Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 13/03/2012
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001129-92.2002.4.03.6000/MS
2002.60.00.001129-7/MS
RELATORA : Desembargadora Federal RAMZA TARTUCE
APELANTE : MILTON FRANCISCO
ADVOGADO : DANIELE DE SOUZA OSORIO (Int.Pessoal)
: ANNE ELISABETH NUNES DE OLIVEIRA (Int.Pessoal)
: DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO : Justica Publica
REU ABSOLVIDO : RAMIRO LUIZ MENDES
EXTINTA A PUNIBILIDADE : EDITH FLORENCIO RAMIRES

EMENTA

PENAL - PROCESSUAL PENAL - ESTELIONATO CONTRA A PREVIDÊNCIA SOCIAL - TENTATIVA - ARTIGOS 171, § 3º C.C. O ARTIGO 14, II, DO CÓDIGO PENAL - USO DE DOCUMENTO FALSO - CERTIDÃO DE NASCIMENTO DE INDIO - MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS - NÃO CONFIGURADO ERRO DE PROIBIÇÃO - ACUSADO NOMEADO CHEFE DE POSTO INDÍGENA - PENA APLICADA UM POUCO ACIMA DO MÍNIMO LEGAL - RECURSO IMPROVIDO.
1. A materialidade e a autoria delitivas restaram comprovadas pela cópia da Certidão de Registro Administrativo de Nascimento de índio (segunda via), pelo Requerimento de Benefício "SALÁRIO MATERNIDADE" em nome de Edite Florêncio Ramirez (corré - que teve extinta a sua punibilidade, pela prescrição), pelo procedimento administrativo instaurado pela Auditoria Regional do INSS e pelos depoimentos colhidos nos autos.
2. Fato inconteste é que a autarquia previdenciária detectou, através de auditoria interna, a existência de irregularidade na documentação que embasou o requerimento de benefício requerido por Edite Florêncio Ramires. Apurou-se que, na Certidão de Nascimento (segunda via), emitida por MILTON FRANCISCO, de "Andreia Ramires Baltazar", filha da segurada Edite, a data de nascimento foi alterada de 19/12/95 para 19/12/1997, dado este divergente dos consignados no Livro de Registro Administrativo de Nascimento do Posto Indígena Ipegue/MS.
3. Tanto o apelante como Edite Florêncio Ramires, em juízo, reservaram-se o direito de permanecer calados. Todavia, a versão prestada por eles à autoridade policial se alinha às demais provas, valendo a pena atinar para o depoimento de Edite, no qual relata que MILTON insistiu com ela dizendo que sabia como fazer para ela receber o benefício, esclarecendo que iria "diminuir" a idade de sua filha.
4. E, conforme se infere do longo depoimento prestado por Juracy Almeida Andrade, chefe do posto indígena, incumbido de fazer uma averiguação sobre as denúncias, as inúmeras irregularidades e fraudes nos livros de registro de pessoas naturais que existiam no Posto Indígena ocorreram na gestão do acusado.
5. Além do documento ideologicamente falso produzido por ele, prova irrefutável que pesa contra si é o requerimento de "Salário Maternidade" para Edite Florêncio Ramires, documento carimbado e subscrito por ele, assinado em conjunto com a segurada.
6. Frise-se que, no presente caso, a tentativa do crime de estelionato restou configurada, quando o réu protocolou requerimento de benefício previdenciário, com documento ideologicamente falso, visando ludibriar a Autarquia para obter vantagem indevida para Edite Florêncio Ramirez.
7. Se o apelante não estava em condições de desempenhar o cargo que ocupava, naturalmente seria logo afastado, ou, em outra hipótese, poderia ele próprio rejeitar o ofício, não justificando sua conduta o fato de ser índio, com parca instrução primária. Viu-se que ele permaneceu no cargo de chefe do posto indígena durante quatro anos (1997/2001) e, após, passou a ser funcionário público da FUNASA/MS (depoimento de fl. 69), fato este que contraria a tese de defesa que visa afastar a consciência da ilicitude da conduta.
8. Dúvida não resta que MILTON tinha conhecimento de que a segurada não fazia jus ao benefício com o documento de Registro de Nascimento anteriormente emitido, e, por isso, emitiu uma segunda via, adulterando a data de nascimento para forçar a concessão do benefício.
9. Trata-se aqui de um comportamento de má fé, que não se confunde com inaptidão para funções que requerem conhecimento técnico. O apelante é índio totalmente integrado na sociedade civilizada, o que dispensa maiores esclarecimentos para afastar a tese de ocorrência de erro de proibição, sustentada pela defesa.
10. Frise-se que o Diploma Processual Penal, nos termos de seu artigo 156, é categórico quando determina que "a prova da alegação incumbirá a quem a fizer" e, in casu, o apelante nada trouxe aos autos além de meras alegações, não havendo qualquer outra prova a confirmá-las. Aliás, a posição da jurisprudência e da doutrina, a respeito do tema, não discrepa desse entendimento :TACRIM/SP - AC - Relator Juiz Franciulli Neto - JUTACRIM 49/356 e Magalhães Noronha - Curso de Direito Processual Penal, 17a. edição, Saraiva, p.90.
11. A certeza necessária para a averiguação da existência do delito nem sempre decorre de prova direta, mas pode advir da soma das diversas circunstâncias que cercam o fato, como ensina Júlio Fabbrini Mirabete, em seu Manual de Processo Penal (in Manual de Processo Penal; Mirabete, Júlio Fabbrini; 17ª Edição; 2005; Editora Atlas; página 344).
12. A prova acusatória é subsistente e hábil a comprovar a materialidade, a autoria e o dolo, devendo ser mantida a sentença condenatória.
13. Quanto à dosimetria da pena, as informações criminais constantes dos autos demonstram que o acusado ostenta impressionante quantidade de inquéritos e ações penais que, no entanto, não podem ser considerados como maus antecedentes, porque tal violaria a presunção de inocência. Por outro lado, restou patente que a conduta social e a personalidade do acusado não o recomendam, pois revelam-se voltadas para a ilicitude, como bem assentou o MM. Juiz "a quo", pois a atitude do acusado denotou total desprezo pelo Estado, representado pela autarquia previdenciária e também pela FUNAI, que implantou o Posto Indígena e o nomeou chefe para facilitar o acesso das comunidades indígenas aos direitos sociais. O acusado aproveitou-se da condição hipossuficiente da comunidade indígena, das facilidades de seu cargo para intentar pedido de benefício e enveredou para o caminho do crime, que perpetrou no âmbito de sua atividade profissional, justificando o aumento da pena para um pouco acima do mínimo.
14. Não havendo que se falar em bis in idem, até porque as duas circunstâncias judiciais eram aptas a aumentar a pena, e o aumento foi tão reduzido que se justificaria mesmo na presença de apenas uma das duas circunstâncias invocadas.
15. Recurso desprovido. Sentença mantida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, à unanimidade, negar provimento ao recurso interposto por Milton Francisco, nos termos do voto da relatora.


