Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0010936-58.2010.4.03.6000/MS
2010.60.00.010936-1/MS
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : ALTIMAR DA SILVA FRAGA
: VIVIANI KELIN LEITE ARANTES
ADVOGADO : EDILBERTO GONCALVES PAEL e outro
APELANTE : COSME DANIEL INCABRALDE VENEGA
ADVOGADO : CHARLES PACHCIAREK FRAJDENBERG (Int.Pessoal)
: DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO : Justica Publica
No. ORIG. : 00109365820104036000 5 Vr CAMPO GRANDE/MS

EMENTA

PPROCESSUAL PENAL E PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES. MATERIALIDADE AUTORIA E DOLO. COMPROVADOS EM RELAÇÃO AOS TRÊS APELANTES. DOSIMETRIA DA PENA. MAJORANTE DA INTERNACIONALIDADE. MANTIDA QUANTO AO RÉU COSME DANIEL. CONCURSO DE CIRCUNSTÂNCIAS ATENUANTES E AGRAVANTES. ALEGAÇÃO DE QUE A CONFISSÃO ESPONTÂNEA DEVE PREPONDERAR SOBRE A AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA. IMPROCEDÊNCIA. REGIME INICIAL FECHADO. INALTERADO. DESCONSIDERAÇÃO DA HEDIONDEZ. TESE NÃO PLAUSÍVEL. RECURSOS DESPROVIDOS.
I - A materialidade do delito restou demonstrada pelo laudo de exame químico toxicológico. A autoria e o dolo restaram comprovados pelo conjunto probatório, ou seja, pelos testemunhos dos policiais, que ratificaram, em juízo, o declarado em sede inquisitorial, bem como o depoimento judicial do taxista, que transportava o corréu Cosme Daniel com a droga, enquanto seguia, à sua frente, a moto dirigida por Altimar, que levava Viviane em sua carona.
II - Não há como descaracterizar a internacionalidade do delito, como requerido pela defesa de Cosme Daniel, uma vez que o apelante confessou em seu interrogatório, realizado perante o Juízo Estadual, que a droga era oriunda do Paraguai e, em seu interrogatório judicial, realizado perante o Juízo Federal de primeiro grau, também confessou a autoria do crime, afirmando ser o dono da droga, que a recebeu em Bela Vista/MS de seu tio que, por sua vez, a trouxe do Paraguai. Ademais, a caracterização da internacionalidade do tráfico se afere também pela abrangência de mais de um país na prática criminosa, justamente o caso dos autos. Ainda, para a caracterização da majorante, seria suficiente que o traficante permanecesse do lado brasileiro da fronteira e recebesse a droga de origem estrangeira para sua difusão no Brasil.
III - A pena-base de Cosme Daniel deve ser majorada de metade, assim como na sentença recorrida, em razão da grande quantidade de maconha transportada (96.665g), nos termos do art. 42 da Lei n.º 11.343/06, bem como pelo fato de possuir maus antecedentes, conforme demonstra as certidões juntada às fls. 353/354 dos autos.
IV- A reincidência é uma circunstância agravante que prepondera sobre as atenuantes, com exceção daquelas que resultam dos motivos determinantes do crime ou da personalidade do agente (art. 67 do Código Penal), hipóteses em que não se enquadra a atenuante da confissão espontânea.
V - Altimar e Viviane são primários e não ostentam maus antecedentes, as demais circunstâncias do art. 59 do Código Penal lhe são favoráveis, entretanto, em razão da grande quantidade de droga apreendida (96.665g de maconha), a pena-base deve ser majorada nos termos da sentença recorrida, ou seja, em 1/3 (um terço), com fundamento no art. 42 da Lei n.º 11.343/06.
VI - Não é plausível o pleito acerca da desconsideração da hediondez do crime de tráfico apenas pela incidência da causa de diminuição do § 4º, do art. 33, da Lei 11.343/06, uma vez que sua incidência não resulta, por si só, nessa desconsideração. O crime de tráfico, ainda que com previsão legal de diminuição de pena, remanesce um crime equiparado a hediondo. A figura delitiva prevista no art. 33, § 4º, da Lei de Drogas não é o "tráfico privilegiado". Não há falar-se em comparação com o homicídio privilegiado, pois não se exige seus motivos (relevante valor social ou moral; em razão de domínio de violenta emoção, logo em seguida à injusta provocação da vítima).
VII - Fica mantido também o regime inicial fechado, pois não existe respaldo legal para aplicação de regime mais benéfico para o cumprimento de pena por previsão do art. 2º, § 1º, da Lei dos Crimes Hediondos. O regime inicial adequado, portanto, é o fechado, conforme alteração pela Lei 11.464/2007, mormente quando a ocorrência do fato delituoso é posterior a vigência da nova lei.
VIII - Não há que se falar em substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos, uma vez que não se encontram preenchidos os requisitos do art. 44 do Código Penal, pois a pena privativa de liberdade supera 4 (quatro) anos de reclusão.
IX - Recursos desprovidos.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento às apelações, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 08 de maio de 2012.
JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0010936-58.2010.4.03.6000/MS
2010.60.00.010936-1/MS
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : ALTIMAR DA SILVA FRAGA
: VIVIANI KELIN LEITE ARANTES
ADVOGADO : EDILBERTO GONCALVES PAEL e outro
APELANTE : COSME DANIEL INCABRALDE VENEGA
ADVOGADO : CHARLES PACHCIAREK FRAJDENBERG (Int.Pessoal)
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RELATÓRIO

