Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 09/03/2012
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0006948-29.2010.4.03.6000/MS
2010.60.00.006948-0/MS
RELATOR : Desembargador Federal LUIZ STEFANINI
APELANTE : VANDERLEI JOSE RAMOS
: DIRNEI DE JESUS RAMOS
: FRANCISCO RAMOS
: SIMONE AGUIAR RAMOS
: ANDREA SAMBLAS FAVARELLI
ADVOGADO : WILLEY LOPES SUCASAS e outro
APELADO : Justica Publica
No. ORIG. : 00069482920104036000 3 Vr CAMPO GRANDE/MS

EMENTA

PENAL - SUPOSTO CRIME DE TRÁFICO DE ENTORPECENTES E LAVAGEM DE BENS E VALORES - SEQUESTRO - PRAZO - TÉRMINO DAS DILIGÊNCIAS - RAZOABILIDADE - IMPROVIMENTO DO RECURSO.
1. Recurso de apelação interposto em face de decisão do MM. Juízo da 3ª Vara Federal de Campo Grande/MS indeferiu pedido inicial, mantendo o sequestro dos bens determinado no inquérito policial instaurado com vistas ao esclarecimento de suposto crime de lavagem de dinheiro e ocultação de bens originários de crime de tráfico de entorpecentes por parte do indiciado.
2. Os bens indicados no mandado de sequestro estão em nome de parentes e pessoas ligadas ao indiciado, havendo indícios de que os bens relacionados teriam sido adquiridos com recursos de origem ilícita, a fundamentar o mandado de sequestro com fulcro no art. 4º da Lei nº 9.613/98, art. 91, II, "b", do Código Penal e art. 125 e segs do Código de Processo Penal.
3. No presente caso, por se tratar de crime complexo, a elucidação dos fatos depende de inúmeras diligências, conforme se depreende das decisões que ordenaram o sequestro, bem como do ofício em que a autoridade policial esclarece as diligências concluídas e as pendentes de cumprimento.
4. O princípio da razoabilidade é inato ao devido processo legal e fator essencial na análise do excesso de prazo na instrução processual. O prazo pode ser extrapolado nos casos de investigações complexas. Essa complexidade sempre se verifica em processos de lavagem ou ocultação de bens, principalmente quando os delitos anteriores são tráfico de drogas.
5. Na presente hipótese, os delitos investigados se afiguram extremamente complexos, quer por sua natureza, quer pelo grande volume de documentos oriundos da quebra de sigilo bancário e fiscal, demandando considerável tempo para sua completa avaliação.
6. Existe razoabilidade no excesso de prazo até então observado, contados da efetivação da medida assecuratória.
7. O sequestro é medida cautelar de danos que podem advir à Fazenda Pública ou outras vítimas dos crimes e é valioso instrumento de eficácia da persecução penal e dos efeitos de futura sentença penal condenatória, constituindo ferramenta hábil à salvaguarda da coisa pública. É, portanto, a ele inerente o caráter precário, provisório, bastando para a sua decretação a presença dos requisitos essenciais de periculum in mora e fumus boni iuris reconhecidos pelo julgador.
8. A hipótese foi pelo MM. Juiz vislumbrada, em face do que dispõe o art. 4º, caput", da Lei nº 9.613/98, com vistas ao acautelamento que deve cercar os bens instrumentos e frutos de condutas criminosas com a prática de tráfico ilícito de entorpecentes ou drogas afins e demais condutas na norma elencadas.
9. Por ser medida cautelar, aguarda o desfecho de uma investigação e ação penal, diante do juízo de probabilidade do crime só aferível no processo principal, a fim de assegurar eventual recuperação civil e a prevenção e coerção da infração.
10. De mister a adoção da medida, também para evitar dissipação ou ocultação dos bens por parte das pessoas envolvidas, não olvidando o fato de que as atividades ilícitas podem abranger ramificações que facilitam a dissipação antecipada dos bens em prejuízo da vítima, considerando a probabilidade de evasão de divisas, de sonegação, transmissão dolosa de bens, doações fraudulentas e outros, para acobertar o "dinheiro sujo".
11. Sobre o prazo legal objeto do recurso, acompanhando entendimentos dos tribunais superiores considera-se que se iniciam quando encerradas as diligências a respeito dos proprietários dos bens constritos e pode ser dilatado em face da complexidade do caso. Precedentes.
12. Improvimento do recurso.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 27 de fevereiro de 2012.
LUIZ STEFANINI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0006948-29.2010.4.03.6000/MS
2010.60.00.006948-0/MS
RELATOR : Desembargador Federal LUIZ STEFANINI
APELANTE : VANDERLEI JOSE RAMOS
: DIRNEI DE JESUS RAMOS
: FRANCISCO RAMOS
: SIMONE AGUIAR RAMOS
: ANDREA SAMBLAS FAVARELLI
ADVOGADO : WILLEY LOPES SUCASAS e outro
APELADO : Justica Publica
No. ORIG. : 00069482920104036000 3 Vr CAMPO GRANDE/MS

