Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002929-84.2009.4.03.6106/SP
2009.61.06.002929-1/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOHONSOM DI SALVO
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : CELIA MARIA ALVES reu preso
ADVOGADO : MARINA SILVA REIS
: LUCIENE TELLES
CODINOME : CELIA MARIA ALVES COLABONE
APELADO : OS MESMOS
EXCLUIDO : MARCIO JOSE OMITO
: EZEQUIEL JULIO GONCALVES
REJEITADA DENÚNCIA OU QUEIXA : ANTONIO SABINO DA SILVA
: JOSICLER DE OLIVEIRA PAIVA
: CLEBER HENRIQUE THOMAZINI SILVEIRA
: ANTONIO CARLOS DE OLIVEIRA
: EDIVALDO GOMES PINHEIRO

EMENTA

PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. SENTENÇA "ULTRA PETITA" REDUZIDA AOS LIMITES DA DENÚNCIA. EVIDENCIADA A PRÁTICA DO CRIME TIPIFICADO NO ARTIGO 34 DA LEI Nº 11.343/2006. AUTORIA DELITIVA COMPROVADA. CONJUNTO PROBATÓRIO IDÔNEO E SUFICIENTE PARA ENSEJAR A CONDENAÇÃO DA RÉ. INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS CORROBORADAS PELAS PROVAS ORAIS PRODUZIDAS COM OBSERVÂNCIA ESTRITA AO PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO. IMPOSSIBILIDADE DE REPETIÇÃO DAS PROVAS EM FACE DO DISPOSTO NO ARTIGO 155 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. PEDIDO DE LIBERAÇÃO DE VEÍCULO NÃO CONHECIDO. APELO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PROVIDO. APELO DA RÉ IMPROVIDO.
1. Não se conhece do pleito de fls. 726/727, tendo em vista que o pedido de liberação de veículo é tema estranho ao vertente neste caso e não pode, por isso, ser resolvido no seu âmbito, tendo em vista que a apreensão foi determinada no processo nº 2008.61.06.012503-2.
2. A ré foi denunciada pela prática dos delitos previstos nos artigos 33, §1º, III, 34, 35, "caput", (por duas vezes) c/c art. 40, I, todos da Lei nº 11.343/2006; combinados com os artigos 29 e 69, ambos do Código Penal.
3. Verifica-se que o MM. Juiz "a quo" proferiu sentença "ultra petita" em relação à condenação da ré pelo cometimento do crime tipificado no artigo 33, "caput", da Lei nº 11.343/2006, tendo em vista que este tipo penal não integrou a denúncia do Ministério Público Federal.
4. A pena privativa de liberdade da ré, com o ajustamento da r. sentença à denúncia passa ser de 11 (onze) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 1748 (um mil setecentos e quarenta e oito) dias-multa, no valor de 1/10 do salário mínimo vigente à época dos fatos, mantendo-se o regime inicial fechado.
5. O tipo penal inserto no artigo 34 da Lei nº 11.343/2006, constitui tipo penal autônomo, não sendo subsidiário do tipo penal disposto no artigo 33 da referida Lei.
6. A prática do crime previsto no artigo 34 da Lei 11.343/32006 é induvidosa, tendo em vista que restou provado que a ré contribuiu de maneira ativa na internação de cocaína diluída em óleo diesel e proveniente da Bolívia, bem como que ela franqueou de forma espontânea e consciente a propriedade denominada "Estância Tarumã", do qual era possuidora e administradora, para que se procedesse a guarda da prensa hidráulica necessária ao empacotamento de drogas, bem como de ácido bórico. Apelo do Ministério Público Federal provido.
7. Condena-se a ré a 4 (quatro) anos, 4 (quatro meses) e 15 (quinze) dias de reclusão e 1633 (um mil seiscentos e trinta e três) dias-multa, no valor unitário de 1/10 (um décimo) do salário-mínimo vigente à época dos fatos.
8. A pena da ré após a sua condenação como incursa no artigo 34 da Lei 11.343/2006, totaliza 16 (dezesseis) anos de reclusão em regime inicial fechado e 3.381 (três mil, trezentos e oitenta e um) dias-multa no valor de 1/10 (um décimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos.
9. As provas carreadas aos autos são fruto de extensa e intensa investigação da Polícia Federal levada à efeito no Inquérito Policial nº 2007.61.06.006084-7 instaurado em 30 de abril de 2007. Foram colhidas dentro da estrita legalidade, com autorização judicial, não se podendo cogitar de que estas são imprestáveis para culminar na condenação da ré.
10. O pedido da defesa, relacionado a repetição da prova se mostra impossível em face das circunstâncias em que estas foram colhidas.
11. O MM. Juiz "a quo" procedeu corretamente, em observância ao disposto no artigo 155 do Código de Processo Penal, pois no caso em tela se trata de prova não repetível.
12. A prova produzida na fase inquisitorial é válida, tendo em vista que foi submetida ao contraditório e a ré, à exceção de um, reconheceu no seu interrogatório os diálogos telefônicos de que participou.
13. A alegação de imprestabilidade da prova, por não ser transcrição literal do diálogo, não prospera, pois não apenas as análises mas os respectivos áudios dos diálogos telefônicos foram disponibilizados para as partes durante a instrução processual.
14. A autoria delitiva é incontestável, o robusto conjunto probatório demonstra de maneira irrefragável que a ré participava ativamente da organização criminosa, figurando como responsável pela parte financeira da organização criminosa, atuando na administração de contas bancárias, aquisição de veículos e na administração do Sítio de propriedade de seu irmão, denominado "Estância Tarumã" e localizado na cidade de Uchoa/SP, bem como que foi responsável por intermediar a compra dos dólares que foram utilizados na aquisição da droga boliviana apreendida em 22 de setembro de 2007.
15. Pedido de liberação de veículo não conhecido, sentença "ultra petita" reduzida aos limites da denúncia, apelo do Ministério Público Federal provido e apelo da ré improvido.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conheço do pedido de fls. 726/727, de ofício, excluir a condenação da ré às penas do artigo 33, "caput" da Lei nº 11.343/2006, por ser a sentença "ultra petita" nesse particular e dar provimento à apelação do Ministério Público para condenar a ré CÉLIA MARIA ALVES, como incursa nas penas do artigo 34 da Lei nº 11.343/2006 e negar provimento à apelação da ré, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.



São Paulo, 26 de junho de 2012.
Johonsom di Salvo
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002929-84.2009.4.03.6106/SP
2009.61.06.002929-1/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOHONSOM DI SALVO
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : CELIA MARIA ALVES reu preso
ADVOGADO : MARINA SILVA REIS
: LUCIENE TELLES
CODINOME : CELIA MARIA ALVES COLABONE
APELADO : OS MESMOS
EXCLUIDO : MARCIO JOSE OMITO
: EZEQUIEL JULIO GONCALVES
REJEITADA DENÚNCIA OU QUEIXA : ANTONIO SABINO DA SILVA
: JOSICLER DE OLIVEIRA PAIVA
: CLEBER HENRIQUE THOMAZINI SILVEIRA
: ANTONIO CARLOS DE OLIVEIRA
: EDIVALDO GOMES PINHEIRO

RELATÓRIO

O Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal Johonsom di Salvo, Relator:

Trata-se de apelações criminais interpostas pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e por CÉLIA MARIA ALVES contra a r. sentença de fls. 372/390vº, prolatada pelo MM. Juiz Federal Substituto Alexandre Carneiro Lima, que julgou parcialmente procedente o pedido da denúncia (recebida em dia 12 de junho de 2009 - fl. 217/219vº) para: a) absolver a ré, com fundamento no artigo 386, inciso V, do Código de Processo Penal, em relação ao fato relativo ao 2º flagrante delito de tráfico ilícito de drogas ocorrido durante as investigações, ocorrido no dia 27/07/2007 com apreensão de 41,515 kg de cocaína; b) absolver a ré, com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, da acusação de guarda de máquina para a produção de droga ilícita, tipificado no artigo 34, da Lei nº 11.343/2006; c) absolver a ré, com fundamento no artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal, da acusação relativa a um segundo e autônomo crime de associação para o tráfico ilícito de drogas; d) condenar a ré pela prática do crime previsto no artigo 33, caput, c/c artigo 40, inciso I, ambos da Lei nº 11.343/2006 e artigo 29, do Código Penal, em decorrência do fato relativo a apreensão de cocaína diluída em óleo diesel transportada por Sérgio Custódio Alves no dia 22/09/2007, às penas de 07 (sete) anos, 03 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, e 728 (setecentos e vinte e oito) dias-multa, no valor unitário de 1/10 (um décimo) do salário mínimo; e) condenar a ré pela prática do crime previsto no artigo 33, §1º, inciso III, c/c artigo 40, inciso I, ambos da Lei 11.343/2006, por conta da permissão de uso a Márcio José Omito da propriedade denominada Estância Tarumã para o tráfico transnacional ilícito de drogas, às penas de 07 (sete) anos, 03 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, e 728 (setecentos e vinte e oito) dias-multa, no valor unitário de 1/10 (um décimo) do salário mínimo; f) por fim, condenar a ré pela prática do crime previsto no artigo 35, caput, c/c artigo 40, inciso I, ambos da Lei 11.343/2006, em razão da associação da ré com Márcio José Omito para o tráfico transnacional ilícito de drogas, às penas de 04 (quatro) anos, 04 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, e 1.020 (um mil e vinte) dias-multa, no valor unitário de 1/10 (um décimo) do salário mínimo. Destarte, verifica-se que a pena imposta à ré totalizou 18 (dezoito) anos, 11 (onze) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 2476 dias-multa, no valor de 1/10 do salário mínimo vigente na época dos fatos, tendo sido fixado o regime inicial fechado.

