D.E. Publicado em 03/05/2012 |
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EMENTA
PENAL. PROCESSUAL PENAL. DESCAMINHO DE MERCADORIAS E CONTRABANDO DE CIGARROS. NULIDADE POR CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO DECRETADA. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ARTIGO 249, §2º DO CPC. ARTIGO 334 DO CP. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. ADOÇÃO DO PARÂMETRO DO ARTIGO 20, DA LEI 10.522/2002. RECURSO REPETITIVO STJ. ARTIGO 543-C E §§ DO CPC. APELAÇÃO PROVIDA.
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ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso interposto por INÊS ROSA JANONES, para absolvê-la da imputação contida no artigo 334, §1º, "d" c.c. o §2º do Código Penal, com fundamento do artigo 386, III do Código de Processo Penal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
Trata-se de APELAÇÃO CRIMINAL interposta por INÊS ROSA JANONES, contra a decisão de primeiro grau proferida pelo MM. Juiz Federal da 1ª Vara Federal de Sorocaba/SP, que a condenou como incurso no artigo 334, §1º, alínea "d" c.c. o §2º do Código Penal, à pena 02 (dois) anos de reclusão, em regime inicial semi-aberto.
Narra a denúncia que:
"No dia 19 de fevereiro de 2004 (fls. 04), próximo à entrada da cidade de Salto/SP, foram apreendidas, em poder de MARCIA VALERIA ESPOSITO, diversas mercadorias de procedência/origem estrangeira, desprovidas de qualquer documentação fiscal.
As mercadorias eram compostas por diversos pacotes de cigarros, que foram apreendidos por policiais na rodovia Santos Dumont.
As mercadorias (fls. 12), encontravam-se no interior de um ônibus que vinha de Foz do Iguaçu/PR, onde as denunciadas eram passageiras (INÊS era guia da excursão). Foram apreendidas e submetidas a exame pericial pela SECRIM (fls. 43/46), perfazendo o valor total de US$ 1.156,11 (mil cento e cinqüenta e seis dólares americanos e onze centavos).
MARCIA declarou (fls. 22/23) que em fevereiro de 2004 '...recebeu um telefonema de uma pessoa cujo prenome é MARIA, não sabendo informar seus dados qualificativos, perguntando-lhe se estava interessada em receber a quantia de R$120,00 (cento e vinte reais), a qual seria entregue caso aceitasse transportar pacotes de cigarro de Foz do Iguaçu/PR para Jundiaí/SP. QUE MARIA instruiu a indicianda para que embarcasse no ônibus SCANIA, placas BTD-6767/Indaiatuba/SP, estacionado na cidade de Salto/SP, o qual tinha como guia a pessoa conhecida como Dona Inês, que a interrogada não pagou passagem, tendo apenas informado a Dona Inês que iria buscar uma 'carga de cigarros' em Foz do Iguaçu, sendo que esta informou-lhe que já sabia do 'serviço'; que chegando em Foz do Iguaçu, recebeu o telefonema de um estranho, o qual lhe avisou que iria entregar-lhe a carga de cigarros; que sendo assim, o estanho dirigiu-se ao Hotel onde estava estacionado o ônibus supracitado e entregou diretamente a indicianda a carga de cigarros(...) que a interroganda foi instruída a desembarcar em Jundiaí, onde 'alguém' iria encontra-la para receber os cigarros transportados no ônibus".
INÊS alegou (fls. 52/53) que, em fevereiro de 2004, realizou uma excursão a Foz do Iguaçu, cujo intuito era efetuar compras no Paraguai. Informou, também, que '...não se recorda do valor que cobrou de cada passageiro do ônibus, vez que o preço eram calculado de acordo com a quantidade de mercadorias embarcadas no ônibus".
Sendo assim, conclui-se que MARCIA VALERIA ESPOSITO e INÊS ROSA JANONES, com vontade livre e consciente, e prévia comunhão de desígnios, receberam e ocultavam, em proveito e ambas e alheio, no exercício de atividade comercial irregular, mercadorias de procedência estrangeira, desacompanhadas de documentação legal" (fls. 02/04).
