Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO/RECURSO EX OFFICIO Nº 0003841-84.2008.4.03.6181/SP
2008.61.81.003841-9/SP
RELATORA : Desembargadora Federal VESNA KOLMAR
RECORRENTE : Justica Publica
RECORRIDO : CELSO FERNANDES LA PASTINA
ADVOGADO : RENATO TARDIOLI LUCIO DE LIMA e outro
INVESTIGADO : CLAUDIO FREDERICO WAIDMANN
ADVOGADO : RENATO TARDIOLI LUCIO DE LIMA e outro
REMETENTE : JUIZO FEDERAL DA 2 VARA CRIMINAL SAO PAULO SP
No. ORIG. : 00038418420084036181 2P Vr SAO PAULO/SP

EMENTA

PENAL. RECURSO EX OFFICIO E RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. INQUÉRITO POLICIAL. "LAVAGEM" DE ATIVOS FINANCEIROS. JUSTA CAUSA. COMPETÊNCIA. VARA ESPECIALIZADA. DELITO ANTECEDENTE. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO. SUFICIÊNCIA DE MEROS ELEMENTOS INDICIÁRIOS. JURISPRUDÊNCIA. DILIGÊNCIAS. PEDIDO QUE DEVE SER FORMULADO PERANTE O JUÍZO DE PRIMEIRO GRAU. RECURSO EX OFFICIO PROVIDO E RECURSO EM SENTIDO ESTRITO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Há justa causa para o prosseguimento das investigações policiais, pois os elementos dos autos estão a indicar a ocorrência de irregularidades, inclusive, quanto à possível prática de delito de "lavagem" de ativos financeiros ou, ainda, contra o sistema financeiro nacional e, conseguintemente, a competência da Vara especializada, sendo prematura a concessão de ordem de habeas corpus, ex officio, para o trancamento de inquérito policial que não teve as investigações aprofundadas.
2. A jurisprudência pátria não exige, nesta fase da persecução criminal, a comprovação de delito antecedente ao crime de "lavagem" de ativos financeiros, sendo suficientes meros elementos indiciários. Precedentes.
3. No que tange às diligências requeridas o pedido deve ser formulado perante o Juízo de primeiro grau, sob pena de supressão de instância.
4. Recurso ex officio provido e recurso em sentido estrito parcialmente provido, para determinar o prosseguimento do inquérito policial quanto ao delito previsto no artigo 1º da Lei nº 9.613/98.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso ex officio e dar parcial provimento ao recurso em sentido estrito para determinar o prosseguimento do inquérito policial quanto ao delito previsto no artigo 1º da Lei nº 9.613/98, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 26 de junho de 2012.
Vesna Kolmar
Desembargadora Federal


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RECURSO EM SENTIDO ESTRITO/RECURSO EX OFFICIO Nº 0003841-84.2008.4.03.6181/SP
2008.61.81.003841-9/SP
RELATORA : Desembargadora Federal VESNA KOLMAR
RECORRENTE : Justica Publica
RECORRIDO : CELSO FERNANDES LA PASTINA
ADVOGADO : RENATO TARDIOLI LUCIO DE LIMA e outro
INVESTIGADO : CLAUDIO FREDERICO WAIDMANN
ADVOGADO : RENATO TARDIOLI LUCIO DE LIMA e outro
REMETENTE : JUIZO FEDERAL DA 2 VARA CRIMINAL SAO PAULO SP
No. ORIG. : 00038418420084036181 2P Vr SAO PAULO/SP

RELATÓRIO

A EXCELENTÍSSIMA SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL VESNA KOLMAR: Trata-se de Recurso ex officio e Recurso em Sentido Estrito interposto pelo Ministério Público Federal contra a r. decisão (fls. 188/191), proferida pelo MM. Juiz da 2ª Vara Federal Criminal de São Paulo (SP), que concedeu de ofício ordem de habeas corpus para trancar inquérito policial que apura a prática do delito descrito no artigo 1º da Lei nº 9.613/98 e declinou da competência da Vara especializada.


