D.E. Publicado em 13/03/2012 |
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EMENTA
PENAL - PROCESSUAL PENAL - APELAÇÃO CRIMINAL - CRIME DE COAÇÃO NO CURSO DO PROCESSO - ARTIGO 344 DO CÓDIGO PENAL - ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS - PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO - DECISÃO DE PRIMEIRO GRAU MANTIDA - RECURSO MINISTERIAL DESPROVIDO.
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ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes os acima indicados, ACORDAM os Desembargadores da Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da Terceira Região, nos termos do relatório e voto da Senhora Relatora, constantes dos autos, e na conformidade da ata de julgamento, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado, por unanimidade, em negar provimento ao recurso ministerial.
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RELATÓRIO
Trata-se de apelação criminal interposta pelo Ministério Público Federal em face da decisão proferida pelo MM. Juiz Federal da 3ª Vara Federal de Marília-SP, que absolveu o réu CARLOS UMBERTO GARROSSINO, acusado pela prática do delito previsto no artigo 344 do Código Penal, com fulcro no artigo 386, inciso V, do Código de Processo Penal, por entender não existir prova suficiente para o édito condenatório (fls.584/599).
Consta da denúncia que:
O recebimento da denúncia se deu em 15.06.2010 (fl. 185/186).
A proposta de suspensão condicional do processo formulada pelo Ministério Público Federal não foi aceita pelo réu (fl. 522).
O réu foi citado (fls. 509), apresentou defesa preliminar e juntou documentos, arrolando três testemunhas (fls. 197/477).
Às fls. 479/480, as preliminares argüidas pelo réu foram afastadas, não se vislumbrando nenhuma hipótese de absolvição sumária.
As testemunhas de acusação e de defesa foram ouvidas em 18/01/2011 (fls. 536/537, 538/539 e 540/542), ao passo que o réu foi interrogado em 03/05/2011 (fls. 566/568).
Em alegações finais, a acusação pugnou pela condenação do réu (fls. 571/575), ao passo que a defesa se bateu pela absolvição (fls. 578/582).
A sentença absolutória foi proferida 584/599 e publicada em 20/05/11 (fl.600).
Em razões de apelação (fls. 604/611), propugnou a acusação pela reforma da sentença absolutória, requerendo a condenação do réu, aduzindo, essencialmente, que a coação em virtude de depoimento prestado pela vítima em outro processo, de fato, ocorreu, e que o apelado foi o autor do delito, conforme se depreende da leitura dos depoimentos coesos de José Ursílio, nos autos, sendo certo que os depoimentos das testemunhas de defesa não podem ser considerados.
Com as contra-razões (fls. 614/618), vieram os autos a esta Egrégia Corte, onde o Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento do recurso, mantendo-se a absolvição (fls. 620/623).
O feito foi submetido à revisão, na forma regimental.
É O RELATÓRIO.
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VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL RAMZA TARTUCE:
Como bem elucidou o nobre magistrado a quo, o acusado poderia muito bem ter motivos para ameaçar o ofendido, em face das disputas políticas e o jogo ferrenho de poder existente na cidade de Marília, na ocasião dos fatos.
Entretanto, não foram colhidos, nos autos, elementos suficientes para um édito de condenação.
Ouvida em Juízo, a testemunha José Ursílio de Souza e Silva afirmou que:
De acordo com o depoimento de José Ursílio de Souza e Silva, constata-se que as aludidas pressões e tentativas de extorsão efetuadas no período em que ele prestou depoimento na Polícia Federal, ou seja, por volta de março de 2006, se mostraram vagas e imprecisas, tanto é que ele, segundo afirmou, "não ofereceu qualquer denúncia contra as pessoas que o ameaçavam por falta de materialidade". Tais fatos, portanto, não poderão ser aqui considerados.
Por outro lado, o fato de a testemunha de acusação, José Ursílio, ter recebido ligação, em seu celular, de seu desafeto Carlos Umberto Garrossino, não constitui prova cabal da grave ameaça, elementar do tipo do artigo 344 do Código Penal, já que, em nenhum momento, veio aos autos o inteiro teor dessa ligação telefônica.
O que se conclui, de todo o material probatório trazido aos autos, é que réu e testemunha de acusação passaram, de amigos que eram, a ser inimigos, tendo em vista questões políticas.
Com efeito, as disputas políticas existentes entre os dois ensejaram o ajuizamento de inúmeros processos cíveis e criminais, em face de José Ursílio, movidos pelo réu e por pessoas a ele ligadas, como o então prefeito do Município de Marília, José Abelardo Guimarães Camarinha, além de outros, o que poderia levar a testemunha de acusação, por esse motivo, a revidar.
É certo que o réu já figurou como secretário municipal, na gestão do prefeito José Abelardo Camarinha. Também é certo que o réu já moveu queixa-crime em face de José Ursílio, que foi julgada procedente (fls. 342/356).
