|
|
|
|
|
VOTO CONDUTOR
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:
Trata-se de apelação criminal interposta pelo Ministério Público Federal contra a sentença que condenou Naomi Elizabeth Lillian Hornsey como incursa nas penas dos artigos 33, caput, c/c. o 40, inciso I, ambos da Lei nº 11.343/06.
Conforme a denúncia (fls. 57/60), Naomi Elizabeth Lillian Hornsey, natural da Inglaterra, foi presa em flagrante no dia 18 de junho de 2010, nas dependências do Aeroporto internacional de Guarulhos/SP, quando tentou embarcar em vôo com destino final a Madri/Espanha, transportando, para fins de comércio ou de entrega de qualquer forma a consumo de terceiros, no exterior, 2.970 g. (dois mil, novecentos e setenta gramas) de cocaína, oculta em forros falsos de bolsas femininas novas que se encontravam em sua bagagem.
Após regular instrução, foi proferida a sentença de fls. 234/239, que fixou a pena-base da ré em 6 (seis) anos e 3 (três) meses de reclusão e 635 (seiscentos e vinte e cinco) dias-multa, reduzida em 1/6 (um sexto) pela aplicação da atenuante genérica da confissão, perfazendo 5 (cinco) anos, 2 (dois) meses e 15 (quinze) dias e 520 (quinhentos e vinte) dias-multa; majorada em 1/6 (um sexto), pela aplicação da causa de aumento prevista no inciso I do artigo 40, da Lei 11.343/06, estabelecida em 6 (seis) anos e 27 (vinte e sete dias de reclusão) e 606 (seiscentos e seis) dias-multa e reduzida em metade, pela aplicação do benefício constante no § 4º do artigo 33, da Lei 11.343/06, perfazendo a pena definitiva de 3 (três) anos e 13 (treze) dias de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado e pagamento de 303 (trezentos e três) dias-multa no valor unitário mínimo.
A pena privativa de liberdade foi substituída por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e limitação de fim de semana, a serem estabelecidas pelo MM. Juízo da Execução. Foi concedido à ré o direito de apelar em liberdade, expedindo-se alvará de soltura clausulado em seu favor.
O Ministério Público Federal apelou, requerendo a reforma parcial da sentença, para que a pena-base seja fixada em patamar maior e para que sejam excluídas, da dosimetria da pena da ré, a atenuante de confissão espontânea e a causa especial de redução prevista no § 4º, do art. 33 da Lei nº 11.343/06 ou a redução dos patamares de diminuição. Requer ainda que seja revertida a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos.
A materialidade do delito está consubstanciada pelo auto de exibição e apreensão (fls. 07/08, laudo de constatação (fl. 14) e laudo pericial de fls. 92/94, atestando que a substância apreendida na bagagem da ré foi positiva para cocaína, no peso de 2.970 g. (dois mil, novecentos e setenta gramas).
Tampouco restam dúvidas acerca da autoria delitiva, em primeiro lugar diante da prisão em flagrante da acusada, de posse da droga, fato corroborado pelos depoimentos das testemunhas. Por outro lado, ao ser interrogada em Juízo, a ré admitiu que fora contratada para o transporte do entorpecente, e que receberia a quantia de três mil euros pelo serviço. Ademais, a defesa não se insurge quanto a estes fatos no presente recurso.
Também está comprovada a transnacionalidade do tráfico, tendo em vista que a droga estava em vias de ser levada do Brasil ao exterior.
Assim sendo, fica mantida a condenação da ré pela prática do crime previsto no artigo 33, caput, c/c o artigo 40, I da Lei nº 11.343/06.
Dosimetria da pena:
Não merece reparos a pena-base. Não vislumbro motivos para que seja exacerbada, por ter sido fixada acima do mínimo legal (seis anos e três meses de reclusão), observados os critérios exigidos pelo artigo 59 do CP e do artigo 42, da Lei 11.343/06, notadamente considerando-se as circunstâncias legais especiais de valor preponderante para a fixação da pena nos crimes de tráfico de drogas, ou seja, a natureza maléfica e a grande quantidade, aptas a causar conseqüências gravíssimas a relevante número de pessoas, demonstrando maior culpabilidade do réu. Assim, mostrou-se justa, proporcional e suficiente para a prevenção e repressão do crime.
