Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000237-91.2009.4.03.6113/SP
2009.61.13.000237-2/SP
RELATORA : Juiza Convocada SILVIA ROCHA
APELANTE : ANTONIO OSMAR BONACINI
ADVOGADO : KATIA REGINA HIEDA DOS PRAZERES e outro
APELADO : Justica Publica
No. ORIG. : 00002379120094036113 1 Vr FRANCA/SP

EMENTA

PENAL. PORNOGRAFIA INFANTIL VIA INTERNET. QUEBRA DE SIGILO TELEMÁTICO. AUTORIA E MATERIALIDADE DO DELITO COMPROVADAS. CONDUTAS CRIMINOSAS PREVISTAS NO ECA, NO ART. 241, "CAPUT", NA MODALIDADE "DIVULGAR OU PUBLICAR", E §1º, III, EM CONCURSO MATERIAL COM O PREVISTO NO ART. 241-B, NA MODALIDADE "POSSUIR OU ARMAZENAR". DOSIMETRIA DA PENA. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA.
1. Materialidade e autoria demonstradas à exaustão.
2. Do Laudo de Exame da Internet (fls. 60/73) consta que no período de 15 a 21 de fevereiro de 2006 a rede foi monitorada e constatou-se que 466 (quatrocentos e sessenta e seis) usuários de diversos países possuíam pelo menos 3 (três) vídeos completos de pornografia infanto-juvenil.
3. Constou também do referido laudo uma tabela contendo 9 (nove) usuários com IP´s brasileiros, bem como seus apelidos, que compartilhavam pelo menos 3 (três) vídeos completos contendo material pornográfico no qual constava indivíduos aparentando idade inferior a 18 anos.
4. Consta da referida tabela o usuário "pato largo" que utilizou os IP´s 201.48.4.221, 201.48.11.176, 201.48.0.245 e 201.48.0.245 em 15.02.2006 (2h10), 15.02.2006 (15h37), 18.02.2006 (15h16) e 18.02.2006 (17h32) respectivamente.
5. Deferida a quebra do sigilo telemático (fls. 33/35), constatou-se que a titularidade do IP 201.48.0.245 pertencia ao acusado, conforme informação de fls. 47.
6. Autorizada busca e apreensão no domicílio do acusado, foram apreendidos, dentre outros materiais, 7 (sete) discos, do tipo "DVD-R", com conteúdo pornográfico envolvendo crianças ou adolescentes, ocasião em que o acusado foi preso em flagrante delito.
7. O acusado, na fase policial, admitiu ter domínio sobre o uso da internet, bem como sobre o programa de compartilhamento de arquivos e-mule, tanto que fazia uso do aplicativo frequentemente para baixar vídeos, filmes e músicas. Por outro lado, não merece credibilidade a sua assertiva no sentido de que desconhecia que o aludido programa compartilhava os arquivos sem que fosse necessário um comando específico para esta finalidade, uma vez que é de sua natureza esta característica, qual seja, o compartilhamento de arquivos. O acusado também admitiu que tinha conhecimento que era considerado crime, desde 2008, guardar material pornográfico infanto-juvenil, o que reforça a reprovabilidade de sua conduta.
8. Na fase judicial, quando interrogado, o acusado tentou convencer o juízo de que não tinha domínio sobre o programa e-mule, além do que teria visto o material proibido e em seguida o teria apagado.
9. A versão apresentada em juízo é totalmente contraditória ao seu depoimento na fase policial, oportunidade em que explicou com detalhes como baixava, via, selecionava e gravava os vídeos e imagens em DVD´s. Beira ao absurdo afirmar que apagou os arquivos logo depois de visualizá-los, se em sua residência foi apreendido farto material de conteúdo pornográfico envolvendo crianças e adolescentes.
10. O acusado também afirmou na fase policial que chegou a constituir uma empresa que prestaria serviços de informática, o que corrobora ainda mais a assertiva no sentido de que ele tinha pleno conhecimento da sistemática de funcionamento do computador, bem como do programa "e-mule", que era utilizado para baixar e compartilhar os arquivos com conteúdo pornográfico infanto-juvenil.
11. Por estes mesmo fundamentos, é descabida a assertiva de que o réu não tinha como saber que estava compartilhando os arquivos pelo mero fato de não ter domínio de outros idiomas, exceto o português. Ademais, o senso comum indica que é possível usar diversos programas de computador feitos em língua estrangeira, sem que, necessariamente, seja fluente no idioma utilizado pelo programa.
12. As condutas criminosas imputadas ao acusado estão previstas no art. 241, "caput", na modalidade "divulgar ou publicar", e §1º, III, do ECA, em concurso material com o previsto no art. 241-B, do mesmo diploma legal, na modalidade "possuir ou armazenar".
13. Descabida a tese da defesa no sentido de não haver prova ou indício de que o acusado tenha produzido ou participado da produção de matéria pornográfico infantil, ou que participe de alguma organização criminosa volta a este fim, pois, como explicitado, não são estas as condutas imputadas ao acusado.
14. Carece de fundamento a assertiva de que nada foi encontrado de ilícito no material examinado e que foi objeto dos laudos de fls. 200/202 e 209/220, pois o fato de que parte do material apreendido não apresentou nada de ilícito não exclui a tipicidade da sua conduta quanto ao material remanescente que, frise-se, foi objeto de perícia na qual foi constada a presença de material pornográfico infanto-juvenil.
15. Fora de propósito a alegação de que as testemunhas de defesa e acusação atestaram a inocência do apelante, pois, como é cediço, na avaliação das provas testemunhais, deve o julgador promover um cotejo analítico com as demais provas carreadas aos autos, e lhes atribuir o peso que julgar correto ante a utilização de regras da lógica e da experiência. Ademais, as testemunhas afirmaram que o acusado tem boa índole, é pessoa honesta, bom pai de família, porém nada sabiam a respeito dos fatos a ele imputados.
16. Pena mantida, porquanto não houve impugnação quanto à dosimetria da pena.
17. Apelação improvida.




ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.



São Paulo, 20 de março de 2012.
SILVIA ROCHA
Juíza Federal Convocada


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000237-91.2009.4.03.6113/SP
2009.61.13.000237-2/SP
RELATORA : Juiza Convocada SILVIA ROCHA
APELANTE : ANTONIO OSMAR BONACINI
ADVOGADO : KATIA REGINA HIEDA DOS PRAZERES e outro
APELADO : Justica Publica
No. ORIG. : 00002379120094036113 1 Vr FRANCA/SP

RELATÓRIO

O Ministério Público Federal, em 23.04.2010, denunciou ANTÔNIO OSMAR BONACINI (nascido em 08.05.1956) como incurso no artigo 241-A, "caput", e no art. 241-B, "caput", ambos da Lei 8.069/1990.


Segundo a denúncia:

a) a Divisão de Direitos Humanos da Polícia Federal em Brasília recebeu documentação do Escritório da Interpol na Suíça informando que 9 (nove) brasileiros disponibilizavam e compartilhavam material pornográfico infanto-juvenil através de IP´s brasileiros.

b) através de laudo realizado (fls. 60/73) verificou-se que os 9 (nove) usuários brasileiros compartilharam pelo menos três vídeos contendo pornografia infanto-juvenil no período de 15 a 21 de fevereiro de 2006, sendo que através de informação da entidade responsável pelos endereços IP´s, apurou-se que era o acusado ANTÔNIO o responsável pelo compartilhamento dos vídeos em questão naquela data e hora.

c) apurou-se que o acusado fazia uso da rede compartilhada "Razorback", sendo que através deste meio, em 18.02.2006, entre 16h32 e 18h32, utilizando o IP nº 201.48.0.245 e o usuário "pato largo", compartilhou material pornográfico infanto-juvenil, conforme laudo pericial de fls. 60/73.

d) realizada busca domiciliar em sua residência, foram apreendidos 7 (sete) discos, do tipo "DVD-R", com conteúdo pornográfico envolvendo crianças ou adolescentes, ocasião em que o acusado foi preso em flagrante delito.

e) feita análise pericial nos discos, verificou-se que continham 13 (treze) vídeos, totalizando 3 (três) horas e 13 (treze) minutos de material pornográfico envolvendo indivíduos com idade inferior a dezoito anos.

f) durante seu indiciamento, o acusado admitiu que os objetos apreendidos eram de sua propriedade, e que ele, pessoalmente, tinha gravado os arquivos após fazer uma seleção entre vários outros arquivos obtidos com o uso do programa "E-mule", via internet.




A denúncia foi recebida em 05.05.2010 (fls. 250/251).


Após instrução, sobreveio sentença (fls. 357/362) publicada em 22.03.2011 (fls. 363), julgando procedente o pedido para condenar ANTÔNIO OSMAR BONACINI como incurso no: a) artigo 241, "caput", e parágrafo primeiro, III, do Estatuto da Criança e do Adolescente, à pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão, e ao pagamento de 13 (treze) dias-multa; b) artigo 241-B, do mesmo diploma legal, à pena de 1 (um) ano de reclusão, e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa. Para as duas reprimendas, o dia-multa foi arbitrado no valor de 1/10 (um décimo) do salário-mínimo vigente à época dos fatos, devidamente corrigido, bem como foi fixado o regime aberto para o cumprimento das penas.