Irresignado, apelou o Ministério Público Federal pugnando pela reforma parcial da r. sentença, para que a ré CÉLIA MARIA ALVES seja condenada como incursa nas penas do artigo 34 da Lei nº 11.343/2006, pois não há dúvida de que ela associou-se com outras pessoas com o intuito de praticar reiteradamente o delito de tráfico internacional de drogas, bem como efetivamente o praticou, pois consentiu que os demais associados utilizassem o local de que detinha a posse e a administração, para o refino e tráfico de cocaína, substância de uso proscrito no Brasil, guardando maquinário destinado a preparação da droga (fls. 392/400).

Contrarrazões apresentadas pela ré às fls. 414/422.

Intimada da r. sentença a ré CÉLIA MARIA ALVES manifestou desejo de apelar (fl. 431), apresentando as razões do seu recurso às fls. 441/461, oportunidade em que pugnou pela reforma da r. sentença, requerendo a sua absolvição ao argumento de que não é acusada de praticar diretamente a ação de importar ou vender droga, não havendo prova de que participou, de forma alguma, de qualquer conduta ilícita. Afirmou, ainda, que a sua condenação baseou-se não nas interceptações telefônicas realizadas e sim nos "comentários" feitos a respeito pelos policiais federais, que seriam meras ilações, interpretações subjetivas, deduções falsas sobre sua conduta e que teriam levado tanto o Ministério Público quanto o Juízo a incidirem no erro que culminou na sua condenação. Aduziu, ainda, que as degravações das conversas telefônicas interceptadas pela Polícia Federal não obedeceram, minimamente, a técnica elementar para tanto recomendada, visto que a degravação não é literal e da forma como foi elaborada encontra-se contaminada por vício que a torna imprestável. Por fim, asseverou que ainda que haja indícios coligidos na fase administrativa cuja interpretação subjetiva poderia, eventualmente, apontar para alguma responsabilidade dela, trata-se de interpretação subjetiva que não resistiria ao crivo do contraditório, visto que os elementos foram coligidos apenas na fase indiciária, não sendo reproduzidos em juízo.

Contrarrazões apresentadas pelo Ministério Público Federal às fls. 470/488.
Parecer da Procuradoria Regional da República, de lavra da Dra. Mônica Nicida Garcia, pelo provimento da apelação criminal interposta pela acusação e pelo desprovimento da apelação criminal manejada pela defesa de CÉLIA MARIA ALVES, a fim de que, mantidas as condenações já impostas, seja parcialmente reformada a r. sentença de primeiro grau e condenada a ré também nas penas do artigo 34 da Lei nº 11.343/2006 (fls. 496/502vº).

Em atenção ao telegrama MCD6T-24495/2010 (fl. 508), da Sexta Turma - STJ, foram prestadas as informações requerida pelo Excelentíssimo Sr. Ministro do E. Superior Tribunal de Justiça, Dr. Hamilton Carvalhido, Relator do Habeas Corpus nº 176109/SP, no qual figura como paciente CÉLIA MARIA ALVES, por meio do Ofício nº 766927 - GABVK (fls. 519/524).

A ré revogou o mandato outorgado aos advogados Antônio Donato, Antônio Roberto Barbosa e, ato contínuo, nomeou as advogadas Marina Silva Reis e Luciene Telles (fl. 530).

A defesa solicitou vista dos autos fora da Subsecretaria pelo prazo de 5 (cinco) dias (fl. 528), o que foi deferido com as devidas cautelas, em face do feito tramitar sob segredo de justiça (fl. 532).

Às fls. 536/ 611 (documentos de fls. 612/716), em peça intitulada "Antecipação de Tutela Recursal", a nova defesa requereu que fosse concedida por decisão monocrática deste Relator a antecipação de tutela recursal, para o fim de declarar-se a nulidade dos atos processuais baseados nas interceptações telefônicas "editadas", com renovação de todos os atos subsequentes, após a realização de perícia judicial para constatação de autenticidade e transcrição integral dos diálogos, garantindo-se que todos os CDs relativos às interceptações telefônicas realizadas e que digam respeito à ré sejam compartilhados com a defesa e acusação mediante fornecimento de mídias.

Se não for esse o entendimento, requer preliminarmente: 1) a decretação de nulidade, a partir do requerimento de fls. 289/290, ordenando-se a expedição de ofício às instituições financeiras onde CÉLIA mantinha conta corrente para que enviem ao Juízo os extratos dos 3 (três) últimos anos; 2) a anulação da sentença proferida por ser ultra petita; 3) a expedição de alvará de soltura por excesso de prazo na formação da culpa. No mérito reitera o pedido de absolvição formulado na oportunidade do oferecimento do apelo. Subsidiariamente, pleiteia: 1) reforma da r. sentença, ou declaração de sua nulidade por inobservância dos critérios estabelecidos no artigo 59 do Código Penal, expedindo-se o competente alvará de soltura; 2) reforma da r. decisão guerreada, fixando-se a pena base no mínimo legal; 3) reforma da r. sentença com o afastamento da qualificadora, pela transnacionalidade do delito e, caso não seja este o entendimento, requer seja utilizada a fração mínima de aumento de pena; 4) a reforma da r. sentença para fins de aplicação, de somente uma das causas de aumento de pena, nos termos do artigo 68 do Código Penal; 5) reforma da r. sentença para fins de diminuição da reprimenda, nos termos do §4º, do artigo 33, da Lei nº 11.343/06; 6) reforma da r. sentença para que, de ofício, modifiquem o regime de cumprimento de pena imposto, 7) liberação dos bens apreendidos em posse da apelante, eis que não foram adquiridos ou fazem parte de qualquer ilícito.

Às fls. 719/720, a Procuradoria Regional da República afirmou que o pleito formulado é inadequado, eis que carece de amparo legal, e inoportuno, porque a questão da liberdade da apelante já foi amplamente discutida nos autos; a alegação de excesso de prazo na formação da culpa não procede ante a complexidade do caso - tráfico internacional de grande vulto realizado por diversas operações criminosas (Operação Alfa) - e também porque nos termos da Súmula 52/STJ, tal alegação seria cabível apenas até o término da instrução, encontrando-se, por ora, no mínimo, superada; bem como que a questão da interceptação telefônica foi bem discorrida na sentença, que consignou: "a prova de interceptação de comunicações telefônicas produzida durante a fase inquisitorial, além de válida, foi posteriormente submetida a contraditório, havendo a ré, à exceção de um, reconhecido em interrogatório os diálogos telefônicos de que participou. Não há cogitar de repetição da prova, ante sua impossibilidade, consoante dispõe o art. 155 do CPP, com a redação dada pela Lei nº 11.690/2008. Também não há, como alega a defesa (fls. 363), imprestabilidade da prova de interceptação de comunicações telefônicas por não haver transcrição literal dos diálogos. Ora, não apenas as análises, mas os respectivos áudios dos diálogos telefônicos também estão nos autos e podem ser ouvidos, quer pelas partes, quer pelo Juízo, para sua perfeita compreensão e convencimento, como de fato ocorreu durante o interrogatório e pode ocorrer durante o exercício da acusação, da defesa e também no momento do julgamento" (fls. 375vº). Ressalta que o presente requerimento apenas reitera os termos do recurso de apelação da defesa e, que as fotos juntadas às fls. 707/716, a pretexto de pretender comprovar ser a apelante pessoa dedicada à família, em nada elide o robusto conjunto probatório produzido nos autos, além de expor desnecessariamente pessoas não ligadas ao caso, inclusive crianças.

Em face do arrazoado da defesa exarei decisão do seguinte teor:

"Mantenho nos autos as fotografias de fls. 707/716, diante do artigo 231 do Código de Processo Penal, para consideração oportuna se for o caso.
Não existe no âmbito do Processo Penal espaço jurídico para o relator de apelação anular, monocraticamente, ação penal, ainda mais que as alegações formuladas pela nova defensoria da ré devem ser avaliadas no momento correto da apreciação da prova colhida nos autos, que é o julgamento pelo colegiado (1ª Turma). O mesmo vale para o pedido de anulação da sentença proferida por ser ultra petita.
Indefiro o pleito de "expedição de ofício às instituições financeiras onde CÉLIA mantinha conta corrente para que enviem ao Juízo os extratos dos 3 (três) últimos anos", porque estamos em sede de apelação onde não há como "abrir-se" uma instrução posterior à sentença pois o artigo 616 do Código de Processo Penal, como regra excepcional que é, só pode ser interpretada restritivamente; não é direito subjetivo do réu (RT 762/596), ainda mais daquele que possuiu defensor constituído que não cogitou oportuno tempore da diligência pretendida pela nova defesa, ainda mais que a providência sequer está justificada.
Não há que se cogitar de exame de excesso de prazo (Súmula 52/STJ).
Tudo o mais que consta de fls. 536/716 repete os termos do apelo da ré, ou, quando não, é matéria de dosimetria da pena e dispositivo da sentença, que será analisada dentro dos rigores da lei processual penal, não se cogitando de ato monocrático do relator que, in casu, seria inoportuno e ilegal.
Aguarde-se a inclusão em pauta." (fls. 722/723vº)

Às fls. 726/727 (documentos de fls. 728/731), a defesa requereu fosse liberada a restrição à circulação de um veículo pertencente a ré para fins de percebimento de indenização junto à companhia seguradora, em função deste haver sido furtado.