Na segunda fase da fixação da pena, não prospera o pleito ministerial a fim de que seja excluída a atenuante genérica da confissão, ainda que tenha ocorrido a prisão em flagrante da ré.
De acordo com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, bem como desta Corte, a atenuante da confissão (CP, art. 65, III, d), ainda que não seja espontânea ou seja parcial, deve incidir sempre que fundamentar a condenação do acusado, como no caso, em que o Juiz afirmou expressamente que a acusada, em seu interrogatório, confessou que trazia consigo o entorpecente, bem como que receberia pagamento pelo transporte da droga, sendo indubitável a autoria delitiva (fls. 234 v).
Dessa forma, se a confissão contribuiu para a formação do convencimento do Juiz, deve ser aplicada, pouco importando se a ré foi presa em flagrante.
Transcrevo alguns julgados a respeito:
Destaco ainda que, em se tratando de atenuantes, o Código Penal não determina as hipóteses em que deve ser aplicada, tampouco o "quantum" da redução da pena. O legislador reservou ao arbítrio do Juiz o valor a ser diminuído da pena-base, à vista das circunstâncias constantes dos autos e aos princípios da proporcionalidade, razoabilidade, necessidade e suficiência para a prevenção e repressão do crime.
Portanto, entendo que deve ser mantida a aplicabilidade, no caso, da circunstância atenuante da confissão (art. 65, III, "d", do CP) no patamar eleito (um sexto), que reduziu a pena para cinco anos, dois meses e quinze dias de reclusão e 520 dias-multa.
Na terceira etapa da individualização da pena, também mantenho a aplicação da causa de aumento prevista no inciso I, do artigo 40, da Lei 11.343/06 em um sexto, tendo em vista que a ré foi detida em circunstâncias que evidenciaram a intenção de embarcar com a droga para o exterior, que totaliza a pena de seis anos, vinte e sete dias de reclusão e seiscentos e seis dias-multa.
CAUSA DE REDUÇÃO DE PENA: § 4º DO ART. 33, DA LEI 11.343/06:
Assiste razão ao Ministério Público Federal ao requerer a exclusão, da dosimetria da pena, do benefício previsto no parágrafo 4º do artigo 33, da Lei 11.343/96, feita nos seguintes termos pela sentença, verbis (fls. 236/237):
Em que pese esse entendimento, penso que não agiu com acerto o MM. Juiz "a quo", ao aplicar essa causa de redução, sob a afirmação que os elementos dos autos demonstraram que o réu preencheu os requisitos necessários à concessão dessa "benesse".De fato, esse benefício exige a presença de quatro requisitos, que devem ser preenchidos cumulativamente, ou seja, que o agente "seja primário, de bons antecedentes, não se dedique a atividades criminosas nem integre organização criminosa".
Como a lei utilizou a conjunção "NEM", deduz-se que há uma diferença substancial entre "se dedicar a atividades criminosas" e "integrar uma organização criminosa". A dedicação a atividades criminosas exige habitualidade, permanência, conjunção de propósitos, divisão de tarefas, ou seja, que o réu faça do crime seu meio de vida. Por outro lado, para que se afirme que o réu integra uma organização criminosa, basta a prova de que participou da empreitada criminosa de alguma forma.
Assim, quando o parágrafo 4º do artigo 33 da Lei 11.343/06 exige que o agente não integre organização criminosa, significa que não é necessário, para esse fim, que esteja incurso no crime de associação para o tráfico. A reiteração de condutas criminosas no passado, ou o ânimo de reiterá-las futuramente, é elemento caracterizador da estabilidade e permanência, exigíveis para a configuração do crime autônomo de associação para o tráfico (antigo artigo 14 da Lei nº 6.368/75 e atual artigo 35, da Lei nº. 11.343/06).