A denúncia foi recebida em 06 de junho de 2005 (fl. 75).
A ré foi interrogada (fls. 109/110), tendo sido apresentada defesa prévia (fls.118).
Quanto à ré Márcia foi oferecida proposta de suspensão condicional do processo, que foi aceita (fls. 94).
Foram ouvidas duas testemunhas arroladas pela acusação (145/148 e 155/158).
A ré Inês Rosa Janones deixou de providenciar o recolhimento das custas referentes à intimação das testemunhas de defesa por ela arroladas, tendo o juiz reconhecido a ocorrência de preclusão (fls. 172).
Na fase do artigo 499 do Código de Processo Penal, nada foi requerido pelas partes.
Em alegações finais, a acusação pugnou pela condenação da ré (fls. 176/180), ao passo que a defesa se bateu pela sua absolvição (fls. 187/194).
A sentença condenatória foi proferida a fls. 199/217 e foi publicada em 11/09/2008 (fls. 218).
Irresignada, a apelante interpôs recurso de apelação (fls. 260/269), aduzindo, essencialmente, que:
a) no interior do ônibus havia por volta de vinte pessoas, que sequer foram qualificadas nos autos;
b)de outro lado, se dividida a responsabilidade entre as pessoas que estavam no veículo, chegar-se-ia à conclusão de que o valor das mercadorias ali apreendidas, em relação a cada passageiro, atendia as regras para a cota de isenção de produtos importados;
c)a ré exercia apenas o trabalho de guia turístico, sendo certo que a quantidade de mercadoria supostamente trazida por ela era muito pequena;
d)as mercadorias apreendidas pertenciam aos passageiros do ônibus que vinha do Paraguai;
e) a ré Inês Rosa Janones afirmou, em juízo, que somente organizava as viagens, não tendo qualquer relação com o fato delituoso;
f) a pequena quantidade de mercadoria apreendida não atingiu o limite permitido pela cota;
g) não houve lesão significativa para o Fisco, o que demonstra a atipicidade da conduta.
Com as contrarrazões (fls. 275/285), subiram os autos a esta E. Corte Regional, onde o Ministério Público Federal opinou pela decretação da nulidade do processo, ou, no mérito, pela absolvição. E, em caso de manutenção da sentença condenatória, manifestou-se pela redução da pena, aplicando-se o regime aberto de cumprimento da pena (fls. 301/305).
O feito foi submetido à revisão, na forma regimental.
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VOTO
A I. Procuradora Regional da República argüiu a nulidade do feito, ante o cerceamento de defesa decorrente do fato de não ter-se dado oportunidade à defesa de produzir prova testemunhal.
Com efeito, o MM. Juiz de primeiro grau deixou de ouvir as testemunhas arroladas pela defesa, sob o argumento de que ocorreu a preclusão, em virtude do não recolhimento das custas necessárias à sua intimação.
Alega a Douta Representante do Parquet Federal que o recolhimento das custas deveria ser realizado ao final do processo, caracterizando o indeferimento da diligência ofensa ao princípio da ampla defesa e do devido processo legal.
Em que pese as judiciosas alegações deduzidas no parecer ministerial, entendo que o feito comporta apreciação do mérito, sem necessidade de se declarar a sua nulidade.
O artigo 249, §2º do Código de Processo Civil estabelece que:
Art. 249. O juiz, ao pronunciar a nulidade, declarará que atos são atingidos, ordenando as providências necessárias, a fim de que sejam repetidos, ou retificados.
(...)
§2º. Quando puder decidir do mérito a favor da parte a quem aproveite a declaração da nulidade, o juiz não a pronunciará nem mandará repetir o ato, a fim de se observarem, quanto possível, as prescrições legais.(grifos nossos).
De outro lado, o artigo 3º do Código de Processo Penal estabelece que "a lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais de direito".