Aberta vista ao Ministério Público Federal, este ressaltou que o pedido de liberação requerido é tema estranho ao vertente neste caso e não pode, por isso, ser resolvido no seu âmbito, tendo em vista que a apreensão foi determinada no processo nº 2008.61.06.012503-2 (fl. 734).

Por fim, esclareço que a apelante CÉLIA MARIA ALVES COLABONI em face da averbação de sua separação judicial (fl. 291vº), voltou a utilizar o seu nome de solteira CÉLIA MARIA ALVES.

É o relatório.

À revisão, na forma regimental.



Johonsom di Salvo
Desembargador Federal


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Data e Hora: 10/05/2012 15:07:20



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002929-84.2009.4.03.6106/SP
2009.61.06.002929-1/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOHONSOM DI SALVO
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : CELIA MARIA ALVES reu preso
ADVOGADO : MARINA SILVA REIS
: LUCIENE TELLES
CODINOME : CELIA MARIA ALVES COLABONE
APELADO : OS MESMOS
EXCLUIDO : MARCIO JOSE OMITO
: EZEQUIEL JULIO GONCALVES
REJEITADA DENÚNCIA OU QUEIXA : ANTONIO SABINO DA SILVA
: JOSICLER DE OLIVEIRA PAIVA
: CLEBER HENRIQUE THOMAZINI SILVEIRA
: ANTONIO CARLOS DE OLIVEIRA
: EDIVALDO GOMES PINHEIRO

VOTO

O Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal Johonsom di Salvo, Relator:

No que tange ao pedido de liberação de veículo, na esteira do parecer do Ministério Público Federal, não conheço do pleito de fls. 726/727 tendo em vista que o pedido de liberação requerido é tema estranho ao presente caso e não pode, por isso, ser resolvido no seu âmbito, tendo em vista que a apreensão foi determinada no processo nº 2008.61.06.012503-2.


A ré CÉLIA MARIA ALVES foi denunciada pela prática dos delitos previstos nos artigos 33, § 1º, III, 34, 35, "caput", (por duas vezes) c/c art. 40, I, todos da Lei nº 11.343/2006; combinados com os artigos 29 e 69, ambos do Código Penal.


Contudo o MM. Juiz "a quo" a condenou pelos seguintes crimes: 1) pela prática do crime previsto no artigo 33, caput, c/c artigo 40, inciso I, ambos da Lei nº 11.343/2006 e artigo 29, do Código Penal, em decorrência do fato relativo a apreensão de cocaína diluída em óleo diesel transportada por Sérgio Custódio Alves no dia 22/09/2007, às penas de 07 (sete) anos, 03 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, e 728 (setecentos e vinte e oito) dias-multa, no valor unitário de 1/10 (um décimo) do salário mínimo; 2) pela prática do crime previsto no artigo 33, §1º, inciso III, c/c artigo 40, inciso I, ambos da Lei 11.343/2006, por conta da permissão de uso a Márcio José Omito da propriedade denominada Estância Tarumã para o tráfico transnacional ilícito de drogas, às penas de 07 (sete) anos, 03 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, e 728 (setecentos e vinte e oito) dias-multa, no valor unitário de 1/10 (um décimo) do salário mínimo; 3) pela prática do crime previsto no artigo 35, "caput" c/c artigo 40, inciso I, ambos da Lei 11.343/2006, em razão da associação da ré a Márcio José Omito para o tráfico transnacional ilícito de drogas, às penas de 04 (quatro) anos, 04 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, e 1.020 (um mil e vinte) dias-multa, no valor unitário de 1/10 (um décimo) do salário mínimo. Destarte, verifica-se que a pena imposta à ré totalizou 18 (dezoito) anos, 11 (onze) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 2476 dias-multa, no valor de 1/10 do salário mínimo vigente à época dos fatos, tendo sido fixado o regime inicial fechado.


Na medida em que a denúncia, conforme sua narrativa, atribuiu à ré CÉLIA MARIA ALVES somente os delitos previstos nos artigos 33, § 1º, III, 34, 35, "caput", (por duas vezes) c/c art. 40, I, todos da Lei nº 11.343/2006; combinados com os artigos 29 e 69, ambos do Código Penal, verifica-se que a sentença é "ultra petita" em condená-la em decorrência do fato relativo a apreensão de cocaína diluída em óleo diesel transportada no dia 22/09/2007, impondo-lhe as penas do artigo 33, "caput", da Lei nº 11.343/2006.


Não é caso de se reconhecer a nulidade da sentença como um todo. O que ocorreu, de fato, foi um julgamento "ultra petita" na medida em que a condenação abarcou fato não imputado à ré.


Destarte, conclui-se que a condenação não poderá ir além dos limites da denúncia, circunstância que embora não eive de nulidade absoluta o "decisum", interfere no cômputo total da pena aplicada, em virtude do cúmulo material dos crimes (artigo 69 do Código Penal).


Nesse sentido, destaco o entendimento da Segunda Turma desta Egrégia Corte:


PENAL E PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO TRANSNACIONAL DE COCAÍNA. SENTENÇA ULTRA PETITA. REDUÇÃO AOS TERMOS DA DENÚNCIA. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. CONDENAÇÃO MANTIDA. DOSIMETRIA DA PENA. TRANSNACIONALIDADE DO TRÁFICO. CRIME REALIZADO EM TRANSPORTE PÚBLICO. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA PREVISTA NO § 4º DO ARTIGO 33 DA LEI N.º 11.343/2006. RÉUS QUE REVELAM DEDICAÇÃO AO TRÁFICO. SENTENÇA PARCIALMENTE MODIFICADA. 1. Se a sentença condena o réu pela prática do fato narrado na denúncia e, também, por outro não descrito, tem-se sentença ultra petita, que deve ser reduzida aos termos da acusação. 2. Comprovados a materialidade, a autoria e o dolo do crime de tráfico ilícito de drogas, é de rigor manter-se a condenação decretada em primeiro grau de jurisdição. 3. A causa de aumento prevista no inciso I do artigo 40 da Lei n.º 11.343/2006 configura-se independentemente da efetiva transposição das fronteiras, bastando que, pelas circunstâncias, se evidencie a transnacionalidade do tráfico. 4. Se o réu vale-se de transporte público para a prática do crime de tráfico ilícito de drogas, merece a causa de aumento de pena prevista no inciso III do artigo 40 da Lei n.º 11.343/2006, majorante que se configura ainda que o agente não pretenda distribuir a droga naquele local. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça e desta Turma. 5. Se o passaporte do réu revela outra viagem internacional relativamente recente, realizada desde a Europa e até o Peru e com custo incompatível com suas modestas condições econômicas, é dado concluir que se dedique ao tráfico, circunstância que por si só lhe subtrai o direito à redução de pena prevista no § 4º do artigo 33 da Lei n.º 11.343/2006. 6. Recurso defensivo parcialmente provido, ao fim de reduzir a pena-base. 7. Recurso ministerial provido, para a aplicação da causa de aumento de pena prevista no inciso III do artigo 40 da Lei n.º 11.343/2006; e para o afastamento da causa de diminuição de pena contemplada no § 4º do artigo 33 da Lei n.º 11.343/2006.(ACR 200761190098656, DESEMBARGADOR FEDERAL NELTON DOS SANTOS, TRF3 - SEGUNDA TURMA, DJF3 CJ1 DATA:11/11/2010 PÁGINA: 260.)

Trago à colação, ainda, apesar de vetusto, o julgamento emanado do Supremo Tribunal Federal, uma vez que se amolda perfeitamente ao caso em tela:


SENTENÇA CONDENATÓRIA. EXTRA PETITA. DEFESA (PREJUÍZO). FATO NÃO CONTIDO NA DENÚNCIA. CIRCUNSTÂNCIA AGRAVANTE. LEI 6.368/76, ART. 18, IV. -IMPLICA EM DECISÃO "EXTRA PETITA A INCLUSÃO NA CONDENAÇÃO DE CIRCUNSTÂNCIA QUALIFICADORA E EXACERBADORA DA PENA, NÃO ARTICULADA NA DENUNCIA, DE MANEIRA A SURPREENDER A DEFESA. RECURSO DE "HABEAS CORPUS" PROVIDO, EM PARTE.
(RHC 60987, RAFAEL MAYER, STF)

Assim, evidente a inobservância do princípio da correlação entre a imputação e a sentença; pelo que, de ofício, excluo a condenação da ré CÉLIA MARIA ALVES pela prática do delito tipificado no artigo 33, "caput", da Lei nº 11.343/2006, tendo em vista que tal imputação não fez parte da denúncia.


Verifica-se, assim, que a pena privativa de liberdade da ré, com o ajustamento da r. sentença à denúncia, neste momento passa ser de 11 (onze) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 1748 (um mil setecentos e quarenta e oito) dias-multa, no valor de 1/10 do salário mínimo vigente à época dos fatos, mantendo-se o regime inicial fechado.