Contudo, no parágrafo 4º do artigo 33, da Lei 11.343/06, não é necessário esse ânimo para que se caracterize a integração em organização criminosa, já que está presente em outro requisito, que é o "não se dedicar a atividades criminosas". Repito: se a lei exigisse que a prática reiterada de delitos, ou a vontade de praticá-los reiteradamente fosse elemento essencial para a integração a uma atividade criminosa, não teria inserido como requisito da causa de redução de pena a exigência de que o agente também não se dedique a atividades criminosas.
Feitas tais considerações, e passando à análise do caso concreto, é certo que consta dos autos que a acusada é primária e que não possui maus antecedentes, e que não há provas de que se dedique a atividades criminosas.
Entretanto, consoante consta da sentença (fls. 235), em seu interrogatório judicial, a ré admitiu ter sido contratada para o transporte da droga, pelo que receberia três mil euros.
É evidente, pois, que a ré integrou uma organização criminosa voltada ao tráfico transnacional de drogas que atua em dois países, na qual há a divisão de tarefas e em que cada integrante tem uma função específica, havendo sempre de um lado um membro da organização que fornece a droga, embala, prepara o local para ocultá-la, de outro lado uma pessoa que recebe a droga, prepara para consumo e posteriormente fornece a pessoas que irão vendê-la.
Embora não possa ser considerada como membro efetivo de uma quadrilha ou que não tivesse o ânimo de voltar a delinqüir, não há como negar que a ré efetivamente figurou, ainda que de forma eventual, em uma ponta da organização criminosa voltada ao tráfico internacional de drogas. Integrou a organização ao lhe prestar serviços na condição de "mula" transportando a droga de um para outro país mediante remuneração, ao promover a conexão entre seus membros e ao colaborar, como elemento essencial, para o sucesso da atividade ilícita e a distribuição mundial de entorpecentes.
Por esses motivos, comungo do entendimento de que a causa de diminuição prevista no parágrafo 4º do artigo 33 da Lei de drogas não foi criada a fim de ser aplicada a pessoas que, como a ré, participa de organizações criminosas de tráfico internacional de grande poder financeiro e logístico,que distribuem grandes quantidades de entorpecentes, plenamente cientes de que estão se envolvendo com pessoas que vivem do crime, mas sim ao tráfico de menor expressão, que não envolve quantidades tão expressivas de entorpecente; como no tráfico urbano de varejo, onde pequenos distribuidores comercializam drogas em quantidades menores, diretamente aos usuários.
Ressalto que a aplicação indiscriminada dessa causa de redução de pena aos "mulas" do tráfico transnacional de drogas certamente servirá como incentivo para que o Brasil se torne, muito em breve, a principal rota para o transporte de drogas provenientes dos países vizinhos para o exterior, fato incompatível com os vários acordos internacionais sobre o combate às drogas firmados pelo nosso País.
Esse é também o entendimento de parte dos integrantes desta Turma. Confira-se:
Por esses motivos, excluo, da dosimetria da pena da acusada, a causa de redução de pena prevista no § 4º do artigo 33 da Lei de drogas, fixando sua pena definitivamente em seis anos e vinte e sete dias de reclusão e seiscentos e seis dias-multa.
REGIME DE CUMPRIMENTO DA PENA, SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS E DIREITO DE APELAR EM LIBERDADE:
Quanto a essas questões, assim pronunciou-se a Juíza "a quo" (fls. 228/239):
Assiste razão ao Ministério Público Federal, ao se insurgir quanto a esses aspectos.
De fato, a Lei 8.072/90, em sua redação original, estabelecia que, no caso do delito de tráfico de entorpecentes, deveria ser imposto o regime integralmente fechado. Com a alteração da Lei 11.464/07, o artigo 2º, § 1º, dessa lei, passou a ter a seguinte redação:
Da interpretação desse artigo, denota-se que é imperativo legal que seja cumprida a pena desses crimes em regime inicial fechado, permitindo-se apenas que seja efetuada a progressão para o menos gravoso.
