D.E. Publicado em 10/05/2012 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação de Cláudio Cândido, para afastar a continuidade delitiva, fixando a pena privativa de liberdade em 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de reclusão, reduzir a pena de multa para 13 (treze) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, devidamente corrigido, reverter, de ofício, a prestação pecuniária em favor da União Federal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
A EXCELENTÍSSIMA SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL VESNA KOLMAR: Trata-se de Apelação Criminal interposta por Cláudio Cândido contra a r. sentença (fls. 92/95), proferida pelo MM. Juiz Federal da 7ª Vara Federal Criminal de São Paulo, que o condenou à pena privativa de liberdade de 1 (um) ano, 06 (seis) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, em regime inicial aberto, e 15 (quinze) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à época dos fatos, corrigido monetariamente, pela prática do delito previsto no Art. 171, § 3º , c.c Art. 71 do Código Penal.
A pena privativa de liberdade foi substituída por 2 (duas) restritivas de direitos consistentes na prestação pecuniária de 1 (um) salário-mínimo, a ser doada em espécie, à entidade assistencial, e na prestação de serviços à entidade pública de assistência a idosos, ambas designadas pelo Juízo da Execução.
A r. sentença fixou ainda o pagamento no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), atualizados a partir do trânsito em julgado da sentença, a título de reparação de danos causados ao erário (CPP, artigo 387, IV), bem como determinou o pagamento de custas judiciais.
Nas razões de apelação (fls. 107/117), Cláudio Cândido pleiteia a absolvição, alegando, em síntese:
a) estar configurado o erro de proibição, por desconhecer a ilicitude de sua conduta o que afasta a culpabilidade;
b) ausência de dolo, como consequência do desconhecimento de que a conduta perpetrada configura crime;
c) aplicabilidade da atenuante prevista no Art. 65, III, "d" do Código Penal, por ter confessado no seu depoimento o recebimento da vantagem;
d) não se aplica a continuidade delitiva, ainda baseada no desconhecimento do delito, uma vez que recebeu as quatro parcelas relativas ao seguro desemprego de boa-fé;
e) falta de fundamentação para a fixação do número de dias multa.
Pleiteia, ainda, a redução do montante fixado para a reparação de danos, em razão de sua hipossuficiência econômica e a isenção de custas processuais, por fazer jus à assistência judiciária gratuita.
Nas contrarrazões (fls. 122/129), o Ministério Público Federal pugnou pela manutenção da sentença.
A Procuradoria Regional da República (fls. 132/135v.), por sua ilustre representante Dra. Mônica Nicida Garcia, opinou pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
À revisão.
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VOTO
A EXCELENTÍSSIMA SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL VESNA KOLMAR: Cláudio Cândido foi denunciado como incurso nas sanções do artigo 171, § 3º, c.c. o artigo 71, caput, ambos do Código Penal.
Narra a denúncia (fls. 02/04):
"(...)
Consta dos autos que o denunciado, de forma continuada, no período compreendido de novembro de 2004 e janeiro de 2005, obteve para si, vantagem ilícita, referente a quatro parcelas de benefício de seguro desemprego, no montante de R$ 1.945,84 (mil novecentos e quarenta e cinco reais e oitenta e quatro centavos), em prejuízo do Ministério do Trabalho e Emprego, induzindo e mantendo-o em erro, mediante falsa comunicação de desemprego, uma vez que manteve vínculo empregatício com a empresa COTERGAVI INSTRUMENTO DE MEDIÇÃO LTDA. de 01 de setembro de 2004 a 19 de janeiro de 2005.
A materialidade delitiva é inconteste, restando comprovada pelo Ofício nº 64/2007/SEGAB/DRT/SP/SEGURODESEMPREGO (fls. 09/10), originário da Delegacia Regional do Trabalho, bem como pela cópia da inicial e do termo de audiência relativos autos da Reclamação Trabalhista nº 0649-2005-056-02-00-7, movida por CLÁUDIO CÂNDIDO, em face da pessoa jurídica COTERGAVI INSTRUMENTO DE MEDIÇÃO LTDA. (fls. 17/28), os quais atestam o recebimento indevido, por parte do denunciado, no período de novembro de 2004 a janeiro de 2005, de quatro parcelas de seguro desemprego.