A partir disso deverão ser apreciadas as demais alegações das partes.


Os fatos narrados na denúncia são decorrentes da investigação policial de codinome "Operação Alfa", realizada no Inquérito Policial e Procedimentos Criminais Diversos de números 2007.61.06.006084-7, 2007.61.06.004141-5 e 2008.61.06.012502-0.


O Inquérito Policial nº 2007.61.06.006084-7 foi instaurado em 30 de abril de 2007 a partir de uma representação da Autoridade Policial solicitando quebra de sigilo telefônico de diversas pessoas (autos nº 2007.61.06.004141-5), diante da notícia de que um traficante da cidade de Campo Grande/MS estaria negociando drogas com os usuários de telefones situados na região de São José do Rio Preto/SP.


No transcurso das investigações os policiais constataram que a droga comercializada era cocaína proveniente da Bolívia e internada no Brasil por quatro organizações criminosas, supostamente lideradas por Luiz Carlos Galha e Carlos Rodrigues Galha, Lourival Máximo da Fonseca, Márcio José Omito e Luiz Carlos Risaldi Jara.


Diante do enorme número de investigados (mais de cem pessoas), o Ministério Público Federal ofereceu três denúncias, uma para cada organização, e uma manifestação para a Justiça Estadual (núcleo liderado por Luiz Carlos Risaldi Jara), no intuito de evitar o tumulto na instrução processual e não prolongar em demasia a instrução do feito, notadamente porque a grande maioria dos indiciados estava presa.


Os presentes autos referem-se a denúncia oferecida contra os oito integrantes do grupo liderado por Marcio José Omito, que destaco: Márcio José Omito, Célia Maria Alves, Antonio Sabino de Silva, Ezequiel Júlio Gonçalves, Edivaldo Gomes Pinheiro, Josicler de Oliveira Paiva, Cleber Henrique Thomazini Silveira e Antonio Carlos de Oliveira.


Segundo apurado nas investigações, o núcleo de Márcio José Omito era voltado para o tráfico internacional de drogas, notadamente a cocaína, de procedência boliviana.


A cocaína era internada no país a partir da cidade de Corumbá/MS e transportada para o Estado de São Paulo em caminhões e carretas, diluída em óleo diesel e colocada em um dos tanques de alimentação desses veículos, adredemente preparados, sendo posteriormente decantada em um laboratório clandestino existente no sítio localizado na cidade de Uchoa/SP - "Estância Tarumã".


CÉLIA MARIA ALVES foi denunciada porque, na qualidade de integrante da organização criminosa liderada por Márcio José Omito, teria sido a responsável pela importação e venda da cocaína apreendida no 2º e 4º flagrantes da denominada "Operação Alfa", consentindo que os demais associados utilizassem local de que detinha a posse e administração para o refino e tráfico de cocaína ("Estância Tarumã"), bem como guardando maquinário e substâncias destinadas à preparação da droga no referido sítio.


Constou da denúncia que CÉLIA MARIA ALVES franqueava a utilização do sítio de propriedade de seu irmão Joel Custódio Alves Filho (preso na Suíça por tráfico de drogas), denominado "Estância Tarumã", localizado na cidade de Uchoa/SP, do qual era administradora, para a instalação de uma base de refino de cocaína, sendo no local apreendida uma prensa hidráulica, uma forma e produtos químicos, nos quais a perícia encontrou vestígios de cocaína.


Registrou, também, que CÉLIA participava ativamente dos negócios da organização criminosa, em especial da parte financeira, sendo apurado que teria informado a Márcio José Omito sobre um doleiro de São Paulo que teria vendido para um terceiro cerca de cem mil dólares a um lucro de oito centavos de real por dólar, devendo Márcio contatar tal doleiro para que uma futura aquisição de dólares pela quadrilha pudesse se dar pelo mesmo preço.


Apurou-se, ainda, que Célia emprestava contas bancárias para circulação do dinheiro proveniente do tráfico e foi a responsável por intermediar a compra dos dólares que foram utilizados na aquisição da droga boliviana.


Durante o deslocamento da quadrilha para o Estado de Mato Grosso do Sul e de lá para a Bolívia, no qual foram presos Márcio José Omito, Juraci Marques e Souza e Sérgio Custódio Alves, a ré CÉLIA foi apontada como a responsável pelo suprimento financeiro da quadrilha, bem como pelo monitoramente da operação e transporte da droga para o Estado de São Paulo/SP.

Após a prisão de Márcio, Juraci e Sérgio, constou que CÉLIA se comunicava com um dos integrantes de outra organização criminosa, Ezequiel Júlio Gonçalves (vulgo "Kia"), tendo ambos demonstrado pleno conhecimento das atividades ilícitas realizadas no sítio de Uchoa/SP, utilizado pela quadrilha para processamento, preparo e guarda da droga.


Ainda, visando livrar-se da investigação policial, observou-se que CÉLIA por várias vezes teria mencionado a necessidade de instruir o caseiro Antonio Sabino, que iria novamente prestar depoimento.


Narrou, também, que o depoimento de CÉLIA havia sido previamente acertado com Márcio Omito, mesmo ele estando preso.


Por fim, constou que outra atividade exercida por CÉLIA após a prisão de seus comparsas foi a ocultação do patrimônio de seu irmão Joel Custódio Alves Filho e dos demais membros da organização criminosa que participava.


É a síntese da denúncia.


Destarte, passo à análise do recurso apresentado pelo Ministério Público Federal, o qual pugna pela reforma da sentença para que a ré CÉLIA MARIA ALVES seja condenada como incursa nas penas do artigo 34 da Lei nº 11.343/2006, por haver guardado no sítio "Estância Tarumã" maquinário consistente em uma prensa hidráulica e ácido bórico, nos quais foram constatados vestígios de cocaína.


Inicialmente, cumpre destacar que o tipo penal inserto no artigo 34 da Lei nº 11.343/2006, constitui delito autônomo, não sendo, de forma nenhuma, subsidiário do tipo penal disposto no artigo 33 da referida Lei.


Neste sentido, destaco o escólio do eminente jurista Guilherme de Souza Nucci, in Leis penais e processuais penais comentadas / Guilherme de Souza Nucci. - 2. ed. Ver. Atual. E ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. p. 332/333:


"98. Figura autônoma e delito equiparado a hediondo: não se trata de tipo subsidiário ao art. 33 (antigo artigo 12 da Lei nº 6.368/76), de modo que, aplicado este desapareceria o crime do art. 34 (antigo art. 13 da Lei nº 6.368/76). São figuras distintas e, igualmente importantes. Se o agente, por exemplo, importar maconha e fabricar, no Brasil, cocaína, deve responder por dois delitos. Não há nenhum fundamento, em nosso entendimento, nem sequer de política criminal, para haver a absorção do delito do art. 34 pelo crime previsto no art. 33, de forma que se afasta a subsidiariedade. Por outro lado, os dois são igualmente relevantes, razão pela qual também não deve haver, como já mencionado, a absorção. Cuida-se de autêntico concurso material de crimes."

Nesse sentido é o entendimento desta Primeira Turma:


APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES. CONDENAÇÃO. TRÂNSITO EM JULGADO. ARTIGO 35 DA LEI Nº 11.343/06. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. INEXISTÊNCIA DE ESTABILIDADE E PERMANÊNCIA. AJUSTE OCASIONAL. ABSOLVIÇÃO DOS RÉUS. ARTIGO 34 DA LEI Nº 11.343/06. INSTRUMENTOS PARA PREPARAÇÃO DE DROGAS. CRIME AUTÔNOMO. CONDENAÇÃO. DOSIMETRIA DA PENA PARCIALMENTE REFORMADA. APELAÇÃO DOS RÉUS PARCIALMENTE PROVIDAS.
1. Corréus foram denunciados como incursos nas sanções dos artigos 33, caput, combinado com o artigo 40, inciso I, e artigo 35, caput, todos da Lei 11.343/2006, por se associarem, de modo permanente e estável, para adquirir e importar cocaína (4,139 Kg), oriunda da Bolívia, sem autorização legal ou regulamentar. Apenas um dos réus também foi denunciado pela prática do artigo 34 da mesma lei, por possuir objetos destinados à transformação e ao preparo de drogas
2. No mérito, para ambos os réus, a condenação para o crime de tráfico de drogas transitou em julgado.
3. Crime do artigo 35 da Lei 11.343/2006. Associação para o tráfico. As provas coligidas aos autos não indicam a existência de uma associação estável e permanente para o tráfico de entorpecentes, requisitos estritamente necessários para a configuração do delito. Houve apenas ajuste ocasional entre os corréus. Reforma da decisão para absolver os acusados.
4. Crime do artigo 34 da Lei 11.343/2006. Autoria e materialidade comprovadas. Tal modalidade criminosa não figura como tipo subsidiário do artigo 33 da lei de drogas, mas crime autônomo. Condenação mantida.
5. Dosimetria da pena parcialmente reformada.
6. Crime de tráfico. Pena base reduzida de ambos os réus. Processos que geraram condenação do réu somente devem ser considerados em uma única circunstância, no caso, na segunda fase de aplicação da pena
7. Reconhecimento de atenuante (confissão), a pedido do parquet. Diante da existência de agravante (reincidência) e atenuante (confissão), consoante a dicção do artigo 67 do Código Penal, a agravante da reincidência demonstra-se preponderante em relação à atenuante.
8. Pena base do crime do artigo 34 da Lei 11.343/2006 reduzida. Mantida a circunstância agravante da reincidência. Afastada a aplicação da causa de aumento de pena da internacionalidade.
9. Artigo 33 § 4º do Código Penal. Não aplicação. Dedicação à atividade criminosa.
10. Apelação dos réus parcialmente providas.(ACR 00093854820074036000, Desembargadora Federal Vesna Kolmar, TRF3 - PRIMEIRA TURMA, DJF3 CJ1 DATA:04/10/2011) (negritei)

A prática do crime previsto no artigo 34 da Lei 11.343/2006 é induvidosa, tendo em vista que restou provado que a ré CÉLIA contribuiu de maneira ativa na operação criminosa que culminou na internação de cocaína diluída em óleo diesel e proveniente da Bolívia, bem como que ela franqueou de forma espontânea e consciente a propriedade denominada "Estância Tarumã", do qual era possuidora e administradora, para que se procedesse a guarda da prensa hidráulica necessária ao empacotamento de drogas e ácido bórico.