O magistrado afirmou na decisão que não há indícios de crime antecedente a configurar a "lavagem" de ativos, in verbis:


"(...)
7. O Ministério Público Federal aduz que as medidas investigativas tem o condão de averiguar, além do crime de 'lavagem', o suposto delito antecedente."
8. Data vênia, não vislumbro elementos mínimos de prova do cometimento dos crimes antecedentes ao de "lavagem" de ativos financeiros. Ademais, o mesmo concluiu a autoridade policial, conforme se verifica no relatório de fls. 161-165.
9. Destarte, não se justifica a permanência destes autos nesta Vara Especializada.
10. A esta Vara especializada compete o processamento do feito que se destina somente à apuração de crimes contra o sistema financeiro nacional e de "lavagem" de ativos. Esta questão já se encontra sumulada pelo Egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região (súmula nº 34).
11. Desta forma, não cabe a este Juízo decretar a quebra de sigilo para se tentar descobrir eventual prática de crimes que não são de competência desta especializada, sob pena de transbordamento da competência ratione materiae, o que inevitavelmente acarretaria em nulidade absoluta. Não obstante, caso surjam provas ou indícios de delito antecedente, aplica-se, por analogia, o disposto no art. 18 do Código de Processo Penal.
12. Por outro lado, não há justa causa para a continuidade das investigações no que tange ao crime de "lavagem" de ativos. Não havendo sequer indícios de crime antecedente, como apontado pela autoridade policial, a própria existência de inquérito policial com tal objetivo configura inadmissível constrangimento ilegal, que não pode perdurar.
(...)
Ante o exposto, concedo ex officio, ordem de habeas corpus, para TRANCAR o presente inquérito policial, com relação ao crime esculpido no art. 1º da Lei nº 9.613/98, nos termos do art. 648, I c.c. o art. 654, § 2º, ambos do Código de Processo Penal brasileiro, uma vez que não há indícios de crime antecedente que poderia dar ensejo à "lavagem" de ativos.
A investigação pode prosseguir com relação ao crime contra a ordem tributária, cuja competência é de uma das Varas não especializadas desta Subseção Judiciária.
Encaminhe-se o presente inquérito policial ao Egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região para reexame necessário, nos termos do art. 574, I, do Código de Processo Penal brasileiro."

Nas razões recursais (fls. 198/205), o Ministério Público Federal pleiteia a reforma da decisão e o deferimento de diligências, alegando, em síntese, que:


a) há justa causa para o prosseguimento das investigações quanto ao delito de "lavagem" de ativos, sendo, por consequência, competente o Juízo especializado;


b) o trancamento do inquérito policial pela via estreita do habeas corpus somente é possível quando, pela mera exposição dos fatos investigados, é constatada a atipicidade flagrante do fato, a ausência de indícios a fundamentar a investigação ou a extinção da punibilidade, o que não se verifica no caso dos autos;


c) o Superior Tribunal de Justiça posiciona-se no sentido de que o delito de "lavagem de dinheiro", por sua complexidade, exige investigações aprofundadas, não cabendo falar-se em manifesta ausência de tipicidade da conduta quando, em sede de investigação preliminar, ainda não há clara evidência da prática de crimes anteriores arrolados pelo artigo 1º da Lei nº 9.613/98;


d) nesta fase da persecução penal, não se exige certeza, bastando a existência de elementos indiciários de que o capital suspeito tem origem ilícita;


e) inquestionável a utilização de mecanismo incomum para a constituição da empresa e aquisição do imóvel sub examine, revelando-se as operações suspeitas típicas de "lavagem" de ativos financeiros, não podendo o magistrado conceder de ofício habeas corpus para o trancamento da investigação policial, pois os órgãos persecutórios se vêm tolhidos em sua função primordial;


f) há diligências complementares consistentes na quebra de sigilo bancário e fiscal da sociedade e dos sócios que são imprescindíveis para a formação da opinio delicti, conforme o requerimento ministerial de fls. 170/173 e o parecer de fls. 186/187.


Sem contrarrazões (fls. 194 e 210).


Em sede de juízo de reconsideração (fl. 220), a decisão foi mantida por seus próprios fundamentos.


A Procuradoria Regional da República, por seu ilustre representante Dr. Marcelo Moscogliato, opinou pelo provimento do recurso (fls. 222/226v.).


É o relatório.


