D.E. Publicado em 21/09/2012 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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VOTO
Imputação. Rita Helena Dialundama foi denunciada pela prática do crime do art. 33 c. c. o art. 40, I, ambos da Lei n. 11.343/06, pois, no dia 03.02.11, no Aeroporto Internacional de Guarulhos (SP), foi presa em flagrante delito quando estava prestes a embarcar em voo da empresa aérea South African Airways, com destino a Joanesburgo, na África do Sul, trazendo consigo, em desacordo com determinação legal/regulamentar, para fins de comércio ou entrega, de qualquer forma, a consumo de terceiros, no exterior, 3.610 g (três mil, seiscentos e dez) gramas - peso bruto - de cocaína, substância entorpecente que causa dependência física e/ou psíquica (fls. 36/38).
Materialidade. Está comprovada a materialidade do delito, conforme decorre dos seguintes elementos de convicção:
Autoria. Comprovada a autoria do delito, pois a acusada foi presa em flagrante, quando pretendia embarcar em voo com destino a Joanesburgo, na África do Sul, transportando droga em sua bagagem.
Em sede policial, a acusada permaneceu em silêncio (fls. 5/6). Em Juízo, admitiu como verdadeiros todos os fatos descritos na denúncia. Narrou que chegou ao Brasil no mês de Dezembro, ficando no Brás, no hotel Vitória. Afirmou que vinha sempre ao Brasil para comprar roupas e depois revender na Praça em Angola, chegando a acumular cinco mil dólares com seu negócio. Disse que já estava aqui há algum tempo, sem "recursos de dinheiro", quando apareceu no restaurante que frequentava um "moço chamado Lama" conhecido de uma amiga da interroganda, que aparentava ter 40 anos, lhe oferecendo dinheiro para transportar drogas. Ao ser indagada pela Juíza sobre ter consciência de que transportar droga é crime, disse que foi a primeira vez e ficou dando evasivas, contudo, afirmou que receberia mil e quinhentos dólares para efetuar o transporte da droga (fl. 148, em mídia digital).
Em sede policial, o Agente de Polícia Federal, Mauro Gomes da Silva, disse que realizava seu trabalho de combate ao tráfico internacional de drogas, no TPS II, quando foi acionado no raio x de bagagens despachadas da Cia. Aérea South African Airways, em razão de acusar grande quantidade de material orgânico em duas malas contendo o nome da conduzida. Afirmou que localizou a passageira no saguão de embarque e solicitou que o acompanhasse até a sala reservada a buscas da Polícia Federal, onde diante da testemunha Ana Leila de Andrade Oliveira, a acusada reconheceu as bagagens que continham a droga, como sendo de sua propriedade. Narrou que se constatou ser cocaína o pó branco encontrado nas bagagens da ré, após teste preliminar, conduzindo-se a acusada para a Delegacia (fls. 2/3). Em Juízo disse que se lembra da ré e de todo o ocorrido no dia dos fatos. Afirmou que foi acionado para verificar bagagem suspeita. Localizou a passageira proprietária das malas e perante uma testemunha civil obteve a resposta da acusada de que as bagagens eram de sua propriedade. Na seqüência, fez um furo nas bolsas existentes no interior da bagagem da ré, descobrindo que se tratava de cocaína (fl. 148, em mídia digital).
A testemunha Ana Leila de Andrade Oliveira, em sede policial, narrou que estava trabalhando na data dos fatos na máquina de raios-X, no Aeroporto Internacional de Guarulhos, quando foi solicitado seu testemunho pelo Agente da Polícia Federal Mauro, que se fazia acompanhar da conduzida. Acrescentou que presenciou a abertura das bagagens cuja propriedade a ré admitiu, bem como o encontro da cocaína (fl. 4). Na fase judicial a testemunha afirmou que se recorda da prisão da acusada, acompanhou a abertura da mala na presença da ré. Ao que se recorda, a ré dizia que as bolsas eram dela, mas que não sabia que havia colocado a droga lá (fl. 148, em mídia digital).
Eduardo Regis Lopes de Freitas, ouvido na fase judicial, aduziu que foi quem fez o laudo preliminar na substância encontrada na bagagem da ré, confirmando que se tratava de cocaína. Ao ser indagado sobre a possibilidade de certeza absoluta sobre ser a amostra suficiente para comprovar todo o demais material que não foi examinada, respondeu que sim (99%), fundamentando sua resposta no fato de ser uma matéria exata, que lida com estatística e que a parte corresponde ao todo. Afirmou que tomou o cuidado de retirar um pouco de substância de cada um dos quatros pacotes de drogas apreendidos na bagagem da ré e que todo o procedimento foi acompanhado pela testemunha civil (fl. 148, em mídia digital).
