D.E. Publicado em 05/07/2012 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar as preliminares e negar provimento à apelação, mantendo na íntegra a decisão de primeiro grau, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
Trata-se de apelação criminal interposta por Eloi Radin Allerand contra a sentença proferida pelo MM. Juiz Federal da 10ª Vara Federal em São Paulo - SP, que o condenou às penas de 03 (três) anos de reclusão e 30 (trinta) dias-multa, em regime aberto, no valor de 1/2 (metade) do salário mínimo vigente à época dos fatos, a ser corrigido a partir daquela data, como incurso no artigo 304 do Código Penal, com substituição da pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, a serem definidas pelo Juízo da Execução Penal.
Consta da denúncia que:
O juiz estadual do Estado de Minas Gerais determinou a remessa do inquérito policial à Justiça Federal de São Paulo, sob o fundamento de que o delito de uso de documento falso deu-se perante o SERAC 4 - Quarto Serviço Regional de Aviação Civil, em São Paulo/Capital, o qual é órgão federal (fls. 99/100).
Recebimento da denúncia, às fls. 198/199, em 20 de janeiro de 2003.
O réu foi interrogado (fls.213/214) e apresentou a defesa prévia (fls. 243/244).
Folhas de antecedentes, às fls. 202, 204, 211, 215/216, 441, 445 vº e 447/449.
Depoimento da testemunha de acusação, à fl. 265, e de defesa, às fls. 300, 301, 302, 330/331 e 332/333.
Alegações finais do Parquet, às fls. 451/455, e da defesa, às fls. 466/473.
Sentença condenatória, às fls.491/502, publicada em 30/08/2005 (fl. 503).
Nas razões de apelação, Eloi Radin Allerand alega (fls. 533/545):
a) nulidade do processo, em razão da incompetência absoluta da Justiça Federal;
b) os documentos de fls. 217/235 indicam que o apelante respondeu a ação penal perante a Justiça Comum do Estado de Minas Gerais por fato materialmente idêntico ao objeto da presente ação;
c) embora a denúncia impute ao apelante os delitos previstos nos artigos 297 e 304, ambos do Código Penal, deve ser adotado o entendimento que prevaleceu no âmbito do STJ e do STF, no sentido de que o apelante deve responder perante a Justiça Comum, competente que é para apreciar a suposta falsificação do documento público, sendo irrelevante para fixação da competência o uso posterior perante repartição federal;
d) os documentos originários da Escola Estadual Alina de Britto não foram apreciados pelo SERAC quando da expedição da licença de piloto privado de helicóptero, como revela a análise do procedimento de fls. 162/171;
e) do reconhecimento da incompetência decorre, portanto, a própria nulidade da denúncia, apresentada por órgão que não possui legitimidade para o seu oferecimento;
f) nulidade do processo, a partir do recebimento da denúncia, em razão da manifesta ilegalidade no ato de interrogatório do apelante, pois não foi garantido ao apelante o direito ao silêncio, a que faz referência o art. 5°, inciso LXIII, da Constituição Federal e o art. 186 CPP, segunda parte;
g) o recorrente foi prejudicado, porque a condenação se baseou, principalmente, no conteúdo de sua declaração;
h) o réu deve ser absolvido, porquanto, ao contrário do que foi consignado na sentença, o ofício de fl. 17, subscrito por Antônio Carlos P. Pertence, a única testemunha acusatória, é desmentido pela certidão de fl. 25;
i) é incontroverso que o apelante compareceu, fez o curso e se submeteu às provas exigidas pelo estabelecimento de ensino, tanto assim que suas declarações estão apoiadas em todos os documentos que constam dos autos, corroborados pela certidão de fls. 25/26;
j) os documentos de fls. 10/12 são verdadeiros e foram assinados pela diretora Gilda Menezes da Silva, cujo óbito ocorreu em 26 de dezembro de 1999 (fl. 76), posteriormente à data inserida às fls. 10 vº, 11 e 12, tendo havido meros erros materiais;
k) a diretora aposentada, por qualquer motivo, exerceu posteriormente funções no referido estabelecimento de ensino, por isso nenhuma responsabilidade tem o apelante por esse fato e pelo princípio da aparência, quem se apresenta como funcionário público em repartição pública goza de presunção de que, realmente, está no regular exercício de suas funções;
