante o período entre novembro de 1996 a maio de 2001, vantagem ilícita consistente em pensão fraudulenta, induzindo em erro o órgão público.


2. Benefício fraudulento em nome de Sandra Botassio, cuja data de inclusão é de 19 de maio de 1995, no período de maio de 1995 a junho de 2001 que acarretou o recebimento irregular de mais de R$ 608.000,00 (seiscentos e oito mil reais).

Apurou-se que o benefício foi obtido em nome de Sandra Rocha Nunes, irmã de Célia. Sandra confessou que o dinheiro era recebido em conta aberta no banco do Brasil e que ficava com um quarto dos valores recebidos mensalmente, dividindo o restante com sua irmã Célia, com Verônica e Teresinha, mediante cheques por ela (Sandra) emitidos, recebendo holerites mensais nos quais constava o benefício em seu nome.

Os documentos enviados pelo Banco do Brasil demonstram os créditos efetuados por Sandra a favor de Verônica, Célia e Teresinha.


3. Benefício fraudulento em nome de Wantonia Perez Marçal, cuja data de inclusão é de 9 de setembro de 1994, no período de janeiro de 1994 a junho de 2001 que acarretou o recebimento irregular de mais de R$ 560.000,00 (quinhentos e sessenta mil) reais.

Apurou-se que a beneficiária, na realidade, vinha a ser a Sra. Antônia Perez Marçal, sogra de Márcia Rocha Nunes, irmã de Célia. A sra. Antônia disse não ter conhecimento da conta-corrente do Banco do Brasil, versão que encontra amparo nos autos, tendo em vista que Célia afirmou que sua irmã Márcia ficou com o cartão do banco, ficando responsável pela administração da conta e pela caixa postal onde eram recebidos os holerites. Márcia ficava com um quarto do dinheiro e dividia o restante com Célia, Teresinha e Verônica. Os extratos bancários comprovam as transferências realizadas na conta de Antônia para as contas de Márcia, Teresinha e Célia.

4.Benefício em nome de Candida Neves Gil


Apurou-se que Cândida, sogra de Célia, estava incluída, sem o seu conhecimento, como beneficiária de três instituidores diferentes: José Florêncio Neves, José Carlos Bezerra Neves e Venâncio Barbosa Neves.

Célia confessou ser responsável pelo benefício instituído em favor de sua sogra Cândida que abriu uma conta no Banco do Brasil para o recebimento. Afirmou que Cândida nada sabia e permaneceu com o cartão do banco e com as chaves da caixa postal aberta em nome de Eriberto Lopes Gil, marido de Célia, para receber holerites de Cândida. O benefício era repartido em duas partes iguais, entre Célia e Teresinha.

Os extratos constantes dos autos confirmam as transferências entre as denunciadas, em relação ao benefício de José Florêncio Neves, incluído em 19 de outubro de 1995, com recebimento irregular de outubro de 1995 a maio de 2001, em cerca de R$ 440.000,00 (quatrocentos e quarenta mil) reais; ao benefício de Venâncio Barbosa Neves, incluído em 23 de maio de 1996, com recebimento irregular de maio de 1996 a setembro de 1998, em cerca de R$ 139.000,00 (cento e trinta e nove mil) reais; ao benefício de José Carlos Bezerra Neves, incluído em 17 de julho de 1997, com o recebimento irregular de julho de 1997 a maio de 2001, em cerca de R$ 310.000,00 (trezentos e dez mil) reais.

Feitas as necessárias digressões em torno dos fatos, passo ao exame das razões recursais.

O pleito de absolvição das rés não merece procedência.