Tráfico. Direito de apelar em liberdade. O direito de apelar em liberdade para os delitos da Lei n. 11.343/06 é excepcional, desafiando fundamentação própria, não havendo ilegalidade em manter a prisão do réu que nessa condição respondeu a ação penal:
Do caso dos autos. Não prospera o pleito da defesa para que a ré responda ao processo em liberdade, porquanto esteve presa durante todo o processo, tendo salientado o Juiz a quo que permaneciam presentes os motivos da cautelaridade da prisão quando da prolação da sentença, a qual devia ser mantida.
Tráfico. Estado de necessidade. Inadmissibilidade. Para que se reconheça o estado de necessidade exculpante ou justificante, é obrigatória a comprovação do preenchimento dos requisitos do art. 24 do Código Penal para o reconhecimento dessa excludente de ilicitude ou de culpabilidade, sendo ônus da defesa fazê-lo, nos termos do art. 156 do Código de Processo Penal:
Do caso dos autos. Não comprovou a defesa, sendo seu ônus fazê-lo (art. 156 do CPP), que a apelante enfrentava a existência de ameaça atual a direito próprio ou alheio, o que, desde logo, impossibilita o reconhecimento do estado de necessidade, exculpante ou justificante.
Ainda que houvesse eventual situação de perigo atual que afligisse a ré, a conduta criminosa não era inevitável, sendo-lhe exigível comportamento conforme o direito.
Não se caracterizou, pois, a ocorrência de causa supralegal de exclusão de culpabilidade, inaplicável, pelas mesmas razões, a causa de diminuição de pena prevista no art. 24, § 2º, do Código Penal.
Dosimetria. Na sentença, o Juízo a quo, com fundamento no art. 42 da Lei n. 11.343/06 e no art. 59 do Código Penal, considerando-se, em especial, a quantidade da droga apreendida (3.610 g) fixou a pena-base 1/6 (um sexto) acima do mínimo legal, em 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa.
Ausentes circunstâncias agravantes, não foi reconhecida a atenuante da confissão, restando mantida a pena anteriormente fixada.
Em razão da transnacionalidade, a pena foi majorada em 1/6 (um sexto) para 6 (seis) anos, 9 (nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 680 (seiscentos e oitenta) dias-multa.
Não aplicou a causa de diminuição do § 4°, do art. 33, da Lei n. 11.343/2006, tornando a pena da ré definitiva em 6 (seis) anos, 9 (nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 680 (seiscentos e oitenta) dias-multa.
O valor unitário de cada dia-multa foi fixado em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente, em razão da condição econômica da ré.
Determinou o cumprimento da pena no regime inicial fechado.
Considerou incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos e determinou que a ré não poderia apelar em liberdade.
A defesa recorre da dosimetria da pena, requerendo a fixação da pena-base no mínimo legal, o reconhecimento da atenuante genérica do art. 65, III, d, o afastamento do art. 40, I, da Lei n. 11.343/06, a aplicação do § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06 em seu máximo legal, o estabelecimento do regime inicial do cumprimento da pena no semiaberto ou aberto (reconhecendo-se a inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei n. 8.072/90), a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos e o afastamento da aplicação da pena de multa (fls. 176/191).
O recurso merece, em parte, prosperar.
O Juízo de primeiro grau fixou a pena-base 1/6 (um sexto) acima do mínimo legal, em 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa, considerando a natureza do entorpecente (cocaína) e a sua quantidade (3.610 g - três mil, seiscentos e dez gramas).
Ausentes circunstâncias agravantes.
Não reconheceu a confissão da ré, entendendo que a acusada apenas "assumiu sua conduta ilícita, quando então foi constatada a presença de substância em pó branca oculta dentro de 04 (quatro) volumes (...)" (fl. 157v.).
Contudo, a atenuante da confissão incide sempre que fundamentar a condenação do acusado, devendo ser reconhecida.
Pelo que se infere dos precedentes do Superior Tribunal de Justiça, a atenuante da confissão (CP, art. 65, III, d) incide sempre que fundamentar a condenação do acusado, pouco relevando se extrajudicial ou parcial, mitigando-se ademais a sua espontaneidade (STJ, HC n. 154544, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 23.03.10; HC n. 151745, Rel. Min. Felix Fischer, j. 16.03.10; HC n. 126108, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 30.06.10; HC n. 146825, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 17.06.10; HC n. 154617, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 29.04.10; HC n. 164758, Rel. Min. Og Fernandes, j. 19.08.10).