Dispensada a revisão a teor do disposto no artigo 236 do Regimento Interno desta Corte.


Vesna Kolmar
Desembargadora Federal Relatora


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Data e Hora: 25/06/2012 16:16:05



RECURSO EM SENTIDO ESTRITO/RECURSO EX OFFICIO Nº 0003841-84.2008.4.03.6181/SP
2008.61.81.003841-9/SP
RELATORA : Desembargadora Federal VESNA KOLMAR
RECORRENTE : Justica Publica
RECORRIDO : CELSO FERNANDES LA PASTINA
ADVOGADO : RENATO TARDIOLI LUCIO DE LIMA e outro
INVESTIGADO : CLAUDIO FREDERICO WAIDMANN
ADVOGADO : RENATO TARDIOLI LUCIO DE LIMA e outro
REMETENTE : JUIZO FEDERAL DA 2 VARA CRIMINAL SAO PAULO SP
No. ORIG. : 00038418420084036181 2P Vr SAO PAULO/SP

VOTO



A EXCELENTÍSSIMA SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL VESNA KOLMAR: Celso Fernandes La Pastina e Cláudio Frederico Waidmann foram investigados pela suposta prática do delito previsto no artigo 1º da Lei nº 9.613/98.


Narra a peça ministerial que requisitou a instauração de inquérito policial (fl. 119 do apenso):


"Trata-se de peças informativas nas quais se analisa a possível prática do crime de 'lavagem' de valores.
Segundo consta, em abril de 2007, Celso Fernandes La Pastina e Cláudio Frederico Waidmann constituíram a Santa Maria de Castellabate Empreendimentos e Participações Ltda, ocasião em que integralizaram todo o capital social cujo valor era de R$ 10.000,00 (dez mil reais) (fls. 26).
Ocorre que, um mês após a sua constituição, a referida sociedade adquiriu um imóvel no valor de R$ 2.550.000,00 (dois milhões, quinhentos e cinquenta mil reais), conforme contrato de fls. 32/46, tendo, no dia 15 de maio de 2007, efetuado pagamento de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) referente à primeira parcela.
Para efetuar o pagamento da segunda parcela, receberia, a título de integralização do capital social, R$ 850.000,00 (oitocentos e cinquenta mil reais) de uma suposta sócia denominada Birskin S.A., situada no Uruguai.
Entretanto, o contrato social de fls 24/31 revela que o capital social da sociedade é de apenas R$ 10.000,00 (dez mil reais), já integralizados pelos sócios.
Diante do exposto, requisite-se a instauração de inquérito policial para apurar a possível pratica do crime de 'lavagem' de valores, indicando sejam ouvidos os sócios da Santa Maria de Castellabate Empreendimentos e Participações Ltda, entre outras medidas a serem adotas a critério da autoridade policial."

Com efeito, as investigações tiveram início a partir da impetração do Mandado de Segurança nº 2007.61.00.017999-8, por Santa Maria de Castellabate, com o objetivo de liberar junto ao Banco Central do Brasil senha que permitisse a efetivação de operação de câmbio para a integralização de capital da suposta sócia Birskin S.A., sediada no Uruguai, no valor de R$ 850.000,00 (oitocentos e cinquenta mil reais), os quais seriam utilizados para honrar o pagamento da segunda parcela referente à aquisição de imóvel pela impetrante na cidade de São Paulo.


Consta dos autos do referido mandado de segurança o Parecer PGBC-151/2007, da Procuradoria-Geral do Banco Central do Brasil, no qual foram noticiados os fatos investigados, in verbis:


"(...)
31. Por último, impõe-se chamar a atenção do douto Juízo para aspectos que envolvem a pretensão deduzida nesta impetração.
32. A impetrante alega que a importância de R$ 850.000,00, cuja operação cambial deixou de ser fechada por efeito da greve, teria sido enviada pela sua sócia BIRSKIN S/A, com sede em Montevidéu, Uruguai, para a integralização de capital social.
33. No entanto, o contrato social de fls. 24/31, revela que o capital social da impetrante é de apenas R$ 10.000,00, já integralizado e dividido entre dois sócios brasileiros, pessoas físicas.
34. Aliás, causa espécie a afirmação contida às fls. 16 da inicial, nestes termos: 'É rotina na vida empresarial da Impetrante a assunção de compromissos perante terceiros, como a aquisição de imóvel como aquele descrito anteriormente.'
35. Ora, segundo o mesmo contrato social já referido, a empresa teria sido constituída apenas aos 16.04.2007, com consequente arquivamento de seus atos constitutivos na JUCESP apenas aos 26 de abril do mesmo ano.
36. Portanto, à que rotina ou tradição se refere a inicial?
37. De outro lado, o 'Instrumento Particular de Compromisso de Venda e Compra', juntado às fls. 32/46, firmado aos 07.05.2007 - portanto, menos de um mês após a constituição da empresa - dá conta de que parte do preço, no importe de R$ 200.000,00, seria pago no dia 15.05.2007 com recursos da própria adquirente, aqui impetrante, ou de seu administrador.
38. Que mágica seria essa, de uma empresa com mísero capital de apenas R$ 10.000,00, suportar pagamentos de R$ 200.000,00, considerando-se que a importância aqui questionada, de R$ 850.000,00, seria destinada ao pagamento da segunda parcela do preço, vencível a partir de 16.05.07 (fls. 35)?
39. São questões que talvez devessem merecer a oitiva do douto Órgão do Ministério Público Federal, por força do disposto na Lei n. 9.613/98."

De fato, embora o magistrado a quo não vislumbre justa causa para o prosseguimento das investigações policiais quanto a delito previsto na Lei nº 9.613/98, pode-se apontar nos autos fundados indícios de irregularidades.


Nesse sentido, anoto que o investigado Cláudio Frederico Waidmann declarou (fls. 16/17) ser o representante legal da empresa Biskin S.A. no Brasil, entretanto, não demonstrou qualquer familiaridade com a citada empresa, como segue:


"Que foi CELSO LA PASTINA quem convidou o declarante para se tornar sócio da SANTA MARIA; Que é representante legal da empresa BIRSKIN S/A; Que pelo fato de CELSO LA PASTINA empreender viagens seguidas ao exterior, foi constituído representante da BIRSKIN, já que sempre encontra-se no Brasil e faz-se necessário um representante da BIRSKIN no território nacional; Que se tornou procurador da BISKIN em virtude de um pedido de CELSO LA PASTINA; Que a BIRSKIN é constituída por investidores italianos; Que não conhece nenhum dos investidores da BIRSKIN; Que foi a BIRSKIN quem escolheu o imóvel do espólio de OLIVE PAMELA SUPLICY adquirido pela SANTA MARIA; Que esta é uma empresa brasileira, que possui como um dos sócios a empresa estrangeira BIRSKIN S/A; Que pelo interesse que possui em investir no mercado imobiliário brasileiro, a BIRSKIN se tornou sócia da SANTA MARIA; Que foi JUAN GUILLERMO VONROTZ INGOLD, presidente da BIRSKIN S/A, quem passou a procuração para o declarante representa-la; Que não conhece JUAN GUILLERMO INGOLD; Que a BIRSKIN enviou a procuração para o escritório da SANTA MARIA; Que até o presente momento nenhum representante da BIRSKIN esteve no Brasil para passar orientações; Que CELSO LA PASTINA é quem possui relações com os investidores da BIRSKIN S/A. Que apresenta , nesta oportunidade, cópia do estatuto social da BIRSKIN S/A."

Registro também que, segundo o investigado Celso La Pastina (fls. 13/15), a empresa Santa Maria dedica-se à compra e venda de imóveis.Verifica-se, portanto, do contrato social da empresa Santa Maria (fls. 22/29) que foi ela constituída com o seguinte objeto:


"CLAÚSULA 4ª
A sociedade tem por objeto a administração de bens próprios; administração de negócios próprios; e a participação em outras sociedades como quotista ou acionista."