A materialidade delitiva vem comprovada nos autos, pelas fichas financeiras de pensão referentes a José Florêncio Neves (fls. 70/85), José Carlos Bezerra Neves (fls. 162/170), Venâncio Barbosa Neves (fls. 181/186), Epitácio João Maçal (fls. 103/117), Joaquim Nunes Marcalian (fls.131/140) e Waldemar Pereira Botassi (fls. 219/231), todos benefícios concedidos fraudulentamente a pessoas que não possuíam vínculo com o Ministério da Fazenda e que indiretamente eram os valores recebidos pelas acusadas, bem como pelos interrogatórios e documentos coligidos no bojo do processo e seus apensos, a exemplo de cópias de extratos de movimentação financeira das rés em razão da quebra de sigilo bancário autorizadas pela Justiça que comprovaram o recebimento de valores referentes aos benefícios irregularmente pagos.

Do mesmo modo, a autoria resultou plenamente comprovada em relação a todas as rés.

Segundo o relatado no procedimento apuratório realizado, Célia Rocha, na qualidade de servidora do Ministério da Fazenda, agenciou as suas irmãs Márcia Rocha Nunes e Sandra Rocha Nunes e sua própria sogra Cândida Neves Gil e a sogra de sua irmã Márcia (Antônia Perez Marçal), para inclusão como beneficiárias de pensões as quais sabia que não tinham direito, apurando-se que as inclusões foram realizadas pelas servidoras da DAMF/SP Maria do Carmo Lombardi, Maria Cecília dos Santos e Verônica Otília Vieira de Souza.

Célia narrou em detalhes os fatos, afirmando que a proposta de participar da fraude partiu de Verônica e que o dinheiro era repartido em três partes iguais entre ela, Teresinha do Carmo e Márcia (fls. 241 e segs). Disse que agenciou Sandra, Márcia, Antônia e Cândida para participarem da fraude.

Teresinha também recebia o dinheiro dos benefícios irregulares de Sandra, Márcia, Cândida e Antônia, o que foi confirmado pelos interrogatórios , indicando que Teresinha era até sócia de Verônica.

Márcia e Sandra são irmãs de Célia e entraram no "esquema" administrando as contas-correntes nas quais o dinheiro repartido era depositado e realizavam transferência de cheques ou emissão de cheques ao portador para Célia, Verônica e Teresinha. Ambas abriram caixas postais para receberem holerites das pensões fraudulentas, manuseavam o dinheiro a evidenciar a ciência da fraude perpetrada, constatando-se nos autos que destruíram cartões de banco quando a fraude foi descoberta.

Sandra e Márcia receberam irregularmente dos cofres públicos de maio de 1995 a junho de 2001 e de novembro de 1996 a maio de 2001, respectivamente, as quantias de R$ 438.000,00 líquidos, conforme as fichas financeiras de fls. 119/149 e mais de R$ 608.000,00 conforme fichas de fls. 209/221.

O cálculo dos benefícios pagos atingiu a cifra de aproximadamente R$ 2.495.000,00 (dois milhões, quatrocentos e noventa e cinco mil) reais líquidos conforme relata o Delegado da Polícia Federal (fls. 303).

Os depoimentos colhidos pelas testemunhas de acusação corroboram os fatos. Maria Cecília dos Santos, também servidora do órgão na mesma época, disse que o envolvimento de Célia e Teresinha foi apurado porque a polícia descobriu que as pessoas que recebiam os benefícios tinham relação de parentesco com as servidoras e que a instituição dos beneficiários era fictícia e passava ao largo das auditorias que eram feitas por amostragem e não eram conferidas porque o sistema ficava em aberto sem passar pelo superior hierárquico (fls. 3312/3314).

Assim, reputo sobejamente comprovadas a materialidade, autoria e dolo na conduta das rés, merecendo manutenção a sentença condenatória.

Passo ao exame da dosimetria das penas, objeto de recurso por parte do Ministério Público Federal e das acusadas.


TERESINHA DO CARMO ARAÚJO


A ré foi condenada à pena definitiva de 5 anos e 4 meses de reclusão, em regime inicial fechado e 266 dias-multa.

