Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 05/07/2012
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0007522-43.2000.4.03.6181/SP
2000.61.81.007522-3/SP
RELATORA : Desembargadora Federal RAMZA TARTUCE
APELANTE : ELOI RADIN ALLERAND
ADVOGADO : JOAO BATISTA DE OLIVEIRA FILHO e outro
APELADO : Justica Publica

EMENTA

PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. USO DE DOCUMENTO FALSO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. FALTA DE ADMOESTAÇÃO ACERCA DO DIREITO AO SILÊNCIO. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DO PREJUÍZO. MATERIALIDADE E AUTORIA DO DELITO COMPROVADAS. DOSIMETRIA DA PENA MANTIDA. PRELIMINARES REJEITADAS. RECURSO DESPROVIDO.
1. A regra de competência para o julgamento das causas em que as infrações penais são perpetradas em detrimento de bens, serviços ou interesses da União está assentada no artigo 109, inciso IV, da Constituição Federal. Nesse passo, a competência da Justiça Federal se justifica pela prática do crime de uso de documento falso perante o Quarto Serviço Regional de Aviação Civil-Serac 4, a evidenciar conduta ofensiva a órgão federal.
2. A consumação do crime contra o órgão público prescinde da análise da documentação apresentada com o intuito de obtenção do serviço respectivo pelo órgão competente. Precedentes.
3. Relativamente a outra preliminar, fundada na ausência de informação acerca do direito ao silêncio, observo que a defesa prévia cingiu-se a refutar a denúncia e apresentar o rol de testemunhas. Não se requereu a realização de novo interrogatório e não foi suscitada a nulidade naquela oportunidade. Outrossim, a matéria não foi articulada em alegações finais. Por outro lado, o advogado do réu estava presente na respectiva audiência (fl. 214), ou seja, acompanhou o ato e poderia se manifestar a respeito da aludida omissão ou caso vislumbrasse eventual abuso, de modo que não se verifica o alegado prejuízo.
4. A materialidade e autoria delitivas restaram demonstradas pelos documentos de fls. 09/12 e 17, bem como pela prova oral produzida, inclusive o interrogatório do acusado.
5. O teor das declarações do acusado revela a manifesta falsidade dos documentos utilizados para instruir o procedimento no Quarto Serviço Regional de Aviação Civil, já que espelham situação incongruente, constando que ele teria cumprido cargas horárias nas disciplinas de Língua Portuguesa, Matemática, Ciências P. de Saúde, Geografia, História, EMC e OSPB nos anos de 86 e 87 (fl. 10 vº), além de constarem as informações referentes aos anos de 83 e 84 (fl. 10), diferentemente do que restou afirmado pelo acusado.
6. Também não milita em favor do apelante o fato de os documentos de fls. 10 e 11 estarem assinados supostamente por Gilda Menezes da Silva como Diretora de Escola, datados do ano de 1998, época em que ela já não detinha o cargo, consoante se extrai do depoimento de Antônio Carlos Peixoto Pertence.
7. A autoria também é inconteste, porquanto o acusado respondeu que encaminhou pessoalmente o certificado de conclusão de primeiro grau, fornecido pela Escola Estadual Alina de Britto, ao SERAC/4 para obter o brevê de piloto de helicóptero e a justificativa de que houve inserção indevida de dados de outro aluno no histórico escolar do réu, cujo erro não foi detectado por falta de conferência, é inverossímil.
8. Não merece respaldo a tese da defesa no sentido de que o delito deva ser desclassificado para a figura prevista no artigo 301, § 1º, do Código Penal. Ressalte-se que os documentos de fls. 10/12 foram apresentados para que o réu obtivesse a licença de piloto privado de helicóptero, o que não se insere nas hipóteses enumeradas no dispositivo, quais sejam: obter cargo público, isenção de ônus ou de serviço de caráter público. Por outro lado, a expressão "qualquer outra vantagem" constante do tipo penal, também deve ter atributo público, o que não se assemelha à obtenção do brevê de piloto, de caráter privado, consoante doutrina e precedente jurisprudencial.
9. Quanto à dosimetria da pena, entendo que foi bem avaliada pelo juízo a quo. Cabe ressaltar que, ao fixar as penas acima do mínimo legal, o magistrado apontou as circunstâncias judiciais, conforme previsão do art. 59 do Código Penal, em que baseava sua decisão. Em relação à assertiva de que houve reconhecimento que "o réu demonstrou sentimento de arrependimento pelo crime que cometeu", como pretende fazer crer a defesa, denota-se claro erro material da decisão, com a supressão da palavra "não", o que se verifica de plano pela leitura completa da frase, que ficou sem sentido sem a expressão negativa.
10. A defesa não trouxe aos autos qualquer prova que pudesse alterar a conclusão a que chegou o magistrado a quo, a qual, conforme acima demonstrado, foi devidamente fundamentada. Assim, a dosimetria das penas não merece qualquer revisão.
11. Preliminares rejeitadas. Recurso desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar as preliminares e negar provimento à apelação, mantendo na íntegra a decisão de primeiro grau, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 25 de junho de 2012.
RAMZA TARTUCE
Desembargadora Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0007522-43.2000.4.03.6181/SP
2000.61.81.007522-3/SP
RELATORA : Desembargadora Federal RAMZA TARTUCE
APELANTE : ELOI RADIN ALLERAND
ADVOGADO : JOAO BATISTA DE OLIVEIRA FILHO e outro
APELADO : Justica Publica

RELATÓRIO

Trata-se de apelação criminal interposta por Eloi Radin Allerand contra a sentença proferida pelo MM. Juiz Federal da 10ª Vara Federal em São Paulo - SP, que o condenou às penas de 03 (três) anos de reclusão e 30 (trinta) dias-multa, em regime aberto, no valor de 1/2 (metade) do salário mínimo vigente à época dos fatos, a ser corrigido a partir daquela data, como incurso no artigo 304 do Código Penal, com substituição da pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, a serem definidas pelo Juízo da Execução Penal.

Consta da denúncia que:

"(...) ELOI apresentou documentos públicos falsos ao requerer licença de piloto privado de helicóptero junto ao Quarto Serviço Regional de Aviação Civil - SERAC 4 (São Paulo - Capital), em 25 de novembro de 1997, sendo esta expedida na mesma data, sob o n. 02120, bem como a correspondente habilitação técnica de tipo, referente à categoria helicóptero - BH 06, inscrita sob o código DAC N.° 92.796-2, ambas válidas até novembro de 2001 (fls. 144).
2. Os documentos a que se refere o item anterior estão acostados a fls. 159/161, quais sejam, uma declaração da Diretora da Escola Estadual Bárbara Heliodora (São Gonçalo do Sapucaí/MG) informando que a conclusão do Curso Fundamental de 5ª a 8ª série comprova-se por certificado, e não diploma, bem como os respectivos certificado e histórico escolar, em nome de ELOI.
3. Para apurar a falsidade destes documentos foi instaurado Inquérito Policial pela Polícia Civil de São Gonçalo do Sapucaí/MG, do qual resultou o processo criminal n.° 022/98 (fls. 92/130), baseado em indícios de autoria contra ELOI e mais quatro amigos deste (fls. 92).
4. Os cinco denunciados em tal processo foram condenados por falsificação de documento público (fls. 104/130), tendo inclusive já ocorrido o trânsito em julgado do acórdão que manteve a decisão condenatória de 1º grau, conforme se depreende de fls. 130.
5. Antes, porém, do término de tal processo, ELOI encaminhou ao SERAC 4 novos documentos relativos à conclusão do curso de 5ª a 8ª série, informando tratar-se desta vez dos documentos verdadeiros.
6. Diante disto, o mencionado serviço de aviação enviou cópia desses novos documentos recebidos ao Ministério Público do Estado de Minas Gerais a fim de complementar o processo n.° 022/98 (fls. 05).
7. Tais documentos são os de fls. 06/08, consistindo em um histórico escolar, uma declaração de escolaridade e outra de que ELOI cursou o 1º Grau no estabelecimento de ensino Alina de Brito (escola estadual).
8. Diante disto, foi enviado ofício ao diretor da escola mencionada no item anterior questionando sobre a autenticidade desses documentos, tendo a resposta informado que não há assentamentos em nome de ELOI nos arquivos daquele estabelecimento de ensino (fls. 10/11).
9. Também consta desta resposta que Antônio Carlos P. Pertence assumiu a diretoria da Escola Alina de Brito em 1996, data em que a diretora cujos nome e assinatura aparecem nos documentos em tela aposentou-se (fls. 11).
10. ELOI, em seu interrogatório (fls. 49), afirmou realmente ter freqüentado a Escola Alina de Brito, afirmando a autenticidade dos documentos por último apresentados ao SERAC 4, o que, segundo ele, seria corroborado pelas declarações de Antônio Carlos acostadas a fls. 46.
11. Nessas declarações, o então diretor da escola mencionada afirmou não ter condições de desconfirmar a autenticidade dos documentos questionados pelo fato de que após 1996 houve três mudanças de endereço de tal estabelecimento de ensino, motivando a perda de alguns documentos, sendo possível ter havido desfalque do arquivo de alunos por extravio de documentos.
12. No entanto, embora Antônio Carlos ainda tenha afirmado a fls. 46 que a assinatura aposta em tais documentos é muito parecida com a de Gilda, diretora que o antecedeu, não há como considerar autênticos os documentos em questão.
13. Isto porque, com exceção dos documentos de fls. 08, são eles datados de 1998, embora Gilda tenha se aposentado em 1996, ano em que Antônio Carlos assumiu a diretoria da escola.
14. Apesar do documento de fls. 08 ser datado de 1989, como foi apresentado juntamente com os de fls. 06/07, por óbvio falsos, torna-se também suspeito de falsidade.
15. Não foi possível confirmar junto a Gilda a autenticidade dos documentos em razão do falecimento da mesma, ocorrido em 1999, conforme atestado de óbito de fls. 67.
16. Diante dos fatos, especialmente do que consta no item13 supra e das fls. 06/08, fica caracterizada a materialidade delitiva.
17. Por outro lado, a autoria de ELOI é comprovada pelo ofício do SERAC 4 enviado ao Ministério Público (fls. 05), o qual atesta o efetivo uso de tais documentos por parte do denunciado a fim de manter sua licença (brevê) de piloto privado de helicóptero.
18. Diante do exposto, o Ministério Público Federal denuncia ELOI como incurso nas sanções do artigo 304 c/c 297, ambos do Código Penal, requerendo que, recebida e autuada essa, seja o denunciado citado e interrogado, prosseguindo-se nos demais atos processuais até final condenação, ouvindo-se, outrossim, a testemunha abaixo arrolada." (fls. 02/04)

O juiz estadual do Estado de Minas Gerais determinou a remessa do inquérito policial à Justiça Federal de São Paulo, sob o fundamento de que o delito de uso de documento falso deu-se perante o SERAC 4 - Quarto Serviço Regional de Aviação Civil, em São Paulo/Capital, o qual é órgão federal (fls. 99/100).

Recebimento da denúncia, às fls. 198/199, em 20 de janeiro de 2003.

O réu foi interrogado (fls.213/214) e apresentou a defesa prévia (fls. 243/244).

Folhas de antecedentes, às fls. 202, 204, 211, 215/216, 441, 445 vº e 447/449.

Depoimento da testemunha de acusação, à fl. 265, e de defesa, às fls. 300, 301, 302, 330/331 e 332/333.

Alegações finais do Parquet, às fls. 451/455, e da defesa, às fls. 466/473.

Sentença condenatória, às fls.491/502, publicada em 30/08/2005 (fl. 503).

Nas razões de apelação, Eloi Radin Allerand alega (fls. 533/545):

a) nulidade do processo, em razão da incompetência absoluta da Justiça Federal;

b) os documentos de fls. 217/235 indicam que o apelante respondeu a ação penal perante a Justiça Comum do Estado de Minas Gerais por fato materialmente idêntico ao objeto da presente ação;

c) embora a denúncia impute ao apelante os delitos previstos nos artigos 297 e 304, ambos do Código Penal, deve ser adotado o entendimento que prevaleceu no âmbito do STJ e do STF, no sentido de que o apelante deve responder perante a Justiça Comum, competente que é para apreciar a suposta falsificação do documento público, sendo irrelevante para fixação da competência o uso posterior perante repartição federal;

d) os documentos originários da Escola Estadual Alina de Britto não foram apreciados pelo SERAC quando da expedição da licença de piloto privado de helicóptero, como revela a análise do procedimento de fls. 162/171;

e) do reconhecimento da incompetência decorre, portanto, a própria nulidade da denúncia, apresentada por órgão que não possui legitimidade para o seu oferecimento;

f) nulidade do processo, a partir do recebimento da denúncia, em razão da manifesta ilegalidade no ato de interrogatório do apelante, pois não foi garantido ao apelante o direito ao silêncio, a que faz referência o art. 5°, inciso LXIII, da Constituição Federal e o art. 186 CPP, segunda parte;

g) o recorrente foi prejudicado, porque a condenação se baseou, principalmente, no conteúdo de sua declaração;

h) o réu deve ser absolvido, porquanto, ao contrário do que foi consignado na sentença, o ofício de fl. 17, subscrito por Antônio Carlos P. Pertence, a única testemunha acusatória, é desmentido pela certidão de fl. 25;

i) é incontroverso que o apelante compareceu, fez o curso e se submeteu às provas exigidas pelo estabelecimento de ensino, tanto assim que suas declarações estão apoiadas em todos os documentos que constam dos autos, corroborados pela certidão de fls. 25/26;

j) os documentos de fls. 10/12 são verdadeiros e foram assinados pela diretora Gilda Menezes da Silva, cujo óbito ocorreu em 26 de dezembro de 1999 (fl. 76), posteriormente à data inserida às fls. 10 vº, 11 e 12, tendo havido meros erros materiais;

k) a diretora aposentada, por qualquer motivo, exerceu posteriormente funções no referido estabelecimento de ensino, por isso nenhuma responsabilidade tem o apelante por esse fato e pelo princípio da aparência, quem se apresenta como funcionário público em repartição pública goza de presunção de que, realmente, está no regular exercício de suas funções;

l) é possível e provável que dados relativos a outro aluno foram, por equívoco, indevidamente inseridos no histórico escolar do apelante, que não percebeu o erro pelo simples fato de que não o conferiu;

m) os fatos revelados no interrogatório do acusado foram confirmados pela testemunha Eliana Beligni Brandão;

n) o período de três dias, mencionado no interrogatório, é aquele "referente à conclusão do curso de 1ª a 8ª série", no qual foram aplicadas provas escritas;

o) ainda que as alegações ministeriais fossem procedentes, a interpretação do art. 304 do Código Penal deve-se dar em conjunto com o art. 301, § 1°, (falsidade material de atestado ou certidão), e não com o art. 297, caput, do Código Penal (falsidade de documento público);

p) os supostos documentos falsificados, conforme a própria denúncia, "são os de fls. 06/08, consistindo em um histórico escolar, uma declaração de escolaridade e outra de que ELOI cursou o 1º grau no estabelecimento de ensino Alma de Brito (escola estadual)", o que atrai a incidência do princípio da especialidade;

q) ainda que se cogite do delito previsto no art. 304 c/c o art. 297, caput, ambos do Código Penal, a pena deve ser diminuída, considerando-se a primariedade do réu, seus antecedentes e conduta social, além do verificado arrependimento.

Com contrarrazões, subiram os autos (fls. 568/574). Nesta Corte, o parecer ministerial foi pelo desprovimento do recurso (fls. 576/582).

O feito foi submetido à revisão, na forma regimental.

É O RELATÓRIO.