l) é possível e provável que dados relativos a outro aluno foram, por equívoco, indevidamente inseridos no histórico escolar do apelante, que não percebeu o erro pelo simples fato de que não o conferiu;
m) os fatos revelados no interrogatório do acusado foram confirmados pela testemunha Eliana Beligni Brandão;
n) o período de três dias, mencionado no interrogatório, é aquele "referente à conclusão do curso de 1ª a 8ª série", no qual foram aplicadas provas escritas;
o) ainda que as alegações ministeriais fossem procedentes, a interpretação do art. 304 do Código Penal deve-se dar em conjunto com o art. 301, § 1°, (falsidade material de atestado ou certidão), e não com o art. 297, caput, do Código Penal (falsidade de documento público);
p) os supostos documentos falsificados, conforme a própria denúncia, "são os de fls. 06/08, consistindo em um histórico escolar, uma declaração de escolaridade e outra de que ELOI cursou o 1º grau no estabelecimento de ensino Alma de Brito (escola estadual)", o que atrai a incidência do princípio da especialidade;
q) ainda que se cogite do delito previsto no art. 304 c/c o art. 297, caput, ambos do Código Penal, a pena deve ser diminuída, considerando-se a primariedade do réu, seus antecedentes e conduta social, além do verificado arrependimento.
Com contrarrazões, subiram os autos (fls. 568/574). Nesta Corte, o parecer ministerial foi pelo desprovimento do recurso (fls. 576/582).
O feito foi submetido à revisão, na forma regimental.
É O RELATÓRIO.
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VOTO
No que diz respeito à competência da Justiça Federal para o processamento e julgamento do delito pelo qual o apelante Eloi Radin Allerand foi condenado, ou seja, a conduta prevista no artigo 304 do Código Penal, referida questão já foi enfrentada pelo Juízo a quo.
Com efeito, a regra de competência para o julgamento das causas em que as infrações penais são perpetradas em detrimento de bens, serviços ou interesses da União está assentada no artigo 109, inciso IV, da Constituição Federal. Nesse passo, a competência da Justiça Federal se justifica pela prática do crime de uso de documento falso perante o Quarto Serviço Regional de Aviação Civil-Serac 4, do que se extrai a ocorrência de fato ofensivo a órgão federal.
Ressalte-se que no habeas corpus julgado pelo Superior Tribunal de Justiça, invocado pela defesa, a situação versada é diversa da destes autos. Naquele feito, o então paciente respondeu pela falsificação do documento, não pelo uso perante ente da União, como restou apurado no presente processo. Confira-se o seguinte trecho do voto vendedor, proferido pelo Ministro Hamilton Carvalhido:
O habeas corpus nº 84533/MG-STF tratou da matéria sob o mesmo enfoque analisado pelo STJ., in verbis:
No mais, a consumação do crime contra o órgão público prescinde da análise da documentação apresentada com o intuito de obtenção do serviço respectivo pelo órgão competente, a teor dos seguintes julgados:
Assim, não há se falar em incompetência absoluta da Justiça Federal para o processo e julgamento do feito e em ilegitimidade do Ministério Público Federal para o oferecimento da denúncia.
Relativamente a outra preliminar, fundada na ausência de informação acerca do direito ao silêncio, observo que a defesa prévia cingiu-se a refutar a denúncia e apresentar o rol de testemunhas. Não se requereu a realização de novo interrogatório e não foi suscitada a nulidade naquela oportunidade. Outrossim, a matéria não foi articulada em alegações finais. Por outro lado, o advogado do réu estava presente na respectiva audiência (fl. 214), ou seja, acompanhou o ato e poderia se manifestar a respeito da aludida omissão ou caso vislumbrasse eventual abuso, de modo que não se verifica o alegado prejuízo. Confiram-se os seguintes julgados:
Rejeito, assim, as preliminares arguidas pelo acusado.
