D.E. Publicado em 18/05/2012 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar o pedido de declaração da extinção da punibilidade do réu e negar provimento às apelações, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
A EXCELENTÍSSIMA JUÍZA FEDERAL CONVOCADA LOUISE FILGUEIRAS:
Trata-se de apelações criminais interpostas pela JUSTIÇA PÚBLICA e por ANDREJ MENDONÇA em face da sentença que o condenou pela prática do crime descrito no artigo 171, § 3º, c/c artigo 65, inciso III, "d", ambos do Código Penal.
Consta da denúncia (fls. 02/05) que Andrej Mendonça e Francisco Pereira de Almeida, agindo dolosamente e cientes das ilicitudes e reprovabilidades de suas condutas, concorreram, por três vezes, para a tentativa de obtenção de vantagens ilícitas contra o INSS, consistentes nas concessões indevidas de benefícios previdenciários de aposentadorias por idade como trabalhadores rurais, requeridos em 17.03.1998, 23.03.1998 e 30.04.1998, por Maria Rolim Morara, Aparecida Maria Rodrigues de Oliveira e Dorotéia Rios dos Santos, respectivamente, procurando induzir a Autarquia em erro uso de documentos ideologicamente falsos, que continham informações que serviriam para comprovar seus tempos de serviço de atividades rurais visando obtenção de aposentadorias por idade.
A denuncia foi recebida em 29 de abril de 2005 (fl. 187).
O Juízo Federal determinou desapensar os autos deste processo dos demais, pois os feitos correram em autos apartados e cada um deles teve sua particular instrução processual, de tal modo que esta ação penal (nº 1999.60.02.001988-4) refere-se à conduta praticada pelos acusados consistente na tentativa de obtenção fraudulenta de benefício previdenciário de aposentadoria por idade como trabalhadora rural, requerido em 30.04.1998, em favor de Dorotéia Rios dos Santos (fl. 190).
Após regular instrução, foi proferida sentença (fls. 380/387) que julgou procedente a ação penal, absolvendo Francisco Pereira de Almeida, com fundamento no artigo 386, inciso VI, do Código de Processo Penal e condenando Andrej Mendonça pela prática do crime descrito no artigo 171, § 3º, c.c. artigo 65, inciso III, "d", ambos do Código Penal, a cumprir a pena de 1 (um) ano, 5 (cinco) meses e 23 (vinte e três) dias de reclusão, em regime inicial aberto, bem como ao pagamento de 23 (vinte e três) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo
Houve a substituição da pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, pelo prazo da pena aplicada, a ser determinada pelo Juízo das Execuções Penais, e em prestação pecuniária, consistente no pagamento de R$ 300,00 (trezentos reais) à entidade privada de destinação social.
Inconformado, o Ministério Público Federal apela (fls. 394/405), requerendo a reforma parcial da sentença, a fim de que seja majorada a pena privativa de liberdade imposta ao réu, a ser fixada acima do ponto médio legal, ou seja, acima de dois anos e seis meses de reclusão, sem prejuízo do aumento relativo à continuidade delitiva, em razão da culpabilidade, dos antecedentes, da personalidade, além dos motivos e das conseqüências do crime lhe serem desfavoráveis.
Por sua vez, o réu Andrej Mendonça, em razões recursais (fls. 422/429), alega a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva estatal e sua absolvição por ter agido em estado de necessidade, bem como não possuir condições de saúde para o cumprimento da pena substitutiva de prestação de serviços.
Foram apresentadas contrarrazões (fls. 411/419 e 431/439).
A Procuradoria Regional da República opina pelo desprovimento da apelação da defesa e pelo provimento da apelação da acusação, devendo a pena-base ser fixada em quantum maior do que o fixado na r. sentença recorrida (fls. 461/465).
É o relatório.
À revisão.
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VOTO
A EXCELENTÍSSIMA JUÍZA FEDERAL CONVOCADA LOUISE FILGUEIRAS:
Inicialmente, não procede a alegação do réu no sentido de que teria ocorrido a prescrição da pretensão punitiva, na modalidade retroativa, calculada com base na pena imposta pela sentença.
Isso porque, nos termos do artigo 109 do Código Penal, a prescrição, antes do trânsito em julgado da sentença para a acusação, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime que, no caso de estelionato, é de cinco anos.
Apenas após o trânsito em julgado da sentença condenatória para a acusação, a prescrição será regulada pela pena em concreto, ocorrendo na modalidade retroativa, nos termos do que dispõe o artigo 110 e parágrafos do Código Penal.
No caso, a pena foi fixada abaixo de dois anos, porém, ainda poderá vir a ser alterada em razão da existência do presente recurso da acusação, exatamente no sentido de aumentá-la.
Portanto, a sentença ainda não transitou em julgado para a acusação, não havendo como, antes de ser julgado o recurso ministerial, que se falar em contagem do prazo prescricional com base na pena fixada pela sentença.
Isto posto, rejeito o pedido de declaração da extinção da punibilidade do réu.