No entanto, depreende-se dos registros da JUCESP (fls. 107/111), quanto à constituição da empresa Santa Maria:


"OBJETO
Holdings de Instituições Não-financeiras
Atividades de Intermediação e Agenciamento de Serviços e Negócios em Geral, exceto Imobiliários
Comércio Atacadista de Produtos Alimentícios em Geral"
(grifo nosso)

Observa-se, ainda, que o instrumento particular de compromisso de venda e compra do imóvel examinado nos autos foi celebrado em 07.05.2007 e ajustado o pagamento da primeira (R$ 200.000,00) e segunda (R$ 850.000,00) parcelas do preço vencíveis em 15.05.2007 e 16.05.2007, respectivamente (fls. 36/50 do apenso). Contudo, a sócia Birskin S.A., que arcaria com o valor da segunda parcela, somente passou a integrar o quadro social da empresa Santa Maria em 12.07.2007, tendo esta sido constituída em 26.04.2007, com capital social de apenas R$ 10.000,00 (dez mil reais), segundo registros da JUCESP (fls. 107/108).


Ademais, consta dos autos transação financeira (fl. 52 do apenso), na qual a empresa Santa Maria figurou como beneficiária de remessa da Birskin S.A., no montante de USD 474.700,00 (quatrocentos e setenta e quatro mil e setecentos dólares americanos), provenientes de Montevideo Uruguay, constando as seguintes informações do destinatário:


"Send. To Rec. Info. 72 :/ACC/YR PLO RUA DR. SEIDEL 425 SÃO
//PAULO,BR(OGB) MULTI CREDIT BANK IN
//C. PANAMA, PANAMA
/INS/MULTI CREDIT BANK INCPANAMA, P
//ANAMA"

Acrescente-se que o Plano de Contas (fl. 50) da empresa Santa Maria revela as seguintes rubricas no concernente a seus investimentos atuais, à época, e futuros:


"1.3 - Permamente
1.3.1 - Investimentos
1.3.1.01 - Participações em outras empresas
1.3.2 - Imobilizado
1.3.2.01 - Imóveis
1.3.2.01.0001 - (0000000002) - Imóveis Urbano
1.3.2.02 - Imóveis Rural
1.3.2.02.0001 - (0000000126) - Imóveis Rural
1.3.2.03 - Embarcações Naval
1.3.2.03.0001 - (0000000037) - Embarcação Tipo Lancha
1.3.2.05 - Veículos
1.3.2.05.0005 - (0000000026) - Veículos
(...)"

Conclui-se, assim, que os elementos dos autos estão a indicar a ocorrência de irregularidades, inclusive, quanto à possível prática de delito de "lavagem" de ativos financeiros ou, ainda, contra o sistema financeiro nacional e, conseguintemente, a competência da Vara especializada, sendo prematura a concessão de ordem de habeas corpus, ex officio, para o trancamento de inquérito policial que não teve as investigações aprofundadas, a exemplo da quebra de sigilo fiscal e bancário dos sócios e da sociedade Santa Maria de Castellabate Empreendimentos e Participações Ltda.


Por fim, assinalo que a jurisprudência pátria não exige, nesta fase da persecução criminal, a comprovação de delito antecedente ao crime de "lavagem" de ativos financeiros, sendo suficientes meros elementos indiciários:


"HABEAS CORPUS. CRIME DE LAVAGEM DE DINHEIRO. PROVA DA MATERIALIDADE DO DELITO ANTECEDENTE. DESNECESSIDADE, BASTANDO A EXISTÊNCIA DE INDÍCIOS. INÉPCIA DA DENÚNCIA. NÃO OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE MOTIVO SUFICIENTE PARA O TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. ORDEM DENEGADA.
Não é inepta a denúncia que, como no caso, individualiza a conduta imputada a cada réu, narra articuladamente fatos que, em tese, constituem crime, descreve as suas circunstâncias e indica o respectivo tipo penal, viabilizando, assim, o contraditório e a ampla defesa. A denúncia não precisa trazer prova cabal acerca da materialidade do crime antecedente ao de lavagem de dinheiro. Nos termos do art. 2º, II e § 1º, da Lei 9.613/1998, o processo e julgamento dos crimes de lavagem de dinheiro "independem do processo e julgamento dos crimes antecedentes", bastando que a denúncia seja "instruída com indícios suficientes da existência do crime antecedente", mesmo que o autor deste seja "desconhecido ou isento de pena". Precedentes (HC 89.739, rel. min. Cezar Peluso, DJe-152 de 15.08.2008). Além disso, a tese de inexistência de prova da materialidade do crime anterior ao de lavagem de dinheiro envolve o reexame aprofundado de fatos e provas, o que, em regra, não tem espaço na via eleita. O trancamento de ação penal, ademais, é medida reservada a hipóteses excepcionais, como "a manifesta atipicidade da conduta, a presença de causa de extinção da punibilidade do paciente ou a ausência de indícios mínimos de autoria e materialidade delitivas" (HC 91.603, rel. Ellen Gracie, DJe-182 de 25.09.2008), o que não é caso dos autos. Ordem denegada."
(STF - HC - 94958 - Ministro Relator JOAQUIM BARBOSA)
"PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO. LEI Nº 7.492/86, ARTS. 4º, 16 E 22, PARÁGRAFO ÚNICO. CRIMES DE LAVAGEM DE DINHEIRO. LEI Nº 9.613/98, ART. 1º, VI E VII C/C ARTIGO 1º, § 1º, II C/C ART IGO 1º, § 2º, II C/C ARTIGO 1º, § 4º. CONEXÃO HÁBIL A FIXAR A COMPETÊNCIA DO JUÍZO PREVENTO. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA NÃO VERIFICADA. SUPERVENIÊNCIA DA SENTENÇA QUE PREJUDICA A ANÁLISE DA AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. INOCORRÊNCIA DA INÉPCIA DA DENÚNCIA. COMPATIBILIDADE ENTRE OS CRIMES DOS ARTIGOS 4º E 16 DA LEI 7.492/86. INADMISSIBILIDADE DE REEXAME DE PROVA NA VIA ESTREITA DO HABEAS CORPUS. PRECEDENTES. ORDEM DENEGADA.
(...)
4. A denúncia que descreve minuciosamente fatos que se subsumem ao disposto no art. 1º, VI, da Lei 9.613/98, qual seja, o crime contra o sistema financeiro nacional, não é inepta, porquanto traz a narrativa dos crimes antecedentes. Para a instauração da ação penal ou para o ato de recebimento da denúncia, não se faz necessária a certeza quanto aos crimes antecedentes.
5. O processo e julgamento do crime de lavagem de dinheiro é regido pelo Princípio da Autonomia, não se exigindo, para que a denúncia que imputa ao réu o delito de lavagem de dinheiro seja considerada apta, prova concreta da ocorrência de uma das infrações penais exaustivamente previstas nos incisos I a VIII do art. 1º do referido diploma legal, bastando a existência de elementos indiciários de que o capital lavado tenha origem em algumas das condutas ali previstas.
6. A autonomia do crime de lavagem de dinheiro viabiliza inclusive a condenação, independente da existência de processo pelo crime antecedente.
7. É o que dispõe o artigo 2º, II, e § 1º, da Lei nº 9.613/98: "O processo e julgamento dos crimes previstos nesta Lei: II - independem do processo e julgamento dos crimes antecedentes referidos no artigo anterior, ainda que praticados em outro país; § 1º A denúncia será instruída com indícios suficientes da existência do crime antecedente, sendo puníveis os fatos previstos nesta Lei, ainda que desconhecido ou isento de pena o autor daquele crime."
8. A doutrina do tema assenta: "Da própria redação do dispositivo depreende-se que é suficiente a demonstração de indícios da existência do crime antecedente, sendo desnecessária a indicação da sua autoria. Portanto, a autoria ignorada ou desconhecida do crime antecedente não constitui óbice ao ajuizamento da ação pelo crime de lavagem. (...) Na verdade, a palavra 'indício' usada na Lei de Lavagem representa uma prova dotada de eficácia persuasiva atenuada (prova semiplena), não sendo apta, por si só, a estabelecer a verdade de um fato, ou seja, no momento do recebimento da denúncia, é necessário um início de prova que indique a probabilidade de que os bens, direitos ou valores ocultados sejam provenientes, direta ou indiretamente, de um dos crimes antecedentes. Não é necessário descrever pormenorizadamente a conduta delituosa relativa ao crime antecedente, que pode inclusive sequer ser objeto desse processo (art. 2º, II, da Lei 9.613/98), mas se afigura indispensável ao menos a sua descrição resumida, evitando-se eventual arguição de inépcia da peça acusatória, ou até mesmo trancamento da ação penal por meio de habeas corpus. (...) De se ver que, no momento do recebimento da denúncia, a lei exige indícios suficientes, e não uma certeza absoluta quanto à existência do crime antecedente" (in Luiz Flávio Gomes - Legislação Criminal Especial, Coordenador Luiz Flávio Gomes e Rogério Sanches Cunha, Lavagem ou Ocultação de Bens - Renato Brasileiro, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 588/590).