Assim, é aplicável, de maneira subsidiária, o Código de Processo Civil, até mesmo porque a situação fática dos autos não é descrita pela lei processual penal.
Ressalte-se, aliás, que em situações anteriores esta E. Corte já se pronunciou pela aplicação analógica do Código de Processo Civil, consoante se depreende da leitura das Súmulas 32 e 33 deste Tribunal.
Feitas essas observações, faço consignar que a conduta desenvolvida pela apelante é materialmente atípica.
Inicialmente, ressalto que sempre fui reticente quanto à aplicação do princípio da insignificância para os delitos de descaminho em que o valor do tributo não recolhido era inferior a R$ 10.000,00, por entender que o patamar previsto no artigo 20 da Lei 10.522/2002 era demasiado elevado.
Ocorre que há recentes julgados, inclusive de Tribunais Superiores que admitem a aplicação do princípio da insignificância para os delitos de descaminho ou contrabando de cigarros cujo valor do tributo não recolhido é inferior ao limite citado acima.
Recentemente, foi suscitada questão de ordem nesta E. Corte, para modificar julgado que dava provimento a recurso em sentido estrito, para afastar a aplicação do princípio da insignificância.
É que, naquele processo, sobreveio a notícia de que fora julgado recurso especial perante o Superior Tribunal de Justiça adotando o patamar do artigo 20 da Lei 10.522/2002, para o reconhecimento da ocorrência do crime de bagatela. Tal recurso foi selecionado como repetitivo, nos termos do artigo 543-C do Código de Processo Civil e do artigo 1º e parágrafos da Resolução nº 8, de 07/08/2008, expedida por aquela Corte de Justiça.
Com efeito, a controvérsia discutida acerca da referida causa excludente de ilicitude já havia sido objeto de outro recurso julgado pelo Superior Tribunal de Justiça (REsp 1112748-TO), sob a nova sistemática da Lei nº 11.672/2008, que tratou do julgamento dos recursos repetitivos.
Assim, não obstante o posicionamento adotado em outros julgamentos desta Egrégia 5ª Turma, revejo meu entendimento e acolho a aplicação do princípio da insignificância, nos moldes hodiernamente adotados nas instâncias superiores, desde que não supere o patamar ora previsto na nova redação dada ao artigo 20 da Lei 10.522/02.
É que o acórdão sobre tema repetitivo está calcado em decisão do próprio Supremo Tribunal Federal e vem ao encontro do princípio da duração razoável do processo, previsto no artigo 5º, LXXVIII da Constituição Federal.
Ressalto que o meu anterior entendimento acerca do tema, que foi acompanhado com muita freqüência pelos meus pares, era o de que o princípio da insignificância não se aplicava ao crime de descaminho a não ser naquelas hipóteses previstas pela própria Lei 10.522/2002, em seu artigo 18, §1º.
E, relativamente ao contrabando de cigarro, em face do risco social que tal conduta implica (por furtar-se ao controle do consumo, realizado pelo emprego extrafiscal do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI e o seu impacto no preço do produto), e, depois, pela coletivização dos riscos sem contrapartida nenhuma ao Poder Público que o consumo desses cigarros implica, uma vez que será o subsistema da saúde pública que, a médio prazo, arcará com o tratamento dos fumantes de cigarros baratos e amplamente comercializados pelo país.
Todavia, deixo de aplicar esse meu entendimento ao caso em tela e adoto o posicionamento que aplica o aludido princípio para os casos em que os débitos tributários não ultrapassem o limite de R$ 10.000,00, inclusive nos casos de importação de cigarros.
Frise-se que a jurisprudência nacional vem se solidificando em posicionar-se no sentido de aplicar a referida causa supralegal de excludente da ilicitude nos casos em que o valor dos tributos relativos às mercadorias apreendidas for inferior ao limite de R$10.000,00, inclusive tratando-se de cigarros.