Entendo que a fixação de regime menos grave para o cumprimento da pena mostra-se absolutamente insuficiente para prevenção e repreensão da conduta, ainda que não fosse legalmente vedada, por ser absolutamente incompatível com o tratamento mais gravoso que o legislador atribuiu aos crimes hediondos e equiparados.
Nesse sentido:
Por outro lado, a Lei nº 9.714/98, que alterou os artigos 43, 44, 45, 46, 47, 55 e 77 do Código Penal, introduzindo, em nosso sistema, a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, determina, no artigo 44:
Portanto, para se conceder a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, faz-se necessário que o réu preencha, além do requisito objetivo (quantidade da pena), os requisitos subjetivos.
No caso, tendo em vista a pena ora majorada, não se faz presente o requisito objetivo. Levando-se em consideração os motivos e as circunstâncias do crime, observa-se que a substituição da pena privativa de liberdade não se mostra suficiente para impedir que a ré volte a traficar drogas, refreando o desejo de ganho irrefletido de dinheiro. Por outro lado, se prestar serviços em instituições públicas, a acusada terá a chance de dar continuidade ao crime de tráfico de drogas.
Por fim, a vedação tem fundamento nos artigos 33, parágrafo 4º e 44, ambos da Lei nº 11.343/06, que proíbem expressamente que a pena privativa de liberdade cominada, embora possa ser objeto de redução, seja convertida em restritiva de direitos, em atenção à função preventivo-repressiva da pena privativa de liberdade como instrumento eficaz ao combate das atividades relacionadas ao tráfico de entorpecentes.
Ademais, a ré é estrangeira, não possui vínculos nem exerce atividade lícita no Brasil, e certamente não terá condições de se manter no país, podendo facilmente se evadir. Nesse sentido, vale transcrever as ponderações do representante do Ministério Público Federal (fls. 283/285).
A esse respeito, transcrevo os seguintes Acórdãos:
Ressalto que o Plenário do STF recentemente declarou, através do "habeas corpus" 97256, pela via incidental, a inconstitucionalidade da expressão "vedada a conversão em penas restritivas de direitos" contida no parágrafo 4º do artigo 33, da Lei nº 11.343/06, bem como da expressão "vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos", constante do artigo 44 da mesma lei. Contudo, a ordem não foi concedida para assegurar ao paciente a imediata substituição, mas sim para remover o óbice contido na Lei 11.343/06, devolvendo ao Juízo das Execuções Criminais a tarefa de auferir o preenchimento das condições objetivas e subjetivas para a concessão.
Assim sendo, ainda que se admita a substituição das penas pelo fato de os estrangeiros serem iguais aos brasileiros perante a Constituição Federal, para a concessão será necessário que não estejam em situação irregular no país e que nele possuam residência fixa.
Confira-se alguns julgados acerca desse tema:
Tampouco há de ser mantida a decisão judicial quanto à concessão do direito ao apelo em liberdade.
Em primeiro lugar, destaco que, consoante entendimento cediço nas Cortes Superiores, a proibição da liberdade provisória, nos casos de crimes hediondos e assemelhados, decorre da própria proibição de fiança imposta pela Constituição Federal no artigo 5º, inciso XLIII. O artigo 2º, inciso II, da Lei nº 8.072/90 nada mais fez do que atender à norma constitucional, ao considerar inafiançáveis os crimes de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os crimes definidos como hediondos.
A Lei nº 11.343/2006, que é específica para os crimes de tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, no artigo 44 estabelece que os crimes previstos nos artigos 33, caput e § 1º e 34 a 37 são insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória. Dispõe ainda o artigo 59 da mesma lei que, nos crimes de tráfico, o réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, salvo se for primário e de bons antecedentes, assim reconhecidos na sentença condenatória.
Sabe-se, contudo, que não tem o direito de recorrer em liberdade o acusado que permaneceu justificadamente preso durante a instrução criminal, por força de prisão em flagrante ou preventiva, ainda que seja primário e de bons antecedentes. Sobrevindo sentença penal condenatória, um de seus efeitos é a manutenção da custódia do réu para apelar, o que não se constitui em ofensa à garantia constitucional da presunção de inocência, nos termos da Súmula 09 do STJ, de forma que eventuais condições favoráveis do agente, como primariedade e bons antecedentes, não são garantidoras de direito subjetivo à liberdade provisória quando outros elementos recomendam a prisão.
