D.E. Publicado em 10/07/2012 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação para declarar extinta a punibilidade do réu quanto ao crime de desobediência em razão da ocorrência da prescrição da pretensão punitiva, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
O Exmo. Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI:
Trata-se de apelação criminal interposta por JOSÉ FERREIRA FILHO contra sentença que o condenou pela prática dos crimes descritos no artigo 10, "caput" e §§ 2º e 4º da Lei nº 9.437/97 c.c. o artigo 16, III do Regulamento 105, em concurso material com o crime previsto no artigo 330 do Código Penal.
Consta na denúncia que no dia 08 de abril de 2001, por volta das 15:30 horas, em uma barreira de fiscalização próxima a Caarapó-MS, uma equipe de Policiais Federais abordou o veículo GM/Pick Up Corsa, cor preta, placas MRI-2740, ocupado por JOSÉ FERREIRA FILHO (motorista) e José Alamir Rocha, tendo o denunciado desobedecido à ordem legal de funcionário público, agente da Polícia Federal, para que entregasse sua Pistola calibre 9mm.
Relata a exordial que o réu possuía, portava, detinha, trazia consigo e transportava 01 (uma) pistola semi-automática, calibre 9mm, Parabellum, marca Pietro Beretta, de fabricação italiana, de uso restrito, e 01 (um) carregador e 13 (treze) projéteis calibre 9 mm.
A inicial salienta que JOSÉ FERREIRA FILHO transportava em proveito próprio, para uso e segurança, referida pistola, que sabia ser produto de crime, pois sua entrada em território nacional ocorreu com ilusão de tributo sem autorização da Receita Federal e do Ministério do Exército.
Por fim, o réu também é denunciado por ter desobedecido a ordem legal de funcionário público, agente federal, para que entregasse a arma.
A denúncia foi recebida em 20 de agosto de 2004 (fl.69).
Regulamente processado o feito, sobreveio sentença (fls.330/338) que julgou parcialmente procedente a ação penal para:
1. absolver o acusado, com fundamento no artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal, do crime do artigo 180, caput do Código Penal;
2. condená-lo a 04 (quatro) anos e 03 (três) meses de reclusão, em regime semi-aberto, e 20 (vinte) dias-multa no mínimo legal pela prática do crime previsto no artigo 10, "caput", e §§ 2º e 4º da Lei nº 9.437/97 c.c. o artigo 16, III do Regulamento 105, e a 02 (dois) meses de detenção, em regime aberto, e 15 (quinze) dias-multa, no valor mínimo, pelo crime de desobediência, em concurso material.
Inconformado, apela o acusado (fls.370/381) postulando:
a) preliminarmente, o reconhecimento da prescrição,
b) no mérito, a absolvição diante da atipicidade da conduta, por ausência de lesividade à segurança pública, bem jurídico tutelado;
c) atipicidade dos fatos tidos como crime de desobediência;
d) absolvição pela inexistêndia de prova da meterialidade;
d) ausência de culpabilidade diante das excludente de ilicitude de estrito cumprimento do dever legal e obediência hierárquica
e) absolvição por insuficiência probatória, sendo carecedores de credibilidade os depoimentos dos policiais federais;
f) inaplicabilidade do artigo 92, I, "b" do Código Penal, por possuir o réu regulamento próprio na condição de policial militar e não constar do reqerimento da acusação;
g) inaplicabilidade do artigo 92, I, "b" do Código Penal e do aumento de pena previsto no artigo 10, §4º da lei 9437/97, consistindo em bis in idem;
h) aplicação dos artigos 77 e 44 do Código Penal e regime aberto.
Contrarrazões do Ministério Público Federal (fls.383/387) em prol de ser mantida a sentença condenatória, exceto quanto à prescrição do crime de desobediência, que deve ser reconhecida.
Nesta Corte, a Procuradoria Regional da República, em seu parecer (fls.389/395) opinou pelo parcial provimento do apelo defensivo para que se reconheça a prescrição do delito de desobediência.
É o relatório.
À revisão.
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VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:
1. Da prescrição.
O réu foi condenado à pena-base de 03 (três) anos de reclusão pela prática do crime previsto no artigo 10, "caput" e §§ 2º e 4º da Lei n. 9.437/97, e 02 (dois) meses de detenção pela prática do delito do artigo 330 do Código Penal.