São Paulo, 05 de março de 2012.
RAMZA TARTUCE
Desembargadora Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001129-92.2002.4.03.6000/MS
2002.60.00.001129-7/MS
RELATORA : Desembargadora Federal RAMZA TARTUCE
APELANTE : MILTON FRANCISCO
ADVOGADO : DANIELE DE SOUZA OSORIO (Int.Pessoal)
: ANNE ELISABETH NUNES DE OLIVEIRA (Int.Pessoal)
: DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO : Justica Publica
REU ABSOLVIDO : RAMIRO LUIZ MENDES
EXTINTA A PUNIBILIDADE : EDITH FLORENCIO RAMIRES

RELATÓRIO

Trata-se de APELAÇÃO CRIMINAL interposta por MILTON FRANCISCO contra a sentença proferida pela MM. Juíza da 5ª Vara Federal de Campo Grande - MS, que julgou parcialmente procedente a pretensão punitiva deduzida na denúncia, para:

1. absolver Ramiro Luiz Mendes, da imputação prevista no artigo 171, § 3º, do Código Penal, com fundamento no artigo 386, inciso VI, do Código de Processo Penal.

2. condenar MILTON FRANCISCO, como incurso nas sanções do artigo 171, § 3º, c/c o artigo 14, inciso II, todos do Código Penal, à pena privativa de liberdade de 01 (um) ano de reclusão, em regime aberto, e ao pagamento de 15 (quinze) dias-multa no valor unitário de um trigésimo do salário mínimo.

3. condenar Edite Florêncio Ramires, como incursa nas sanções do artigo 171, § 3º, c/c o artigo 14, inciso II, todos do Código Penal, a pena privativa de liberdade de 06 (seis) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, em regime aberto, e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa no valor unitário de um trigésimo do salário mínimo.

As penas privativas de liberdade aplicadas aos condenados foram substituídas por uma restritiva de direito, consistente na prestação de serviços à comunidade.

Consta da denúncia (fls. 02/07) que:

"1. No dia 06 de março de 2001, EDITE FLORENCIO RAMIRES, indígena residente no Posto Indígena Ipegue, requereu ao Instituto Nacional de Seguro Social - INSS, por meio do posto de atendimento na cidade de Aquidauna/MS, a concessão de benefício previdenciário da espécie "salário maternidade", e apresentou, para tanto, a Certidão de Registro Administrativo de Nascimento de Índio à fl. 13, em nome de "Andreia Ramires", qualificada como sua filha e com data de nascimento em 19 de dezembro de 1997.
2. O Instituto em tela detectou, através de auditoria interna, a existência de irregularidade no requerimento de EDITE FLORÊNCIO RAMIRES, consistente no fato de que a Certidão apresentada continha dados divergentes dos consignados no Livro de Registro Administrativo de Nascimento do Posto Indígena Ipegue/MS. Após o devido processamento, verificou-se que EDITE possuía uma filha de nome "Andreia Ramires Baltazar", nascida em 23 de junho de 1993 e regularmente registrada no Cartório Civil de Aquidauna/MS, tendo o referido requerimento sido indeferido sem o pagamento de qualquer parcela a título de benefício previdenciário.
Posteriormente, comunicado o fato ao MPF, foi instaurado o incluso inquérito para apuração.
3. Consta do investigatório que MILTON FRANCISCO, na época dos fatos chefe do Posto Indígena Ipegue, próximo a Aquidauna/MS, procurou EDITE FLORENCIO RAMIRES e se ofereceu para obter auxílio maternidade referente à sua filha Andreia, esclarecendo que isso seria possível mediante a diminuição da idade da criança.
4. Na condição de Chefe do Posto Indígena, MILTON FRANCISCO registrou falsamente, em 14 de novembro de 2000, no Livro de Registro Administrativo de Nascimentos n.º A-05/2000, o nascimento de "Andreia Ramires Baltazar", filha de EDITE FLORENCIO RAMIRES e Amado Ramires Baltazar, como ocorrido em 19 de dezembro de 1995 (fl. 103)
5. Consta ainda, que RAMIRO LUIZ MENDES, conhecido pela alcunha de "CHICO RAMIRO", providenciou, juntamente com MILTON FRANCISCO, a expedição da Certidão ideologicamente falsa de Registro Administrativo de Nascimento de Índio, com cópia à fl. 13, na qual se anotou como data de nascimento de "Andreia Ramires" não mais no dia 19/12/95, mas sim 19 de dezembro de 1997, a fim de que o recebimento do auxílio-maternidade pelo nascimento ali falsamente registrado ainda não estivesse prescrito (o prazo de prescrição é de 05 anos, conforme o art. 103, parágrafo único, da Lei n.º 8.213/91).
6. Inquirida pela autoridade policial (f. 55/56), EDITE asseverou, em agosto de 2002, que sua filha "Andreia Ramires Baltazar" já estava com 09 (nove) anos, o que remete sua data de nascimento a 1993, em acordo com o Registro Civil à f. 2, realizado ainda em agosto daquele mesmo ano e dotado de fé pública quanto à ocorrência daquela declaração.
Asseverou ainda, que foi procurada por MILTON FRANCISCO, "que se ofereceu para obter auxílio-maternidade" em seu favor e que a levou, dias depois, "até o posto do INSS em Aquidauna/MS onde ela assinou alguns documentos", tendo reconhecido como de sua autoria a assinatura no requerimento à Autarquia Previdenciária (fl. 10).
EDITE confessou, por fim, que "sabia que não era possível obter tal benefício do INSS tendo em vista a idade de sua filha, no entanto, MILTON FRANCISCO insistiu com ela dizendo que sabia como fazer para ela receber" e que, diante dessa situação, "forneceu seus documentos para que ele providenciasse a papelada" (f. 55).
7. Em sua perquirição, MILTON FRANCISCO declarou que "foi envolvido na fraude apurada nestes autos pela pessoa de nome RAMIRO LUIZ MENDES, conhecido pelo apelido de 'CHICO RAMIRES' (sic), o qual também é indígena residente na aldeia Ipegue". Declarou ainda, que era "CHICO RAMIRO" quem lhe entregava as certidões falsificadas para que ele apenas assinasse (f. 59-61). " (...)

A denúncia foi recebida em 03/11/2004 (fl. 155).

Os réus foram interrogados às fls. 171 (Ramiro), 220 (Milton), 221 (Edite), defesa prévia às fls. 238/240, 255/256,

As testemunhas de defesa e as de acusação, em comum, foram ouvidas às fls. 325/329.

Alegações finais ofertadas às fls. 377/383, 392/394 (Ramiro), 403/411 (Milton) e 416/423 (Edith).

Sentença parcialmente procedente às fls. 425/440, publicada em 20/06/2008 (fl. 441).

Sentença de extinção da punibilidade de EDITE FLORENCIO RAMIRES, nos termos do artigo 107, IV, do Código Penal às fls. 475/476, publicada em 30/01/2009.

Em razões de apelação (fls. 483/494), MILTON FRANCISCO requereu a reforma integral da sentença, nos seguintes termos:

1. Pede a absolvição por falta de provas. Alega que foram ouvidas apenas duas testemunhas que relataram fatos genéricos e não se recordaram especificamente dos casos que envolveram Edite Florêncio Ramires; nos interrogatórios de Edite e do apelante se reservaram ao direito de permanecer em silêncio; o depoimento extrajudicial de EDITE não restou confirmado judicialmente. Sustenta ainda que "Não é ônus da defesa elidir as informações do inquérito; é, sim, ônus da acusação convertê-las, de meras informações, em provas obtidas em procedimento contraditório" (STF, HC 67917/RJ). A apuração policial possui natureza de procedimento administrativo, não podendo sozinho fundamentar a condenação (artigo 155 do Código de Processo Penal).