As penas privativas de liberdade foram substituídas por penas restritivas de direito. No que se refere ao crime tipificado no artigo 241, "caput", e parágrafo primeiro, III, do ECA, as penas consistem em uma prestação pecuniária no montante de 6 (seis) salários-míninos, a ser revertida a entidade privada a ser determinada pelo Juízo da Execução, e na prestação de serviços à comunidade, pelo prazo da pena substituída. No que tange à conduta tipificada no artigo 241-B, do ECA, a substituição dar-se-á por prestação de serviços à comunidade também pelo prazo da pena substituída.


Ao réu foi concedido o direito de apelar em liberdade.


Apela ANTONIO OSMAR BONACINI (fls. 371/373) requerendo sua absolvição, sustentando, em síntese que: a) não há prova ou indício de que o acusado tenha produzido ou participado da produção de matéria pornográfico infantil, ou que participe de alguma organização criminosa volta a este fim; b) nada foi encontrado de ilícito no material examinado e que foi objeto dos laudos de fls. 200/202 e 209/220; c) no que se refere ao período de 15 a 21 de fevereiro de 2006, o apelante não tinha conhecimento de que estava compartilhando material pornográfico infantil pela internet com outros usuários, pois só conhece o idioma português; e d) as testemunhas de defesa e acusação atestaram a inocência do apelante.


Contrarrazões do Parquet Federal às fls. 376/382 pela manutenção da sentença.


Parecer ministerial pelo desprovimento da apelação (fls. 388/390).


É o relatório.


À revisão.





SILVIA ROCHA
Desembargadora Federal Relatora


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000237-91.2009.4.03.6113/SP
2009.61.13.000237-2/SP
RELATORA : Juiza Convocada SILVIA ROCHA
APELANTE : ANTONIO OSMAR BONACINI
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VOTO

O apelo não comporta provimento.


A materialidade e autoria estão demonstradas à exaustão nestes autos.


Do Laudo de Exame da Internet (fls. 60/73) consta que no período de 15 a 21 de fevereiro de 2006 a rede foi monitorada e constatou-se que 466 (quatrocentos e sessenta e seis) usuários de diversos países possuíam pelo menos 3 (três) vídeos completos de pornografia infanto-juvenil.

Constou também do referido laudo uma tabela contendo 9 (nove) usuários com IP´s brasileiros, bem como seus apelidos, que compartilhavam pelo menos 3 (três) vídeos completos contendo material pornográfico no qual constava indivíduos aparentando idade inferior a 18 anos.

Consta da referida tabela o usuário "pato largo" que utilizou os IP´s 201.48.4.221, 201.48.11.176, 201.48.0.245 e 201.48.0.245 em 15.02.2006 (2h10), 15.02.2006 (15h37), 18.02.2006 (15h16) e 18.02.2006 (17h32) respectivamente.


Do laudo ainda destaco os seguintes quesitos e respectivas respostas:


2) As mensagens da conta citada contêm fotografias, vídeos ou imagens com pornografia ou cenas de sexo explícito envolvendo crianças ou adolescentes ?

R: Sim, foram encontrados 28 (vinte e oito) vídeos contendo pornografia ou cenas de sexo explícito envolvendo crianças ou adolescente. (...)


3) Existem evidências de que houve apresentação, fornecimento, divulgação ou publicação de imagens e fotos citadas do item anterior, na rede mundial de computadores, internet, ou em qualquer outro meio ?

R: Sim. Os vídeos citados no item anterior encontravam-se disponíveis nos computadores de diversos usuários conectados em uma rede de compartilhamento de arquivos na Internet.


4) Em caso positivo, a partir dos dados contidos nas mídias é possível identificar indícios de responsáveis pela apresentação, fornecimento, divulgação ou publicação das imagens e fotos citadas do item anterior que realizaram tais condutas por meio de IPs brasileiros ? Caso positivo, relacionar as imagens e fotos, vinculando-as aos usuários/IPS (com indicação de data, horário e fuso horário), ou em CD, tratando de vasto material.

R: Sim. De acordo com os registros analisados, foram encontrados 09 (nove) usuários que compartilhavam os vídeos citados por meio de endereços IPS brasileiros. Esses usuários encontram-se listados na Tabela 01 que apresenta sua identificação única na rede de compartilhamento (hash de usuário), seu apelido (...) e os arquivos que eram por esses usuários disponibilizados. (...)