Por outro lado, a vigência da Lei nº 11.464/07, que deu nova redação ao artigo 2º, II, da Lei 8.702/90 afastando a vedação à liberdade provisória aos crimes equiparados a hediondos, não revogou o disposto no artigo 44 da Lei 11.343/06 em relação à liberdade provisória, já que a Lei 11.343/06 se trata de legislação especial, que expressamente veda essa concessão aos acusados de tráfico de drogas, não se havendo que falar que o artigo 44 da lei de drogas foi derrogado tacitamente pela Lei 11.464/2007, ou em inconstitucionalidade do referido dispositivo legal, uma vez que é fruto da regra constitucional prevista no art. 5º, inc. XLIII da Constituição Federal, e de uma política criminal mais rigorosa de repressão aos crimes de tráfico.
No caso, a ré foi presa em flagrante e assim permaneceu durante toda a instrução criminal. Ademais, trata-se de ré estrangeira, sem vínculos com o distrito da culpa, com fortes possibilidades de se evadir se for solto, de forma que sua prisão tem por finalidade assegurar o próprio resultado do processo e a aplicação da lei penal, com o cumprimento integral da pena, evitando que venha a se evadir.
Confira-se, a respeito, os seguintes julgados:
Por fim, ressalto que, ao expedir alvará de soltura em favor da ré (que veio ao Brasil especificamente para buscar a droga e levá-la para a Espanha) e permitir que retornasse ao seu país de origem, a sentença colocou em risco a aplicação da lei penal, pois a acusada não mais retornou ao Brasil e, pelo visto, não pretende retornar.
De fato, conforme a manifestação de seu patrono, às fls. 369/370 (onde requer que a ré possa responder ao processo na residência de seus pais, na Inglaterra), afirmando que seria uma tolice e crueldade exigir que a Ré retorne ao Brasil, onde "iria ficar à toa", deduz-se que não mais retornará ao nosso país, e desta forma, ficará isenta de qualquer espécie de punição pelo crime que cometeu.
Diante do exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação ministerial em maior extensão, para excluir, da dosimetria da pena da ré, a aplicação da causa de redução prevista no § 4º do artigo 33, da Lei 11.343/06 e fixar a pena da ré em 6 (seis) anos e 27 (vinte e sete) dias de reclusão e pagamento de 600 (seiscentos) dias-multa; para afastar a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos e para decretar a prisão preventiva da ré, determinando a expedição de mandado de prisão em seu desfavor.
É o voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | ANTONIO CARLOS CEDENHO:10061 |
Nº de Série do Certificado: | 07ED7848D1F21816 |
Data e Hora: | 01/03/2012 21:01:31 |
D.E. Publicado em 13/03/2012 |
|
|
|
|
|
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, dar parcial provimento ao recurso interposto pela Justiça Pública em maior extensão, para não aplicar o § 4º do art. 33 da Lei nº. 11.34306 e fixar a reprimenda em 6 anos e 27 dias de reclusão e 600 dias-multa, nos termos do voto do Des. Fed. ANTONIO CEDENHO, acompanhado pelo voto da des. Fed. RAMZA TARTUCE. Vencido o Relator LUIZ STEFANINI, que dava parcial provimento ao recurso, para o fim de aplicar a causa de diminuição de pena em menor extensão e tornar a pena definitiva fixada em 5 (cinco) anos e 22 (vinte e dois) dias de reclusão e 505 (quinhentos e cinco) dias-multa e, à unanimidade, afastar a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos e decretar a prisão preventiva da ré Naomi Elizabeth Lillian Hornsey, com fundamento no artigo 312 do CPP, medida essa necessária e urgente, conforme externado na fundamentação do voto, determinando, assim, a expedição de Mandado de Prisão em seu desfavor, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | ANTONIO CARLOS CEDENHO:10061 |
Nº de Série do Certificado: | 07ED7848D1F21816 |
Data e Hora: | 06/03/2012 20:46:48 |
|
|
|
|
|
RELATÓRIO
Trata-se de Apelação Criminal interposta pelo Ministério Público Federal contra r. sentença (fls. 234/239) que, julgando procedente a denúncia, condenou Naomi Elizabeth Lillian Hornsey, ao cumprimento das penas de 03 (três) anos e 13 dias de reclusão, em regime inicial fechado e 303 (trezentos e três) dias-multa, como incursa no art. 33, c/c. artigo 40, inciso I, da Lei nº 11.343/06.