9. In casu, o acórdão do Superior Tribunal de Justiça observou que a ausência de justa causa que justificaria o trancamento da ação penal seria aquela que evidenciasse clara causa extintiva de punibilidade ou fato narrado atípico, verbis: "O fato de não estar, de imediato e cabalmente comprovada a ocultação de valores, não indica a impossibilidade de manutenção da ação penal, sobretudo por estarem presentes indícios fortes da ocorrência criminosa. O trancamento da ação penal só é cabível quando evidente está uma causa extintiva da punibilidade, o fato narrado é atípico e ressalta aos olhos, de plano, a ausência de justa causa para o seu prosseguimento, o que não se pode, na hipótese dos autos, se verificar sem aprofundamento na prova, situação totalmente incompatível com o writ. É notório que a vultuosa quantia transacionada internacionalmente é presumidamente de origem ilícita, posto que, se não fosse, não haveria a necessidade de se recorrer a tal caminho obscuro. Diante disto, entendo que a denúncia atacada contém os elementos necessários exigidos em lei, descreve fato típico, há aparentes indícios de autoria e da existência do delito imputado ao paciente, logo, não se justifica o pleiteado trancamento da ação penal."
(...)
23. Ordem denegada."
(STF - HC - 93368 - Ministro Relator LUIZ FUX)
"HABEAS CORPUS. LAVAGEM DE DINHEIRO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. INOCORRÊNCIA. MANDAMUS CONHECIDO. CRIMES ANTECEDENTES. INDÍCIOS SUFICIENTES. PRESSUPOSTOS DA LEI ESPECIAL ATENDIDOS. ALEGAÇÃO DE ILICITUDE DE PROVAS. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL INCABÍVEL. ORDEM DENEGADA.
(...)
2. Pela simples leitura da exordial verifica-se que o órgão acusador cumpriu a disposição processual especial do artigo 2º, § 1º, da Lei nº 9.613/98. Ressalte-se, ainda, que a teor do que dispõe o inciso II do mesmo dispositivo legal, a denúncia pelo crime de lavagem de dinheiro independe do processamento do acusado pelas infrações que a antecedem.
3. A prova da materialidade exigida pelo artigo 41 do Código de Processo Penal relaciona-se ao delito de lavagem de dinheiro e não aos delitos antecedentes, dos quais na norma extravagante requer singelos indícios de existência. Precedentes da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça.
4. A denúncia instruída com indícios suficientes da existência do crime antecedente ao delito de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores satisfaz os pressupostos da Lei Especial para o seu oferecimento e recebimento.
5. O trancamento de uma ação penal exige que a ausência de justa causa, a atipicidade da conduta ou uma causa extintiva da punibilidade estejam evidentes, independente de investigação probatória, incompatível com a estreita via do habeas corpus. Precedentes.
4. Ordem conhecida e denegada."
(STJ - HC - 200800665089 - Desembargadora Convocada Relatora JANE SILVA)
"PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL. FATOS QUE CONSTITUEM CRIME EM TESE. IMPOSSIBILIDADE. CRIME DE LAVAGEM DE DINHEIRO. INDÍCIOS DO CRIME ANTECEDENTE. PRINCÍPIO DA RESERVA LEGAL.
O trancamento da ação penal através da angusta via do habeas corpus consiste em medida excepcional, somente aceita pelos Tribunais pátrios quando demonstrada, inequivocamente, a ausência de justa causa hábil à sua instauração, tal como o fato em apuração não constituir crime ou a impossibilidade de a autoria ser atribuída ao investigado. A teor do art. 2º, II, da Lei nº 9.613/98, não se exige, para a aptidão da denúncia que imputa ao réu o delito de lavagem de dinheiro, prova concreta da ocorrência de uma das infrações penais exaustivamente previstas nos incisos I a VIII do art. 1º do referido diploma legal, bastando a existência de elementos indiciários de que o capital branqueado provenha de alguma de tais condutas ilícitas. Precedentes. Não pode a Lei nº 9.613/98, sob pena de afronta ao princípio da reserva legal, retroagir para alcançar lavagem de bens, direitos ou capitais consumada anteriormente à sua edição. Todavia, se, após o branqueamento inicial, outras negociações, agora já sob a égide do referido diploma legal, são realizadas com a finalidade de distanciar a origem criminosa do patrimônio, não há falar, diante da norma incriminadora contida no § 1º, II, do art. 1º da Lei nº 9.613/98, em atipicidade flagrante destes fatos passível de reconhecimento nos estritos limites de cognição do writ."
(TRF4 - HC - 200704000035513 - Desembargador Federal Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ)