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI: Trata-se de Apelações interpostas pelos réus ALTIMAR DA SILVA FRAGA, COSME DANIEL INCABRALDE VENEGA e VIVIANE KELIN LEITE ARANTES contra a r. sentença de fls. 506/515, que julgou procedente o pedido da denúncia (recebida em 16.02.2011 - fls. 357), para condenar:


COSME DANIEL INCABRALDE VENEGA pela prática do crime previsto no art. 33, caput, c/c art. 40, inciso I, da Lei n.º 11.343/06, à pena de 10 (dez) anos, 02 (dois) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, no regime inicial fechado, e pagamento de 1020 (mil e vinte) dias-multa, no valor unitário de um trigésimo do salário mínimo vigente na data dos fatos.

ALTIMAR DA SILVA FRAGA e VIVIANE KELIN LEITE ARANTES pela prática do crime previtso no art. 33, caput, da Lei n.º 11.343/06, à pena de 05 (cinco) anos, 06 (seis) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, no regime inicia fechado; e pagamento de 555 (quinhentos e cinquenta e cinco) dias-multa, no valor unitário de um trigésimo do salário mínimo vigente na data dos fatos.


Narra a denúncia, verbis:


"1. Infere-se do incluso inquérito policial que na madrugada do dia 18 de abril de 2010, por volta da 01:00h, nas intermediações do Núcleo Industrial (Indubrasil), nesta Capital, policiais militares realizavam rondas, quando resolveram abordar e fiscalizar um ônibus que fazia o itineário Aquidauana-Campo Grande/MS, nada encontrando de irregular.
2. Após a liberação do coletivo, os policiais receberam notícia anônima no sentido de que um indivíduo que se encontrava no ônibus havia descido poucos metros antes da barreira policial e estava embarcando entorpecentes em um táxi.
A partir dessa informação, a equipe logrou abordar mais adiante um táxi, conduzido por Rubensglau Vieira, cujo passageiro foi identificado como COSME DANIEL INÇABRALDE. Na moto foram abordados e identificados os dois outros denunciados, ALTIMAR DA SILVA FRAGA, condutor, e a carona VIVIANE KELIN LEITE ARANTES.
3. Vistoriado o porta-malas do táxi, foram encontradas mochilas onde estavam acondicionadas embalagens contendo substância vegetal que reagiu positivamente para o estupefaciente conhecido vulgarmente como "maconha", num total de 96.665g.
Inquirido, COSME relatou ter sido contratado por um desconhecido para trazer a maconha e Aquidauana para Campo Grande, sob a promessa de pagamento de R$ 2.000,00; não obstante essa primeira versão, processado inicialmente perante o Juízo Estadual, em interrogatório judicial (f. 146/151) COSME mudou a narrativa, passando a afirmar que buscou a droga no Paraguai, pagando pela maconha o equivalente a cem mil guaranis.
Ainda durante a abordagem policial, COSME relatou eu seu contratante orientou-o a tomar o ônibus que faz o percurso Aquidauana/Campo Grande e desembarcar antes de chegar no viaduto defronte o frigorífico.
Isso feito, antes de chegar no local apontado, COSME recebeu uma ligação d co-denunciado ALTIMAR, que se comprometeu e ir bucá-lo no lugar combinado para seu desembarque.
Com efeito, ao ser abordado, COSME havia acabado de tomar o táxi que havia sido providenciado por ALTIMAR, que compareceu ao local acompanhado de VIVIANE, tendo estes dois seguido à frente do táxi, na moto, para orientar a direção a ser seguida pelo automóvel que transportava COSME e a maconha.
4. Não obstante ALTIMAR e VIVIANE tenham negado participação no tráfico, o envolvimento de ambos restou inequívoco: ALTIMAR tentou justificar as providências adotadas relativamente ao deslocamento de COSME aduzindo ser este seu antigo conhecido, no que foi desmentido pelo próprio COSME, que afirmou nunca tê-lo visto anteriormente. Já VIVIANE, além do fato de ser filha de José Cláudio Arantes (vulgo Tio Arantes - o qual registra vasta ficha criminal, como incursos em crimes de homicídio, roubo, tráfico e formação de quadrilha), segundo COSME, ela, juntamente com ALTIMAR, foram ao seu encontro questionando-o a respeito da droga.
5. Inquirido, o taxista Rubensglau relatou ter sido acionado, através da central de taxis, para atender uma solicitação de corrida feita por ALTIMAR, que o recebeu num posto de combustíveis do Industrial, o levou até o local onde COSME e VIVIANE aguardavam, ajudou a acondicionar as mochilas no porta-malas do veículo e orientou-o a seguir a moto até o destino que não foi esclarecido previamente. (...)"