A pena privativa de liberdade foi convertida em duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e limitação de fim de semana, a serem estabelecidas pelo MM. Juízo da Execução, concedido à ré o direito de apelar em liberdade, expedindo-se Alvará de Soltura Clausulado em seu favor.
Em razões recursais (fls. 260/292), pleiteia o Ministério Público Federal a revisão da dosimetria da pena, para que:
1. seja exasperada a pena-base acima do patamar fixado;
2. sejam afastadas a atenuante de confissão espontânea e a causa especial de redução da pena prevista no § 4º, do art. 33 da Lei nº 11.343/06;
3. seja revertida a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos;
4. Caso mantidas as a atenuante de confissão espontânea e a causa diminuição do § 4º, do art. 33, da Lei nº 11.343/06, seja reduzido o quantum da diminuição.
Contrarrazões às fls. 331/338, pela manutenção da sentença.
Parecer do Ministério Público Federal, da lavra da ilustre representante Maria Iraneide Olinda S. Facchini, opina pelo parcial provimento do recurso, com a imediata decretação da prisão preventiva da recorrida (fls. 345/360).
Às fls. 369/370 e 373/381, juntado aos autos pedido da defesa para que a execução da pena se dê em Bolton/Inglaterra, onde a ré permanece.
É o relatório.
Feito sujeito à revisão.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | LUIZ DE LIMA STEFANINI:10055 |
Nº de Série do Certificado: | 47D97696E22F60E3 |
Data e Hora: | 28/10/2011 18:15:47 |
|
|
|
|
|
VOTO
Naomi Elizabeth Lillian Hornsey, de nacionalidade inglesa, foi denunciada pelo Ministério Público Federal como incursa no art. 33, caput, c.c. art.40, inc. I, todos da Lei nº 11.343/06, porque no dia 18 de junho de 2010 foi presa em flagrante delito nas dependências do Aeroporto Internacional de Guarulhos/São Paulo, tentando embarcar em vôo da empresa aérea Ibéria, com destino final em Madrid/Espanha, transportando em sua bagagem, para fins de comércio ou de entrega de qualquer forma a consumo de terceiros, 2.970gs. (dois mil, novecentos e setenta gramas) de cocaína, substância entorpecente que determina dependência física e/ou psíquica, sem autorização legal ou regulamentar.
A dosimetria da pena veio assim estabelecida na sentença condenatória:
Considerando, sobretudo, a natureza e quantidade da substância entorpecente, bem como as circunstâncias previstas no art. 59 do Código Penal, a pena-base foi aumentada em ¼ (um quarto) e fixada em 6 (seis) anos e 3 (três) meses de reclusão e 625 (seiscentos e vinte e cinco) dias-multa.
Na segunda fase, aplicada a circunstância atenuante de confissão (art.65, III, "d", do Código Penal), tendo em vista que o fato de a acusada ter sido presa em flagrante não afasta a aplicabilidade da atenuante, conforme entendimento do Superior Tribunal da Justiça lançado na decisão e que confessou a prática delitiva ao ser inquirida em fase judicial, a pena restou atenuada em 1/6 (um sexto) para 5 (cinco) anos, 2 (dois) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 520 (quinhentos e vinte) dias-multa.
Presente a causa de aumento em razão da internacionalidade do delito a pena foi majorada em 1/6 (um sexto) para 6 (seis) anos e 27 (vinte e sete) dias de reclusão e 606 (seiscentos e seis) dias-multa, uma vez que ausentes demais causas de aumento.