Houve o trânsito em julgado para a acusação (fl.339-verso).
Os fatos datam de 08/04/2001.
A denúncia foi recebida em 20/08/2004.
A sentença foi publicada em cartório em 15/10/2009.
Em relação ao crime de desobediência, acolho manifestação do Ministério Público Federal, tanto em contrarrazões quanto em parecer, e declaro extinta a punibilidade pela prescrição, com fundamento no artigo 107, IV, c. c. o artigo 109, VI, e 110, todos do Código Penal, pelo decurso do lapso prescricional.
No que concerne ao porte ilegal de arma de fogo de uso restrito, a pena-base a ser considerada para fins de prescrição é aquela fixada na sentença, em 03 (três) anos, cujo prazo prescricional é de 08 (oito) anos, a teor do inciso IV do artigo 109 do Código Penal.
Entre a data dos fatos e a do recebimento da denúncia, bem como entre o recebimento da denúncia e a sentença condenatória, ou entre esta última e o presente aresto não se vislumbra o decurso da pretensão punitiva do Estado.
De tal forma, acolho a preliminar arguida para declarar extinta a punibilidade do réu pela ocorrência da prescrição apenas em relação ao crime de desobediência.
2. Da materialidade.
Foi amplamente comprovada a materialidade do delito de porte ilegal de arma de fogo de uso restrito, previsto no artigo 10, §§ 2º e 4º da Lei n. 9.437/97, conforme decorre do Auto de Apresentação e Apreensão, que revela terem sido encontrados com o acusado 01 (uma) pistola semi-automática, calibre 9mm, Parabellum, marca Beretta, de fabricação italiana, 01 (um) carregador e 13 (treze) projéteis calibre 9 mm, de uso restrito (fl. 16), o que foi confirmado pelo Exame em Arma de Fogo e Munição (fls. 42/44), que atestou sua potencialidade lesiva.
Insta salientar que o artigo 16, I e III, do Regulamento para a Fiscalização de Produtos Controlados (R-105), aprovado pelo Decreto n. 2.998/99, classifica alguns dos projéteis e a arma encontrados com o acusado como "de uso restrito".
Assim, restou amplamente demonstrada a materialidade delitiva.
3. Da autoria.
Encontra-se satisfatoriamente comprovada a autoria da conduta criminosa.
O acusado foi preso em flagrante delito, oportunidade em que confessou o porte ilegal da arma de fogo, assim explanando (fl.11).:
Em suas declarações em Juízo o réu reiterou as assertivas apresentadas na denúncia, relatando que realmente portava a pistola descrita, que havia ganho de um fazendeiro (fl.150/151).
Restou comprovada a autoria do acusado, pois admitiu que portava a arma descrita, de uso restrito, sem autorização, o que foi corroborado pelas declarações das testemunhas de acusação.
A testemunha de acusação Paulo César Martins, agente da Polícia Federal que conduziu o flagrante, declarou em Juízo que (fls. 202):
Corrobora seus dizeres a outra testemunha ouvida na fase inquisitorial, que também participou da abordagem (fl.09).
Insurge-se a defesa contra tais depoimentos, imputando-lhes falta de valor probatório, por serem carecedores de credibilidade os depoimentos dos policiais federais.
Todavia, perfeitamente válida a prova testemunhal, eis que reiterada em Juízo, com observância do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal. Não se demonstrou, ademais, qualquer vício nos relatos das testemunhas, tampouco interesse em prejudicar o réu, sendo corroborados perante os demais elementos probatórios constantes dos autos.
Nesse sentido, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça:
Aduz a defesa ter agido o réu sob o manto das excludentes do estrito cumprimento do dever legal e obediência hierárquica, previstas nos artigos 22 e 23, III do Código Penal, tendo sido a própria corporação que o autorizara a portar a arma.
A tese defensiva não prospera, pois não encontra qualquer respaldo no conjunto probatório.