As circunstâncias do art. 59 do Código Penal não lhe são favoráveis, tal como reconhecido na sentença.

A culpabilidade mostrou-se em grau acentuado, face à análise de antecedentes, conduta social e personalidade da ré. Não obstante os apontamentos de outros processos que apuram condutas semelhantes a dos autos e que não se prestam à presunção de culpabilidade e reincidência, a pena-base resultou fixada acima do mínimo legal em face da reprovabilidade da conduta, em se tratando de servidora pública da qual deve se exigir condutas ilibadas, do abalo ao bem jurídico protegido pela norma e o atingimento da sociedade como todo em face da conduta ilícita perpetrada a órgão público.

Assim, ainda que não considerados os inquéritos e processos em andamento, reputo acertado o quantum da pena-base em 3 anos de reclusão, não tendo ocorrido bis in idem, conforme consignado na sentença.

As circunstâncias judiciais não lhe são favoráveis e a pena deve refletir, tanto os aspectos objetivos como subjetivos que envolveram a conduta extraídos da livre apreciação do juiz dentro dos parâmetros fixados pelo legislador no artigo 59, mostrando-se a pena-base ideal na individualização procedida.

Conforme preleciona Guilherme de Souza Nucci "é defeso ao magistrado deixar de levar em consideração as oito circunstâncias judiciais existentes no art. 59, caput, para a fixação da pena-base. Apenas se todas forem favoráveis tem cabimento a aplicação da pena no mínimo. Não sendo, deve ela situar-se acima da previsão mínima feita pelo legislador".

Tenho, pois, que o elemento volitivo, a desaprovação penal no âmbito das condutas, a individualização da conduta da ré que defluiu do revolvimento do conjunto fático-probatório, o abalo causado pelo crime, a necessidade de adequada prevenção e repressão da conduta estão a autorizar a fixação da pena acima do mínimo.Lembro ainda a participação destacada da ré Teresinha que, na qualidade de servidora propiciou o desencadeamento de condutas posteriores com o mesmo modus operandi, a exemplo de Célia, também servidora, na dissipação do crime perpetrado no âmbito do Ministério da Fazenda, avolumando-se as condutas com motivação de lucro fácil e despercebido por parte do órgão público acentuando-se a dimensão da culpabilidade.

Ainda ressalto que a pena deve ser proporcional ao crime cometido e significar a efetiva punibilidade esperada pela sociedade no reparo e prevenção desta e de outras condutas semelhantes.

Desse modo, mantenho a pena-base, tanto a corporal como a pena de multa e, considerando o recurso apresentado pelo Ministério Público Federal, entendo não merecer majoração, estando dentro da razoabilidade que norteia a fixação das reprimendas.

Na segunda fase, não encontra acolhida o pedido de redução da pena em face de confissão espontânea que deve ser sinceramente desejada, segundo a posição doutrinária dominante a ser aferida no motivo e não na voluntariedade da ação. Tenho anotado que a confissão espontânea é aquela sem ressalvas e sem desculpas para o ato e corresponde a gesto de arrependimento e admissão incondicional da prática do delito, não tendo a confissão se revestido dessas características.

Conforme consignado na sentença, a ré embora tivesse confirmado o recebimento de parte dos valores não apresentou versão condizente com o apurado da conduta, tampouco praticou qualquer ação para ressarcir ou minorar o prejuízo causado.Disse que não sabia como era feito o procedimento de inclusão e que após o falecimento de Verônica, não sabia como excluir os benefícios continuando a recebê-los. Afirmou que passava por dificuldades financeiras e precisava custear tratamento, tentando justificar a conduta.

Na terceira fase, presente a causa de aumento do § 3º do art. 171 e a continuidade delitiva que acarretou majoração em um terço para cada uma a resultar na pena de 5 anos e 4 meses e 226 dias-multa, aumentos acertados que mantenho.