As interceptações telefônicas afastam qualquer dúvida quanto a essa ocorrência, conforme se extrai das transcrições a seguir:


"Índice .............................:9579538
Operação .........................: SJE-ALFA
Nome Alvo......................: CÉLIA - LIG. AO MÁRCIO
Fone Alvo .......................: 1781153324
Localização do Alvo........:
Fone Contato....................: @@
Localização do Contato ....:
Data ..........................: 25/09/2007
Horário......................: 13:17:19
Observações .............: R8 @@@@ CÉLIA X HNI (KIA)
Transcrição................: HNI diz que quer saber sobre o depoimento. Célia diz que já saiu até no jornal que o sítio servia para refino. HNI diz que eles tem que provar. Célia diz que mandou o advogado para defender, falar que ela alugou pra ele lá uma semana para ele passear, que eles não tem nada a ver com isso. Diz que o que foi levado qualquer pessoa pode ter, que levaram acetona, máquina, fotos e que foi lacrado. HNI diz que precisa ver o que era. HNI pergunta o que o Antônio falou. Célia diz que ele está em pânico. Que falou que nunca viu nada, que nunca foi ninguém lá. Que ele desconfiou de alguma coisa." (fl. 22vº)
"Índice ...................: 9579590
Operação ................: SJE-ALFA
Nome Alvo..............: CÉLIA - LIG. AO MÁRCIO
Fone Alvo .......................: 1781153324
Localização do Alvo........:
Fone Contato....................: @@
Localização do Contato ....:
Data ..........................: 25/09/2007
Horário......................: 13:22:39
Observações .............: R8 @@@@ CCA CÉLIA X HNI (KIA)
Transcrição ...............: Célia diz que eles tiraram tudo do lugar e não acharam nada e que eles levaram a prensa e os líquidos, as formas, mais acetona e outra coisa que ela não sabe dizer. HNI diz que lá não existia nada que comprometa. Célia diz que eles lacraram o barracão e perguntaram sobre uma mudança. Diz que seu Antônio falou que ela administrava mas que ia muito pouco. Falou que a pessoa para quem ela alugou também ia muito pouco, nunca dormiu lá. Célia diz para HNI não passar nem na porta. HNI diz que é bom ler o depoimento do Antônio e do tio do rapaz (Juraci). Célia diz que se HNI conseguir mandar alguma coisa para ela... HNI diz que amanhã ele já consegue." (fl. 22vº)
"Índice ...................: 9588659
Operação ................: SJE-ALFA
Nome Alvo..............: CÉLIA - LIG. AO MÁRCIO
Fone Alvo .......................: 1781153324
Localização do Alvo........:
Fone Contato....................:
Localização do Contato ....:
Data ..........................: 26/09/2007
Horário......................: 09:11:20
Observações .............: R8 @@@ CÉLIA X KIA
Transcrição ...............: HNI pede para Célia cobrar do advogado o depoimento. Célia diz que no jornal sai que o caseiro do sítio foi investigado e alegou que não viu nada e não teve participação. Célia diz que o outro irmão tem um sítio e que a polícia chegou lá ontem de madrugada. Diz que o sítio tá no nome da cunhada dela. Diz que eles reviraram tudo e não acharam nada. Diz que a cunhada que mora em Hortolândia pegou a menina uma hora da manhã e saiu com medo. HNI diz que eles (PF) só tão fazendo isso porque não vai ter jeito de fechar o inquérito. Diz que eles só fecham o inquérito com prova senão não vira processo. Célia diz que o delegado não deixou ver pois está em segredo e tem mais pessoas suspeitas. HNI diz que eles não vão conseguir provar nada. Célia diz que o material apreendido foi uma prensa, éter, ácido bórico e mais não sabe o que. HNI diz que ácido bórico usa-se na plantação de café, que compra em qualquer lugar. Diz que éter não existia lá. Célia pede para ele mandar alguma coisa pois ela está sem nenhum real. HNI diz que foi buscar um dinheiro ontem e na hora que eles jogaram lá a Federal prendeu o cara." (fls. 22vº/23).
"Índice ...................: 9589520
Operação ................: SJE-ALFA
Nome Alvo..............: CÉLIA - LIG. AO MÁRCIO
Fone Alvo .......................: 1781153324
Localização do Alvo........:
Fone Contato....................:
Localização do Contato ....:
Data ..........................: 26/09/2007
Horário......................: 10:19:27
Observações .............: R8 @@@ CÉLIA X KIA
Transcrição ...............: Célia pergunta em que a prensa pode ser utilizada. HNI diz que ela pode ser usada para tirar rolamento. Célia pergunta se oficina de funilaria não. HNI diz que em oficina de tornearia, para tirar rolamento. Célia que tinha uma firma que fechou faz e um ano e tinha torno, tinha tudo e por isso ela pode falar que era dela. HNI fala para Célia argumentar bem argumentado para não ter problema. Célia diz que estão estudando o que vai ser feito pois alguém vai ter que aparecer como dono dessa máquina. Célia diz que se falar que é do Márcio este vai falar o que? HNI diz que eles não vão ter prova concreta. HNI diz que está preocupado com o que eles conversaram ontem. Célia pergunta para que serve o ácido bórico, se para lavar pedra ou alguma coisa. HNI diz que é pra matar formiga no cafezal. Célia diz que lá não tem café. HNI que é pra falar que só estava guardado no sítio. Célia pergunta se não tem éter pois na foto do jornal tem dois galões azul. HNI diz que um galão tem um resto de água suja. Célia pergunta se fizer uma filtragem não vai achar nada. HNI diz que tem que ser muito, muito, muito, consta alguma. Célia pergunta pelo saco com pó branco. HNI diz que é ácido bórico. Célia diz que eles vão mantendo HNI informado." (fls. 23/23vº)