Ademais, um outro exemplo da existência de sérias rixas entre a pessoa do réu, do grupo político a que fazia parte, e a testemunha de acusação é o pedido de busca e apreensão no jornal da testemunha, tendo em vista que, às vésperas da eleição, publicar-se-ia matéria que tinha como manchete a informação de que Vinícius Camarinha, filho do ex-prefeito da cidade de Marília, teria se tornado inelegível, sendo que, na realidade, o processo a que respondia ainda se encontrava sub judice (fls. 428/439).
Constata-se, dos documentos juntados aos autos, que as críticas formuladas pela testemunha, em seu jornal, eram ferrenhas e endereçadas ao grupo liderado pelo réu e José Abelardo Guimarães Camarinha, pessoas influentes naquela cidade.
Os fatos descritos nas notícias publicadas, no entanto, não eram comprovados nas demandas ajuizadas, a indicar que, muito provavelmente, José Ursílio pretendia, tão somente, dar um caráter sensacionalista às informações, prejudicando o réu, por conta da inimizade que existia entre os dois.
No caso dos autos, pode ser que o réu visou, mesmo, causar mal injusto e grave à testemunha, em virtude desse cenário político que os cercava. Contudo, a testemunha também pode ter visado prejudicar o réu, aproveitando-se da ligação efetuada em seu celular.
Ressalte-se que, a par da atual inimizade existente entre eles, o réu já foi pessoa muito próxima da testemunha de acusação, sendo, inclusive, seu padrinho de casamento.
Assim, a versão apresentada pelo acusado, no sentido de que um terceiro conhecido de ambos é que teria efetuado a ligação, na data dos fatos, não deve ser descartada de plano.
Para situações como a descritas no presente processo, é necessário que se produza prova robusta da imputação. E a mera versão apresentada por José Ursílio, somada à constatação de que recebeu ligação telefônica proveniente de número de celular cujo titular é a Prefeitura de Marília, não consubstancia um conjunto de prova capaz de fundamentar uma condenação.
Colhe-se, dos autos, que o depoimento prestado por Eduardo Caetano, em Juízo, guarda relação de coerência com a declaração por ele anteriormente prestada. Confira-se:
(declaração apresentada por Eduardo Caetano - fls. 224/225).
De outro lado, o interrogatório do acusado não conflita com as declarações acima mencionadas, como se vê, a seguir:
Em síntese, José Ursílio teria dito que a ameaça consistiu numa ligação, em que o réu lhe teria dito que "parasse de tecer crítica contra ele, o grupo e em especial contra o ex- Prefeito Camarinha", "porque a sua situação vai se tornar pior" (fl. 35).
Ora, a própria acusação formulada pela vítima/testemunha se mostrou vaga e imprecisa. Considerando que os ataques e contra-ataques ocorridos não raro se materializaram na esfera judicial, com demandas cíveis e criminais deduzidas por ambos, a alegada ameaça poderia muito bem se materializar em um novo processo a ser promovido em face de José Ursílio, que, por sua vez, em nenhum momento se calou, vindo a denunciar o réu, seja pela via judicial, seja por meio da imprensa.
Neste feito, nenhuma prova se produziu efetivamente no sentido de que houve ameaça à integridade física de José Ursílio ou de que sua vida estava em risco.
E, nenhuma ameaça de qualquer outro mal vindo do réu se constatou do exame autos, sendo certo que eventual propositura de ação judicial da parte dele em face de José Ursílio, o que se poderia cogitar caso ficasse provado que foi o acusado o autor da ligação, não configuraria ilícito penal, a menos que restasse comprovado que foi intentada com o dolo de prejudicar o demandado.
Não há, pois, nos autos, elementos de prova suficientes a demonstrar a promessa de mal injusto e grave à testemunha, nos moldes descritos na denúncia.
Como bem argumentou a i. procuradora regional da república:
Assim, em homenagem ao princípio in dubio pro reo, a manutenção da sentença absolutória é medida de rigor.
Quanto a eventual crime de denunciação caluniosa supostamente praticado por José Ursílio, não só pelo fato de seu adversário político ter sido absolvido no caso dos autos por insuficiência de provas, como também por ter se criado uma zona cinzenta envolvendo Carlos Garrossino e José Ursílio, com históricos de denúncias de um lado e demandas judiciais e queixas crimes de um e outro, bem como de suspeitas de atos de terrorismo no jornal onde trabalhava José Ursílio, não aconselham a requisição de instauração de inquérito policial ao Ministério Público Federal, conforme pretendido pelo apelado. Fica, assim, tal pedido indeferido.
Diante do exposto, nego provimento ao recurso ministerial.
É COMO VOTO.
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Data e Hora: | 09/02/2012 19:23:56 |