Afasto ainda a pretensa participação de menor importância. Teresinha sabia que as pessoas arregimentadas não fariam jus a benefícios, mesmo assim foram incluídas nos sistema do Ministério, conduta direta e consciente que se multiplicou e que gerou prejuízo irreparável ao órgão e à sociedade.

No que diz com o regime, acolho o pedido defensivo, uma vez que a ré não é reincidente e o quantum da pena autoriza o regime inicial semiaberto, em conformidade com o art. 33, § 2º, "b", do Código Penal.

Assim, para essa ré, nego provimento ao recurso ministerial e dou parcial provimento ao recuso da defesa, apenas para modificar o regime de cumprimento de pena, mantida, no mais, a sentença.


CÉLIA ROCHA NUNES GIL

A ré foi condenada à pena definitiva de 4 anos e 5 meses de reclusão, em regime inicial fechado e 213 dias-multa.

A pena-base restou fixada em 2 anos e 6 meses de reclusão.

Analisando os fundamentos da imposição da pena, considerando-se as razões recursais apresentadas pelo Ministério Público Federal, tenho que a pena-base a ser estabelecida para essa ré segue os mesmos argumentos expendidos por ocasião da análise da pena para a corré Teresinha, uma vez que Célia, como Teresinha era servidora do órgão público e propiciou o ingresso dos pensionistas seus familiares. A sentença consignou que as circunstâncias do art. 59 do Código Penal, para essa ré, segue os mesmos motivos explanados para a ré Teresinha, ou seja, culpabilidade acentuada, antecedentes, personalidade distorcida, condição de servidora pública, valor elevado desviado dos cofres públicos, caráter negativo da conduta social.

Em função de todos esses fatores, tenho por dever ser fixada a mesma pena em relação a Teresinha. Pena-base de 3 anos de reclusão, incidindo também o mesmo aumento pela causa do § 3º, do art. 171 do Código Penal e a continuidade delitiva, aumentos na mesma porcentagem à vista de seis vezes incidir a ré na prática do crime.

Assim, resta a pena definitiva para Célia de 5 anos e 4 meses de reclusão, em regime inicial semiaberto e 266 dias-multa no mesmo valor unitário estabelecido na sentença. O regime prisional segue a mesma fundamentação utilizada para a corré Teresinha no presente voto.

Assim, dou parcial provimento ao recurso ministerial para essa ré, para condená-la ao cumprmento das penas de 5 anos e 4 meses de reclsuão e 266 dias-multa e parcial provimento do recurso defensivo, apenas em relação ao regime prisional imposto, para o semiaberto.


MÁRCIA ROCHA NUNES


A ré foi condenada ao cumprimento das penas definitivas de 2 anos 7 meses e 3 dias de reclusão, em regime inicial aberto e 112 dias-multa, no valor de um trigésimo do salário mínimo.

A pena-base restou fixada em 1 ano e 8 meses de reclusão. Acima do mínimo legal, tendo consignado o magistrado aspecto desfavorável a essa ré pelo fato de utilizar dados de terceira pessoa (sua sogra) para, com isso, obter a vantagem indevida, e atuação com ganância, motivo considerado para a elevação da pena que também mantenho.

Mantenho igualmente o aumento no patamar mínimo pela continuidade delitiva (por duas vezes) e o aumento pelo § 3º do art. 171 do Código Penal, bem como a substituição da pena corporal fixada na sentença.

Para essa ré, considerando-se o apelo do Ministério Público Federal, tenho que o mesmo não merece guarida. A ré não pertencia aos quadros do órgão público e foi influenciada por Célia, sua irmã, para incorrer na prática delitiva. Embora dissesse que à época passava por dificuldades financeiras e que não tinha conhecimento de que se tratava de recebimento ilícito, tais considerações não se apresentaram convincentes, uma vez que declarou que sabia do recebimento do benefício por parte da sua sogra. Por essa razão, não há que ser considerada atenuante de confissão espontânea por não retratar a ré a prática do crime como acontecido. A pena se apresenta razoável, devendo ser mais branda em relação às penas de Célia e Teresinha, por todas as razões elencadas para ambas na análise do art. 59 do Código Penal.