Na terceira fase, a MM. Juíza entendeu por aplicável a causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11343/06 na porcentagem de ½ (metade), tendo em vista a inexistência de violência ou grave ameaça na prática da conduta criminosa, os antecedentes da acusada, personalidade e conduta social, além do fato de ter confessado a prática do crime, colaborando com as investigações e de ter demonstrado arrependimento, restando fixada a pena de 3 (três) anos e 13 (treze) dias de reclusão e 303 (trezentos e três) dias-multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, tornada definitiva.
No que diz com a conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos, assim consignou a ilustre julgadora:
"Nos autos inexistem elementos que impeçam concluir que a conversão de pena em restritiva de direitos para a acusada não será suficiente à repressão da conduta, bem como para que não tornem a delinquir.
Muito embora as penas do tráfico, segundo a Lei 11.343/06 não comportem a conversão em penas restritivas de direitos, a vedação em abstrato foi recentemente declarada inconstitucional pelo plenário do STF, por estar baseada na gravidade da conduta, critério que não se coaduna com o princípio da individualização da pena, pois negligencia a análise da situação do acusado.
A linha de raciocínio, que determina a vedação da conversão pela gravidade da conduta, condiz com as teorias absolutas da pena, para as quais a pena é mera retribuição do mal causado à sociedade, razão pela qual a gravidade abstrata desse mal é critério para a aplicação do castigo. Tal pensamento não se coaduna, entretanto, com o moderno direito penal, que considera a pena um instrumento de prevenção do crime e de reinserção social do condenado, e, portanto, exige que o juiz ao aplicá-la tenha em mente a adequação da medida à situação daquele, com vistas ao bem comum, pois o interesse maior da sociedade é na pacificação dos conflitos, na prevenção dos atos de delinquência".
No que diz com o regime imposto, salientou a Magistrada que o regime inicial fechado é o que se justifica, muitas vezes diante da inoperância prática dos instrumentos de aplicação das penas alternativas e que, no caso, é medida adequada, pois não há qualquer motivo que induza a crer que a medida no caso concreto não seria suficiente e converteu a pena para prestação de serviços à comunidade e limitação de fim de semana, concedido o direito de apelar em liberdade e a devolução do passaporte, fazendo jus à autorização de permanência e de trabalho no país enquanto aguarda julgamento definitivo do processo e, após cumprir pena alternativa a que foi condenada, que deve ser providenciada pela Polícia Federal e pelo Ministério do Trabalho.
Feitas essas digressões, passo ao exame da dosimetria da pena.
No que diz com a pena-base, entendo que não merece reparo.
A MM. Juíza considerou os critérios predominantes estabelecidos no art. 42 da Lei nº 11.343/06, de quantidade de entorpecente (2.970gs - dois mil novecentos e setenta gramas de entorpecente) e natureza (cocaína), bem como as circunstâncias elencadas no art. 59 do Código Penal dentro do critério da discricionariedade regrada que lhe serve de parâmetro na dosimetria da pena.
No caso dos autos, a pena acima do mínimo estabelecida bem se coaduna com os critérios adotados, estando devidamente fundamentada, razão pela qual entendo por dever ser mantida.
Na segunda fase, mantenho a aplicação da circunstância atenuante de confissão espontânea obtida em fase judicial, conforme ressaltado pela D. Julgadora, o que serviu de esclarecimento para a autoria do crime e fundamentação da sentença.
Veja-se trecho da sentença:
"A autoria do delito também restou cabalmente demonstrada nos autos.
A acusada foi flagrada quando tentava embarcar com destino a Madri/Espanha, tendo sido constatado que ela trazia consigo 2.970g (dois mil, novecentos e setenta gramas_ - peso líquido - de cocaína (fls. 92/94).
Ademais, em seu interrogatório, a acusada confessou que trazia consigo o entorpecente, bem como que receberia pagamento pelo transporte da droga.
Indubitável, portanto, a autoria delitiva".
(fls. 234vº - grifo nosso).