Deferida a quebra do sigilo telemático (fls. 33/35), constatou-se que a titularidade do IP 201.48.0.245 pertencia ao acusado ANTÔNIO, conforme informação de fls. 47.


Autorizada busca e apreensão no domicílio do acusado, foram apreendidos, dentre outros materiais, 7 (sete) discos, do tipo "DVD-R", com conteúdo pornográfico envolvendo crianças ou adolescentes, ocasião em que o acusado foi preso em flagrante delito.


Do Laudo de Exame de Dispositivo de Armazenamento Computacional realizado nos 7 (sete) discos apreendidos na casa do acusado ANTÔNIO (fls. 174/181), reproduzo o quesito "b" e respectiva resposta:


b) Há imagens contendo cenas de sexo explícito ou pornográfica envolvendo indivíduos aparentando menoridade (menores de 18 anos) ? Caso positivo, relacionar os materiais e esclarecer se foram divulgadas através da rede INTERNET ?
R: Conforme exposto na seção 3, foram encontrados no material examinado 13 (treze) arquivos de vídeo contendo cenas de sexo explícito ou pornográfica envolvendo indivíduos aparentando ter idade inferior a 18 anos, perfazendo uma duração total aproximada de 03 (três) horas e 13 (treze) minutos. (...)

Assim, resta clara a materialidade e autoria dos delitos, uma vez que os laudos periciais demonstram a presença de pornografia infanto-juvenil tanto nos arquivos compartilhados pelo acusado através da Internet, bem como nos DVD´s apreendidos em seu domicílio quando da batida policial.


Destaco também trechos do interrogatório do réu na fase policial


"QUE trabalha desde o ano de 1999 como representante comercial de várias fábricas de calçados de Franca/SP; QUE no período anterior, trabalhou durante oito meses aproximadamente com manutenção de aparelhos de informática, havendo constituído a empresa CYCOBELLI COMERCIO LTDA ME; QUE atualmente referida empresa encontra-se inativa; QUE melhor esclarecendo esta empresa nunca chegou a operar de fato; (...) QUE no ano de 2002 instalou em seu computador o programa e-mule; QUE referido programa se conectava por meio de um servidor global ponto a ponto denominado RAZORBACK, o qual foi instalado concomitantemente com o programa e-mule; QUE utilizava o programa e-mule para baixar vídeos, filmes e músicas; (...) QUE para baixar os arquivos de conteúdo pornográfico, utilizava palavras da industria pornô como por exemplo "brasileirinhas", "buttman", "paris filmes", etc; QUE costumava selecionar os arquivos que lhe interessavam, gravando-os em mídia digital; QUE aqueles que não lhe interessava, apagava; QUE indagado se antes de gravá-los em mídia os assistia ou ouvia, respondeu que sim, para fins de conferir os respectivos conteúdos; (...) QUE usava o programa e-mule freqüentemente; QUE não tinha conhecimento que o programa e-mule compartilha automaticamente os arquivos baixados, sem necessidade de um comando específico; (...) QUE a respeito do material contendo pornografia infanto-juvenil encontrado em sua residência, em seu quarto, disse que o salvou em mídia, juntamente com outros arquivos que lhe interessavam, uma vez que não conseguiu apagá-los; QUE tinha conhecimento que em meio aos arquivos salvos havia material de pornografia infanto-juvenil; (...) QUE tinha conhecimento que desde o ano de 2008 é crime possuir, manter ou guardar material de pornografia infanto-juvenil; (...) QUE entretanto afirma que os arquivos apreendidos são todos de propriedade do interrogado; (...)"

Verifica-se que o acusado, na fase policial, admitiu ter domínio sobre o uso da internet, bem como sobre o programa de compartilhamento de arquivos e-mule, tanto que fazia uso do aplicativo frequentemente para baixar vídeos, filmes e músicas. Por outro lado, não merece credibilidade a sua assertiva no sentido de que desconhecia que o aludido programa compartilhava os arquivos sem que fosse necessário um comando específico para esta finalidade, uma vez que é de sua natureza esta característica, qual seja, o compartilhamento de arquivos. O acusado também admitiu que tinha conhecimento que era considerado crime, desde 2008, guardar material pornográfico infanto-juvenil, o que reforça a reprovabilidade de sua conduta.


Saliento que na fase judicial, quando interrogado, o acusado tentou convencer o juízo de que não tinha domínio sobre o programa e-mule, além do que teria visto o material proibido e em seguida o teria apagado. Confira-se excerto de seu interrogatório:


"J. Qual a sua versão dos fatos ?