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Criminal interposta por Vanderlei José Ramos, Dirnei de Jesus Ramos, Francisco Ramos, Simone Aguiar Ramos e Andréa Samblas Favarelli contra decisão prolatada pelo MM. Juízo Federal da 3ª Vara de Campo Grande/MS, Especializada em Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional e crimes de "lavagem" ou ocultação de bens, direitos e valores que indeferiu o pedido de levantamento do sequestro dos bens pertencentes aos requerentes.

O sequestro dos bens foi decretado em inquérito policial que apura, em tese, o crime de lavagem de dinheiro, ocultação de bens, direitos e valores provenientes de atividades ligadas ao tráfico de drogas. No inquérito pairam indícios de que pessoas estariam lavando dinheiro para uma quadrilha liderada por Vanderlei Eurames Barbosa, a partir do fato apurado sobre a queda de aeronave em São Gabriel do Oeste/MS proveniente da Fazenda Santo Hilário, onde foi encontrada grande quantidade de cocaína, o que ensejou o mandado de sequestro dos bens móveis e imóveis dos apelantes.

Em razões de apelação (fls. 1751/1760), sustentam os apelantes excesso de prazo na medida assecuratória, uma vez que o parágrafo 1º, do art. 4º da Lei nº 9.613/98 estabelece o prazo máximo de 120 dias contados da conclusão da diligência, que, in casu, ocorreu em 12 de março de 2008, tendo sido ultrapassado o lapso temporal, considerando-se que ainda não houve oferecimento de denúncia.

Alegam que eventual entendimento sobre a complexidade dos fatos para a dilação não se justifica diante do princípio da razoabilidade, bem como que cabe aos órgãos que pediram o sequestro a prova de que os bens não teriam origem lícita.

Contrarrazões recursais (fls. 1766/1679), pelo improvimento do recurso.

Parecer do Ministério Público Federal opina pelo improvimento do recurso (fls. 1800/1804).

É o relatório.

Dispensada a revisão.


VOTO

O recurso de apelação foi interposto em face de decisão do MM. Juízo da 3ª Vara Federal de Campo Grande/MS, da lavra do Juiz Dr. Odilon de Oliveira que indeferiu o pedido inicial, mantendo o sequestro dos bens determinado no inquérito policial instaurado com vistas ao esclarecimento de suposto crime de lavagem de dinheiro e ocultação de bens originários de crime de tráfico de entorpecentes por parte do indiciado Vanderlei Eurames Barbosa.

O inquérito 516/2006-SR/SPF/MS (2007.60.00.000111-3) iniciou-se após queda de avião em que foram apreendidos aproximadamente U$ 710.000,00, além de R$10.000,00 (dez mil reais). Em investigações posteriores foram encontradas drogas na Fazenda Santo Hilário, dando início a outro inquérito(533/2006- SR/DPF/MS). Foi verificada também, pela Polícia Federal, relação entre os investigados no inquérito sobre Operação Kolibra.

A aeronave acidentada tinha por piloto Marcelo Coelho e pertenceria a Vanderlei Ramos e seria utilizada por Vanderlei Eurames Barbosa. Vanderlei Ramos teria adquirido trator para abertura de pista de pouso na fazenda a indicar vínculo entre os mesmos.

Os bens indicados no mandado de sequestro estão em nome de parentes e pessoas ligadas a Vanderlei José Ramos e seu irmão Dirnei de Jesus Ramos, além daqueles em nome de Vanderlei Eurames Barbosa. As pessoas referidas são Simone Aguiar Ramos (cônjuge de Vanderlei Ramos), Andrea Samblas Favarelli (cônjuge de Dirnei de Jesus Ramos), Franscico Ramos (pai de Vanderlei e Dirnei) Doroti Eurames de Araújo (mãe de Vanderlei Eurames Barbosa), Orlando Gonçalves Filho e Mônica Maria Gonçalves (laranjas utilizados pelos irmãos Ramos), havendo indícios de que os bens relacionados teriam sido adquiridos com recursos de origem ilícita, a fundamentar o mandado de sequestro com fulcro no art. 4º da Lei nº 9.613/98, art. 91, II, "b", do Código Penal e art. 125 e segs do Código de Processo Penal.