2. Houve erro de proibição. O apelante, indígena, com apenas o ensino fundamental incompleto, foi indicado pelo responsável da FUNAI para exercer o cargo de confiança de Chefe do Posto Indígena. Ele não tinha a capacidade e o discernimento necessários para cumprir tarefas técnicas e cartorárias que exigiam conhecimentos específicos. Ele assinava, por formalidade, toda a documentação apresentada, principalmente os documentos oriundos do Administrador Executivo da FUNAI, Márcio Justino Marcos. O depoimento de Juracy Almeida Andrade informa que o apelante foi enganado pelo "esquema" de fraudes, premeditada por "Chico Ramiro".

3. Não houve dolo. Não há elemento probatório no sentido de que o réu tenha, propositadamente, falsificado a certidão de nascimento para permitir o recebimento do auxílio-maternidade. As circunstâncias pessoais do apelante (índio, de parca instrução escolar e residente na aldeia), aliada à influência de Ramiro (ou Chico Ramiro) dentro da comunidade indígena, demonstram que MILTON desconhecia a fraude que seria perpetrada.

Alternativamente, pede a redução da pena-base ao mínimo legal de 01 (um) ano e afirma que o registro de processos em andamento na folha de antecedentes do apelante não pode ser interpretado como "referências desabonadoras na vida social". As circunstâncias judiciais previstas no artigo 59, caput, do Código Penal, não foram corretamente sopesadas porque as certidões de antecedentes do apelante foram consideradas duas vezes em seu desfavor (bis in idem), tanto para valorar a circunstância judicial relativa à conduta social quanto para a aferição da personalidade do agente. As demais circunstâncias judiciais, as quais são favoráveis ao apelante, não foram consideradas pelo Magistrado "a quo".

Com as contrarrazões (fls. 501/506), vieram os autos a esta Egrégia Corte, onde a Procuradoria Regional da República opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 511/516).

O feito foi submetido à revisão, na forma regimental.

É O RELATÓRIO.

À revisão.



RAMZA TARTUCE
Desembargadora Federal


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Data e Hora: 13/02/2012 19:05:36



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001129-92.2002.4.03.6000/MS
2002.60.00.001129-7/MS
RELATORA : Desembargadora Federal RAMZA TARTUCE
APELANTE : MILTON FRANCISCO
ADVOGADO : DANIELE DE SOUZA OSORIO (Int.Pessoal)
: ANNE ELISABETH NUNES DE OLIVEIRA (Int.Pessoal)
: DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO : Justica Publica
REU ABSOLVIDO : RAMIRO LUIZ MENDES
EXTINTA A PUNIBILIDADE : EDITH FLORENCIO RAMIRES

VOTO

A materialidade e a autoria delitivas restaram comprovadas, pela cópia da Certidão de Registro Administrativo de Nascimento de índio (Segunda via - fl. 22), pelo Requerimento de Benefício "SALÁRIO MATERNIDADE" em nome de Edite Florêncio Ramirez (corré que teve extinta sua punibilidade, pela prescrição), subscrito pelo apelante (fl. 19), pelo procedimento administrativo instaurado pela Auditoria Regional do INSS (fls. 14/49) e pelos depoimentos colhidos nos autos.

Fato inconteste é que a autarquia previdenciária detectou, através de auditoria interna, a existência de irregularidade na documentação que embasou o requerimento de benefício de Edite Florêncio Ramires. Apurou-se que, na Certidão de Nascimento (segunda via) de "Andreia Ramires Baltazar", filha da segurada Edite, emitida por MILTON FRANCISCO, a data de nascimento foi alterada de 19/12/95 (fl. 40) para 19/12/1997 (fl. 22), dado este divergente dos consignados no Livro de Registro Administrativo de Nascimento do Posto Indígena Ipegue/MS.

Tanto o apelante como Edite Florêncio Ramires, em juízo, reservaram-se o direito de permanecer calados. Todavia, a versão prestada por eles à autoridade policial (fls. 64/65 e 68/70), se alinha às demais provas, valendo a pena transcrever o depoimento de Edith, a qual relata que MILTON insistiu dizendo que sabia como fazer para ela receber o benefício, esclarecendo que iria "diminuir" a idade da filha da declarante. Acerca de seu depoimento, anote-se que a corré prestou-o na presença de representante da FUNAI, confira-se:

" QUE, comparece neste Posto da Funasa, aldeia BANANAL, a fim de prestar esclarecimentos no interesse do IPL 014/02-SR/DPF/MS, o que faz na presença do Chefe do posto SAMUEL DE MARCOS; QUE, a declarante conhece a pessoa de MILTON FRANCISCO, o qual foi chefe do Posto Indígena IPEGUE, QUE, a declarante tem uma filha de nome ANDREIA RAMIRES BALTAZAR que está com 09 anos de idade, não sabendo declinar precisamente qual a data de nascimento desta; QUE, no ano passado, não sabendo precisar data, MILTON FRANCISCO procurou pela declarante e se ofereceu para obter auxílio maternidade referente a filha da declarante de nome ANDREIA; QUE, a declarante sabia que não era possível obter tal benefício do INSS tendo em vista a idade de sua filha, no entanto, MILTON FRANCISCO insistiu com ela dizendo que sabia como fazer para ela receber, esclarecendo que iria 'diminuir' a idade da filha da declarante; QUE, diante da insistência de MILTON FRANCISCO, a declarante acabou concordando com ele e forneceu seus documentos para que ele providenciasse a papelada; QUE, após alguns dias a declarante foi levada por MILTON FRANCISCO até o posto do INSS em Aquidauna/MS onde ela assinou alguns documentos; QUE, a declarante reconhece como sendo de sua autoria a assinatura de seu nome por extenso aposto no documento de fls. 10; QUE, MILTON disse a declarante que quando ela recebesse ele iria fazer "um trato" com ela para que ela lhe desse uma parte do dinheiro; QUE, a declarante acredita que MILTON iria ficar com a metade do dinheiro que seria recebido; QUE, a declarante não sabe qual o motivo, mas acabou não recebendo o auxílio maternidade; QUE, a declarante não foi mais procurada por MILTON e ele não mais falou com a declarante sobre o assunto em epígrafe; QUE a declarante não sabe afirmar ao certo quem teria sido responsável pela elaboração da Certidão de Nascimento cuja cópia se vê às fls. 13, mas por certo deve ter sido MILTON, vez que no documento consta seu carimbo e sua assinatura."

E, conforme se infere do longo depoimento prestado por Juracy Almeida Andrade (fls. 325/328), chefe do posto indígena, incumbido de fazer uma averiguação sobre as denúncias, foram descobertas inúmeras irregularidades e fraudes nos livros de registro de pessoas naturais que existiam no Posto Indígena e que ocorreram na gestão do acusado, in verbis :