Desse modo, a confissão obtida em juízo em face das declarações da acusada que manifestou arrependimento teve valor de prova no processo, razão pela qual deve ser levada em consideração na fixação da dosimetria da pena, de modo que voluntária e espontânea, não importando in casu, a ocorrência de flagrante, conforme a diretriz do E. Supremo Tribunal Federal que entende por relevante o reconhecimento da prática do delito, mesmo em se tratando de prisão em flagrante, a exemplo da jurisprudência citada pela douta Procuradora da República no Parecer.
Na terceira fase, entendo por acertadas a aplicação da internacionalidade e da causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06. Em meus votos, tenho, reiteradamente, expressado que a referida causa de diminuição há de ser aferida casuisticamente porque não pode deixar de ser aplicada de forma genérica, ao entendimento singelo e automático de que as chamadas "mulas" certamente integram organização criminosa, conforme destacado pela acusação.
No caso dos autos, entendo que a acusada reúne os requisitos para a aplicação da causa de diminuição. É primária, não ostenta antecedentes, não havendo prova nos autos de que integre organização criminosa ou de que se dedique à prática de crimes.
Contudo, a porcentagem de diminuição em metade merece reforma, em face das circunstâncias que envolveram o crime. A Magistrada considerou a inexistência de violência ou grave ameaça e também o fato de a acusada ter colaborado para o esclarecimento do crime com a confissão para acenar com porcentagem maior de diminuição.
Porém, entendo que a pena resultou branda demais em face do crime equiparado a hediondo, não atingindo os critérios de necessidade e adequação da reprimenda para a prevenção e repressão do crime, fim último da norma penal.
Assim sendo, aplico a porcentagem de um sexto para a redução. Tomando a pena resultante do aumento pela internacionalidade de 6 anos e 27 dias de reclusão e 606 dias multa, com a incidência da causa de diminuição em um sexto resta a pena de 5 (cinco) anos e 22 (vinte e dois) dias de reclusão e 505 (quinhentos e cinco) dias-multa, na mesma proporção, mantido o valor unitário estabelecido na sentença, pena que resta definitiva.
A pena imposta não comporta substituição por penas alternativas, conforme estabelece o art. 44, inc. I, do Código Penal, em seu requisito objetivo, não cabendo ao juiz criar exceção não estabelecida em lei. Também entendo que a inoperância das penas alternativas é questão que não deve ser considerada para fins de sua aplicação.
Do mesmo modo, não foi adequado ao caso em tela o direito de recorrer em liberdade após a condenação da acusada mantida presa no decorrer da instrução processual, entendimento consolidado nessa E. 5ª Turma.
Aliás, a soltura da ré e a permissão para retornar à casa de seus pais na cidade de Bolton/Inglaterra impediu a aplicação da lei penal, eis que a acusada não mais voltou ao Brasil, nem intenta voltar, consoante expõe a petição de fls. 370 na qual a defesa alega que "não há sentido algum que precise vir ao Brasil para se reinserir em sociedade que nunca foi a sua".
Desse modo, para garantir a aplicação da lei penal, conforme dispõe o art. 312 do Código de Processo Penal decreto a prisão preventiva de Naomi Elizabeth Lillian Hornsey.
Expeça-se Mandado de Prisão em nome da acusada.
Ante todo o exposto, dou parcial provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público Federal, para o fim de aplicar a causa de diminuição de pena em menor extensão e tornar a pena definitiva fixada em 5 (cinco) anos e 22 (vinte e dois) dias de reclusão e 505 (quinhentos e cinco) dias-multa, afastar a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, bem como decretar, de ofício, a prisão preventiva de Naomi Elizabeth Lillian Hornsey, com fundamento no art. 312 do Código de Processo Penal, medida essa necessária e urgente, conforme externado na fundamentação supra e determino a expedição de Mandado de Prisão em seu nome.
É como voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | LUIZ DE LIMA STEFANINI:10055 |
Nº de Série do Certificado: | 47D97696E22F60E3 |
Data e Hora: | 22/11/2011 16:16:28 |