"Índice ...................: 9589716
Operação ................: SJE-ALFA
Nome Alvo..............: CÉLIA - LIG. AO MÁRCIO
Fone Alvo .......................: 1781153324
Localização do Alvo........:
Fone Contato....................:
Localização do Contato ....:
Data ..........................: 26/09/2007
Horário......................: 10:35:02
Observações .............: R8 @@@ CÉLIA X KIA
Transcrição ...............: HNI diz para Célia que pode ser usado para botar em pé de coqueiro. Que ela pode falar que pode ser usado em folhagem de café e pé de coqueiro. HNI diz que uma prensa não incrimina ninguém. Célia pergunta se eles fizerem uma geral, passar produto, se não vai ter vestígio de nada. HNI diz que não, que um galão azul está vazio e o outro é só água. HNI diz para Célia não ficar ligando com esse celular para qualquer lado." (fl. 23vº)
"Índice ...................: 9554632
Operação ................: SJE-ALFA
Nome Alvo..............: CÉLIA
Fone Alvo .......................: 1781111554
Localização do Alvo........:
Fone Contato....................: 1981232243
Localização do Contato ....:
Data ..........................: 22/10/2007
Horário......................: 15:37:30
Observações .............: R10 @@@ HNI (KIA?) X CÉLIA
Transcrição ...............: Pergunta se CÉLIA foi lá. CÉLIA diz que foi, mas que pra ela não deve ter nada. CÉLIA diz que mandaram um recado para HNI, daquele carrinho lá, que é para ele ir lá e tirar aquela parte de baixo que fica perto do tanque, porque o pessoal sabe quem comprou e derrepente pega alguém assim, vai juntar tudo. Que é para evitar usar aquilo lá, porque eles já tem a informação. HNI pergunta de qual CÉLIA está falando. CÉLIA diz que é da Pampa ou Saveiro azul ou verde, pick-up. Diz que é para evitar, porque eles já sabem quem comprou, porque o recibo tá lá ainda. CÉLIA diz que seu ANTÔNIO (caseiro) falou um monte, mas nada de nome. CÉLIA diz que está morrendo de medo de perder lá. CÉLIA diz que era para ele (ANTÔNIO) ter despachado aquele material lá, os galões, posto fogo, porque ele sabia o que tinha aquilo. HNI diz que eles (FEDERAL) vão ter que apurar aquilo lá. CÉLIA diz que sabe, mas um estava vazio e o outro cheio. HNI que diz que (o cheio) tinha muita água suja, porque foi ele que colocou. CÉLIA diz que fechou o negócio sexta-feira . CÉLIA diz que a chácara está lacrada, mas o seu ANTÔNIO está lá. Diz que ele (ANTÔNIO) deve ser ouvido de novo, porque ele falou que recebia uns R$ 100,00 para ficar quieto, que viu pó branco secando no sol, que fez umas caixas de madeira para o irmão de CÉLIA, que tinha gente hospedada lá. CÉLIA diz que um dia antes, ela esteve lá para conversar com ele (ANTÔNIO). HNI diz que vai estar "aí" daqui uns dias e aí eles conversam pessoalmente. CÉLIA diz que esteve lá visitando eles (MÁRCIO E SÉRGIO) e eles mandaram esse recado para HNI, tomar cuidado porque eles já tem informação desse carro. HNI diz que uns dias vai melhorar." (fl. 23vº/24)
"Índice ...................: 9817941
Operação ................: SJE-ALFA
Nome Alvo..............: CÉLIA - LIG. AO MÁRCIO
Fone Alvo .......................: 1781153324
Localização do Alvo........:
Fone Contato....................: 1781393512
Localização do Contato ....:
Data ..........................: 12/10/2007
Horário......................: 08:12:33
Observações .............: R10 @@@ MÃE X CÉLIA
Transcrição ...............: CÉLIA disse que FLÁVIA falou com o advogado e este falou que eles (polícia federal) tinha que investigar, eles já ouviram, que ela estaria fora. Célia diz que o único que será ouvido novamente é o seu ANTÔNIO, que ele tem que ser bem instruído para não colocar tudo a perder." (fl. 24)
"Índice ...................: 9972118
Operação ................: SJE-ALFA
Nome Alvo..............: CÉLIA
Fone Alvo .......................: 1781111554
Localização do Alvo........:
Fone Contato....................:
Localização do Contato ....:
Data ..........................: 24/10/2007
Horário......................: 09:08:38
Observações .............: R10 @@@ CÉLIA X FLÁVIA
Transcrição ...............: CÉLIA pergunta se FLÁVIA soube de alguma coisa. FLÁVIA diz que não, que só sabe que o JURACI deveria sair ontem à noite.FLÁVIA diz que o advogado tem que conversar com o caseiro, porque ele vai ser ouvido de novo. CÉLIA diz que vai junto. FLÁVIA diz que ELISÂNGELA vai falar com o cara da carreta e que o LÚCIO vai ser ouvido por causa da saveiro. CÉLIA diz a FLÁVIA que ELISÂNGELA pode contar com ela se precisar de cheque para descontar. FLÁVIA diz que ELISÂNGELA foi no agiota e este fechou a porta na cara dela. Telefone do sítio onde CÉLIA está - 17.8139.3512." (fl. 24)
"Índice ...................: 10416085
Operação ................: SJE-ALFA
Nome Alvo..............: CÉLIA
Fone Alvo .......................: 1781111554
Localização do Alvo........:
Fone Contato....................:
Localização do Contato ....:
Data ..........................: 03/12/2007
Horário......................: 15:16:36
Observações .............: R13 @@@ SEU ANTÔNIO X CÉLIA
Transcrição ...............: Seu Antônio diz que recebeu uma intimação. Célia diz que é para testemunharem em defesa do Juraci, "é para dizer que a gente não conhece ele." (fl. 24vº)
"Índice ...................: 10060145
Operação ................: SJE-ALFA
Nome Alvo..............: CÉLIA
Fone Alvo .......................: 1781111554
Localização do Alvo........:
Fone Contato....................:
Localização do Contato ....:
Data ..........................: 31/10/2007
Horário......................: 11:23:32
Observações .............: R11 @@@ CÉLIA X KIA
Transcrição ...............: Célia pergunta se tem como Kia vir pra cá. Kia diz que esses dias está resolvendo uma situação de parte financeiro, pois "surgiu tudo daí". Célia diz que foram lá no sítio e pegaram o "negócio". Célia diz que o caseiro falou que foram os "homens", mas ela acha que não. Célia diz que os homens fizeram o caseiro desenterrar. Célia diz que ficou sabendo na segunda-feira quando ela foi falar com o caseiro e este lhe disse. Diz que os caras chegaram lá ameaçando o caseiro e fizeram-no desenterrar." (fl. 24vº).
"Índice ...................: 10060190
Operação ................: SJE-ALFA
Nome Alvo..............: CÉLIA
Fone Alvo .......................: 1781111554
Localização do Alvo........:
Fone Contato....................:
Localização do Contato ....:
Data ..........................: 31/10/2007
Horário......................: 11:26:31
Observações .............: R11 @@@ CÉLIA X KIA
Transcrição ...............: Célia diz que a Elisângela deu o carro dela pro advogado e está a pé. Kia pergunta quem foram as pessoas que foram no sítio pegar o negócio. Célia diz que o caseiro falou que foi um delegado e um policial. Kia diz que é mentira. Célia diz que falou para o caseiro que isso vale dinheiro e tem dono. Diz que foi na hora contar para a Elisângela. Célia diz que precisa arrumar um dinheiro para pagar um cheque dela que está com o cara da carreta, pois este quer preencher o recibo no nome dela e ela não pode aparecer. Célia pergunta quando ele vem. Kia diz que fora a próxima semana, na outra. Célia pergunta se antes disso ele não consegue algum dinheiro. Kia diz que semana que vem ele consegue.

Destarte, das transcrições acima se verifica que CÉLIA tinha pleno conhecimento da guarda da prensa hidráulica e de produtos químicos no barracão da "Estância Tarumã". Nota-se que ela sempre teve o domínio da situação, controlava de perto o andamento do inquérito policial.


Destaco que a ré agia de forma ardilosa e premeditada, intentava "manipular" o depoimento do caseiro Antônio, para que este dissesse às autoridades policiais somente o que convinha ao grupo criminoso.


No caso em exame estamos diante de ré com alto grau de instrução, professora universitária, com sólida formação pedagógica, que exercia a função de "Assessora Pedagógica" no Município de Urupês/SP. Assim, se CÉLIA viabilizava as operações do narcotráfico, que visavam importar da Bolívia cocaína diluída em óleo diesel, não é crível que com o seu elevado nível intelectual, ela não soubesse que a droga, para ser comercializada, precisaria passar por processo de decantação e processos químicos para separá-la do óleo diesel e posteriormente ser prensada.


A droga era levada para a "Estância Tarumã" e nesse local era refinada, prensada e enterrada na propriedade, pois se verifica que em certa ocasião o caseiro foi forçado por dois homens a desenterrar "o negócio" (droga), o que levou CÉLIA a adverti-lo de que "isso vale dinheiro e tem dono".


A ré, no pleno domínio da situação, "arquitetava" qual desculpa daria para a polícia por ter sido encontrada na propriedade que administrava uma prensa hidráulica (para compactação da droga) e o ácido bórico. Pensava nos mínimos detalhes de como agiria diante das autoridades e como manipularia o caseiro.


O dolo é inafastável: não se pode acreditar que alguém que controla grande parte das ações da organização criminosa, e é pessoa de confiança do chefe do bando, não tenha conhecimento de que os apetrechos necessários para o processamento da droga estavam guardados no barracão do sítio.


Conforme bem salientado pelo Ministério Público Federal em seu parecer "Não merece prevalecer o entendimento do D. Juízo a quo no sentido de que, por terem ocorrido depois da prisão de Márcio José Omito e da apreensão de bens, os diálogos travados entre CÉLIA e EZEQUIEL não se prestariam para comprovar que CÉLIA tinha conhecimento de que na Estância Tarumã havia maquinários e instrumentos destinados à preparação, produção e transformação de drogas. Realmente, a leitura dos diálogos transcritos nas razões recursais não revela qualquer surpresa em relação ao fato de terem sido apreendidos aqueles maquinários e instrumentos, o que seria natural, caso CÉLIA realmente desconhecesse a existência do material. Mesmo, porém, que os áudios mencionados não se prestassem a comprovar a plena consciência da apelada sobre o equipamento que estava instalado no seu imóvel, ainda assim não haveria de se cogitar de sua absolvição. É que, tendo CÉLIA MARIA ALVES atuado intensamente nas atividades da organização criminosa, estando indiscutivelmente ciente da forma como a internação da droga era feita no país e de como se dava a sua distribuição, não poderia ignorar o que acontecia dentro do imóvel que ela mesmo havia cedido, para o sucesso da empreitada criminosa." (fls. 501vº/502)


Assim, merece provimento a apelação do Ministério Público Federal.


No que tange ao apelo de CÉLIA MARIA ALVES, verifica-se que o seu recurso se restringe a negar a autoria delitiva e impugnar as provas colacionadas aos autos.


Das provas


Constata-se que as provas carreadas aos autos são fruto de extensa e intensa investigação da Polícia Federal levada à efeito no Inquérito Policial nº 2007.61.06.006084-7 instaurado em 30 de abril de 2007. Narra a denúncia que a partir de representação da autoridade policial solicitando a quebra de sigilo telefônico (autos nº 2007.61.004141-5) pois havia a notícia de que um traficante de Campo Grande/MS estaria negociando drogas com os usuários de telefones situados na Região de São José do Rio Preto.