"Que a testemunha reside em Campo Grande. Que um pouco posterior aos fatos assumiu a chefia do Posto Indígena Ipegue. Que assim que assumiu a chefia do Posto, a administração (FUNAI) o incumbiu de fazer uma averiguação sobre as denúncias de eventuais fraudes previdenciárias envolvendo índios do Posto Ipegue. Que a denúncia feita ao Ministério Público Federal noticiando tais fraudes foi feita pelo acusado Ramiro Luiz Mendes e, inicialmente, envolvia apenas as filhas do capitão Mauro Paes, de nomes Erineide e Eniéia. Que Ramiro era rival político do Capitão Mauro Paes. Que no dia 08 de novembro de 2002, a testemunha acompanhada de sua colega Tereza foram conduzir alguns indígenas ao Posto do INSS na cidade de Aquidauna. Que no decorrer do atendimento, notaram a indígena Cleonice Botelho Correa chorando irresignada, pois o funcionário do INSS havia lhe noticiado que ela, Cleonice, já havia recebido o benefício de auxílio maternidade. Que Cleonice esclareceu à testemunha que alguém havia recebido o benefício por ela, utilizando indevidamente o seu nome e de um suposto filho e marido que Cleonice jamais tivera. Que dessa forma, Cleonice ficou impedida de receber o benefício com o advento do seu verdadeiro filho Willian Botelho Mota, uma vez que o INSS já havia pago ao falso filho de nome Claudemir Correa Mendes, cujo falso pai seria Marcelino Luiz Mendes. A testemunha fez questão de apresentar ao Juízo o termo de declaração prestada na época por Cleonice Botelho Correa no INSS. Que naquela ocasião, Cleonice em suas declarações afirmou que os responsáveis pelo recebimento indevido de salário maternidade em seu nome, seriam Milton Francisco e Ramiro Luiz Mendes. Observa a testemunha para o Juízo que coincidentemente o sobrenome do falso filho e falso marido de Cleonice (Correa Mendes) coincide em parte com Ramiro Luiz Mendes. Que esse episódio fez com que a testemunha desencadeasse uma investigação administrativa lá no Posto Ipegue, a fim de verificar a possível ocorrência de outras fraudes. Que posteriormente àquele dia, o INSS comunicou a suspensão do benefício indevido que estava em nome de Cleonice. Então, a testemunha, na qualidade de chefe do Posto, fez um recurso para a Previdência social, no qual explicava o ocorrido e pleiteava a concessão do benefício à Cleonice. Entretanto, tal recurso foi improvido. Que no decorrer de suas investigações, a testemunha foi procurada pelo cacique e membros do conselho tribal que fizeram denúncias da existência de outras irregularidades e fraudes nos livros de registro de pessoas naturais que existiam no Posto. Que ao verificarem os livros ficou assustado com a quantidade de rasuras grosseiras, que alteravam datas de nascimento, nomes de pai e outros dados, principalmente idade, com intuito de obter aposentadoria. Que de imediato, em 10 de fevereiro de 2003, a testemunha encaminhou o ofício apresentado a esse Juízo no presente ato, à FUNAI, relatando as irregularidades, elencando alguns registros notoriamente fraudados, uma vez que nenhum membro da comunidade conhecia as pessoas ali registradas. Asseverou ainda, no referido ofício destinado ao Administrador Executivo da FUNAI, não poderia expedir uma Certidão sequer com base nos dados existentes naqueles livros, sob pena de vir também incidir em falsidade ideológica. Que apesar de ter encaminhado o referido oficio a FUNAI continuou omissa em relação à situação. Denuncia a testemunha que as irregularidades perpetradas no Posto Indígena Ipegue estendem-se além das fronteiras da reserva, pois no Distrito de Taunay existem pessoas não indígenas que obtiveram certidão de nascimento, carteira de identidade, benefícios do INSS como se fossem indígenas. Que todas essas falcatruas ocorreram na gestão do acusado Milton Francisco e foram feitas pessoalmente por Ramiro Luiz Mendes, pois este guardava os livros em sua residência, bem como a máquina de datilografar de propriedade da FUNAI. Que quando assumiu o Posto, a testemunha ficou um mês impedido de trabalhar, pois os livros de assento não estavam no local. Que seu antecessor no Posto, Samuel Gomes Marcos, já havia passado pela mesma situação e enviado ofício à FUNAI solicitando os livros. Que a testemunha só recebeu os livros depois de oficiar a FUNAI e insistir na sua devolução. Que os livros estavam na casa de Ramiro Mendes e por ordem do administrador da FUNAI foram trazidos para Campo Grande e entregues à testemunha no Gabinete do administrador da FUNAI, Marcio Justino Marcos. Que todos no Posto sabiam que os livros estavam na casa de Ramiro Luiz Mendes. Que havia comentários na comunidade, ressaltando a testemunha que não fez uma constatação pessoal acerca desses comentários, no sentido de que Milton Francisco receberia R$50,00 por cada benefício previdenciário concedido irregularmente, que Ramiro e o Beneficiário dividiam o restante. Que Ramiro passou a não cumprir o trato com os beneficiários então começaram a surgir às denúncias de uma parte desses beneficiários. Que pela legislação vigente, o chefe do Posto é quem tem atribuição de efetivar os registros e assinar as certidões e em seguida submetê-las ao administrador regional da FUNAI para que este assine validando o documento, entretanto, na gestão de Milton Francisco, quem fazia os registros e as certidões era Ramiro, senão todas, grande parte. Que Milton limitava-se apor sua assinatura e em alguns casos nem isso fazia. Que havia casos de as certidões virem sem assinatura de Milton para o administrador Regional, na época Márcio Justino, que este na base da confiança validava essas certidões, pois, Milton Francisco era a pessoa por si nomeada para ocupar o cargo de chefe do posto. Que, em verdade, era um esquema montado no qual Milton Francisco facilitava a ação de Ramiro Luiz. Que pela experiência da testemunha, a mesma acredita que ou Milton Francisco sentia-se coagido por Ramiro ou tinha alguma vantagem, ressalta que esta conclusão é apenas uma inferência pessoal, baseada em comentários que havia na comunidade. Que com base em sua experiência de indigenista de carreira, que conviveu dentro de aldeias durante 30 anos, no Estado do Amazonas, Rondônia, Rio Grande do Sul, Acre, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Roraima, afirma que mulher indígena é facilmente manipulada, pois ela não tem a malícia que a mulher não indígena tem, na medida em que não sabe distinguir as conseqüências de atos como os praticados na presente ação penal. A mulher índia não tem noção da estrutura da sociedade, que não compreendem a ilicitude da fraude previdenciária, pois não sabem nem mesmo o que é previdência. Afirma a testemunha que o desconhecimento da ilicitude por parte das índias ficou demonstrado, quando estas o procurava e falavam livremente, sem censura, sobre o arranjo feito pelo acusado Ramiro Luiz para obter o benefício previdenciário. Cita como exemplo o caso das indígenas Elineide e Elinéia, primas de Ramiro, que apesar de solteiras e sem filhos emprestaram seu nome para receber salário maternidade. Que disseram à testemunha que assim agiram por que acreditaram que iam trazer benefícios para a comunidade. Que Ramiro sempre teve uma ascendência muito grande sobre os membros da comunidade, motivado inclusive pelo seu status social, pois mora na melhor residência da comunidade e dispõe sempre de veículo do ano, pelo menos atualmente. Que inclusive, no decorrer das investigações administrativas, a testemunha foi ameaçada de morte pelo tio de Ramiro Luiz Mendes, tendo o ocorrido um episódio no qual o veículo da testemunha foi interceptado por 12 indígenas armados com facas, facões e pedaços de madeira. Que a testemunha salvou-se, por que tinha, na época porte de arma, e defendeu-se sacando sua pistola." (...) (g.n.)
"Que foram vários casos de fraudes, não se recorda especificamente dos casos que envolveram Edite Florência Ramires, Elaine Botelho e Rosely Gomes. Que não se recorda do período que Milton Francisco foi chefe do Posto." (...) "Que quando disse que a FUNAI foi omissa, referia a administração Regional e à Presidência da FUNAI em Brasília que nomeou um indígena para esse cargo, pois acredita que o índio que é tutelado, não pode ser tutor ocupando um cargo de Administrador. Que quando mencionou que Milton Francisco poderia estar sofrendo uma coação, em verdade, referia-se ao suposto temor de Milton Francisco em perder o cargo, pois o salário é pequeno e gratificação de função é alta. A testemunha acredita que devido a ascendência política de Ramiro na comunidade, este tenha indicado o nome de Milton Francisco para o cargo. Que a mulher indígena é totalmente submissa ao marido." (...) "Que a ingenuidade cultural da mulher indígena não se estende aos homens indígenas, pois, este tem um convívio social maior com a comunidade não indígena, na medida em que sai para trabalhar nas usinas, nas fazendas. Que a maioria das índias não acesso aos meios de comunicação de massa como por exemplo a televisão." (g.n.)