Inconformados, apelam os réus Altimar e Viviane, em cujas razões (fls. 547/558) postulam, em síntese:

a) a absolvição por atipicidade da conduta; ou por ausência da materialidade do delito, ou, ainda, por inexistirem provas de que os apelantes transportavam a droga apreendida;

b) a fixação da pena-base no mínimo legal;

c) que seja declarado o caráter não hediondo da imputação de tráfico e que seja concedido todos os benefícios pertinentes ao tráfico privilegiado.

Por sua vez, apela o réu Cosme Daniel, em cujas razões (fls. 561/565-v) postula, em síntese:

a) a fixação da pena-base no mínimo legal "ou o mais próximo disso possível (com elevação máxima em 1/3, diante da quantidade de droga (1/6) e dos maus antecedentes (1/6)";

b) "a aplicação da atenuante da confissão espontânea a ser compensada com a agravante da reincidência, conforme entendimento já sedimentado na 6ª Turma do STJ;"

b) a exclusão da causa de aumento prevista no art. 40, inciso I, da Lei n.º 11.343/06 (transnacionalidade do delito);

c) a fixação de regime mais brando de cumprimento de pena, nos termos do art. 33, § 2º, do Código Penal;

d) a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos.

Contrarrazões do Ministério Público Federal (fls. 568/578), nas quais postula o desprovimento dos recursos interpostos pelos réus.

Nesta Corte, a Procuradoria Regional da República, em seu parecer (fls. 608/612 vº), opina pelo desprovimento dos recursos.

Feito submetido à revisão, conforme previsão regimental.



JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0010936-58.2010.4.03.6000/MS
2010.60.00.010936-1/MS
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : ALTIMAR DA SILVA FRAGA
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VOTO

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI: O apelante Cosme Daniel não nega a autoria nem materialidade do delito, apela apenas requerendo a descaracterização da transnacionalidade do delito, bem como a reforma da sentença no tocante à dosimetria da pena. De outra parte, Altimar e Viviane postulam a absolvição por atipicidade do fato, bem como ausência de provas da materialidade e autoria delitivas. Subsidiariamente, pugnam pela redução da pena e para que seja declarado a não hediondez do delito de tráfico, em razão da aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei n.º 11.343/06.

A materialidade do delito restou demonstrada pelo laudo de exame químico toxicológico (fls. 74/76).

A autoria do crime é inconteste em relação aos três apelantes.