Neste sentido, confira-se o seguinte aresto do Superior Tribunal de Justiça:
"DIREITO PENAL. CRIME DE CONTRABANDO POR ASSIMILAÇÃO. CIGARROS. REINSERÇÃO DE MERCADORIA BRASILEIRA DESTINADA À EXPORTAÇÃO NO TERRITÓRIO NACIONAL. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INCIDÊNCIA. VALOR INFERIOR A R$ 2.500,00, NOS TERMOS DA LEI N.º 10.522/02. CAUSA SUPRALEGAL DE EXCLUDENTE DE ILICITUDE. PRECEDENTES DO STJ.
1. Se a própria União, na esfera cível, a teor do art. 20 da Lei n.º 10.533/2002, entendeu por perdoar as dívidas inferiores a R$2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), não faz sentido apenar o recorrente pelo crime de contrabando por assimilação, pelo fato de ter introduzido no país mercadoria nacional sem o recolhimento de tributo inferior ao mencionado valor.
2. Aplicação do princípio da insignificância como causa supralegal de exclusão da tipicidade. Precedentes do STJ.
3. Recurso provido."
(STJ, RESP nº 308.307/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 18.03.2004, v.u., DJ12/04/2004, p 232).
É que, tem-se levado em conta, como fator de discriminem, o valor monetário as mercadorias apreendidas sobre o qual incidem os tributos devidos.
Confira-se :
PROCESSO PENAL - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - ART. 334 DO CÓDIGO PENAL - ALEGAÇÃO DE OMISSÃO E DE CONTRADIÇÃO - ACORDÃO QUE APLICA O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA COM FUNDAMENTO NA INEXPRESSIVIDADE DA LESÃO AO BEM JURÍDICO TUTELADO PELA NORMA PENAL - EMBARGOS REJEITADOS.
1. Acórdão que, por unanimidade, negou provimento ao recurso nos termos de voto por mim apresentado
2. Ao tomar ciência do acórdão, a Procuradoria Regional da República alegou que: a) omissão, pois o acórdão "não apreciou os fundamentos do recurso do MPF, que foi além da mera questão patrimonial, apontando razões de saúde pública para o combate do contrabando e do descaminho, mormente no que se refere ao tabaco" e b) contradição, pois o julgado do STF (HC 84.412-0/SP) invocado no acórdão "refere-se, entre outros aspectos objetivos a serem considerados, à periculosidade social da ação e à inexpressividade da lesão, nada destacando sobre o aspecto patrimonial/monetário, como acabou por ser adotado no v. acórdão".
3. No acórdão embargado entendeu-se aplicável o princípio da insignificância ao caso concreto levando-se em conta, como fator de discriminem, o valor monetário das mercadorias apreendidas sobre o qual incidem os tributos devidos.
4. O bem jurídico tutelado pela norma do artigo 334 - quanto ao descaminho ou no caso concreto do "contrabando por assimilação " (cigarros) - é o interesse do FISCO no pagamento dos tributos devidos. Não se ignora a possibilidade de ofensa reflexa a outros bens jurídicos, dentre os quais até mesmo a saúde pública, todavia, o fator característico da norma penal incriminadora referida é a lesão ao interesse arrecadatório do FISCO. Nota-se que o próprio Ministério Público Federal na denúncia de fls. 130/132 apenas faz menção à lesão aos interesses do FISCO decorrente da conduta dos acusados.
5. A aplicação do princípio da insignificância deve ser verificada de acordo com o bem jurídico tutelado pela norma penal; se o bem jurídico tutelado tem clara natureza patrimonial, não há que se cogitar de outros elementos, salvo a expressão patrimonial da lesão, para a incidência do referido princípio, sem que isso importe em qualquer contradição do acórdão embargado com o decidido pelo Supremo Tribunal Federal no HC 84.412-0/SP.
6. In casu, a aplicação do princípio da insignificância deve levar em conta a lesão decorrente da infração descrita na denúncia ao bem jurídico penalmente tutelado; resultando insignificante a lesão ao interesse do FISCO em razão do valor das mercadorias apreendidas ser irrisório, não há que se falar na ocorrência do crime de descaminho ou de "contrabando por assimilação " (cigarros).