A autoria, por seu turno, é inafastável, pois, conforme se depreende da petição inicial da Reclamação Trabalhista nº 0649-2005-056-02-00-7 (fls. 17/22), o próprio denunciado admite ter recebido as parcelas do seguro desemprego na vigência de seu contrato de trabalho com a empresa COTERGAVI INSTRUMENTO DE MEDIÇÃO LTDA.
Dos fatos acima noticiados, observa-se que o denunciado CLÁUDIO CÂNDIDO, de maneira livre e consciente, obteve para si, de forma continuada, vantagem ilícita, no valor total de R$ 1.945,84 (mil, novecentos e quarenta e cinco reais e oitenta e quatro centavos), em prejuízo do Ministério do Trabalho e Emprego.
Posto isto, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL denuncia CLÁUDIO CÂNDIDO como incurso no delito capitulado no art. 171, § 3º, c.c. o artigo 71, caput, ambos do Código Penal, (...)."
A materialidade delitiva restou comprovada, como se depreende do Ofício nº 64/2007/SEGAB/DRT/SP/SEGURODESEMPREGO, da Delegacia Regional do Trabalho em São Paulo, que confirma o recebimento do benefício seguro-desemprego por Cláudio Cândido nos meses de novembro de 2004 a janeiro de 2005 (fls. 14/15); da cópia da peça exordial da Reclamação Trabalhista proposta pelo acusado contra Cotergavi Instrumento de Medição Ltda., na qual objetivava o reconhecimento do vínculo empregatício no período de 01.09.2004 a 19.01.2005 (fls. 22/27); e do termo de audiência realizada no Processo nº 0649-2005-056-02-00-7, da 56º Vara do Trabalho de São Paulo (fl. 32/33).
Também induvidosa é a autoria, pois o réu em juízo confirmou os fatos narrados na denúncia (fls. 60/61). Confira-se:
"(...) Sobre os fatos, afirma que trabalhava para a empresa "Salve Casa Grande", que é de propriedade do Sr. Jose Salve, também proprietário da 'Cotergav'. Fizeram um acordo para sair da primeira empresa e gerenciar a 'Cotergav', onde receberia o mesmo salário e os valores do seguro-desemprego.
(...) Nesses três meses trabalhou para a 'Cotergav', recebeu os salários, mas eles não quiseram pagar essas comissões. Assim o interrogando ingressou com uma ação trabalhista reivindicando seus direitos nesses três meses que trabalhou sem registro."
Evidente, portanto, que a conduta de Cláudio Cândido subsume-se ao tipo penal inscrito no artigo 171, § 3º, do Código Penal.
Todavia, alega o apelante que incorrera em erro de proibição, conforme aponta em seu interrogatório (fls. 60/61):
"(...) não tinha noção de que havia irregularidade no procedimento decorrente do acordo estabelecido com o empregador. O interrogando tem o segundo grau de escolaridade completo."
Ora, o conjunto probatório demonstra que o réu tinha plena consciência da ilicitude dos fatos a ele atribuídos e agiu imbuído de vontade própria ao realizar um acordo para gerenciar a empresa Cotergavi, onde recebeu, simultaneamente, o salário e os valores do seguro-desemprego (fl. 60).
É do potencial conhecimento do homem médio que a percepção da remuneração salarial exclui o recebimento do referido benefício. Além disso, resta claro que o réu, na posição de gerente da empresa, tinha plena consciência da ilicitude de sua conduta e agiu dolosamente no sentido de receber ambas as verbas, mantendo em erro o Ministério do Trabalho e Emprego quanto ao vínculo empregatício com a empresa Cotergavi.