Ouvidos em juízo, os policiais militares, Abrão e Edemair, ratificaram o quanto foi dito por ocasião do flagrante, esclarecendo que abordaram o táxi conduzido por Rubens, que trazia como passageiro o réu Cosme, bem como a motocicleta que estava trafegando à frente do táxi, conduzida pelo réu Altimar e tendo como passageira a corré Viviane. Encontraram a droga apreendida na bagagem do réu Cosme, que estava no porta-malas do táxi. Na ocasião, Cosme confessou o transporte da droga e Altimar e Viviane afirmaram que sabiam do entorpecente e que levariam o táxi até o local da entrega da "maconha".

Além disso, o taxista Rubens Glau Vieira também reafirmou em juízo que foi o corréu Altimar quem ligou para o Radiotáxi solicitando um táxi para o Indubrasil. A testemunha reconheceu Altimar em audiência e disse que muito embora ele estivesse sozinho no local da chamada, pediu-lhe que o acompanhasse mais à frente, onde estavam Cosme e Viviane. Colocadas as malas no táxi, Altimar pediu à testemunha que o seguisse. Na moto, estavam Altimar e Viviane e, no táxi, Cosme com suas malas. Passado pouco tempo do início da corrida, todos foram abordados pela polícia militar (fls. 377).

Como bem ressaltado pelo Ministério Público Federal em seu parecer, tais elementos, aliados às alegações contraditórias dos réus em sede policial e em Juízo (inicialmente confessaram o crime, tendo Viviane afirmado que a moto era de Altimar, que foi ele quem deu a ordem para o taxista e que sabiam do transporte da droga e, depois, afirmaram que foram apenas levar um dinheiro a Cosme, a pedido do pai de Viviane), levam a crer que, de fato, os apelantes Altimar e Viviane concorreram para o transporte da droga atuando como "batedores" do veículo (táxi) no qual a substância entorpecente se encontrava.

Também não ficou comprovada a alegação de que ambos os apelantes, Altimar e Viviane, teriam confessado, em sede policial, sob tortura, porque, além de estarem acompanhados de advogado, durante os interrogatórios policiais (fls. 16/19), também restou registrado (fls. 44/45) que os apelantes foram entregues na Delegacia sem quaisquer lesões corporais.

Por tais razões, não há como afastar a condenação de Altimar e Viviane pelo delito de tráfico de entorpecentes.

Não há como descaracterizar a internacionalidade do delito, como requerido pela defesa de Cosme Daniel, uma vez que o apelante confessou em seu interrogatório, realizado perante o Juízo Estadual, que a droga era oriunda do Paraguai e, em seu interrogatório judicial, realizado perante o Juízo Federal de primeiro grau (fls. 411), também confessou a autoria do crime, afirmando ser o dono da droga e que a recebeu em Bela Vista/MS de seu tio que, por sua vez, a trouxe do Paraguai.

Ademais, foi preso em flagrante, transportando grande quantidade de maconha na capital de Mato Grosso do Sul, Estado que faz fronteira com o Paraguai.

Ressalte-se que, para a caracterização da majorante, é suficiente que o traficante permaneça do lado brasileiro da fronteira e receba a droga de origem estrangeira para sua difusão no Brasil.


Nesse sentido, decisão desta C. Primeira Turma:


"APELAÇÃO CRIMINAL - TRÁFICO DE ENTORPECENTES E MOEDA FALSA - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL - MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS - INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA - IMPOSSIBILIDADE DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME PREVISTO NO ARTIGO 16 DA LEI Nº 6.368/76 - INTERNACIONALIDADE DO TRÁFICO - DOSIMETRIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE QUE NÃO COMPORTA REPARO - REDUÇÃO DE OFÍCIO DO NÚMERO DE DIAS-MULTA - POSSIBILIDADE DE PROGRESSÃO DE REGIME PRISIONAL - LEI Nº 11.464/07 - APELAÇÃO IMPROVIDA.
(...)
6. A admissão do apelante quanto à sua presença em território paraguaio em 3 (três) oportunidades distintas, inclusive no dia dos fatos, em lapso temporal inferior a uma semana; as circunstâncias fáticas nas quais ele foi flagrado, especialmente no que concerne à forma de acondicionamento da droga - em um compartimento existente atrás das lanternas traseiras do veículo; os consonantes depoimentos dos Policiais Rodoviários Federais empreendedores da prisão em flagrante no sentido de que o apelante foi flagrado em uma região de passagem de entorpecentes, transportando 1.255g de "haxixe", substância entorpecente produzida no Paraguai, tornam evidente e incontestável o caráter internacional do tráfico de entorpecentes. Ademais, a caracterização da internacionalidade do tráfico se afere também pela abrangência de mais de um país na prática criminosa, justamente o caso dos autos. Ainda, para a caracterização da majorante, seria suficiente que o traficante permanecesse do lado brasileiro da fronteira e recebesse a droga de origem estrangeira para sua difusão no Brasil.
(...) 9. Apelação não provida" Grifei.

