D.E. Publicado em 06/07/2012 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, de ofício, desclassificar os fatos para a figura do artigo 125, inciso XIII, da Lei 6.815/1980, e negar provimento ao recurso, mantendo-se a absolvição dos réus com fulcro no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
Trata-se de apelação criminal interposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL contra a r.sentença que absolveu DAVID AMAECHI AGUSIONU (nigeriano) e KARINA SILVA SOARES da prática dos crimes previstos nos artigos 299 e 304, ambos do Código Penal (fls. 399/405).
Narra a denúncia que DAVID AMAECHI AGUSIONU, no dia 13/07/2006, na sede da DELEMIG, na Superintendência da Polícia Federal em São Paulo/SP, inseriu declaração falsa em seu processo de permanência definitiva no Brasil, consistente na afirmação de que era casado com KARINA SILVA SOARES e que residia na rua Guaicuri, nº 220, Cidade Júlia em Santo Amaro. Nesse mesmo dia, Walter Gomes (guineense), mas na Rua Conrado Mazzeo, nº 292, bloco 2, apartamento 64, nesta Capital (verdadeiro endereço de DAVID), fez uso de documento público tido como falso (passaporte) perante as autoridades policiais. Por esses motivos, DAVID AMAECHI AGUSIONU foi denunciado pela prática do crime do artigo 299, do Código Penal, e Walter Gomes, pelo crime do artigo 304, do Código Penal (fls. 06/08).
Em aditamento a denúncia constou que no dia 25/03/2006, KARINA SILVA SOARES, mediante recompensa em dinheiro, simulou a convolação de núpcias com DAVID AMAECHI AGUSIONU para que este conseguisse visto permanente no Brasil. Posteriormente KARINA voltou a inserir em documento particular, apresentado nos autos do procedimento de permanência definitiva de DAVID, nova declaração falsa consistente na confirmação do matrimônio fictício. Por esses motivos, KARINA e DAVID foram também denunciados pela prática dos crimes dos artigos 299 e 304, ambos do Código Penal, em concurso material.
A denúncia foi rejeitada com relação a Walter Gomes, uma vez que o laudo pericial atestou que o passaporte por ele apresentado era autêntico (fls. 60/62), sendo recebida, já aditada, no dia 08/09/2006 (fls. 139/140).
Nas razões recursais o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL requer a condenação de DAVID AMAECHI AGUSIONU pela prática do crime do artigo 299, do Código Penal (duas vezes e em concurso material), e a condenação de KARINA SILVA SOARES pela prática do crime do artigo 299 e 304, ambos do Código Penal, também em concurso material, uma vez que as provas dos autos são cabais quanto a materialidade e a autoria delitivas.
Contrarrazões apresentadas por ambos os réus.
A PROCURADORIA REGIONAL DA REPÚBLICA no parecer opinou pelo provimento do recurso, com a condenação dos réus, porém na penas do crime do artigo 125 inciso, XIII, da Lei 6.815/80.
É o relatório.
À revisão.
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VOTO
Segundo consta, no dia 12/07/2006, a fim de confirmar a residência de DAVID e a constância de casamento celebrado com KARINA, o agente da polícia Federal Antonio D'Angelo Junior - em procedimento de rotina para casos como esse - quando chegou ao endereço apontado como sendo o do casal (Rua Guaicuri, nº 220, cidade Júlia, São Paulo/SP), entrevistou KARINA e a mãe dela, d. Antonieta Francisco da Silva. Nessa ocasião, para surpresa do policial, d. Antonieta afirmou que uma pessoa de nome Valquíria havia cooptado KARINA para casar-se de forma fictícia com o estrangeiro DAVID, e, tanto a mãe quanto KARINA, não se recordavam do nome do suposto "genro e marido".