Assim, reconheço a atenuante genérica do art. 65, III, d, do Código Penal, haja vista que a ré confessou a autoria delitiva em Juízo (fl. 148, em mídia digital).
Reconhecida a confissão espontânea da acusada, diminuo a pena-base em 1/6 (um sexto), respeitado o limite da Súmula n. 231 do Superior Tribunal de Justiça, para 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa.
Há elementos nos autos de que a ré se dedica a atividades criminosas, sendo que transportava grande quantidade de droga altamente nociva (3.610 g de cocaína), o que demonstra que sua conduta contribuiu para as finalidades ilícitas de grupos criminosos.
Não preenchidos os requisitos legais ensejadores do benefício pretendido pela defesa, deixo de aplicar o § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06 mantendo a pena como anteriormente fixada, em 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa.
A internacionalidade do delito de tráfico de drogas exsurge das circunstâncias fáticas e dos elementos coligidos, como as passagens aéreas em nome da acusada, a tentativa de envio da droga ao exterior, e de a ré ter sido presa no Aeroporto Internacional de Guarulhos (SP) prestes a embarcar em voo da empresa aérea South African Airways, com destino a Joanesburgo, na África do Sul, tudo a indicar a feição transnacional do tráfico de entorpecentes.
A causa de aumento pela transnacionalidade do delito deve elevar a pena em 1/6 (um sexto), o que resulta em 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa. O aumento da pena pela internacionalidade do crime não deve ultrapassar o mínimo legal, pois restou configurada de forma ordinária, não se evidenciando no caso dos autos circunstâncias do delito que reclamassem o recrudescimento da majorante em questão.
Sem outras atenuantes, agravantes, causas de diminuição ou de aumento, torno a pena definitiva de Rita Helena Dialundama em 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente à época dos fatos.
Quanto à pena pecuniária, eventual afastamento deve ser pleiteado ao Juízo das Execuções Penais, porquanto àquele competente a apreciação desse pedido.
Tráfico. Substituição. O Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade da vedação à conversão das penas privativas de liberdade em restritivas de direitos contida no § 4º do art. 33 e no art. 44 da Lei n. 11.343/06 (STF, Pleno, HC n. 97256, Rel. Min. Ayres Britto, j. 01.09.10), de modo que, nos delitos de tráfico transnacional de entorpecentes cumpre resolver sobre a substituição à luz do disposto no art. 44 do Código Penal.
Do caso dos autos. Rita Helena Dialundama não preenche o requisito objetivo do art. 44, I do Código Penal, porquanto condenada a pena superior ao quantum estabelecido no mencionado dispositivo legal para obtenção do benefício pleiteado, bem como a grande potencialidade e efeitos maléficos da droga trazida pelo recorrente (cocaína) são circunstâncias suficientes a revelar que ela não cumpre também os requisitos subjetivos previstos nos artigos 59 e 44, inciso III, ambos do Código Penal, de maneira que, também por essa razão, não faz jus à pretendida substituição.
Assim, rejeito o pleito da defesa quanto à substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos em face da expressa vedação legal e, mormente, por se mostrar inadequada a medida para os fins de repressão e prevenção do ilícito praticado pelo acusado.
Tráfico. Regime inicial fechado. Admissibilidade. É possível fixar o regime inicial fechado no delito de tráfico internacional de entorpecentes, ainda que a pena seja inferior a quatro anos, desde que haja circunstâncias judiciais desfavoráveis ou fatos concretos a justificar a decisão:
Do caso dos autos. Considerando as circunstâncias do caso, bem como a pena privativa de liberdade aqui aplicada, cabível o regime inicial fechado para o cumprimento de pena, o que não impede, cumpridos os requisitos legais, que futuro pedido de verificação do tempo de cárcere para progressão a regime menos gravoso seja apreciado pelo Juízo das Execuções Penais, a quem compete o acompanhamento da execução da pena.
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso para reconhecer a atenuante da confissão, tornando a pena definitiva de Rita Helena Dialundama em 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente à época dos fatos. No mais, fica mantida a sentença.
É o voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | ANDRE CUSTODIO NEKATSCHALOW:10050 |
Nº de Série do Certificado: | 5575CE3631A25D56 |
Data e Hora: | 13/09/2012 12:19:19 |