7. Embargos de declaração a que se nega provimento.
(TRF3, RSE - 200361240015681, Desemb Fed. JUIZ JOHONSOM DI SALVO, 1ª Turma - DJF3:13/06/2008)
PENAL. COMETIMENTO, EM TESE, DO DELITO CAPITULADO NO ARTIGO 334 DO CP. IMPORTAÇÃO ILEGAL DE CIGARROS. CONTRABANDO E DESCAMINHO. DELITOS SIMILARES. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. PARÂMETROS LEGAIS. CARACTERIZAÇÃO DA ATIPICIDADE DA CONDUTA.
1. A caracterização da atipicidade, que permite o sobrestamento da persecução penal, em face da aplicação do princípio da insignificância, tem lugar quando se puder verificar, em relação à conduta perpetrada pelo agente, uma ofensividade mínima, em que a ação, apesar de encontrar tipificação no ordenamento pátrio, além de não representar periculosidade social, também conte com grau de reprovabilidade irrisório, mercê de o ataque ou a omissão levados a efeito pelo investigado não implicarem lesão expressiva ao bem jurídico penalmente tutelado, o que permitiria o reconhecimento do chamado crime de bagatela que se caracteriza por não deter caráter penal relevante.
2. Estando-se diante de caso, em tese, de crime de contrabando ou descaminho, a doutrina e a jurisprudência vêm traçando alguns parâmetros a serem obedecidos, especialmente estar-se diante de mercadoria cujo tributo incidente não supere o valor legalmente fixado para o cancelamento do crédito fiscal, qual seja R$ 10.000,00 (dez mil reais), em conformidade com o previsto no artigo 20 da Lei 10.522/02, na redação dada pela Lei 11.033/04, que regula a extinção daquele, uma vez que se entende ser o direito penal a última ratio, não sendo razoável, de um lado, punir determinada conduta penalmente e, de outro, considerá-la irrelevante sob a égide administrativa, em função da ausência de grave violação ao bem juridicamente tutelado, porquanto aquele rege-se pelos princípios da subsidiariedade, intervenção mínima e fragmentariedade.
3. Para o cálculo do valor do crédito tributário relativo às mercadorias estrangeiras que sofreram importação ilegal, deve-se, em conformidade com o inciso III do artigo 2º da Lei 10.865/04, levar-se em consideração apenas o Imposto de Importação (II) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), sem computar-se as quantias devidas a título de COFINS e PIS.
4. Afeiçoando-se a hipótese dos autos a esses parâmetros, uma vez que o montante dos tributos federais iludidos é inferior àquele patamar, considerando-se que os impostos impagos devem ser calculados na forma como preconizado pelo artigo 65 da Lei 10.833/2003, está-se diante de conduta atípica, hábil a justificar o trancamento pretendido.
5. Não obstante no delito de contrabando não seja o erário público o único atingido, a Seção Criminal desta Corte já definiu pela não diferenciação entre as figuras do artigo 334 do Código Penal para fins de aplicação do princípio da insignificância. Precedentes. (g.n)
(TRF4, ACR 2004.70.05.003546-7/PR, 8ª T. - Rel. JUÍZA FEDERAL ELOY BERNST JUSTO D.E. 04/02/2010)
PENAL. DESCAMINHO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICAÇÃO. EXCLUSÃO PARA O CÁLCULO DOS TRIBUTOS DO PIS E COFINS. Aplica-se o princípio da insignificância ao crime de descaminho quando o valor do tributo não recolhido mostra-se irrelevante, justificando, inclusive, o desinteresse da Administração Pública na sua cobrança. A mesma solução se dará quando do contrabando em caso de proibição relativa, à exemplo de cigarros ou componentes eletrônicos. Para aferição da incidência do princípio despenalizador consideram-se apenas os valores referentes ao II e ao IPI.