Nesse sentido, manifestou-se a Procuradoria Regional da República (fls. 222/226v.). Confira-se:


"10. O recurso merece ser provido.
11. Como bem observou o Parquet Federal em suas razões recursais, há justa causa para o prosseguimento das investigações no que concerne ao crime de 'lavagem' de ativos.
12. Apesar de ainda não ter sido claramente identificado o crime antecedente, consta dos autos fortes indícios do crime de lavagem de dinheiro por intermédio de Celso Fernandes La Pastina e Cláudio Frederico Waidmann, ambos sócios da empresa Santa Maria de Castellabate Empreendimentos e Participações Ltda. Esta, ao adquirir imóvel de valor muito maior que o capital social destinado à sua constituição; tudo por meio de um empréstimo de um dos sócios e, o restante, proveniente da empresa uruguaia Birskin S/A., empresa estrangeira interessada em investir no mercado brasileiro, revela possível esquema de lavagem de dinheiro aliado ao crime de evasão de divisas ou possivelmente um crime contra o sistema financeiro nacional.
13. Na atual fase do inquérito policial, não é possível concluir, através de um juízo de cognição sumária, pela absoluta falta de provas ou indícios que levem à possível propositura de ação penal em face dos investigados por crime de 'lavagem' de dinheiro. Somente é admissível o trancamento de ação penal e de inquérito policial em situações excepcionais. Nesse sentido, já decidiu o Excelso Supremo Tribunal Federal e o Egrégio Superior Tribunal de Justiça:
(...)
14. Ademais, não se pode abusar do remédio heróico para obstar o prosseguimento de uma investigação em curso, mormente quando ainda pendentes diligências imprescindíveis ao término da mesma. Os crimes de 'lavagem de dinheiro', pela sua complexidade, exigem investigações aprofundadas, que requerem tempo e a colaboração de órgãos públicos, como a Receita Federal, o COAF e a Polícia Federal.
15. No caso dos autos, o trancamento do inquérito policial se revelou ainda mais precipitado porque se deu antes de se atender aos requerimentos formulados pelo Ministério Público Federal, mormente a quebra de sigilo fiscal e bancário dos investigados e da empresa citada no inquérito. Este, nunca é demais lembrar, é um procedimento administrativo, de natureza inquisitorial, que visa a apurar a prática de crimes e a sua autoria, o que implica, evidentemente na colheita de provas e nos atos descritos no art. 6º do Código de Processo Penal.
Isto posto, opina o Ministério Público Federal pelo provimento do recurso em sentido em estrito, a fim de que se determine o prosseguimento das investigações, com a análise dos requerimentos formulados às fls. 170/173."

Desse modo, resta induvidoso que tem o Estado o poder-dever de apurar devidamente os fatos narrados.


Todavia, no que tange às diligências requeridas o pedido deve ser formulado perante o Juízo de primeiro grau, sob pena de supressão de instância.

Por esses fundamentos, dou provimento ao recurso ex officio e dou parcial provimento ao recurso em sentido estrito, para determinar o prosseguimento do inquérito policial, quanto ao delito previsto no artigo 1º da Lei nº 9.613/98.


É o voto.



Vesna Kolmar
Desembargadora Federal


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