RAMZA TARTUCE
Desembargadora Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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Data e Hora: 29/05/2012 12:27:12



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0007522-43.2000.4.03.6181/SP
2000.61.81.007522-3/SP
RELATORA : Desembargadora Federal RAMZA TARTUCE
APELANTE : ELOI RADIN ALLERAND
ADVOGADO : JOAO BATISTA DE OLIVEIRA FILHO e outro
APELADO : Justica Publica

VOTO

No que diz respeito à competência da Justiça Federal para o processamento e julgamento do delito pelo qual o apelante Eloi Radin Allerand foi condenado, ou seja, a conduta prevista no artigo 304 do Código Penal, referida questão já foi enfrentada pelo Juízo a quo.

Com efeito, a regra de competência para o julgamento das causas em que as infrações penais são perpetradas em detrimento de bens, serviços ou interesses da União está assentada no artigo 109, inciso IV, da Constituição Federal. Nesse passo, a competência da Justiça Federal se justifica pela prática do crime de uso de documento falso perante o Quarto Serviço Regional de Aviação Civil-Serac 4, do que se extrai a ocorrência de fato ofensivo a órgão federal.

Ressalte-se que no habeas corpus julgado pelo Superior Tribunal de Justiça, invocado pela defesa, a situação versada é diversa da destes autos. Naquele feito, o então paciente respondeu pela falsificação do documento, não pelo uso perante ente da União, como restou apurado no presente processo. Confira-se o seguinte trecho do voto vendedor, proferido pelo Ministro Hamilton Carvalhido:

"Pedi vista dos autos para melhor examinar a questão e, data vênia do ilustre Relator, dele divirjo.
Condenado o réu por crime de falsificação de documento público, induvidosamente próprio da competência da Justiça Estadual, não há como pretender a declaração de nulidade do processo por incompetência absoluta, ao argumento de que o uso se deu perante repartição pública federal, cuidando-se, como se cuida, de pós fato impunível.
É este o entendimento doutrinário:
"Se na mesma pessoa reúnem-se as figuras do falsário e usuário, ela responde por um só delito: o de falsidade, que absorve o de uso (CP, art. 304). O uso, nesse caso, funciona como post factum impunível, aplicando-se o princípio da consunção na denominada progressão criminosa." (Damásio de Jesus, in Código Penal Anotado, Editora Saraiva, 9ª edição, 1999)
E também o jurisprudencial:
"- FALSIDADE IDEOLÓGICA. DOCUMENTO PÚBLICO. USO PELO PRÓPRIO FALSIFICADOR. CONCURSO DE CRIMES. INEXISTÊNCIA. - Pacífico o entendimento de que o falsário não responde, em concurso, pelo crime de falso e uso do documento falsificado. - O usuário é punível apenas, nesse caso, pelo crime de falsidade, considerado como fato posterior não punível, o uso. - Análise de provas. Súmula 7, do STJ. Inaplicável o art. 384, do CPP, se inexistiu inovação quanto aos fatos narrados na denúncia, mas apenas nova definição delituosa desses mesmos fatos. - Recurso não conhecido da condenada. Recurso conhecido e desprovido do Ministério Público." (RESP. 166.888/SC, Relator Ministro José Arnaldo da Fonseca, in DJ 16/11/1998).
"PENAL. FALSIDADE IDEOLÓGICA. CRIME CONTINUADO. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO. USO PELO FALSÁRIO. DELITO ÚNICO.
- Configura crime continuado duas ações consistentes no preenchimento de laudas assinadas por outrem e utilizadas para os
expedientes ideologicamente falsos, dirigidas a um mesmo resultado.
- A doutrina e a jurisprudência são unânimes no entendimento de que o uso do documento falso pelo próprio autor da falsificação configura um único delito, seja, o do art. 297, do Código Penal, pois, na hipótese, o uso do falso documento é mero exaurimento do crime de falsum.
- Habeas-corpus concedido." (HC 10.447/MG, Relator Ministro Vicente Leal, in DJ 01/07/2002).
Como, pois, afirmar-se a competência da Justiça Federal, se o uso que a determinaria é impunível e nenhuma conseqüência produziu ao paciente?
Pelo exposto, rogando vênia ao Ministro-Relator, denego a ordem de habeas corpus ." (HABEAS CORPUS Nº 13.386 - MG (2000/0051629-5, relator: Min. FONTES DE ALENCAR )

O habeas corpus nº 84533/MG-STF tratou da matéria sob o mesmo enfoque analisado pelo STJ., in verbis:

E M E N T A: "HABEAS CORPUS" - FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO - FATO DELITUOSO, QUE, ISOLADAMENTE CONSIDERADO, NÃO OFENDE BENS, SERVIÇOS OU INTERESSES DA UNIÃO FEDERAL, DE SUAS AUTARQUIAS OU DE EMPRESA PÚBLICA FEDERAL - RECONHECIMENTO, NA ESPÉCIE, DA COMPETÊNCIA PENAL DA JUSTIÇA ESTADUAL PARA O PROCESSO E JULGAMENTO DO CRIME TIPIFICADO NO ART. 297 DO CP - USO POSTERIOR, PERANTE REPARTIÇÃO FEDERAL, PELO PRÓPRIO AUTOR DA FALSIFICAÇÃO, DO DOCUMENTO POR ELE MESMO FALSIFICADO - "POST FACTUM" NÃO PUNÍVEL - CONSEQÜENTE FALTA DE COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL, CONSIDERADO O CARÁTER IMPUNÍVEL DO USO POSTERIOR, PELO FALSIFICADOR, DO DOCUMENTO POR ELE PRÓPRIO FORJADO - ABSORÇÃO, EM TAL HIPÓTESE, DO CRIME DE USO DE DOCUMENTO FALSO (CP, ART. 304) PELO DELITO DE FALSIFICAÇÃO DOCUMENTAL (CP, ART. 297, NO CASO), DE COMPETÊNCIA, NA ESPÉCIE, DO PODER JUDICIÁRIO LOCAL - PEDIDO INDEFERIDO. - O uso dos papéis falsificados, quando praticado pelo próprio autor da falsificação, configura "post factum" não punível, mero exaurimento do "crimen falsi", respondendo o falsário, em tal hipótese, pelo delito de falsificação de documento público (CP, art. 297) ou, conforme o caso, pelo crime de falsificação de documento particular (CP, art. 298). Doutrina. Precedentes (STF). - Reconhecimento, na espécie, da competência do Poder Judiciário local, eis que inocorrente, quanto ao delito de falsificação documental, qualquer das situações a que se refere o inciso IV do art. 109 da Constituição da República. - Irrelevância de o documento falsificado haver sido ulteriormente utilizado, pelo próprio autor da falsificação, perante repartição pública federal, pois, tratando-se de "post factum" impunível, não há como afirmar-se caracterizada a competência penal da Justiça Federal, eis que inexistente, em tal hipótese, fato delituoso a reprimir. (HC 84533, Relator(a):  Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 14/09/2004, DJ 30-06-2006 PP-00035 EMENT VOL-02239-01 PP-00112 RTJ VOL-00199-03 PP-01112)

No mais, a consumação do crime contra o órgão público prescinde da análise da documentação apresentada com o intuito de obtenção do serviço respectivo pelo órgão competente, a teor dos seguintes julgados:

PENAL. USO DE DOCUMENTO FALSO. CONDENAÇÃO. PRESCRIÇÃO PENAL RETROATIVA. TERMO INICIAL. INOCORRÊNCIA. - Em sede de crime de uso de documento falso, previsto no art. 304, do Código Penal, a sua consumação ocorre no momento em que o mesmo é apresentado para produzir os seus efeitos, sendo irrelevante a data em que se produziu a contratação. - Tendo sido o falso documento utilizado em 18.10.1995 e recebida a denúncia em 16.10.1997, não houve a extinção da punibilidade pela prescrição com base na pena concretizada de dois anos de reclusão. - Habeas-corpus denegado. (HC 200000548154, VICENTE LEAL, STJ - SEXTA TURMA, DJ DATA:04/06/2001 PG:00255.-grifei)
PENAL. USO DE DOCUMENTOS FALSOS. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. REQUERIMENTO DE INSCRIÇÃO COMO ADVOGADO JUNTO À RESPECTIVA ORDEM. DIPLOMAS FALSOS. INCONSISTÊNCIA DA TESE DE CRIME IMPOSSÍVEL. ANTECEDENTES CRIMINAIS. SÚMULA 444 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. CONFISSÃO PARCIAL DOS FATOS. VALOR DO DIA-MULTA. RECURSOS PROVIDOS EM PARTE. 1. Comprovados a materialidade, a autoria e o dolo do crime de uso de documentos falsos, é de rigor confirmar a solução condenatória exarada em primeiro grau de jurisdição. 2. O uso de diploma falso, instruindo requerimento de inscrição como advogado no quadro da Ordem dos Advogados do Brasil, consuma o delito tipificado no artigo 304 do Código Penal. 3. A falta de submissão ao exame de ordem tornaria impossível o deferimento do pedido de inscrição, mas não a consumação do uso do diploma falso, já aperfeiçoado no instante em que efetuado o protocolo. 4. É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base (Súmula 444 do Superior Tribunal de Justiça). 5. Se o réu, acusado de uso de documento falso, admite a autoria e, mais, a própria falsidade, é de rigor abrandar-lhe a pena, ex vi do artigo 65, inciso III, alínea "d", do Código Penal. 6. O valor do dia-multa deve ser fixado na conformidade das condições econômicas do réu. 7. Recursos providos em parte.
(ACR 199961810037680, DESEMBARGADOR FEDERAL NELTON DOS SANTOS, TRF3 - SEGUNDA TURMA, DJF3 CJ1 DATA:21/10/2010 PÁGINA: 96.)
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. USO DE DOCUMENTO PÚBLICO FALSO. ARTIGO 304 C.C. O ARTIGO 297, DO CÓDIGO PENAL. FALSIFICAÇÃO DE DIPLOMA DE INSTITUIÇÃO DE ENSINO SUPERIOR. APRESENTAÇÃO PERANTE CONSELHO REGIONAL DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. IMPOSSIBILIDADE DE TIPIFICAÇÃO DA CONDUTA COMO O DELITO PREVISTO NO CP, 301, §1º. DOCUMENTO QUE NÃO É APENAS UM ATESTADO. NATUREZA FORMAL DO CRIME DE USO DE DOCUMENTO PÚBLICO FALSO. CONSUMAÇÃO ANTERIOR À VERIFICAÇÃO DO DOCUMENTO. APELAÇÃO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. A Justiça Federal é competente para julgar o delito de uso de diploma falso perante Conselho profissional que tem a natureza de autarquia federal (Lei 4769/65, art. 6º), ainda que emitido por instituição privada de ensino superior, que atua em função delegada pelo Ministério da Educação. 2. O diploma de curso superior emitido por instituição de natureza privada constitui documento público para todos os fins, dado o caráter público da atividade exercida pela instituição de ensino, bem como a sujeição do diploma a registro federal. 3. Essa conduta não configura meramente delito de falsidade de atestado ou certidão (CP, 301, §1º), por não ser o diploma documento com finalidade específica para determinado fim e por possuir conteúdo ideológico mais amplo. 4. Somente se poderia falar em atipicidade ou mesmo em impossibilidade do crime se o documento estivesse sujeito a prévia verificação obrigatória, isto é, não pudesse surtir qualquer efeito antes que a sua autenticidade seja confirmada, na forma e no conteúdo, e essa verificação necessariamente implicasse a descoberta da fraude: havendo a possibilidade de o documento falso produzir qualquer efeito, ainda que por prazo pequeno e sob grande probabilidade de ser descoberto, a conduta é penalmente típica e relevante. No caso dos autos, o efeito inclusive se verificou concretamente, obtendo o autor o registro profissional pretendido, posteriormente anulado. 5. As penas aplicadas não merecem reparo. 6. Apelação a que se nega provimento.
(ACR 200161810006175, JUIZ CONVOCADO ROBERTO JEUKEN, TRF3 - SEGUNDA TURMA, DJF3 CJ1 DATA:03/09/2009 PÁGINA: 80.-grifei)

Assim, não há se falar em incompetência absoluta da Justiça Federal para o processo e julgamento do feito e em ilegitimidade do Ministério Público Federal para o oferecimento da denúncia.

Relativamente a outra preliminar, fundada na ausência de informação acerca do direito ao silêncio, observo que a defesa prévia cingiu-se a refutar a denúncia e apresentar o rol de testemunhas. Não se requereu a realização de novo interrogatório e não foi suscitada a nulidade naquela oportunidade. Outrossim, a matéria não foi articulada em alegações finais. Por outro lado, o advogado do réu estava presente na respectiva audiência (fl. 214), ou seja, acompanhou o ato e poderia se manifestar a respeito da aludida omissão ou caso vislumbrasse eventual abuso, de modo que não se verifica o alegado prejuízo. Confiram-se os seguintes julgados:


PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. ART. 121, § 2º, INCISO IV, C/C ART. 14, INCISO II, TODOS DO CÓDIGO PENAL. ALEGAÇÃO DE FALTA DE ADVERTÊNCIA AO PACIENTE QUANTO AO DIREITO AO SILÊNCIO. NULIDADE DO PROCESSO. NÃO DEMONSTRAÇÃO DE PREJUÍZO SOFRIDO. REGIME SEMI-ABERTO. DIREITO DE APELAR EM LIBERDADE. I - Não há que se falar em nulidade do processo por falta de aviso ao réu do direito ao silêncio no ato do interrogatório judicial, se não se observa a comprovação do efetivo prejuízo para a defesa, ainda mais estando o réu acompanhado de seu advogado, que deteve-se em silêncio no momento da alegada omissão. II - Segundo o princípio pas de nullité sans grief, evidenciado no art. 563 do CPP, não há que se falar em declaração de nulidade se não estiver concretamente demonstrado o prejuízo (Precedentes). III - Se na r. sentença condenatória foi fixado o regime semi-aberto como o inicial de cumprimento da pena, deverá, em princípio, o réu aguardar o julgamento do recurso de apelação em liberdade, se por outro motivo não estiver preso (Precedentes). Ordem parcialmente concedida.(HC 200602006089, FELIX FISCHER, STJ - QUINTA TURMA, DJ DATA:05/11/2007 PG:00303.) PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. ART. 121, § 2º, INCISO IV, C/C ART. 14, INCISO II, TODOS DO CÓDIGO PENAL. ALEGAÇÃO DE FALTA DE ADVERTÊNCIA AO PACIENTE QUANTO AO DIREITO AO SILÊNCIO. NULIDADE DO PROCESSO. NÃO DEMONSTRAÇÃO DE PREJUÍZO SOFRIDO. REGIME SEMI-ABERTO. DIREITO DE APELAR EM LIBERDADE. I - Não há que se falar em nulidade do processo por falta de aviso ao réu do direito ao silêncio no ato do interrogatório judicial, se não se observa a comprovação do efetivo prejuízo para a defesa, ainda mais estando o réu acompanhado de seu advogado, que deteve-se em silêncio no momento da alegada omissão. II - Segundo o princípio pas de nullité sans grief, evidenciado no art. 563 do CPP, não há que se falar em declaração de nulidade se não estiver concretamente demonstrado o prejuízo (Precedentes). III - Se na r. sentença condenatória foi fixado o regime semi-aberto como o inicial de cumprimento da pena, deverá, em princípio, o réu aguardar o julgamento do recurso de apelação em liberdade, se por outro motivo não estiver preso (Precedentes). Ordem parcialmente concedida.(HC 200602006089, FELIX FISCHER, STJ - QUINTA TURMA, DJ DATA:05/11/2007 PG:00303.)
EMENTA: Informação do direito ao silêncio (Const., art. 5º, LXIII): relevância, momento de exigibilidade, conseqüências da omissão: elisão, no caso, pelo comportamento processual do acusado. I. O direito à informação da faculdade de manter-se silente ganhou dignidade constitucional, porque instrumento insubstituível da eficácia real da vetusta garantia contra a auto- incriminação que a persistência planetária dos abusos policiais não deixa perder atualidade. II. Em princípio, ao invés de constituir desprezível irregularidade, a omissão do dever de informação ao preso dos seus direitos, no momento adequado, gera efetivamente a nulidade e impõe a desconsideração de todas as informações incriminatórias dele anteriormente obtidas, assim como das provas delas derivadas. III. Mas, em matéria de direito ao silêncio e à informação oportuna dele, a apuração do gravame há de fazer-se a partir do comportamento do réu e da orientação de sua defesa no processo: o direito à informação oportuna da faculdade de permanecer calado visa a assegurar ao acusado a livre opção entre o silêncio - que faz recair sobre a acusação todo o ônus da prova do crime e de sua responsabilidade - e a intervenção ativa, quando oferece versão dos fatos e se propõe a prová-la: a opção pela intervenção ativa implica abdicação do direito a manter-se calado e das conseqüências da falta de informação oportuna a respeito.(HC 78708, SEPÚLVEDA PERTENCE, STF-grifei)
Ementa: PENAL. PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. NULIDADES PROCESSUAIS. PROCESSO PENAL MILITAR. INTERROGATÓRIO. AMPLA DEFESA E CONTRADITÓRIO. PRESENÇA DO DEFENSOR. AUSÊNCIA DE ADVERTÊNCIA SOBRE O DIREITO AO SILÊNCIO. RÉUS QUE APRESENTAM SUA VERSÃO DOS FATOS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO PREJUÍZO. ALTERAÇÃO DE ADVOGADO SEM ANUÊNCIA DOS RÉUS. FATO QUE NÃO PODE SER ATRIBUÍDO AO PODER JUDICIÁRIO. PAS DE NULLITÉ SANS GRIEF. AUSÊNCIA DE ABUSO DE PODER, ILEGALIDADE OU TERATOLOGIA APTAS A DESCONSTITUIR A COISA SOBERANAMENTE JULGADA. RECURSO ORDINÁRIO DESPROVIDO. 1. As garantias da ampla defesa e do contraditório restam observadas, não prosperando o argumento de que a falta de advertência, no interrogatório, sobre o direito dos réus permanecerem calados, seria causa de nulidade apta a anular todo o processo penal, nos casos em que a higidez do ato é corroborada pela presença de defensor durante o ato, e pela opção feita pelos réus de, ao invés de se utilizarem do direito ao silêncio, externar a sua própria versão dos fatos, contrariando as acusações que lhes foram feitas, como consectário de estratégia defensiva. 2. A falta de advertência sobre o direito ao silêncio não conduz à anulação automática do interrogatório ou depoimento, restando mister observar as demais circunstâncias do caso concreto para se verificar se houve ou não o constrangimento ilegal. (HC 88.950/RS, Relator Min. Marco Aurélio, Primeira Turma, Julgamento em 25/9/2007, HC 78.708/SP, Relator Min. Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, Julgamento em 9/3/1999, RHC 79.973/MG, Relator Min. Nelson Jobim, Segunda Turma, Julgamento em 23/5/2000.) 3. In casu: a) os recorrentes, policiais militares, foram processados e condenados como incursos no § 1º do artigo 308 do Código Penal Militar, a 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de reclusão em regime inicial aberto; b) a sentença destaca que, no dia 3/4/1996, na cidade de São Paulo/SP, os sentenciados, agindo em coautoria, exigiram da vítima vantagem indevida no valor de R$ 150,00 (cento e cinquenta reais) com o escopo de se omitirem quanto às providências cabíveis relativas ao ato ilícito de condução de veículo automotor sem portar os documentos necessários, que implicaria na apreensão do veículo e autuação do infrator; c) a condenação ocorreu em 21/7/1997, confirmada por apelação julgada em 19/12/2000, sendo certo que o Ministério Público ajuizou representação junto ao Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo com o escopo de decretação de perda da graduação das praças, julgada procedente, e transitada em julgado em 27/11/2001 (fls. 123); d) destarte, em 8/1/2002, a defesa dos réus ajuizou revisão criminal, que foi julgada improcedente, e transitou em julgado em 28/10/2008, sendo as penas julgadas extintas ante o seu cumprimento, conforme sentenças exaradas pelo Juízo de Direito das Execuções Criminais da Comarca de Santo André, em 9/11/2004 e 16/2/2005; e) aos 20/10/2009, a defesa reabriu o caso por meio de impetração do writ junto ao Superior Tribunal de Justiça, que se voltou contra o acórdão da apelação julgada pelo Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo. 4. A suposta nulidade decorrente de alteração de defensor sem a anuência das partes restou superada pelas informações prestadas pelo Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo ("1º à época, a grande maioria dos policiais militares processados no âmbito da Justiça Militar era defendida por advogados que integravam o Departamento Jurídico da Associação dos Cabos e Soldados da Polícia Militar e prestavam assistência jurídica aos associados dessa entidade, como ocorreu neste caso; 2º - em nenhum momento houve por parte do Juízo a "desconstituição" ou a "nomeação" de qualquer advogado para atuar nos autos, tendo sim na verdade ocorrido apenas alterações no quadro de advogados da referida Associação, cuja composição, como não poderia deixar de ser, é de seu livre arbítrio). 5. É cediço na Corte que: a) o princípio geral vigente no processo penal é o de que somente se proclama a nulidade de um ato processual quando há a efetiva demonstração de prejuízo, nos termos do que dispõe o art. 563 do CPP, verbis: Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa; b) a Súmula nº 523 do Supremo Tribunal Federal dispõe que "No processo penal, a falta de defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu" (HC 93.868/PE, Rel. Ministra Cármen Lúcia, Primeira Turma, Julgamento em 28/10/2008; HC 98.403/AC, Rel. Ministro Ayres Britto, Segunda Turma, Julgamento em 24/8/2010, HC 94.817, Rel. Ministro Gilmar Mendes, Segunda Turma, Julgamento em 3/8/2010.) 6. Os presentes autos não revelam a existência de abuso de poder, ilegalidade ou teratologia que possa autorizar a concessão do writ, desconstituindo, assim, um feito processual já acobertado pela coisa soberanamente julgada. 7. Recurso ordinário desprovido.(RHC 107915, LUIZ FUX, STF)

Rejeito, assim, as preliminares arguidas pelo acusado.

A materialidade e autoria delitivas restaram demonstradas pelos documentos de fls. 09/12 e 17, bem como pela prova oral produzida, inclusive o interrogatório do acusado.

Ouvido no inquérito policial, o apelante afirmou que frenquentou e cumpriu toda a carga horária exigida para o curso a que se refere o documento de fl. 06 (10, nesta autuação), in verbis:

"que, quanto ao documento constante nas fls. 06 destes autos, confirma que realmente frequentou ao Estabelecimento de ensino denominado DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO COORDENAÇÃO DE ENSINO SUPLETIVO; CUMPRINDO TODA CARGA HORÁRIA exigida pelo Curso; que, as divergências havidas quanto a documentação do Histórico Escolar de fls. 06, foi esclarecida nas declarações do funcionário ANTONIO CARLOS PEIXOTO PERTENCE, constantes destes autos. Bem como o documento de fls. 19, o qual, confirma a integridade de documento." (fl. 56 e verso)

Não obstante a certidão de fl. 25 noticie que Eloi Radin Allerand cursou a 8ª série, em 1987, bem como sua aprovação, o acusado não confirmou tal informação ao responder, em juízo, que frequentou o estabelecimento de ensino durante 03 dias, onde se submeteu às provas escritas, mas sem ter participado de cursos ou aulas. Confira-se:

"que o interrogando toma ciência neste ato do inteiro teor da denúncia, cuja cópia encontra-se às fls. 03/05, que lhe foi integralmente lida; que o interrogando nega a acusação que lhe é imputada na denúncia; que não conhece a testemunha arrolada na denúncia; que o interrogando afirma ter frequentado o estabelecimento de ensino Escola Estadual Alina de Brito, na cidade do Rio de Janeiro/RJ; que o interrogando afirma que frequentou o citado estabelecimento de ensino durante três (03) dias, não se recordando a data exata e nem do ano que isso ocorreu; que o interrogando esteve na cidade do Rio de Janeiro/RJ, por ocasião desses três (03) citados dias, a fim de se submeter aos exames médicos exigidos para obter o brevê de piloto de helicóptero; que na ocasião o interrogando obteve informações junto ao DAC daquela cidade do Rio de Janeiro/RJ, que poderia obter o diploma de conclusão de primeiro grau em qualquer escola estadual; que o interrogando obteve tal informação em razão de ter alegado no referido DAC/RJ que não tinha o primeiro grau completo; que a citada Escola Estadual Alina de Brito foi indicada ao interrogando no próprio DAC/RJ, não se recordando quem teria sido a pessoa que lhe passou tais informações e fez tal indicação; que o interrogando esteve na referida Escola Estadual Alina de Brito, sendo atendido por uma senhora, cujo nome não sabe informar, tendo ali se submetido a várias provas escritas; que dois ou três dias depois o interrogando obteve o certificado de conclusão de primeiro grau, fornecido pela citada escola; que este certificado de conclusão de primeiro grau foi pessoalmente encaminhado pelo interrogando ao SERAC/4 em São Paulo/SP, para obter o brevê de piloto de helicóptero; que o interrogando estudou até o quarto ano, tendo frequentado de 1ª a 4ª série em escola da cidade de Sarandi/RS; que as provas escritas que o interrogando se submeteu na Escola Estadual Alina de Brito, foi referente à conclusão de curso de 1ª a 8ª série; que o interrogando afirma que apenas se submeteu às provas escritas na referida Escola Estadual Alina de Brito, não tendo frequentado cursos ou aulas; que o interrogando não se recorda a data ou o ano em que esteve na referida escola e nela se submeteu às provas escritas; que o interrogando não sabe informar o nome da senhora que o atendeu na referida Escola Estadual Alina de Brito e lhe aplicou as provas escritas, como também não sabe informar qual era a função dela na escola; que o interrogando não pode informar se referida senhora seria ou não a pessoa chamada GILDA, mencionada na denúncia; que o interrogando não chegou a conhecer qualquer dos diretores da referida Escola Estadual Alina de Brito, nem mesmo referida GILDA ou ANTONIO CARLOS PEIXOTO PERTENCE; que o interrogando obteve o brevê de piloto de helicóptero junto ao SERAC/4 em São Paulo/SP; que nunca foi preso anteriormente; que o interrogando já foi processado criminalmente nesta Comarca; que possui Advogado constituído na pessoa da DR. JOSÉ SAD JÚNIOR, ora também presente nesta audiência, o qual fica também ciente e intimado para apresentação de defesa prévia no prazo legal." (fls. 213/214-grifei)

O teor de suas declarações revela a manifesta falsidade dos documentos utilizados para instruir o procedimento no Quarto Serviço Regional de Aviação Civil, já que espelham situação incongruente, constando que ele teria cumprido cargas horárias nas disciplinas de Língua Portuguesa, Matemática, Ciências P. de Saúde, Geografia, História, EMC e OSPB nos anos de 86 e 87 (fl. 10 vº), além de constarem as informações referentes aos anos de 83 e 84 (fl. 10), diferentemente do que restou afirmado pelo acusado.

Também não milita em seu favor o fato de os documentos de fls. 10 e 11 estarem assinados supostamente por Gilda Menezes da Silva como Diretora de Escola, datados do ano de 1998, quando ela já não detinha o cargo, consoante se extrai do depoimento de Antônio Carlos Peixoto Pertence, no sentido de que ela se aposentou em 1996, in verbis:

"que a partir de 1991, o depoente atuou como Professor de História da Escola Estadual Alina de Brito; que só assumiu a direção da referida escola em 1996; * que recebeu um documento do ministério público de Minas Gerais pedindo a confirmação da autenticidade; que tratava-se de um histórico escolar em nome de Eloi; que o modelo do documento e a assinatura da antiga diretora eram idênticos aos verdadeiros; que não pôde confirmar a autenticidade, todavia, porque não havia documentos nos arquivos da escola indicando que o acusado tenha freqüentado aulas no estabelecimento; que entre o ano de 1994 e o de 2000 a escola mudou de endereço três vezes; que alguns documentos foram extraviados; que não sabe dizer se os documentos referentes a Eloi encontram-se nessa situaçao; que houve casos de outros alunos terem buscado informações e os arquivos da escola não registrarem nada. As perguntas da acusação respondeu que o histórico de Eloi teria sido assinado pela antecessora do depoente de nome Gilda; que Gilda aposentou-se em 1996 e faleceu em 1999." (fl. 265)

Como bem salientado pelo magistrado a quo, a materialidade está bem delineada. Ademais, considerado o fato de que sua freqüência no estabelecimento de ensino deu-se durante o período de 03 (três) dias, não são justificadas as informações constantes do histórico escolar, in verbis:


Assim, no caso em exame a materialidade está comprovada, conforme bem ressaltou o órgão do Ministério Público Federal, em suas alegações finais, pelo fato de que os documentos apresentados ao Serac 4 (fls. 10/12) foram subscritos por pessoa que não teria essa competência. Com efeito, Gilda Menezes da Silva subscreveu o histórico escolar (fls. 10), a declaração de fls. 11 e a declaração de escolaridade (fls. 12) no dia 12 de março de 1998, quando já não era diretora da Escola Estadual de Ensino Supletivo Alina de Britto, pois, de acordo com a declaração do diretor daquele estabelecimento de ensino (fls. 17), Antonio Carlos P. Pertence, ela se aposentou em agosto de 1996. Essa declaração foi corroborada por seu depoimento em juízo, como testemunha da acusação (fls. 265).
É irrelevante o fato de que, no documento de fls. 12, conste como data de sua emissão o dia 12 de março de 1989. Isto porque o reconhecimento da firma nesse documento somente se deu no dia 17 de março de 1998 (fls. 12v), mesma data em que foram reconhecidas as firmas de Gilda Menezes da Silva nos documentos de fls. 10 e 11, o que indica que são da mesma época. Além do mais, a própria defesa admite que essa data pode ter decorrido de erro material (fls. 471, item 15).
Ainda quanto à materialidade, é relevante notar que, no documento de fls. 10 (histórico escolar), consta que ELOI teria estudado na E. E. S. Alina de Britto de 1983 a 1987, porém o próprio acusado, em seu interrogatório, afirmou que esteve nessa escola por apenas três dias, não se recordando quando. Do interrogatório extraio o seguinte trecho, cujos destaques em negrito não constam no original (sic):
(...)
Ora, se o acusado esteve na referida escola por apenas três dias, submetendo-se a provas escritas, sem sequer recordar-se quando, é lógico que não poderia possuir o histórico escolar referido no documento de fls. 10, no qual constam as notas obtidas entre 1983 e 1987. Aliás, nesse documento consta que, no primeiro quadrimestre de 1983, o aluno foi considerado desistente e que "o aluno pediu a 2ª via do histórico escolar em maio de 1996". Se só esteve nessa escola por três dias, por indicação de alguém do próprio DAC, como poderia ter pedido a 2ª via do histórico em 1996? É evidente, portanto, que se trata de documento ideologicamente falso." (fls. 497/498)

A autoria também é inconteste, porquanto o acusado afirmou que encaminhou pessoalmente o certificado de conclusão de primeiro grau, fornecido pela Escola Estadual Alina de Britto, ao SERAC/4 para obter o brevê de piloto de helicóptero e a justificativa de que houve inserção indevida de dados de outro aluno no histórico escolar do réu, cujo erro não foi detectado por falta de conferência, é inverossímil.