Assim sendo, para essa ré, nego provimento ao seu recurso e ao do Ministério Público Federal.


SANDRA ROCHA NUNES


A ré foi condenada definitivamente às penas de 1 ano e 4 meses de reclusão, em regime inicial fechado e 13 dias-multa, no valor unitário mínimo legal.

Para essa ré, verifico que o recurso ministerial merece procedência, uma vez que a pena resultou branda demais em relação a conduta perpetrada tal como ocorreu com a corré Márcia.

Com efeito, a ré foi influenciada por Célia a receber os fundos de pensão irregulares, sendo que recebeu os valores indevidos por seis anos. Embora dissesse que não desconfiou da ilicitude, afirmou que os ganhos eram divididos em quatro partes, tendo aberto conta para tal fim e entregava cheques para Célia e Verônica e terceira pessoa, não se aplicando para essa ré a confissão espontânea por não haver retratado em sua inteireza a prática delitiva.

Analisando as circunstâncias do art. 59 do Código Penal, teço as mesmas considerações expendidas para a corré Márcia. Sandra, como Márcia, não pertencia aos quadros do órgão público, porém a culpabilidade apresenta-se acentuada, os motivos são de ganância e as consequências do crime são de grande vulto para os cofres públicos, embora em menor extensão em relação a Célia e Teresinha. As fichas financeiras de fls. 209/221 demonstram que Sandra recebeu mais de R$ 608.000,00, de maio de 1995 a junho de 2001, quantia significante para os cofres públicos e para a sociedade. Por tais razões, entendo por branda demais a sanção imposta, tal como expendido pelo Ministério Público Federal nas razões recursais às quais dou provimento.

Desse modo, estabeleço para essa ré, a mesma pena imposta a Márcia, nos seguintes termos:

Pena-base - 1 ano e 8 meses de reclusão, em regime inicial aberto e 72 dias-multa.

Ausentes atenuantes e agravantes.

Na terceira fase, aumento a pena em um sexto pela continuidade delitiva (duas vezes), mais um terço pela causa de aumento do § 3º do art. 171, do Código Penal, restando a pena definitivamente fixada em 2 anos, 7 meses e 3 dias de reclusão e 112 dias-multa,à razão da sentença.

Determino o regime inicial aberto e mantenho a substituição da pena corporal por restritivas de direitos, tal com estabelecido na sentença.


DISPOSITIVO


Por todo o exposto:

Em relação a Teresinha do Carmo Araújo, dou parcial provimento ao recurso da defesa, apenas para estabelecer o regime semiaberto de cumprimento da pena privativa de liberdade, mantida, no mais, a sentença e nego provimento ao recurso do Ministério Público Federal.

Em relação a Célia Rocha Nunes Gil, dou parcial provimento ao recurso da defesa, apenas para estabelecer o regime semiaberto de cumprimento da pena privativa de liberdade e dou parcial provimento ao recurso do Ministério Público Federal, para reformar a pena e fixá-la em 5 anos e 4 meses de reclusão em regime inicial semiaberto e 266 dias-multa à razão unitária da sentença.

Em relação a Márcia Rocha Nunes, nego provimento a ambos os recursos e mantenho a sentença.

Em relação a Sandra Rocha Nunes, dou parcial provimento ao recurso da defesa, apenas para estabelecer o regime inicial aberto de cumprimento de pena e dou parcial provimento ao recurso ministerial, para reformar a pena e fixá-la em 2 anos, 7 meses e 3 dias de reclusão, em regime inicial aberto e 112 dias-multa, mantida, no mais a r.sentença de primeiro grau.

É como voto.


LUIZ STEFANINI
Desembargador Federal


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