Diante disso, no dia seguinte, o policial Antonio entrou em contato telefônico com DAVID pelo número de telefone que constava do processo administrativo e solicitou que comparecesse na Delegacia, supostamente para a retirada da pretendida carteira de permanência. Na Delegacia DAVID foi novamente questionado quanto ao seu endereço, tendo firmado um documento confirmando o endereço da Rua Guaicuri, nº 220, São Paulo/SP. Ato contínuo, o policial passou a examinar os documentos que estavam de posse de DAVID, sendo encontrado um cartão de determinada loja, para a qual foi telefonado, constatando-se em seus registros cadastrais que o endereço do acusado era a Rua Conrado Mazzeo, nº 292, bloco 2, apartamento 64, Jardim Luíza, São Paulo/SP; era, inclusive, o mesmo endereço que constava no seu CPF. Com a autorização de DAVID e em sua companhia, o policial e outros colegas (Mauro Sabatino e Paulo Nakamashi) dirigiram-se ao segundo endereço, sendo neste encontrados diversos celulares e relógios, além do guineense Walter Gomes que se encontrava com o prazo de estada no Brasil vencido e era também morador do mesmo local.
Às fls. 38 consta declaração firmada por DAVID, confirmando seu casamento com KARINA e o endereço na Rua Guaicuri, nº 220, Cidade Júlia, em Santo Amaro.
Às fls. 76/118 consta cópia do processo de permanência definitiva (casamento) em nome de DAVID, nele colacionada a certidão de casamento dos réus datada de 25/03/2006 (fls. 78), bem como a declaração datada de 05/04/2006 prestada por KARINA confirmando o tal casamento (fls. 80).
Para instruir seu processo administrativo, DAVID declarou que chegou ao Brasil em 23/03/2005, pelo porto de Santos/SP, tendo aqui permanecido na condição de clandestino. Conheceu KARINA no Shopping Ligth em 07/2005 e alguns encontros depois iniciaram relacionamento amoroso que culminou em seu casamento no dia 25/03/2006. Esclareceu que o casamento foi feito apenas no cartório de registro civil, ocorrendo um pequeno almoço após a celebração em uma churrascaria. Afirmou que o casal vivia maritalmente e em harmonia e que KARINA tem um filho que inclusive já conhecia (fls. 108).
Diante disso, pela suposta prática de simulação de casamento e declarações falsas de que eram casados e moravam juntos, os réus foram denunciados pela prática dos crimes dos artigos 299 e 304, c/c 69, todos do Código Penal.
No entanto, a situação fática narrada na denúncia diz respeito a prática de fraudes para a obtenção de visto de permanência definitiva no Brasil, conduta claramente tipificada no artigo 125, inciso XIII, da Lei 6.815/1980, in verbis:
(...)
No caso em que uma mesma conduta pode ser tipificada segundo duas, a regra especial afasta a incidência da regra geral (princípio da especialidade); essa é a situação dos autos, e tendo a denúncia apresentado narrativa abrangente que admite outra adequação típica, tem-se a possibilidade da emendatio libelli , conforme o artigo 383 do Código de Processo Penal.
Dito isso, prossigo na análise do mérito, tendo em mente que a definição jurídica é aquela prevista no artigo 125, inciso XIII, da Lei 6.815/1980.
Em juízo, DAVID declarou:
KARINA, por sua vez, declarou (fls. 243/246):
(...) que realmente se casou com DAVID em 25 de março de 2006, sendo que o conheceu no shopping light em julho de 2005; que no primeiro mês depois do casamento a interroganda e David moraram na casa da mãe da interroganda, situada na Rua Guacuri, e os dois meses seguintes, a interroganda morou na casa de David na Rua Conrado Mazzeo; que depois desse tempo a interroganda se separou (de fato) do interrogando porque ele estava com outra, com a qual, inclusive, teve filho; que a interroganda não recebeu nenhuma importância em dinheiro para se casar com David; que depois que deixou a casa de David, a interroganda não teve mais nenhum relacionamento com ele e nem o tem atualmente; que não conhece Valter Gomes; que depois de um mês de casamento saíram da casa de sua mãe porque ela não queria que a interrogando ficasse com David; que acha que sua mãe tinha medo que David levasse a interroganda embora do país; que David trabalha vendendo cartão telefônico; que a depoente realmente assinou a declaração de fls. 80; que não conhece as testemunhas arroladas na denúncia; (...) que entre a data em que conheceu David e o casamento, decorreu quase um ano. (...).