Por outro lado, as declarações apresentadas pelas testemunhas de defesa, em juízo, não infirmam a tese da acusação relativa à prática delitiva imputada ao apelante. Confiram-se:


SALETE PIAIA BLANK disse no depoimento judicial:

"Conhece o réu apenas de nome, não sabendo se o mesmo morou em Sarandi. Que não conhece o réu e apenas ouviu dizer que o mesmo teria morado nesta cidade. Nunca foi professora dele. Diz que no final da década de 1990, quando Luiz Carlos foi diretor da Escola Dr. João Carlos Machado, da qual a depoente é diretora atualmente, ouviu falar que o réu teria pedido para fazer "parecer 147", que são provas aplicadas a quem deixou de estudar, para verificar o grau de escolaridade. Que o réu chegou a fazer as provas e as mesmas estão na escola, não lembrando a depoente o resultado dos testes." (fl. 300)

ILDA ANA FORNARI respondeu:

"Que conheceu o réu, pois o mesmo foi aluno da depoente, não lembrando de que série, na época em que a depoente lecionava na Escola Municipal Borges de Medeiros da localidade de Mendes Médio. Que a escola era de primeira à quinta série, não lembrando a depoente quais as séries feitas pelo réu. Depois disso não teve mais contato com o réu, até porque em 1971 a depoente deixou de ser professora. Não sabe até que série ele estudou e nem se concluiu os estudos. PELO DEFENSOR PUBLICO: Que a autora foi professora na escola acima mencionada, de 1966 a abril de 1971." (fl. 301)

LUIZ CARLOS LUCIETTO declarou:

"Que conhece o réu e sabe que o mesmo morou nesta cidade, mas não lembra a época. Que não lembra se o mesmo estudou nesta cidade. Que em 1998, quando o depoente era diretor da Escola de Ensino Fundamental Dr. João Carlos Machado, o réu esteve na escola fazendo as provas do "parecer 147", que se destinam à verificar o grau de escolaridade, não lembrando qual foi o resultado das provas. Lembra que o réu conseguiu a média mínima, tendo feito as provas para comprovar a escolaridade até a quarta série. Que as provas se encontram na escola. PELO DEFENSOR PUBLICO: Nada requereu." (fl. 302)

ELIANA BELIGNI BRANDÃO consignou:

"que exerce a profissão de professora há 28 anos, trabalhando como professora efetiva da rede Estadual de Ensino do Estado de Minas; que já exerceu durante o período de oito anos, isto é, de 1992 a 1999, também a função de diretora da Rede Estadual de Ensino do Estado de Minas Gerais; que atualmente exerce a função de Secretaria Municipal de Educação do Município de Soa Gonçalo do Sapucaí; que foi diretora da Escola Estadual Ministro Lucio de Mendonça, localizada na cidade de SG Sapucaí; que durante o período em que foi diretora, tem conhecimento de que alunos que não tenham cursado regularmente o ensino fundamental e também o ensino médio, podem legalmente, através da Lei de Diretrizes e Bases (LDB), obter o diploma de ensino equivalente ao nível fundamental e médio; que para obter o diploma de "equivalência", basta o interessado requerê-lo na escola; que como requisito o interessado deve ter mais de quinze anos de idade para obter o certificado de "equivalência" de ensino fundamental; e para obter o certificado de "equivalência" de ensino médio o interessado deve ter mais de dezoito anos de idade; que a Lei da Diretrizes e Bases, prevê que o interessado, pode até mesmo em um único dia, requerer o certificado, prestar as provas, e se aprovado obter o certificado; que o acima informado encontra-se previsto na LDB, artigos 24-c, 36, 38 parágrafo 1°, e também nas resoluções da Secretaria de Estado da Educação, de cada Estado da Federação, como por exemplo em Minas Gerais a resolução n° 7.584/94; que o acusado ELOI assim o desejasse, estaria habilitado, a requerer no Estado de Minas Gerais, tal certificado, concernente as conclusões dos ensinos fundamental e médio, desde que realizasse os exames por etapas; que quando ficou sabendo dos fatos narrados na denuncia, procurou o acusado e lhe disse que não haveria necessidade de recorrer ao alegado na denuncia, vez que a Lei o amparava para realizar os exames no próprio Estado de Minas Gerais, como varias outras pessoas o fizeram regularizando suas situações escolares; que o acusado não precisava fazer nada disso, isto é, fazer o exame de "equivalência" no Estado do Rio de Janeiro, vez que poderia fazê-lo no Estado de Minas Gerais; que não conhece a escola de nome Alina de Brito, vez que no município de São Gonçalo não tem nenhuma escola com esta denominação; que não sabe dizer se o acusado frequentou a escola Alina de Brito; que aqui em Minas Gerais o acusado não chegou a realizar qualquer procedimento para fazer o exame de "equivalência", pelo que sabe; que para tal exame não se faz necessário qualquer freqüência na escola, conforme prevê a LDB; que todo o procedimento relativo ao exame de "equivalência", é lavrado em ata, montando-se um dossiê de cada aluno que é guardado por tempo indeterminado." (fls. 316/318)

GERMANO MARTINS FILHO explicitou:

"Que conhece o acusado pois fez um vôo de cheque DAC, para verificar as condições de pilotagem do acusado; que nada sabe acerca dos fatos narrados na denúncia; que o depoente foi à cidade do acusado, e fez o cheque ou recheque do acusado e de outro piloto da região; que esse foi o único contato que teve com o acusado, não podendo dizer nada mais sobre sua pessoa. "Dada a palavra à Defesa do acusado, foi perguntado e respondido que o aproveitamento do acusado no recheque ou cheque foi satisfatório, podendo afirmar que se trata de um bom piloto. "Dada a palavra ao Ministério Público Federal: sem reperguntas." (fl. 330)

LAERCIO PEREIRA DE LIMA afirmou:

"Que conhece o acusado pois o depoente é examinador credenciado pelo DAC, e nesta qualidade, já se dirigiu várias vezes à cidade em que o acusado mora, São Gonçalo do Sapucaí/MG, para fazer recheques de pilotos da região, bem como para vôos de instrução; que nada sabe acerca dos fatos narrados na denúncia, uma vez que só conheceu o acusado quando este já era piloto privado de helicóptero; que pelo que conhece do acusado, é um empresário e que não sabe de nada que o desabone. Dada a palavra à defesa do acusado, foi perguntado e pela testemunha respondido que o aproveitamento do acusado nos recheques efetuados pelo depoente foram satisfatórios, tanto assim que o acusado continua sendo piloto; que outros checadores também fizeram recheques com o acusado e acredita que todos o aprovaram. "Dada a palavra ao Ministério Público Federal: sem reperguntas." (fl. 332)

Assim, as circunstâncias do delito, aliadas ao depoimento colhido na fase judicial, bem como as declarações do acusado, confirmam, de forma precisa e harmônica, a ocorrência dos fatos e a responsabilidade do apelante, que apresentou justificativa que peca por sua inverossimilhança.

Não merece respaldo a tese da defesa no sentido de que o delito deva ser desclassificado para a figura prevista no artigo 301, § 1º, do Código Penal. Ressalte-se que os documentos de fls. 10/12 foram apresentados para que o réu obtivesse a licença de piloto privado de helicóptero, o que não se insere nas hipóteses enumeradas no dispositivo, quais sejam: obter cargo público, isenção de ônus ou de serviço de caráter público. Por outro lado, a expressão "qualquer outra vantagem", constante do tipo penal, também deve ter atributo público, o que não se assemelha à obtenção do brevê de piloto, de caráter privado. No magistério de Guilherme de Souza Nucci, explicita-se: "Qualquer outra vantagem: por interpretação analógica, o tipo penal fornece exemplos - cargo público, isenção de ônus, isenção de serviço de caráter público - para depois generalizar, através do processo de semelhança. Portanto, quando, em virtude do atestado ou da certidão falsa, a pessoa obtiver qualquer vantagem relativa ao setor público, configura-se o crime." Acerca da falsificação de certidão ou atestado emitido por escola, o doutrinador esclarece: "cremos estar configurada a falsidade de documento público e não o delito do art. 301 (certidão ou atestado ideologicamente falso e falsidade material de atestado ou certidão-§ 1º). Este último tipo penal prevê que o atestado, ou a certidão, seja destinado à habilitação de alguém a obter cargo público, isenção de ônus ou serviço público ou qualquer outra vantagem semelhante, o que não é necessariamente a finalidade do atestado ou da certidão escolar. Por isso, melhor é a aplicação da figura típica genérica do art. 297. (...)" (Guilherme de Souza Nucci, in Código Penal Comentado, 10 ed. rev. atual. e ampl.-São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, pp. 1076 e 1064). Nesse mesmo sentido o seguinte julgado indicado pelo Procurador Regional da República:

"PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. FALSIFICAÇÃO DE CERTIDÃO NEGATIVA DE DÉBITO. PRESCRIÇÃO. DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA PARA O ARTIGO 301, § 1° DO CÓDIGO PENAL. IMPOSSIBILIDADE. ADEQUAÇÃO TÍPICA COM O ARTIGO 297 DO CÓDIGO PENAL. NATUREZA PRIVADA DA VANTAGEM AUFERIDA. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DA EXPRESSÃO "QUALQUER OUTRA VANTAGEM" PARA RECONHECÊ-LA COMO VANTAGEM DE CARÁTER PÚBLICO. RECURSO PROVIDO POR MAIORIA DE VOTOS.
1 - A contrafação de certidão negativa de débito, utilizada por um terceiro para a averbação da construção em imóvel perante o Cartório de Registro de Imóveis, constitui o delito previsto no artigo 297 do Código Penal.
2 - Incabível a desclassificação da conduta para o tipo do artigo 301, § 1° do Código Penal, considerando que a expressão "qualquer outra vantagem", contida no artigo 301, § 1° do Código Penal, deve ser interpretada restritivamente, limitando-se a vantagem que também tenha caráter público, em interpretação sistemática com as demais elementares contidas no mesmo parágrafo.
3 - Afastada a desclassificação operada e a conseqüente extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva in abstrato, uma vez comprovado nos autos que o animus da conduta do recorrido se limitou à obtenção de vantagem de cunho estritamente privado, oriunda unicamente da remuneração pela contrafação da certidão, flagrantemente incompatível com o elemento subjetivo do tipo previsto no artigo 301, § 1º, in fine, do Código Penal.
4 - Reformada a decisão de extinção da punibilidade, mantendo-se a capitulação legal da conduta no tipo do artigo 297 do Código Penal, não verificada a prescrição da pretensão punitiva com base na pena máxima abstrata a este cominada.
5 - Recurso provido, por maioria, para devolver o feito ao seu regular processamento. (Recurso Criminal n° 97.03.01 5780-7/SP/726-Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL OLIVEIRA LIMA-grifei)

A defesa também se insurge contra a pena aplicada pelo magistrado, nos seguintes termos:


"Fixo a pena-base em 3 (três) anos de reclusão e 30 (trinta) dias- multa, acima do mínimo legal, pois as circunstâncias judiciais não são favoráveis ao réu. Com efeito, possui antecedentes criminais, conforme se verifica em sua folha de antecedentes e nas certidões criminais apresentadas, tendo sido condenado por falsificação de documento, em crime noticiado pelo próprio réu, visando à obtenção da mesma licença de piloto privado de helicóptero. Além disso, o réu demonstrou sentimento de arrependimento pelo crime que cometeu, reiterando no mesmo crime, de modo que possui personalidade criminosa. Assim, a culpabilidade, a conduta social e a personalidade do réu apontam para a necessidade de fixação da pena-base acima do mínimo legal, a fim de que haja suficiente reprovação do injusto por ele cometido.
Não obstante a condenação anterior, o réu não é reincidente, pois o fato de que trata este processo é anterior ao trânsito em julgado daquela condenação. Assim, não ocorre qualquer circunstância agravante prevista no art. 61 do Código Penal. Também não ocorrem circunstâncias atenuantes. Não há causas de aumento ou de diminuição da pena, razão pela qual tomo definitiva a pena base acima fixada." (fls. 500/501)

Quanto à dosimetria da pena, entendo que foi bem avaliada pelo juízo a quo. Cabe ressaltar que, ao fixar as penas acima do mínimo legal, o magistrado apontou as circunstâncias judiciais, conforme previsão do art. 59 do Código Penal, em que baseava sua decisão. Em relação à assertiva de que houve reconhecimento de que "o réu demonstrou sentimento de arrependimento pelo crime que cometeu", como que fazer crer a defesa, denota-se claro erro material da decisão, com a exclusão da palavra "não", o que se verifica de plano, pela leitura completa da frase, que perdeu o sentido sem a expressão negativa. Ademais, verifica-se que o julgador adotou posicionamento que se coaduna com o entendimento do E. Superior Tribunal de Justiça, porquanto a exasperação da pena fundou-se em condenação por crime praticado antes do fato delitivo versado nestes autos e com trânsito em julgado posterior ao respectivo delitivo (fl. 215), o que não configura reincidência, mas caracteriza mau antecedente, conforme se extrai de recentes julgados do STJ. Confira-se:


HABEAS CORPUS. FURTO QUALIFICADO. DOSIMETRIA DA PENA. MAJORAÇÃO DA PENA-BASE. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. SEGUNDA FASE. AGRAVANTES E ATENUANTES. PREPONDERÂNCIA DA REINCIDÊNCIA SOBRE A CONFISSÃO ESPONTÂNEA. COMPENSAÇÃO. INVIABILIDADE. PRECEDENTES. HABEAS CORPUS DENEGADO.
1. "Segundo entendimento desta Corte, a condenação por crime anterior, cujo trânsito em julgado ocorreu após a nova prática delitiva, embora não caracterize a reincidência, constitui maus antecedentes." (HC 167.602/SP, 5.ª Turma, Rel. Min. LAURITA VAZ, DJe de 9/3/2011.) 2. O Supremo Tribunal Federal e a Quinta Turma desta Corte Superior firmaram o entendimento de que a circunstância agravante da reincidência é preponderante sobre a atenuante da confissão espontânea, nos termos do art. 67 do Código Penal, sendo, por isso, inviável a compensação entre essas circunstâncias. Precedentes.
3. Habeas corpus denegado.
(HC 170.835/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 10/04/2012, DJe 17/04/2012-grifei)
HABEAS CORPUS. CRIME DE INCÊNDIO. PENA RECLUSIVA. SUBSTITUIÇÃO POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. PRETENDIDA CONCESSÃO. AUSÊNCIA DE PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS SUBJETIVOS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO.
1. Encontrando-se a negativa de substituição fulcrada nos antecedentes da paciente, considerados desfavoráveis, e na sua personalidade, tida como voltada à prática criminosa, inviável acoimar de flagrantemente ilegal a decisão que entendeu não preenchidos os requisitos subjetivos exigidos pelo art. 44, III, do Código Penal.
REPRIMENDA. REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO. MODO SEMIABERTO.
CONDENAÇÃO PENAL DEFINITIVA. MAUS ANTECEDENTES E PERSONALIDADE VOLTADA À PRÁTICA DE CRIMES. CARACTERIZAÇÃO. MODO INTERMEDIÁRIO JUSTIFICADO. COAÇÃO NÃO DEMONSTRADA.
1. Segundo precedentes da Suprema Corte e deste Superior Tribunal, podem ser considerados, para caracterização de maus antecedentes, condenações por crime anterior com trânsito em julgado posterior ao delito em exame.
2. Não há ilegalidade na fixação do modo semiaberto de execução quando, não obstante a pena tenha sido definitivamente fixada em 4 (quatro) anos de reclusão, constata-se a existência de condenação penal anterior hábil para gerar maus antecedentes, o que indica que o modo intermediário para o início do desconto da sanção privativa de liberdade mostra-se justificado e é o mais adequado para a prevenção e repressão do delito denunciado.
3. Ordem denegada.
(HC 202.577/RJ, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 10/04/2012, DJe 23/04/2012-grifei)

Destaco que a defesa não trouxe aos autos qualquer prova que pudesse alterar a conclusão a que chegou o magistrado a quo, a qual, conforme acima demonstrado, foi devidamente fundamentada. Assim, a dosimetria das penas não merece qualquer revisão.

Diante do exposto, rejeito as preliminares e nego provimento à apelação, mantendo, integralmente, a sentença.

É COMO VOTO.


RAMZA TARTUCE
Desembargadora Federal


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