No mesmo sentido, decisão do Supremo Tribunal Federal:


"TÓXICO - APREENSAO EM POSTO DE FRONTEIRA - NUCLEO DO TIPO. Tratando-se de apreensão no posto de fronteira, tem-se a configuração do núcleo "transportar". Exclui-se, por isso mesmo, a possibilidade de considerar outro dos dezoito mencionados no artigo 12 da Lei n. 6.368 e que desaguaria na tentativa - importar substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar. TÓXICO - AGRAVANTE - TRAFICO COM O EXTERIOR - ALCANCE. A causa de aumento prevista no inciso I do artigo 18 da Lei n. 6.368/76 alcança o transporte da droga, sendo que a referencia a "trafico com o exterior" conduz a pertinência na hipótese em que ocorrida a apreensão em posto da fronteira" ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 34290 Nº Documento: 3 / 33. (STF, HC 72658). Grifei.

Portanto, não há como afastar a internacionalidade do delito, no tocante ao apelante Cosme Daniel, ressaltando que, quanto aos apelantes Altimar e Viviane o magistrado sentenciante deixou de aplicar a majorante decorrente da transnacionaliade (art. 40, inc. I, da Lei 11.343/ 06), fazendo constar que: "Entretanto, não há prova nos autos de que os demais réus, ALTIMAR e VIVIANE, sabiam da procedência da droga. Assim, a pena deve ser majorada somente em relação ao réu COSME."

Não houve irresignação da acusação, razão pela qual não se pode fazer incidir referida majorante para os apelantes Altimar e Viviane.


DOSIMETRIA DA PENA


1) No tocante ao apelante Cosme Daniel:


Na primeira fase da dosimetria da pena, o magistrado sentenciante majorou a pena-base para 07 (sete) anos e 06 (seis) meses de reclusão e, para tanto, assim fundamentou:


"Quanto ao réu COSME, a culpabilidade (no sentido de medida da pena) é elevada. Trata-se da apreensão de grande quantidade de droga, isto é, 96.665 gramas de maconha. O réu COSME possui maus antecedentes, visto que já foi condenado pelo art. 12, da Lei n. 6.368/76, por fato praticado em 2007, tendo transitado em julgado em 9.8.2010 (cf. certidão de fls. 353/354). Os demais itens do art. 59, do CP, são favoráveis ao réu."

Nos mesmos termos da sentença recorrida, a pena-base deve ser majorada em ½ (metade), passando a ser fixada em 07 (sete) nos e 06 (seis) meses de reclusão e 750 (setecentos e cinquenta) dias-multa, em razão da grande quantidade de maconha transportada (96.665g), nos termos do art. 42 da Lei n.º 11.343/06, bem como pelo fato de possuir maus antecedentes, conforme demonstra a certidão juntada às fls. 353/354 dos autos.

Na segunda fase da dosimetria da pena, há concurso entre a agravante da reincidência e a atenuante da confissão espontânea, devendo preponderar a agravante da reincidência, nos termos do art. 67 do Código Penal.


Nesse sentido, decisão do Supremo Tribunal Federal


"EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PENAL. CRIME DE PORTE ILEGAL DE MUNIÇÃO DE USO PERMITIDO (ART. 14 DA LEI 10.826/2003). DOSIMETRIA DA PENA. CONCURSO DE CIRCUNSTÂNCIAS ATENUANTES E AGRAVANTES. ALEGAÇÃO DE QUE A CONFISSÃO ESPONTÂNEA DEVE PREPONDERAR SOBRE A AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA. IMPROCEDÊNCIA. 1. A reincidência é uma circunstância agravante que prepondera sobre as atenuantes, com exceção daquelas que resultam dos motivos determinantes do crime ou da personalidade do agente (art. 67 do Código Penal), hipóteses em que não se enquadra a atenuante da confissão espontânea. Precedentes. 2. Recurso ao qual se nega provimento" (RHC 102957 - Rel. Min. Carmen Lúcia - m. 27.04.2010). Grifei.