(TRF4, c, 8ª Turma, Rel. Desemb, Fed. LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO D.E. 25/03/2010)
E, na Suprema Corte, podem ser mencionados os seguintes julgados: HC 99594, Dje - 204 Divulg. 28/10/2009, HC 96374, Dje 075 - Divulg. 23/04/2009, HC 96309-Dje-075 Divulg. 23/04/2009, HC 96976 - Dje 084 - Divulg. 07/05/2009.
Repita-se que o Recurso Especial Representativo da Controvérsia matéria do presente feito (REsp 1.112.748-TO) trata justamente de um caso em que foram internados e expostos à venda 120 (cento e vinte) maços de cigarros de origem estrangeira e sem a respectiva documentação legal.
Assim, reconhecida a atipicidade da conduta imputada a apelante, cai por terra a alegação de que o princípio da insignificância não é aplicável ao delito de contrabando ou descaminho de cigarros.
Por sua vez, faço consignar que na hipótese vertente não restou comprovado que o valor dos tributos supera o valor previsto no artigo 20, da Lei 10.522/2002, sendo certo, ainda, que o valor das mercadorias apreendidas é muito inferior ao patamar previsto nesse dispositivo (US$ 1.156,11).
Com efeito, esta E. Corte tem firmado entendimento de que o valor dos tributos suprimidos deve vir indicado e provado nos autos pela acusação, para que o réu possa vir a ser responsabilizado nas penas do artigo 334 do Código Penal.
Acerca do tema, colaciono o seguinte julgado:
"PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL.DECISÃO MONOCRÁTICA QUE ABSOLVEU A RÉ. NÃO DESCRIÇÃO NA DENÚNCIA DE MERCADORIA DE IMPORTAÇÃO PROIBIDA. CIGARROS DE ORIGEM ESTRANGEIRA. DELITO DE DESCAMINHO. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA BAGATELA. REITERAÇÃO CRIMINOSA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. I - A ré foi surpreendida dando entrada intencionalmente a 5.000 maços de cigarros estrangeiros, oriundos do Paraguai, os quais foram avaliados em R$ 3.750,00. II - Observa-se, de imediato, que o caso presente diz respeito a cigarros de origem estrangeira internados irregularmente no território nacional, mercadoria cuja importação não é proibida. Proibida é a comercialização de cigarro nacional fabricado para exportação, de cigarro falsificado e de marca sem registro perante a autoridade sanitária brasileira. III - A denúncia não afirma que os cigarros apreendidos em poder da denunciada são de comercialização proibida. Tampouco a sentença condenatória esposou a tese de contrabando, limitando-se a afastar a aplicação do princípio da insignificância devido à reiteração delituosa da ré e à expressiva quantidade de cigarros apreendidos. IV - Trata-se, portanto, do delito de descaminho e não de contrabando. V - E, sobre o descaminho, tanto o Supremo Tribunal Federal, quanto o Superior Tribunal de Justiça entendem que o limite a ser considerado, para fins de intervenção do direito penal, é o de R$10.000,00 (dez mil reais). VI - A reiteração delituosa não afasta a aplicação do princípio da insignificância desde que a somatória dos tributos não recolhidos nas diversas vezes em que o réu for flagrado praticando o descaminho não supere o limite de R$ 10.000,00. Precedente do STF. VI - Cabia ao Ministério Público Federal a prova de que a ré não faz jus à aplicação do princípio da insignificância, o que não foi feito. A acusação não acostou aos autos documentos para comprovar que a soma dos valores não recolhidos supera o limite de R$ 10.000,00 (dez mil reais). VII - Agravo regimental improvido.
(TRF3 - Apelação Criminal 42704 - 2ª Turma - DJF3 CJ1 DATA:02/06/2011 - p. 454, Desembargadora Federal Cecília Mello)
Impõe-se, portanto, a aplicação do princípio da insignificância.
Diante do exposto, dou provimento ao recurso interposto por INÊS ROSA JANONES, para absolvê-la da imputação contida no artigo 334, §1º, "d" c.c. o §2º do Código Penal, com fundamento do artigo 386, III do Código de Processo Penal.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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