No transcurso das investigações - que recebeu a denominação de "Operação Alfa" e durou mais de um ano - foi possível constatar que a droga comercializada era cocaína proveniente da Bolívia, internada no Brasil por quatro organizações criminosas lideradas por Luiz Carlos Galha, Lourival Máximo da Fonseca, Luiz Carlos Risaldi Jará e Márcio José Omito.


Diante da complexidade das organizações criminosas, da multiplicidade dos locais de ocorrência e, principalmente, da pluralidade de pessoas envolvidas exercendo as mais diversas tarefas, a d. Autoridade Policial representou ao Poder Judiciário pelo deferimento da ação controlada para possibilitar a identificação e responsabilização do maior número de integrantes da organização criminosa, evitando a colocação em circulação da cocaína que era comercializada sistematicamente.


Destarte, como se vê, as provas foram colhidas dentro da estrita legalidade, com autorização judicial, não se podendo cogitar de que são imprestáveis para culminar na condenação da ré.


Nesse sentido:


HABEAS CORPUS. PACIENTE DENUNCIADO POR TRÁFICO DE ENTORPECENTES E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO (ARTS. 33, CAPUT, E 34, CAPUT, AMBOS DA LEI 11.343/06). ALEGAÇÃO DE PROVA ILÍCITA. TRANSCRIÇÃO DE ESCUTAS TELEFÔNICAS. LEGALIDADE DO PROCEDIMENTO, EM RAZÃO DA DEVIDA AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE EXAME PERICIAL (ESPECTOGRAMA). NOME DO PACIENTE QUE É CITADO DURANTE O CONTATO TELEFÔNICO. PEDIDO MERAMENTE PROTELATÓRIO. PARECER DO MPF PELA DENEGAÇÃO DA ORDEM. ORDEM DENEGADA.
1. Segundo informações da autoridade coatora, as interceptações telefônicas foram judicialmente autorizadas.
2. A simples alegação, por parte do réu, de que a voz não é sua é meramente protelatória, visto que, pela leitura da transcrição dos diálogos, constata-se que o nome do paciente é citado por várias vezes.
3. Parecer do MPF pela denegação da ordem. 4. Ordem denegada.
(HC 200801536298, NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, STJ - QUINTA TURMA, DJE DATA:29/06/2009.)
HABEAS CORPUS. AÇÃO PENAL. EXCESSO DE PRAZO. COMPLEXIDADE. PLURALIDADE DE DENUNCIADOS. PACIENTE FORAGIDO E CAPTURADO EM OUTRO ESTADO. NECESSIDADE DE EXPEDIÇÃO DE CARTAS PRECATÓRIAS. AUSÊNCIA DE DESÍDIA DO ESTADO-JUIZ. DEMORA JUSTIFICADA. COAÇÃO NÃO EVIDENCIADA. 1. Não se constata desídia estatal que pudesse ensejar constrangimento ilegal quando a suposta demora na realização dos atos instrutórios advém de características peculiares ao feito, como a pluralidade de réus, a necessidade de expedição de cartas precatórias para oitiva de testemunhas e também para interrogatório do paciente que, preso foragido do distrito da culpa, contribuiu para o atraso na formação da culpa. PRISÃO PREVENTIVA. ALEGADA CARÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA VOLTADA AO TRÁFICO. EVASÃO DO DISTRITO DA CULPA. SUFICIENTE MOTIVAÇÃO. CONSTRANGIMENTO NÃO VERIFICADO. 1. Como medida de exceção, não basta que o decreto que impõe a prisão preventiva aponte, de maneira abstrata, as hipóteses do art. 312 do Código de Processo Penal que autorizam a cautela. 2. Entende-se ser motivação idônea para que persista a custódia processual do paciente seu suposto envolvimento com organização criminosa formada no intuito de praticar, regular e costumeiramente, o tráfico de entorpecentes na região, denotando este fato a periculosidade concreta de sua atuação. Precedentes. 3. Situação que, ademais, é agravada pela evasão do réu do distrito da culpa, que restou preso em outro Estado da Federação portando documentos falsos, em evidente intuito de se furtar à aplicação da lei penal. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. RECLAMADA ILICITUDE DE PROVA. ESCUTAS AUTORIZADAS JUDICIALMENTE. 1. Não há que se falar em ilicitude da degravação originada de interceptação telefônica devidamente autorizada pela autoridade judiciária. 2. Ordem denegada.(HC 200800840895, JORGE MUSSI, STJ - QUINTA TURMA, DJE DATA:09/03/2009.) (negritei)
RHC. PROVAS. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. AUTORIZAÇÃO JUDICIAL DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA. VALIDADE.
1. Se a escuta estava autorizada judicialmente, através de despacho devidamente fundamentado, não há falar em prova ilícita ou inadmissível.
2. A apreciação da existência de indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal e da possibilidade de utilização de outros meios de prova não se coaduna com a via estreita do writ, pois demanda revolvimento do conjunto fático dos autos.
3. Recurso improvido.
(RHC 200000097764, FERNANDO GONÇALVES, STJ - SEXTA TURMA, DJ DATA:12/06/2000 PG:00135 JBC VOL.:00047 PG:00102.)

Assim, a prova produzida na fase inquisitorial é válida, tendo em vista que foi submetida ao contraditório e a ré reconheceu no seu interrogatório os diálogos telefônicos - à exceção de um - de que participou.


Ainda, a alegação de imprestabilidade da prova por não haver transcrição literal do diálogo, não prospera, pois não apenas as análises mas os respectivos áudios dos diálogos telefônicos estavam disponíveis podendo ser acessados pelas partes e pelo Órgão Julgador.


Nesse sentido destaco os seguintes acórdãos:


HABEAS CORPUS. DIREITO PROCESSUAL PENAL. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. ÚNICO MEIO DE PROVA VIÁVEL. PRÉVIA INVESTIGAÇÃO. DESNECESSIDADE. INDÍCIOS DE PARTICIPAÇÃO NO CRIME SURGIDOS DURANTE O PERÍODO DE MONITORAMENTO. PRESCINDIBILIDADE DE DEGRAVAÇÃO DE TODAS AS CONVERSAS. INOCORRÊNCIA DE ILEGALIDADE. ORDEM DENEGADA. 1. Na espécie, a interceptação telefônica era o único meio viável à investigação dos crimes levados ao conhecimento da Polícia Federal, mormente se se levar em conta que as negociações das vantagens indevidas solicitadas pelo investigado se davam eminentemente por telefone. 2. É lícita a interceptação telefônica, determinada em decisão judicial fundamentada, quando necessária, como único meio de prova, à apuração de fato delituoso. Precedentes. 3. O monitoramento do terminal telefônico da paciente se deu no contexto de gravações telefônicas autorizadas judicialmente, em que houve menção de pagamento de determinada porcentagem a ela, o que consiste em indício de sua participação na empreitada criminosa. 4. O Estado não deve quedar-se inerte ao ter conhecimento da prática de outros delitos no curso de interceptação telefônica legalmente autorizada. 5. É desnecessária a juntada do conteúdo integral das degravações das escutas telefônicas realizadas nos autos do inquérito no qual são investigados os ora Pacientes, pois basta que se tenham degravados os excertos necessários ao embasamento da denúncia oferecida, não configurando, essa restrição, ofensa ao princípio do devido processo legal. Precedentes.
6. Writ denegado.
(HC 105.527, Relatora:  Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 29/03/2011, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-089 DIVULG 12-05-2011 PUBLIC 13-05-2011)
EMENTA: PROCESSUAL PENAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INDEFERIMENTO DE DILIGÊNCIA PROBATÓRIA. OFENSA REFLEXA. INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS JUDICIALMENTE AUTORIZADAS. DEGRAVAÇÃO INTEGRAL. DESNECESSIDADE. AGRAVO IMPROVIDO. I - Este Tribunal tem decidido no sentido de que o indeferimento de diligência probatória, tida por desnecessária pelo juízo a quo, não viola os princípios do contraditório e da ampla defesa. Precedentes. II - No julgamento do HC 91.207-MC/RJ, Rel. para o acórdão Min. Cármen Lúcia, esta Corte assentou ser desnecessária a juntada do conteúdo integral das degravações das escutas telefônicas, sendo bastante que se tenham degravados os excertos necessários ao embasamento da denúncia oferecida. III - Impossibilidade de reexame do conjunto fático probatório. Súmula 279 do STF. IV - Agravo regimental improvido.
(AI 685.878 AgR, Relator:  Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 05/05/2009, DJe-108 DIVULG 10-06-2009 PUBLIC 12-06-2009 EMENT VOL-02364-06 PP-01155)

No mais, o pedido da defesa, relacionado com a "repetição" da prova se mostra impossível em face das circunstâncias em que estas foram colhidas.


O MM. Juiz "a quo" procedeu corretamente e em observância ao disposto no artigo 155 do Código de Processo Penal, pois, na hipótese dos autos, se trata de prova não repetível.


Da autoria


A autoria delitiva é incontestável. O robusto conjunto probatório demonstra de maneira indene de dúvidas que CÉLIA MARIA ALVES participava ativamente da organização criminosa.


Ficou demonstrado que CÉLIA era a responsável pela parte financeira da organização criminosa chefiada por Márcio José Omito, atuando na administração de contas bancárias , aquisição de veículos e na administração do Sítio de propriedade de seu irmão Joel Custódio Alves Filho (preso na Suíça por tráfico de drogas), denominado "Estância Tarumã" e localizado na cidade de Uchoa/SP.