R: A minha versão dos fatos é que... se eu dissesse para o senhor que eu acessei isso diretamente eu não acessei. Foi mais por burrice, por não conhecer o sistema, que de certa forma direcionou para isso. Eu vi as imagens, coisa que deletei de imediato, e nunca mais entrei...não foi uma coisa que eu entrei propositalmente, foi coisa que foi direcionada a isso. Eu vi, achei coisa ... eliminei, acabou e nunca mais, acabou. Inclusive, na seqüência até ... que me apavorou e... mesmo porque eu tenho filho... nunca, nunca... Não foi uma coisa que eu fiz propositalmente... honestidade a máquina me pegou por falta de conhecimento dela, porque eu não..."


A versão apresentada em juízo é totalmente contraditória ao seu depoimento na fase policial, oportunidade em que explicou com detalhes como baixava, via, selecionava e gravava os vídeos e imagens em DVD´s. Beira ao absurdo afirmar que apagou os arquivos logo depois de visualizá-los, se em sua residência foi apreendido farto material de conteúdo pornográfico envolvendo crianças e adolescentes.

Lembre-se que o acusado também afirmou na fase policial que chegou a constituir uma empresa que prestaria serviços de informática, o que corrobora ainda mais a assertiva no sentido de que ele tinha pleno conhecimento da sistemática de funcionamento do computador, bem como do programa "e-mule", que era utilizado para baixar e compartilhar os arquivos com conteúdo pornográfico infanto-juvenil.

Por estes mesmo fundamentos, tenho por descabida a assertiva de que o réu não tinha como saber que estava compartilhando os arquivos pelo mero fato de não ter domínio de outros idiomas, exceto o português. Ademais, o senso comum nos indica que é possível usar diversos programas de computador feitos em língua estrangeira, sem que, necessariamente, seja fluente no idioma utilizado pelo programa.


Prossigo.


As condutas criminosas imputadas ao acusado estão previstas no art. 241, "caput", na modalidade "divulgar ou publicar", e §1º, III, do ECA, em concurso material com o previsto no art. 241-B, do mesmo diploma legal, na modalidade "possuir ou armazenar". Veja-se:


Art. 241. Apresentar, produzir, vender, fornecer, divulgar ou publicar, por qualquer meio de comunicação, inclusive rede mundial de computadores ou internet, fotografias ou imagens com pornografia ou cenas de sexo explícito envolvendo criança ou adolescente: (redação dada pela Lei 11.764/2003)
§ 1º Incorre na mesma pena quem: (Acrescentado pela Lei 11.764/2003)
III - assegura, por qualquer meio, o acesso, na rede mundial de computadores ou internet, das fotografias, cenas ou imagens produzidas na forma do caput deste artigo.
Art. 241-B. Adquirir, possuir ou armazenar, por qualquer meio, fotografia, vídeo ou outra forma de registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente: (Acrescentado pela Lei 11.829/2008)

Desta forma, descabida a tese da defesa no sentido de não haver prova ou indício de que o acusado tenha produzido ou participado da produção de matéria pornográfico infantil, ou que participe de alguma organização criminosa volta a este fim, pois, como explicitado, não são estas as condutas imputadas a ANTÔNIO OMAR.


Também carece de fundamento a assertiva de que nada foi encontrado de ilícito no material examinado e que foi objeto dos laudos de fls. 200/202 e 209/220, pois o fato de que parte do material apreendido não apresentou nada de ilícito não exclui a tipicidade da sua conduta quanto ao material remanescente que, frise-se, foi objeto de perícia na qual foi constada a presença de material pornográfico infanto-juvenil.


Por fim, fora de propósito a alegação de que as testemunhas de defesa e acusação atestaram a inocência do apelante, pois, como é cediço, na avaliação das provas testemunhais, deve o julgador promover um cotejo analítico com as demais provas carreadas aos autos, e lhes atribuir o peso que julgar correto ante a utilização de regras da lógica e da experiência. Ademais, as testemunhas afirmaram que o acusado tem boa índole, é pessoa honesta, bom pai de família, porém nada sabiam a respeito dos fatos a ele imputados.


Ressalte-se que não houve impugnação quanto à dosimetria da pena, razão pela qual deixo de apreciá-la.


Ante o exposto, nego provimento ao recurso de apelação.


É o voto.



SILVIA ROCHA
Juíza Federal Convocada


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Data e Hora: 24/01/2012 12:19:36