Passando ao exame das apelações, consigno que os elementos de convicção constantes nos autos compuseram conjunto probatório harmônico e apto ao desate condenatório, na medida em que permitiram concluir que Andrej Mendonça, dolosamente e ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, concorreu para a tentativa de obtenção de vantagem ilícita contra o INSS, consistente na concessão indevida do beneficio previdenciário de aposentadoria por idade em favor de Dorotéia Rios dos Santos, procurando induzir a Autarquia em erro mediante a utilização de documentos ideologicamente, que serviriam para comprovar o tempo de serviço de atividade rural.
A materialidade delitiva restou comprovada através dos documentos que instruíram o requerimento de benefício de aposentadoria por idade rural formulado por Doracéia Rios dos Santos perante o INSS (fls. 18/19), que eram ideologicamente falsos, tendo em vista que as notas fiscais teriam sido emitidas pelas empresas "Cerealista e Agrícola Iguá Ltda", "Cerealista Ivaiporã" e "Supermercado Marques e Merco Sul Cereais" (fls. 24/27 e 62/67), as quais não estavam mais em atividade há mais de cinco anos quando da emissão delas, conforme apurado em auditoria realizada pela própria Autarquia (fls. 91/93).
Também não restam dúvidas quanto à autoria delitiva do apelante, pois, apesar do acusado Andrej Mendonça, em Juízo, ter alterado sua versão prestada em sede policial (fls. 116/118), restou evidente que preencheu as referidas notas fiscais falsas (fls. 62/67), fato devidamente corroborado pelo laudo de exame grafotécnico (fls. 136/139), atestando que aqueles documentos provieram do punho do réu Andrej Mendonça, fornecendo-as a diversas pessoas para que as utilizassem a fim de instruir os requerimentos de benefícios previdenciários.
Cabe transcrever trechos de seu interrogatório, prestado perante a autoridade policial (fls. 116/118):
Sendo o crime de estelionato material, pois para a sua consumação exige-se a produção de um dano efetivo, bem como exige o dolo específico consistente na vontade de fraudar com a obtenção de lucro para si ou para outrem, exige-se do agente, conforme ensinamento de Nelson Hungria (in Comentários ao Código Penal, vol. 7, pág. 246), o animus lucri faciendi, uma vez que a consumação do delito realiza-se com a obtenção da vantagem ilícita em prejuízo alheio.
Todavia, é certo que o elemento subjetivo (dolo), por residir apenas nas mentes dos agentes, não pode ser demonstrado diretamente, devendo ser analisados os elementos colhidos nos autos como um todo, de forma a demonstrar a vontade dos agentes em praticar as condutas descritas nos tipos penais pelos quais são acusados.
No caso, a análise do conjunto probatório permite concluir, sem sombra de dúvidas, e apesar da negativa do acusado, que ele agiu dolosamente, estando evidenciado que o sucesso da empreitada criminosa, consistente no deferimento do pedido de benefício previdenciário de aposentadoria por idade como trabalhadora rural a Dorotéia Rios dos Santos, somente seria possível em razão das notas fiscais ideologicamente falsas emitidas pelo réu.
Por esses motivos, mantenho a condenação do acusado.
Passo à análise da dosimetria da pena.
A pena-base deve ser fixada considerando-se as circunstâncias judiciais previstas no artigo 59 do CP, ou seja, a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social, a personalidade do agente, os motivos, as circunstâncias e conseqüências do crime, bem como o comportamento da vítima. A finalidade dessas circunstâncias, denominadas judiciais, por balizarem uma atuação jurisdicional fundada num exercício discricionário, é a de permitir a aplicação de penas individualizadas e proporcionais aos delitos praticados, que sejam necessárias e suficientes para promover a reprovação e a prevenção da conduta.
Nesse contexto, havendo no preceito secundário do tipo penal uma margem entre o mínimo e máximo da pena a ser aplicada, deve-se confrontar as circunstâncias judiciais para chegar ao quantum adequado da pena, a fim de que atinja sua finalidade.
No caso, verifico que o MM. Juiz fixou a pena-base do réu acima do mínimo legal (dois anos de reclusão), em atenção aos maus antecedentes do réu.
Todavia, o Ministério Público Federal se insurge quanto ao quantum da pena-base fixada para o apelante, afirmando que deve ser exasperada em razão dos seguintes elementos: culpabilidade intensa do réu, em razão de suas condições de comerciante, forneceu, por inúmeras vezes, notas fiscais ideologicamente falsas aos que almejavam e necessitavam se aposentar; maus antecedentes ou péssima conduta social, demonstrando que possui perfil voltado para a criminalidade, em face de inúmeras ações penais que responde perante a Justiça Federal, demonstrando que possui conduta criminosa própria dos indivíduos altamente nocivos à sociedade, sendo que o simples fato de ser o réu primário e possuir bons antecedentes não induz, necessariamente, a fixação da pena-base do acusado próximo ao mínimo legal, pois responde a várias ações penais; má personalidade, pois possuindo uma boa condição sócio-econômica, na época dos fatos, agiu com ausência de sentimento humanitário, procurando obter lucro com a premente necessidade de trabalhadores rurais em se aposentarem, não se importando com o fato de que os documentos seriam utilizados para a obtenção de benefício previdenciário indevido, bem como pelo fato de não ter demonstrado arrependimento ou sensação de culpa, além de procurar se eximir das imputações que lhe recaem; e, motivos e conseqüências do crime, em razão de ter sido motivado pelo lucro através da necessidade alheia, em detrimento do INSS, desprezando as leis e normas de conduta, e das fraudes cometidas contra a Autarquia possuírem sérias conseqüências a médio e longo prazo, tornando-a mais deficitária, com o remanejamento de verbas públicas, prejudicando outros setores essenciais à população.