No que concerne ao erro de proibição, confira-se a jurisprudência:
"PENAL. APELAÇÃO. ESTELIONATO. RECEBIMENTO INDEVIDO DE SEGURO-DESEMPREGO E FGTS. ART. 171, §3º, DO CP. CRIME INSTANTÂNEO DE EFEITO PERMANENTE. CO-RÉU MAIOR DE 70 ANOS. PRESCRIÇÃO DECLARADA DE OFÍCIO. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. COMPROVADA A MATERIALIDADE DELITIVA E AUTORIA DO CRIME. DOLO. ERRO DE PROIBIÇÃO NÃO CONFIGURADO. PRESCRIÇÃO PARCIAL. PENA. APELOS DESPROVIDOS. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA.
(...)
VII. O erro de proibição, inserto no Art. 21 do CP, exige demonstração clara e inequívoca de que o agente não tinha consciência do injusto, supondo que atuava corretamente; ademais, para ser escusável, o discernimento errôneo acerca da ilicitude fática deve ser invencível, insuperável, de forma a impedir o conhecimento do acusado acerca da antijuridicidade de sua conduta, que entende permitida.
VIII. Demonstrada a potencial consciência da ilicitude do fato. A própria denominação dos benefícios - seguro-desemprego e FGTS- são termos cuja compreensão a simplicidade de um homem pode indubitavelmente alcançar, especialmente quando sua concessão é fato ordinário na vida da maioria dos cidadãos, de todas as classes sociais, que conhecem seus significados, ainda que de todos os meandros burocráticos para obtê-los não saibam. Qualquer indivíduo, por mais simples e limitada seja sua cultura, está ciente de que simular uma demissão para obter seguro-desemprego e FGTS e continuar trabalhando e recebendo concomitantemente salário é crime.
(...)
XII. Apelações da defesa não providas."
(ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - Processo: 2004.61.06.006081-0 UF: SP Relator DESEMBARGADOR FEDERAL BAPTISTA PEREIRA)
Nesse mesmo sentido, manifestou-se a Procuradoria Regional da República (fl. 133v.):
"3 - A alegação de que o apelante não teria condições pessoais para reconhecer a ilicitude em sua conduta, o que excluiria seu dolo, não procede.
(...)
É indiscutível que o apelante efetivamente recebeu parcelas de seguro-desemprego durante a vigência do contrato de trabalho. Sua consciência acerca da ilicitude de tal situação, por sua vez, é evidente. Por menos instruída que uma pessoa seja, não se demonstra razoável receber benefício denominado 'seguro-desemprego' e continuar trabalhando sem desconfiar que há algo de errado. Se o apelante recebia tal benefício, decerto que deveria estar desempregado. Ainda, note-se que em 2002 o apelante já havia recebido o benefício em questão (fl. 16), indicando-se que ele conhecia os requisitos para a concessão do benefício, ou seja, a necessidade de estar desempregado. Neste sentido, aliá, a concessão de seguro-desemprego só é possível desde que o requerente declare não possuir emprego. No caso, se houve concessão, é porque o apelante omitiu deliberadamente das autoridades de Assistência Social que mantinha vínculo empregatício com a COTERGAVI INSTRUMENTO DE MEDIÇÃO LTDA., o que demonstra sua consciência sobre a ilicitude da situação, não havendo de se falar em erro de proibição e consequente exclusão do dolo."
Desse modo, comprovadas a materialidade e a autoria do crime, bem como, considerando ter o apelante agido com o fim de obter para si, vantagem ilícita, em prejuízo da Assistência Social, induzindo e mantendo-a em erro, mediante falsa comunicação de desemprego, não há reparos a fazer na sentença que o condenou como incurso no delito do artigo 171, § 3º, do Código Penal.
Insurge-se o apelante, também quanto à dosimetria da pena.
Passo à análise.