O policial que entrevistou a mãe de KARINA para instruir o processo de permanência, Antonio D' Angelo Junior, afirmou em juízo (fls. 270/272):
O policial Mauro Sabatino que conheceu dos fatos narrados na denúncia a partir do momento em que DAVID foi chamado até a Delegacia depois do policial Antonio D Ângelo ter ido até a casa de KARINA e sua mãe, esclareceu (fls. 273/274):
A mãe de KARINA, Antonieta Francisca da Silva, ouvida como informante, afirmou (fls. 277/279):
A testemunha arrolada pela defesa, Janaína Beatriz de Morais NWadinobia, vizinha de KARINA, declarou ter ouvido dela que estava morando junto com DAVID e que haviam se casado escondido. Disse que ficou muito tempo ser ver KARINA e que sua mãe lhe disse que ela havia ido embora. Ressaltou que KARINA lhe disse que estava gostando de um rapaz e que sua mãe não admitia que ela ficasse com ele, não sabendo como falaria a sua mãe e o que faria (fls. 291/292).
Por fim, a testemunha Sandra Cistina Florêncio da Silva, esclareceu (fls. 293/294), verbis:
Pelas provas expostas, penso que a absolvição é de rigor.
Com efeito, há várias contradições nos depoimentos colhidos. DAVID disse que nunca morou na casa da mãe de KARINA, tendo morado juntos em sua residência na Rua Conrado Mazzeo. Já KARINA afirmou que inicialmente moraram juntos na casa da mãe dela e somente depois foram morar na casa de DAVID. KARINA afirmou que depois que se separaram não manteve mais contato com DAVID, enquanto este disse que mantinham relacionamento, embora já estivesse com outra mulher com a qual inclusive teve um filho. A mãe de KARINA afirmou que KARINA sempre morou com ela e que no início do casamento o casal morava em sua casa.
Enfim, embora não tenham passado despercebidas as contradições apontadas, e que se deva destacar a existência de fortes indícios de que o casamento entre DAVID e KARINA era mentiroso e tencionava única e exclusivamente a permanência definitiva de DAVID no Brasil, as provas colhidas durante a instrução probatória não recomenda a condenação.
Extrajudicialmente, o policial Antonio categoricamente afirmou as declarações da mãe de KARINA no sentido que o casamento era forjado e que sua filha teria recebido uma recompensa em dinheiro para se casar com DAVID. No entanto, em juízo, apenas declarou que a genitora da ré lhe disse que sabia que isso não daria certo e singelamente mencionou o oferecimento de recompensa paga a KARINA. Os demais policiais ouvidos, não presenciaram a entrevista inicial de Antonio com KARINA e d. Antonieta, tampouco ambas foram ouvidas extrajudicialmente.
Em juízo os réus confirmaram a veracidade do casamento e Antonieta não ratificou as declarações apresentadas pelo policial Antonio, mas insistiu no casamento efetivo de sua filha com DAVID, deixando claro o seu descontentamento com a união pelo fato do genro ser estrangeiro.
As duas testemunhas arroladas pela defesa foram uníssonas em confirmar a união do casal e sua moradia inicial na casa da mãe de KARINA, além de afirmarem que Antonieta não aceitava o casamento da filha.
Sobre o suposto recebimento de recompensa por parte de KARINA para se casar com DAVID; esse aspecto dos fatos decorreu de exclusivas declarações do policial Antonio, mas "por ouvir dizer" da boca de d. Antonieta; essa situação não permite crer sem qualquer dúvidas na tal promessa de ganhos, já que sabidamente d. Antonieta era contra o casamento e nos autos inexistem outros elementos indicativos dessa tal recompensa.
Enfim, pelas provas produzidas sob o crivo do contraditório, penso que não há como concluir peremptoriamente pela condenação, devendo ser mantida a sentença absolutória.
A propósito:
Ante o exposto, de ofício, desclassifico os fatos para a figura do artigo 125, inciso XIII, da Lei 6.815/1980, e nego provimento ao recurso, mantendo-se a absolvição dos réus com fulcro no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal.
É o voto.
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