Assim, em razão da reincidência, a pena é majorada em 1/6 (um sexto), passando a ser fixada em 08 (oito) anos e 09 (nove) meses de reclusão e 875 (oitocentos e setenta e cinco) dias-multa.

Na terceira fase de aplicação da pena, verifico que o juiz de primeiro grau fixou o aumento da internacionalidade, corretamente, em seu mínimo legal (1/6), com fundamento no art. 40, inciso I, da Lei n. 11.343/06, pois presente uma única causa de aumento.

Nesse sentido, decisão desta Corte: "(...) O emprego do acréscimo de 2/3 (dois terços) decorrente da internacionalidade do tráfico é nitidamente excessivo, eis que presente uma única causa de aumento, devendo o percentual de majoração ser reduzido ao mínimo legal. Na esteira do entendimento do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, há de se admitir a retroatividade benéfica do artigo 40, inciso I, da Lei nº 11.343/06, que abriga o percentual mínimo de 1/6 (um sexto), resultando a pena privativa de liberdade definitivamente fixada em 04 (quatro) anos e 08 (oito) meses de reclusão, e a pena pecuniária em 77 (setenta e sete) dias-multa, mantido o valor unitário mínimo." (ACR 2005.61.19.0069763, rel. Des. Fed. Johonsom Di Salvo, DJF3 27.05.10) grifei.

Com isso, a pena passa a ser fixada em 10 (dez) anos, 02 (dois) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 1020 (mil e vinte) dias-multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do valor do salário mínimo vigente na data dos fatos.

Por fim, o magistrado sentenciante, com acerto, deixou de aplicar, ao apelante Cosme Daniel, a causa de diminuição prevista no artigo 33, §4º, da Lei nlº 11.343/06, que prevê redução de 1/6 a 2/3 para o agente que seja primário, possua bons antecedentes e não se dedique a atividades criminosas nem integre organização criminosa, pois o conjunto probatório demonstra que o apelante dedica-se a atividades criminosas (certidões de fls. 328 e fls. 353/354).

Assim, resta mantida a pena definitiva de Cosme Daniel em 10 (dez) anos, 02 (dois) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 1020 (mil e vinte) dias-multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do valor do salário mínimo vigente na data dos fatos.

Fica mantido também o regime inicial fechado, pois não existe respaldo legal para aplicação de regime mais benéfico para o cumprimento de pena por previsão do art. 2º, § 1º, da Lei dos Crimes Hediondos. O regime inicial adequado, portanto, é o fechado, conforme alteração pela Lei 11.464/2007, mormente quando a ocorrência do fato delituoso é posterior a vigência da nova lei.


Nesse sentido, vide:


"COMETIMENTO APÓS A EDIÇÃO DA LEI N.º 11.464/07, INDEPENDENTEMENTE DA APLICAÇÃO, OU NÃO, DA CAUSA ESPECIAL DE DIMINUIÇÃO PREVISTA NO § 4.º, DO ART. 33, DA LEI N.º 11.343/06. PRECEDENTES. DECRETO N. 7.046/09. VEDAÇÃO À CONCESSÃO DE INDULTO A CONDENADOS POR TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS, OU POR CRIME HEDIONDO. WRIT DENEGADO.
1. O regime prisional inicial fechado é obrigatório aos condenados pelo crime de tráfico de drogas cometido após a publicação da Lei n.º 11.464/07, que deu nova redação ao § 1º, do art. 2º, da Lei 8.072/90, independentemente da aplicação, ou não, da causa especial de diminuição prevista no § 4.º, do art. 33, da lei n.º 11.343/06. Precedentes.
2. Nos termos do art. 8.º, incisos I e II, do Decreto n.º 7.046/09, é vedada a concessão de indulto a condenados por tráfico ilícito de drogas, ou por crime hediondo.
3. Writ denegado". (HC 179801/MS, Rel. Min. LAURITA VAZ, DJe 06/04/2011).