O MM. Juiz a quo fixou, com acerto, a pena-base no mínimo legal, em 1 (um) ano de reclusão. O réu não possui antecedentes criminais, sendo-lhe favoráveis as circunstâncias judiciais previstas no artigo 59 do Código Penal.
Ausentes circunstâncias atenuantes e agravantes, como bem considerou o magistrado.
Não merece reparo a sentença no ponto em que afastou a atenuante da confissão espontânea. A circunstância prevista no artigo 65, III, d, do Código Penal, não se aplica à hipótese dos autos, pois a confissão do réu em sede de interrogatório judicial, acompanhada das alegações de erro de proibição e exclusão do dolo, não autoriza a sua incidência. Acrescente-se que a referida circunstância não tem o condão de reduzir a pena aquém do mínimo legal (STJ, Súmula 231).
Na terceira fase, o MM. Juiz majorou a pena em 1/3 (um terço), para 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de reclusão, pela causa de aumento prevista no § 3º do artigo 171 do Código Penal, aumentando-a, ainda, em 1/6 (um sexto) pela continuidade delitiva o que resultou na pena definitiva de 1 (um) ano, 06 (seis) meses e 20 (vinte) dias de reclusão.
Mantenho o aumento de 1/3 (um terço), em razão do disposto no § 3º do artigo 171 do Código Penal; todavia, acolho o pleito do apelante para afastar a majoração da continuidade delitiva, por se tratar de delito eventualmente permanente, conforme orientação jurisprudencial desta Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da Terceira Região, assim como do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, tornando-a definitiva em 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de reclusão.
A pena de multa foi fixada em 15 (quinze) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, devidamente corrigido, observados os mesmos critérios do cálculo da pena privativa de liberdade, afastada a continuidade delitiva reduzo-a para 13 (treze) dias-multa, mantido o valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, devidamente corrigido.
Mantenho o regime inicial aberto para o cumprimento de pena e a substituição por 2 (duas) restritivas de direitos, nos termos fixados na sentença, ambas pelo mesmo período da pena privativa de liberdade. Contudo, reverto, ex officio, a prestação pecuniária em favor da União Federal.
Mantenho a condenação do apelante ao pagamento do valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), atualizados a partir do trânsito em julgado da sentença, a título de reparação de danos ao erário, valor que se aproxima daquele indevidamente percebido pelo réu e, consequentemente, do prejuízo sofrido pela Assistência Social, de forma a atender o comando do artigo 387, IV, do Código de Processo Penal, com a redação dada pela Lei nº 11.719/08, devendo a alegada hipossuficiência econômica ser aferida no Juízo da Execução.
Nesse mesmo sentido, opina a ilustre Procuradoria Regional da República (fl. 134v.):
"6 - Não merece reparo o montante estipulado a título de reparação de danos causados ao erário, (...).
A capacidade econômica do apelante é irrelevante na estipulação do quanto devido como reparação. Esta deve ter como base os prejuízos sofridos pelo ofendido, nos termos do art. 387, IV, do Código de Processo Penal. Ao apelante foi imposta a obrigação de pagamento no valor de R$ 2.000,00 (dois mil Reais), montante este próximo àquele recebido da Assistência Social, como indicado na denúncia (R$ 1.945,84 - mil novecentos e quarenta e cinco Reais e oitenta e quatro centavos).
Naturalmente, a cobrança de tal valor depende do patrimônio em nome do apelante, mas esta é uma questão da esfera de execução, e que não interfere na fixação do montante por ocasião da sentença penal."
Finalmente, pelos mesmos fundamentos acima expendidos afasto o pedido de Assistência Judicial Gratuita que todavia poderá ser avaliado no Juízo das Execuções.
Por esses fundamentos, dou parcial provimento à apelação de Cláudio Cândido, para afastar a continuidade delitiva e fixar a pena privativa de liberdade em 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de reclusão, reduzir a pena de multa para 13 (treze) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, devidamente corrigido, e de ofício, reverter a prestação pecuniária em favor da União Federal.
É o voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 26/01/2012 16:43:59 |