Inicialmente, ressalto que não se pode considerar como fator exasperador da pena a boa condição econômica do réu, tendo em vista que, conforme bem salientado pela acusação em razões recusais, recebia uma renda mensal equivalente a mil reais.
No tocante à falsificação de documento na prática do crime, verifica-se que se trata de elemento do tipo, pois foi um meio para a prática do crime de estelionato, não podendo ser considerado para efeito de majoração da pena.
Por outro lado, o artigo 171 do CP dispõe sobre a figura do estelionato simples, cuja pena é de um a cinco anos de reclusão e multa.
O parágrafo 3º do mesmo artigo dispõe: "A pena aumenta-se de um terço se o crime é cometido em detrimento de entidade de direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficiária."
Portanto, a gravidade do crime já se constitui em circunstância elementar do delito de estelionato qualificado, nos termos do parágrafo 3º do artigo 171 do Código Penal, que prevê pena mais grave quando o delito é praticado em detrimento de entidade de direito público, no caso o INSS.
Penso que também não se justifica acréscimo maior à pena-base em razão dos motivos do crime, sob a alegação de que o réu visava lucro com a necessidade alheia em detrimento do INSS, pois a dilapidação do patrimônio social decorrente da ação criminosa do réu refere-se à maior reprovabilidade da conduta, sancionada com o aumento do § 3º, do artigo 171, do Código Penal.
Por outro lado, não se podem considerar como fator exasperante os prejuízos que eventualmente seriam causados pela prática do delito, já que o estelionato ocorreu de forma tentada.
Consoante bem ressaltado no parecer ministerial, o bem jurídico tutelado pelo artigo 171 do CP é o patrimônio e, diante da ausência de lesão ao bem jurídico, não há que se falar em conseqüências do crime.
A pena-base merece ser mantida em que pese ter sido indevidamente exacerbada em razão do réu ser portador de maus antecedentes, pois constam apenas ações penais não transitadas em julgado (fls. 142/159, 269/281, 311/317 e 318/330), nos termos da Súmula nº 444 do STJ.
Contudo, há que se manter o aumento da pena-base por se entender maior a culpabilidade do réu em função do acentuado desvalor da específica conduta praticada que contou, para a sua consumação, com ousado, ardiloso e complexo esquema de falsificações de documentos com o intuito de satisfazer interesses privados e/ou eleitoreiros, sendo-lhes, portanto, desfavoráveis as circunstâncias judiciais, razão pela qual a mantenho em 2 (dois) anos de reclusão e 30 (trinta) dias-multa.
Na segunda fase da fixação da pena, o MM. Juiz aplicou a atenuante genérica da confissão espontânea, sob a afirmação de que o réu confessou o crime perante a autoridade policial, que fica mantido, consoante recente entendimento do STJ: "Se a confissão do paciente, colhida na fase extrajudicial e retratada em Juízo, é utilizada como prova para a condenação, obrigatória a aplicação da atenuante prevista no art. 65, III, "d", do Código Penal" (HC 175027/SP, 010/0100443-2, Relator Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, Data do Julgamento, 13/03/2012, Data da Publicação/Fonte DJe 02/04/2012).
Ausentes agravantes, a pena resta em 1 (um) ano e 8 (oito) meses de reclusão e 25 dias-multa.
Na terceira etapa da individualização da pena, incide a causa de aumento prevista no parágrafo 3º do artigo 171 do Código Penal no patamar de um terço, nos termos da Súmula nº 24 do STJ, por se tratar de crime de estelionato em que figura como vítima entidade autárquica, perfazendo 2 (dois) anos, 2 (dois) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 33 (trinta e três) dias-multa.
Tratando-se de crime na modalidade tentada, deve ser aplicada a regra contida no artigo 14, II, parágrafo único do CP, diminuindo a pena em 1/3 (redução mínima), o que resulta na pena de 1 (um) ano, 5 (cinco) meses e 23 (vinte e três) dias de reclusão e 22 (vinte e dois) dias-multa.
Mantenho o valor unitário do dia-multa, o regime inicial de cumprimento de pena e a substituição da pena privativa de liberdade, nos termos estabelecidos pela sentença, pois a defesa não se incumbiu de demonstrar que o réu sofre de eventuais problemas de saúde hábeis a impossibilitar o cumprimento da pena de prestação de serviços à comunidade.
Diante do exposto, rejeito o pedido de declaração da extinção da punibilidade do réu e nego provimento às apelações.
É o VOTO.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 14/05/2012 16:25:21 |