Feitas essas considerações, passo ao exame das razões recursais.

A decisão que indeferiu o pedido veio fundamentada nos seguintes termos:

"(...) Quanto ao outro caso, qual seja, o prazo para levantamento do sequestro, penso não ser peremptório o mencionado prazo de 120 dias, de forma que admissíveis eventuais retardos, desde que justificados à luz do princípio da razoabilidade.

No presente caso, por se tratar de crime complexo, a elucidação dos fatos depende de inúmeras diligências, conforme se depreende das decisões de fls. 49/58 e 138/143, que ordenaram o sequestro, bem como do ofício nº 8858/2009-SR/DPF/MS (fls. 1644/1661), em que a autoridade policial esclarece as diligências concluídas e as pendentes de cumprimento.

O princípio da razoabilidade é inato ao devido processo legal e fator essencial na análise do excesso de prazo na instrução processual. O prazo pode ser extrapolado nos casos de investigações complexas. Essa complexidade sempre se verifica em processos de lavagem ou ocultação de bens, principalmente quando os delitos anteriores são tráfico de drogas".

E prossegue:


"(...)Na presente hipótese, os delitos investigados se afiguram extremamente complexos, quer por sua natureza, quer pelo grande volume de documentos oriundos da quebra de sigilo bancário e fiscal, demandando considerável tempo para sua completa avaliação".

Vê-se, portanto, existir razoabilidade no excesso de prazo até então observado, de quase 3 (anos) anos (sic) contados da efetivação da medida assecuratória.

Conforme entendimento pacificado no STJ, os prazos indicados na lei para a conclusão da instrução criminal são apenas parâmetros gerais, posto variarem conforme as peculiaridades de cada caso concreto, razão pela qual sofrem sensível mitigação pela jurisprudência de nossos tribunais".

Tenho que a decisão não merece reparo.


Por primeiro, cumpre consignar que o sequestro é medida cautelar de danos que podem advir à Fazenda Pública ou outras vítimas dos crimes e é valioso instrumento de eficácia da persecução penal e dos efeitos de futura sentença penal condenatória, constituindo ferramenta hábil à salvaguarda da coisa pública. É, portanto, a ele inerente o caráter precário, provisório, bastando para a sua decretação a presença dos requisitos essenciais de periculum in mora e fumus boni iuris reconhecidos pelo julgador.

In casu, a hipótese foi pelo MM. Juiz vislumbrada, em face do que dispõe o art. 4º, caput", da Lei nº 9.613/98, com vistas ao acautelamento que deve cercar os bens instrumentos e frutos de condutas criminosas com a prática de tráfico ilícito de entorpecentes ou drogas afins e demais condutas na norma elencadas.

Por ser medida cautelar, aguarda o desfecho de uma investigação e ação penal, diante do juízo de probabilidade do crime só aferível no processo principal, a fim de assegurar eventual recuperação civil e a prevenção e coerção da infração.

Assim, mister se fez a adoção da medida, também para evitar dissipação ou ocultação dos bens por parte das pessoas envolvidas, não olvidando o fato de que as atividades ilícitas podem abranger ramificações que facilitam a dissipação antecipada dos bens em prejuízo da vítima, considerando a probabilidade de evasão de divisas, de sonegação, transmissão dolosa de bens, doações fraudulentas e outros, para acobertar o "dinheiro sujo". São, pois, crimes próprios de objeto de dissimulação e pulverização de bens ou de negociação aparentemente lícita, através do artifício de "lavagem", de molde a tornar-se medida tutelar de relevante valor quanto ao aspecto retributivo do crime para a vítima e para a sociedade.

Mais precisamente sobre o prazo legal objeto do recurso, acompanhando entendimentos dos tribunais superiores considero que se iniciam quando encerradas as diligências a respeito dos proprietários dos bens constritos e pode ser dilatado em face da complexidade do caso (grifei).