Restou comprovado que a ré foi responsável por intermediar a compra dos dólares que foram utilizados na aquisição da droga boliviana apreendida em 22 de setembro de 2007 por ocasião da prisão em flagrante de Márcio José Omito e Sérgio Custódio Alves (irmão de Célia).


Nesse sentido destaco excerto da sentença que discorre sobre a autoria delitiva:


"A participação de CÉLIA MARIA ALVES em auxílio na importação da cocaína adquirida na Bolívia está comprovada nos autos.
Com efeito, CÉLIA foi responsável por intermediar a aquisição de dólares para a compra de cocaína na Bolívia, pelo auxílio na aquisição do caminhão utilizado para o transporte da droga e também por aliciar seu irmão SÉRGIO CUSTÓDIO ALVES para realizar o transporte da droga diluída em óleo diesel para o Brasil. Essa droga foi posteriormente aprendida por ocasião do 4º flagrante delito ocorrido em 22/09/2007 durante a ação controlada deferida nos autos do Procedimento Criminal diverso nº 2007.61.06.004141-5.
Os diálogos dos índices 9397681, 9398027 e 9408689, cuja análise foi transcrita nas alegações finais da acusação (fls. 312) mostram CÉLIA MARIA ALVES em diálogo com MÁRCIO JOSÉ OMITO, tratando a cotação de dólar. A tomada de cotação de dólar foi confirmada por Célia em seu interrogatório, que, entretanto, afirmou que desconhecia a real finalidade da aquisição de dólares por MÁRCIO.
Sucede, entretanto, que no diálogo de índice 9398027 ficou também evidenciada a sociedade de CÉLIA e MÁRCIO na aquisição de um caminhão que foi utilizado no transporte da droga, sendo dirigido por Sérgio Custódio Alves, irmão de Célia.
Com efeito, da parte final do áudio do diálogo 9398027, escuta-se claramente - além de tratativa sobre aquisição de dólares e disponibilização de conta bancária por Célia - que CÉLIA diz a Márcio que estava entrando em contato com seu irmão Sérgio e que este teria se mostrado interessado no negócio e até disposto a separar-se de sua esposa; escuta-se ainda que CÉLIA diz que havia comprado a "carretinha" e Márcio o "carro"; é também muito evidente que "carretinha" e "carro" são a carreta e o cavalo do caminhão adquirido, porquanto Célia faz referência a uma observação de seu irmão Sérgio sobre a possibilidade de o caminhão quebrar quando sair da estrada.
Inexiste dúvida, portanto, de início, que Célia adquiriu o caminhão em sociedade com Márcio, posteriormente apreendido transportando cocaína diluída em óleo diesel.
De outra parte, o diálogo índice 9110293 contido no relatório nº 07 dos autos Procedimento Criminal Diverso nº 2007.61.06.004141-5, na "ficha alvo" da ré (cópia em apenso) e cuja análise foi transcrita no anexo da denúncia e nas alegações finais da acusação (fls. 19 e fls. 315), mostra dialogo entre a ré CÉLIA MARIA ALVES e MÁRCIO JOSÉ OMITO ocorrido em 17/08/2007, ocorrido alguns dias antes do 4º flagrante (22/09/2007). No final desse diálogo, Célia pergunta a Márcio se tem algum recado para "seo" Antônio, ao que Márcio diz para falar que está chegando "amanhã lá no barracão" e vai "fazer a funilaria" do carro lá.
Veja-se:
"Índice ...................: 9110293
Operação ................: SJE-ALFA
Nome Alvo..............: MÁRCIO (GOIANO, GATO, GORDO)
Fone Alvo .......................: 1183769334
Localização do Alvo........:
Fone Contato....................: 1781153324
Localização do Contato ....:
Data ..........................: 17/08/2007
Horário......................: 13:01:42
Observações .............: R7 @@@ MÁRCIO (1781371557) LIMEIRA/SP X MNI (CÉLIA)
Transcrição ...............: Márcio diz que não vai chegar naquele rapaz, porque é cinco (5.000,00kg) e nem vai ligar pra ele. MNI diz que está bem e pergunta se Márcio já está voltando. Márcio vai voltar só à tarde. MNI diz para voltar com cuidado e fala que o seu Antônio está aqui e pergunta se tem algum recado pra ele. Márcio diz para falar que "nós estamos chegando amanhã, lá no barracão" e vão fazer a funilaria do carro lá."
A existência de outro barracão em que poderia haver funcionamento de oficina mecânica a que estaria se referindo MÁRCIO não é minimamente demonstrada nos autos, do que se pode concluir com segurança que se tratava do barracão existente na Estância Tarumã - propriedade rural de Joel Custódio Alves Filho, irmão de Célia e por esta administrada, na qual fora apreendida a prensa hidráulica com vestígios de cocaína.
Para mais, o diálogo é travado por meio de conversa cifrada. Márcio diz que "não vai chegar naquele rapaz, por é cinco" e Célia demonstra já saber do que se trata ao não questionar sobre a natureza do assunto e apenas dizer para Márcio ter cuidado e perguntar se há algum recado para "seo" Antônio.
A posterior apreensão de cocaína por ocasião do 4º flagrante delito ocorrido durante as investigações (22/09/2007) sendo transportada diluída em óleo diesel de caminhão dirigido por um dos irmãos de CÉLIA, de nome SÉRGIO CUSTÓDIO ALVES, supostamente a mando de MÁRCIO JOSÉ OMITO, e a apreensão da prensa hidráulica com vestígios de cocaína no barracão da Estância Tarumã afastam qualquer dúvida sobre o teor daquela conversa cifrada: MÁRCIO conversava com CÉLIA a respeito de tráfico de cocaína. (...)" (fls. 377vº/379)

Destarte, demonstrada a idoneidade do conjunto probatório e a autoria delitiva não prospera o recurso apresentado pela defesa de CÉLIA MARIA ALVES.


Dosimetria da pena.


Em face do acolhimento da apelação do Ministério Público Federal, para condenar a ré como incursa nas penas do artigo 34 da Lei nº 11.343/2006, passo à dosimetria da pena, em consonância com o que a r. sentença aplicou para os demais crimes.


Na primeira fase da fixação da reprimenda pesa a favor da ré a inexistência de antecedentes criminais até a data dos fatos.


Contudo, a culpabilidade e as circunstâncias do crime lhe são amplamente desfavoráveis.


A culpabilidade é acentuada, uma vez que a ré apresentou dolo intenso ao ceder o imóvel denominado "Estância Tarumã" para a guarda de maquinário utilizado para processamento da droga importada da Bolívia diluída em óleo diesel, imóvel do qual tinha a posse e administração.


As circunstâncias também não lhe são favoráveis em face da natureza e da quantidade de droga que CÉLIA e as pessoas a quem se associou importaram da Bolívia para venda em território nacional, tendo em vista que foi apreendido no 4º flagrante delito cerca de 130 quilos de cocaína diluídos em óleo diesel. Verifica-se que a quantidade é elevada e a substância é reconhecidamente de alto poder causador de dependência.


Nesse passo, como consequência destas duas circunstâncias judiciais desfavoráveis à ré, e considerando os seus bons antecedentes, acresço à pena-base a fração de 1/6 (um sexto), fixando-a em 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 1400 (um mil e quatrocentos) dias-multa, no valor unitário de 1/10 (um décimo) do salário-mínimo à época dos fatos, considerando a situação econômica da acusada.


Na segunda fase da fixação das penas, não se verifica quaisquer circunstâncias agravantes ou atenuantes.


Na terceira fase da dosimetria das penas, verifica-se que está provada a transnacionalidade do delito, conforme dispõe o artigo 40, I, da Lei nº 11.343/2006, causa especial de aumento de pena para qual a legislação de regência prevê o acréscimo aos crimes tipificados nos artigo 33 a 37 da referida lei de 1/6 (um sexto) a 2/3 (dois terços). Destarte, seguindo o raciocínio adotado na r. sentença, a pena base deve ser acrescida de 1/4 (um quarto).


Ausente no caso qualquer causa de diminuição de pena, salientando-se a impossibilidade de aplicação do benefício disposto no artigo 33, §4º, da Lei nº 11.343/2006, tendo em vista a participação ativa da ré em organização criminosa.


Nesse diapasão, a pena ré passa ser de 4 (quatro) anos, 4 (quatro meses) e 15 (quinze) dias de reclusão e 1633 (um mil seiscentos e trinta e três) dias-multa, no valor unitário de 1/10 (um décimo) do salário-mínimo vigente à época dos fatos, em regime inicial fechado.


Assim sendo, a pena da ré após a sua condenação como incursa no artigo 34 da Lei 11.343/2006, totaliza 16 (dezesseis) anos de reclusão em regime inicial fechado e 3.381 (três mil, trezentos e oitenta e um) dias-multa no valor de 1/10 (um décimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos.


Ante o exposto, não conheço do pedido de fls. 726/727, de ofício, excluo a condenação da ré às penas do artigo 33, "caput", da Lei nº 11.343/2006, por ser a sentença "ultra petita" nesse particular e dou provimento à apelação do Ministério Público para condenar a ré CÉLIA MARIA ALVES, como incursa nas penas do artigo 34 da Lei nº 11.343/2006 e nego provimento à apelação da ré.


É o voto.



Johonsom di Salvo
Desembargador Federal


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