Com efeito, o depoimento de Juracy em Juízo não diverge daquele apresentado em sede de investigação policial (fls. 79/82), sendo que em ambos denota-se que tanto MILTON FRANCISCO como Ramiro Luiz Mendes (corréu absolvido) estavam envolvidos com o esquema de fraudes, exerciam direta influência sobre a comunidade indígena e, para subsistência do "negócio", estavam dispostos a afastar todo e qualquer risco. A participação e a influência de ambos também ficaram visíveis no depoimento de Márcio Justino Marcos, administrador da FUNAI (2001/2003 - fl. 329).

Contudo, deixo assentado que referida conclusão tem efeito apenas para avaliação da conduta de MILTON, visto que não há recurso contra a absolvição do corréu Ramiro.

Assim, não é de se admirar que os corréus MILTON e Edite, em interrogatório judicial, optaram pelo direito de permanecer calados (fls. 220/221). Vê-se dos autos que as fraudes e irregularidades que assolaram a aldeia indígena tomaram dimensões desproporcionais a ponto de serem veiculadas pela imprensa, comunicadas ao INSS da região de Aquidauna/MS, suscitando a investigação dos fatos, como ocorreu nesta ação e outras mais (fl. 15/17). Os fatos foram também objeto de discussão em reunião entre o Ministério Público Federal, o Técnico Indigenista da FUNAI e o Cacique da Aldeia IPEGUE (fls. 124/128 - maio/2003).

Não perdendo de vista as provas contidas nos autos acerca da conduta do apelante, além do documento ideologicamente falso por ele produzido, prova irrefutável que pesa contra si é o requerimento de "Salário Maternidade" fornecido para Edite Florêncio Ramires, documento carimbado e subscrito por ele, assinado em conjunto com a segurada (fl. 19).

Frise-se que, no presente caso, a tentativa do crime de estelionato restou configurada, quando o réu protocolou requerimento de benefício previdenciário, com documento ideologicamente falso, visando ludibriar a Autarquia para obter vantagem indevida para Edite Florêncio Ramires.

Em sua tese de defesa, o apelante alega que não tinha a capacidade e o discernimento necessários para cumprir tarefas técnicas e cartorárias que exigiam conhecimentos específicos e, por isso, acabou sendo influenciado por Ramiro Luiz Mendes (ou Chico Ramiro), em esquema fraudulento.

Todavia, anoto que, se o apelante não estava em condições de desempenhar as atividades do cargo que ocupava, naturalmente seria logo afastado, ou, em outra hipótese, poderia ele próprio rejeitar o ofício, não justificando a sua conduta delituosa o fato de ser índio, com parca instrução primária, como quer fazer crer a defesa. Viu-se que ele permaneceu no cargo de chefe do posto indígena durante quatro anos (1997/2001) e, após, passou a ser funcionário público da FUNASA/MS (depoimento de fl. 69), fato este que contraria sua tese absolutória, visando afastar a consciência da ilicitude do fato.

Com efeito, dúvida não resta que MILTON tinha conhecimento de que a segurada não conseguiria obter o benefício com o documento de Registro de Nascimento anteriormente emitido, e, por isso emitiu uma segunda via, adulterando a data de nascimento, para que ela conseguisse obter a concessão do benefício.