A respeito, reproduzo aqui a jurisprudência do E. Supremo Tribunal Federal:

"INQUÉRITO. QUESTÃO DE ORDEM. APREENSÃO DE NUMERÁRIO, TRANSPORTADO EM MALAS. COMPROVAÇÃO DE NOTAS SERIADAS E OUTRAS FALSAS. INVESTIGAÇÃO CRIMINAL PELA SUPOSTA PRÁTICA DO CRIME DE LAVAGEM DE DINHEIRO. LEI Nº 9.613/98 (LEI ANTILAVAGEM). PEDIDO DE LEVANTAMENTO DO DINHEIRO BLOQUEADO, MEDIANTE CAUCIONAMENTO DE BENS IMÓVEIS QUE NÃO GUARDAM NENHUMA RELAÇÃO COM OS EPISÓDIOS EM APURAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE, À FALTA DE PREVISÃO LEGAL. Nos termos do art. 4º da Lei Antilavagem, somente podem ser indisponibilizados bens, direitos ou valores sob fundada suspeição de guardarem vinculação com o delito de lavagem de capitais. Patrimônio diverso, que nem mesmo indiretamente se vincule às infrações referidas na Lei nº 9.613/98, não se expõe a medidas de constrição cautelar, por ausência de expressa autorização legal. A precípua finalidade das medidas acautelatórias que se decretam em procedimentos penais pela suposta prática dos crimes de lavagem de capitais está em inibir a própria continuidade da conduta delitiva, tendo em vista que o crime de lavagem de dinheiro consiste em introduzir na economia formal valores, bens ou direitos que provenham, direta ou indiretamente, de crimes antecedentes (incisos I a VIII do art. 1º da Lei nº 9.613/98). Daí que a apreensão de valores em espécie tenha a serventia de facilitar o desvendamento da respectiva origem e ainda evitar que esse dinheiro em espécie entre em efetiva circulação, retroalimentando a suposta ciranda da delitividade. Doutrina. Se o crime de lavagem de dinheiro é uma conduta que lesiona as ordens econômica e financeira e que prejudica a administração da justiça; se o numerário objeto do crime em foco somente pode ser usufruído pela sua inserção no meio circulante; e se a constrição que a Lei Antilavagem franqueia é de molde a impedir tal inserção retroalimentadora de ilícitos, além de possibilitar uma mais desembaraçada investigação quanto à procedência das coisas, então é de se indeferir a pretendida substituição, por imóveis, do numerário apreendido. Não é de se considerar vencido o prazo a que alude o § 1º do art. 4º da Lei nº 9.613/98, que é de 120 dias, pois ainda se encontram inconclusas as diligências requeridas pelo Ministério Público Federal, em ordem a não se poder iniciar a contagem do lapso temporal. Questão de ordem que se resolve pelo indeferimento do pedido de substituição de bens".

(QO no inquérito 2248/DF, PLENO, Rel. Carlos Britto, em 25/5/06, DJ 20/10/2006, p. 49).


Não foi outro o entendimento dessa C. 5ª Turma a respeito do tema, a exemplo do julgado verbis:


"PENAL. LAVAGEM DE DINHEIRO, BENS E VALORES. SEQUESTRO DE BENS. PRAZO DE 120 DIAS. ART. 4º, § 1º, DA LEI Nº 9.613/98. RAZOABILIDADE. FIM DAS DILIGÊNCIAS INVESTIGATÓRIAS. CONSTRIÇÃO MANTIDA. ORIGEM LÍCITA NÃO DEMONSTRADA. 1. A jurisprudência manifesta-se no sentido de que o prazo de 120 (cento e vinte) dias previsto no § 1º do art. 4º da Lei n. 9.613/98 não é peremptório, sendo que o dispositivo deve ser interpretado de acordo com a razoabilidade e a complexidade do feito, havendo ainda precedentes no sentido de que esse prazo apenas tem início após encerradas todas as diligências investigatórias. 2. Para que ocorra a devolução de bens apreendidos ou sequestrados o acusado deve comprovar a origem lícita dos bens sequestrados. 3. Apelação desprovida".

(TRF3, ACR 35065, j. 22/3/2010, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, DLF3 08/04/2010, pág. 1030).

Ante tais considerações, não operado o prazo que se desenvolve dentro da razoabilidade para o presente caso, tenho por irreparável a sentença recorrida pelos seus próprios e jurídicos fundamentos, razão pela qual NEGO provimento ao recurso.

É como voto.


LUIZ STEFANINI
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): LUIZ DE LIMA STEFANINI:10055
Nº de Série do Certificado: 47D97696E22F60E3
Data e Hora: 07/02/2012 14:11:49