As testemunhas de defesa, policiais militares, relataram:
E também:
No entanto, suas declarações não se prestam a comprovar a origem lícita da arma e da munição apreendidas, pois verifica-se que tais testemunhas não afirmaram, em nenhum momento, que a arma objeto dos autos tenha sido fornecida ao réu pela companhia. Apenas relataram, de forma genérica, que armas de grosso calibre poderiam ser fornecidas pela instituição aos policiais.
O próprio réu, tanto na fase inquisitorial, quanto em Juízo, declarou expressamente que a pistola que portava no momento de sua prisão não está registrada e não pertence ao acervo da Polícia Militar do Mato Grosso do Sul (fls.11 e 150).
A testemunha de acusação Joel Martins dos Santos, major da Polícia Militar e comandante da companhia em que o réu estava lotado, esclareceu (fl.220):
Por ocasião da lavratura do flagrante, a mesma testemunha detalhou (fl.11):
Dessa forma, as provas dos autos infirmam a tese de que o réu agiu sob o manto das excludentes propaladas.
Também é pleiteada a absolvição diante da atipicidade da conduta, por ausência de lesividade à segurança pública.
A potencialidade lesiva do porte ilegal da arma de fogo de uso restrito constitui ameaça tanto a paz social como a incolumidade física individual. Trata-se, na verdade, de crime de mera conduta ou de perigo abstrato, o qual não exige a ocorrência de nenhum resultado naturalístico, consumando-se com a mera subsunção da conduta delitiva ao tipo penal o que, por si só, já vulnera o bem jurídico tutelado.
Tal é o entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça:
4. Dosimetria.
A sentença adequadamente fixou a pena-base em 03 (anos) anos de reclusão. Embora não se possa considerar como maus antecedentes as absolvições alcançadas pelo réu nos processos que respondeu por tráfico de entorpecente e homicídio, como vez o magistrado de primeiro grau, visto que tal juízo choca-se com o princípio da presunção de inocência, certo é que outros critérios previstos no artigo 59 do Código Penal também foram utilizados, como a culpabilidade, a personalidade, os motivos determinantes e as circunstâncias objetivas do delito (fls.335).
Reconhecida a atenuante da confissão, reduziu-se a pena em 02 (dois) meses. Presente a causa de aumento do artigo 10, §4º da lei 9.437/97, a pena foi tornada definitiva em 04 (quatro) anos e 03 (três) meses de reclusão e 20 (vinte) dias-multa, no piso legal.
Mantido o regime semi-aberto, conforme prevê o artigo 33, §2º, "b" do Código Penal.
Ausentes os requisitos do artigo 44 do Código Penal, incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos.
Não prospera o alegado bis in idem por estar previsto como infração na legislação própria, que regulamenta a atividade dos policiais militares do Estado do Mato Grosso do Sul, a utilização de arma de fogo de uso restrito por servidor público integrante da corporação, com a conseqüente perda do cargo.
Igualmente é rechaçada a pretensa inaplicabilidade do aumento de pena previsto no artigo 10, §4º da lei 9437/97, em conjunto com a agravante genérica estatuída no artigo 92, I, "b" do Código Penal e as sanções administrativas previstas nas normas próprias referentes aos policiais militares do estado.
Cabe ressaltar que se trata de norma interna corporis, atinente ao processo administrativo a que se sujeitam os policiais militares do estado, sendo independentes as esferas criminal e administrativa.
Nesse sentido:
Não há que se falar, por conseqüência, em duplicidade de punição.
Não obstante a acusação ter formulado, em alegações finais, o pedido de perda do cargo público para o réu com fulcro no artigo 92, I "a" do Código Penal (violação de dever para com a Administração Pública), a sentença condenatória aplicou tal efeito da condenação baseando-se no inciso II do mesmo dispositivo (quando aplicada pena privativa de liberdade superior a 04 (quatro) anos).
O julgador não está adstrito à capitulação legal formulada pela acusação, não havendo qualquer mácula em tal cominação. A perda do cargo público é prevista como efeito específico da condenação, sendo possível em ambas as hipóteses, já que preenchidos todos os seus requisitos.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação apenas para declarar extinta a punibilidade do réu quanto ao crime de desobediência em razão da ocorrência da prescrição da pretensão punitiva. No mais resta mantida a sentença condenatória.
É o voto.
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Data e Hora: | 28/06/2012 14:41:49 |