Não há que se falar em substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos, uma vez que não se encontram preenchidos os requisitos do art. 44 do Código Penal, pois a pena privativa de liberdade supera 4 (quatro) anos de reclusão.


2) No tocante aos apelantes Altimar da Silva Fraga e Viviane Kelin Leite Arantes:


Na primeira fase da dosimetria da pena, o magistrado sentenciante majorou a pena-base para 06 (seis) anos e 08 (oito) meses de reclusão e, para tanto, assim fundamentou:


"Quanto aos réus ALTIMAR e VIVIANE, a culpabilidade (no sentido de medida da pena) é elevada, porém, inferior à do réu COSME. Isto porque os réus ALTIMAR e VIVIANE participaram da empreitada criminosa quando a droga já estava em Campo Grande. Não a transportaram pelas rodovias do Estado. Trata-se de apreensão de grande quantidade de droga, isto é 96.665 gramas de maconha. Os demais itens do art. 59, do CP, lhes são favoráveis."

Os apelantes são primários e não ostentam maus antecedentes, as demais circunstâncias do art. 59 do Código Penal lhe são favoráveis, entretanto, em razão da grande quantidade de droga apreendida (96.665g de maconha), entendo que a pena-base deve ser majorada nos termos da sentença recorrida, ou seja, em 1/3 (um terço), restando fixada em 06 (seis) anos e 08 (oito) meses de reclusão e 666 (seiscentos e sessenta e seis) dias-multa.

Na segunda fase da dosimetria, não existem atenuantes ou agravantes.

Na terceira fase da dosimetria da pena, foi aplicada a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei n.º 11.343/06, para ambos os apelantes, no percentual mínimo de 1/6 (um sexto), razão pela qual a pena definitiva resta fixada em 05 (cinco) anos, 06 (seis) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 555 (quinhentos e cinquenta e cinco) dias-multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data dos fatos.

Não houve irresignação da acusação. A defesa, em razão da aplicação da referida causa de diminuição requer seja reconhecida a figura do tráfico privilegiado, afastando-se a hediondez do delito.

Entretanto, não merece acolhida a postulação da defesa, pois o crime de tráfico, ainda que com a incidência da causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06, remanesce um crime equiparado a hediondo. Da mesma forma, não há falar-se em comparação com o homicídio privilegiado, pois não se exige seus motivos (relevante valor social ou moral; em razão de domínio de violenta emoção, logo em seguida à injusta provocação da vítima).


Nesse sentido, decisão do Superior Tribunal de Justiça:


"RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE DROGAS. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DA PENA PREVISTA NO § 4º DO ART. 33 DA LEI Nº 11.343/2006. DESCONSIDERAÇÃO DA HEDIONDEZ. TESE NÃO PLAUSÍVEL. REGIME INICIALMENTE FECHADO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA. POSSIBILIDADE. VEDAÇÃO LEGAL INCONSTITUCIONAL. 1. Não é plausível o pleito acerca da desconsideração da hediondez do crime de tráfico apenas pela incidência da causa de diminuição do § 4º, do art. 33, da Lei 11.343/06, uma vez que sua incidência não resulta, por si só, nessa desconsideração. 2. O crime de tráfico, ainda que com previsão legal de diminuição de pena, remanesce um crime equiparado a hediondo. 3. A figura delitiva prevista no art. 33, § 4º, da Lei de Drogas não é o "tráfico privilegiado". Não há falar-se em comparação com o homicídio privilegiado, pois não se exige seus motivos (relevante valor social ou moral; em razão de domínio de violenta emoção, logo em seguida à injusta provocação da vítima). 4. O regime nos crimes de tráfico, consoante art. 2º, da Lei 8.072/90 (alterada pela Lei 11.464/2007), é o inicialmente fechado, mormente quando a ocorrência do fato delituoso é posterior a vigência da nova lei. 5. O Plenário do Supremo Tribunal Federal nos autos do HC nº 97256-RS, Rel. Min. Ayres Britto, declarou a inconstitucionalidade do art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006, na parte que veda a substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direito. 6. Recurso especial conhecido e parcialmente provido" (REsp 201000841306 - Rel. Des. Conv. Do TJ/AP Honildo Amaral de Mello Castro - DJE 16.11.2010). Grifei.

Diante do exposto, NEGO provimentos às apelações.

É o voto.


JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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