Tendo ocupado o cargo em comissão na FUNAI, de chefe do posto indígena, com funções administrativas, entre elas de guardar e zelar pelo assento nos livros da comunidade do posto, detinha ele condições de conferir a regularidade das certidões dos nascimentos até então registrados na aldeia.

Trata-se aqui de um comportamento de má fé, que não se confunde com inaptidão para funções que requerem conhecimento técnico, o que também não é o caso. O apelante é índio integrado na sociedade civilizada, dispensando maiores esclarecimentos para afastar, assim, a tese de ocorrência de erro de proibição.

Frise-se que o Diploma Processual Penal, nos termos de seu artigo 156, é categórico quando determina que "a prova da alegação incumbirá a quem a fizer" e, in casu, o apelante nada trouxe aos autos além de meras alegações, não havendo qualquer outra prova a confirmá-las.

Aliás, a posição da jurisprudência e da doutrina, a respeito do tema, não discrepa desse entendimento, como segue:

"Quem invoca desconhecer o caráter criminoso do fato, tem contra si o ônus de demonstrá-lo não sendo suficiente a alegação do réu , no sentido de que estava prestando serviço a terceiro, pessoa não identificada suficientemente"(TACRIM/SP - AC - Relator Juiz Franciulli Neto - JUTACRIM 49/356).
"A prova da alegação incumbe a quem a fizer, é o princípio dominante em nosso código. Oferecida a denúncia, cabe ao ministério público a prova do fato e da autoria; compete-lhe documentar a existência concreta do tipo (nullum crimen sine tipo) e de sua realização pelo acusado. Este também tem a seu cargo o onus probandi. Com efeito, se ele invoca uma causa excludente de anti-juridicidade (legítima defesa p.ex.) ou da culpabilidade (v.g., erro de fato), incumbe-lhe prová-la. Não apenas isso; a ele cabe ainda o ônus, se alega não estar provada a existência do fato." (Magalhães Noronha- Curso de Direito Processual Penal, 17a. edição, Saraiva, p.90).

De outra feita, é de se ressaltar que a certeza necessária para a averiguação da existência do delito nem sempre decorre de prova direta, mas pode advir da soma das diversas circunstâncias que cercam o fato, como ensina Júlio Fabbrini Mirabete, em seu Manual de Processo Penal¸in verbis:

"Diante do sistema de livre convicção do juiz, encampado pelo Código, a prova indiciária, também chamada circunstancial, tem o mesmo valor das provas diretas, como se atesta na Exposição de Motivos, em que se afirma não haver hierarquia de provas por não existir necessariamente maior ou menor prestígio de uma com relação a qualquer outra (item VII). Assim, indícios múltiplos, concatenados e impregnados de elementos positivos de credibilidade são suficientes para dar base a uma decisão condenatória, máxime quando excluem qualquer hipótese favorável ao acusado." (in Manual de Processo Penal; Mirabete, Júlio Fabbrini; 17ª Edição; 2005; Editora Atlas; página 344)

Assim, conclui-se que a prova acusatória é subsistente e hábil a comprovar a materialidade, autoria e o dolo, devendo ser mantida a sentença condenatória.

Quanto à dosimetria da pena.

Atenta às diretrizes do artigo 59 do Código Penal, verifico pelas informações criminais constantes dos autos que o acusado ostenta impressionante quantidade de inquéritos e ações penais (fls. 199/205 e 225/228), que, em sua quase totalidade, se referem a delitos da mesma natureza do aqui tratado. Todavia, não podem ser considerados como maus antecedentes, porque tal violaria a presunção de inocência.

Por outro lado, restou patente que a conduta social e a personalidade do acusado não o recomendam, pois revelam-se voltadas para a ilicitude dentro de seu campo de trabalho, como bem assentou o MM. Juiz "a quo". Veja-se que a atitude do acusado denota total desprezo pelo Estado, representado pela autarquia previdenciária e também pela FUNAI, que implantou o Posto Indígena e o colocou na chefia, para facilitar o acesso das comunidades indígenas aos direitos sociais, tendo o acusado se aproveitado dessa circunstância, da condição hipossuficiente da comunidade indígena, e das facilidades de seu cargo para intentar pedido de benefício, e enveredou para o caminho do crime perpetrado no âmbito de sua atividade profissional, justificando o aumento da pena para um pouco acima do mínimo legal, não havendo que se falar em bis in idem, até porque as duas circunstâncias judiciais eram aptas a aumentar a pena, e o aumento foi tão reduzido que se justificaria mesmo na presença de apenas uma das duas circunstâncias invocadas.

Quanto às demais circunstâncias judiciais, o MM. Juiz "a quo" não as teve como desabonadoras da conduta (fl. 437).

Diante do exposto nego provimento ao recurso de MILTON FRANCISCO.

É COMO VOTO.


RAMZA TARTUCE
Desembargadora Federal


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