A materialidade e autoria delitivas restaram demonstradas pelos documentos de fls. 09/12 e 17, bem como pela prova oral produzida, inclusive o interrogatório do acusado.
Ouvido no inquérito policial, o apelante afirmou que frenquentou e cumpriu toda a carga horária exigida para o curso a que se refere o documento de fl. 06 (10, nesta autuação), in verbis:
Não obstante a certidão de fl. 25 noticie que Eloi Radin Allerand cursou a 8ª série, em 1987, bem como sua aprovação, o acusado não confirmou tal informação ao responder, em juízo, que frequentou o estabelecimento de ensino durante 03 dias, onde se submeteu às provas escritas, mas sem ter participado de cursos ou aulas. Confira-se:
O teor de suas declarações revela a manifesta falsidade dos documentos utilizados para instruir o procedimento no Quarto Serviço Regional de Aviação Civil, já que espelham situação incongruente, constando que ele teria cumprido cargas horárias nas disciplinas de Língua Portuguesa, Matemática, Ciências P. de Saúde, Geografia, História, EMC e OSPB nos anos de 86 e 87 (fl. 10 vº), além de constarem as informações referentes aos anos de 83 e 84 (fl. 10), diferentemente do que restou afirmado pelo acusado.
Também não milita em seu favor o fato de os documentos de fls. 10 e 11 estarem assinados supostamente por Gilda Menezes da Silva como Diretora de Escola, datados do ano de 1998, quando ela já não detinha o cargo, consoante se extrai do depoimento de Antônio Carlos Peixoto Pertence, no sentido de que ela se aposentou em 1996, in verbis:
Como bem salientado pelo magistrado a quo, a materialidade está bem delineada. Ademais, considerado o fato de que sua freqüência no estabelecimento de ensino deu-se durante o período de 03 (três) dias, não são justificadas as informações constantes do histórico escolar, in verbis:
A autoria também é inconteste, porquanto o acusado afirmou que encaminhou pessoalmente o certificado de conclusão de primeiro grau, fornecido pela Escola Estadual Alina de Britto, ao SERAC/4 para obter o brevê de piloto de helicóptero e a justificativa de que houve inserção indevida de dados de outro aluno no histórico escolar do réu, cujo erro não foi detectado por falta de conferência, é inverossímil.
Por outro lado, as declarações apresentadas pelas testemunhas de defesa, em juízo, não infirmam a tese da acusação relativa à prática delitiva imputada ao apelante. Confiram-se:
SALETE PIAIA BLANK disse no depoimento judicial:
ILDA ANA FORNARI respondeu:
LUIZ CARLOS LUCIETTO declarou:
ELIANA BELIGNI BRANDÃO consignou:
GERMANO MARTINS FILHO explicitou:
LAERCIO PEREIRA DE LIMA afirmou:
Assim, as circunstâncias do delito, aliadas ao depoimento colhido na fase judicial, bem como as declarações do acusado, confirmam, de forma precisa e harmônica, a ocorrência dos fatos e a responsabilidade do apelante, que apresentou justificativa que peca por sua inverossimilhança.
Não merece respaldo a tese da defesa no sentido de que o delito deva ser desclassificado para a figura prevista no artigo 301, § 1º, do Código Penal. Ressalte-se que os documentos de fls. 10/12 foram apresentados para que o réu obtivesse a licença de piloto privado de helicóptero, o que não se insere nas hipóteses enumeradas no dispositivo, quais sejam: obter cargo público, isenção de ônus ou de serviço de caráter público. Por outro lado, a expressão "qualquer outra vantagem", constante do tipo penal, também deve ter atributo público, o que não se assemelha à obtenção do brevê de piloto, de caráter privado. No magistério de Guilherme de Souza Nucci, explicita-se: "Qualquer outra vantagem: por interpretação analógica, o tipo penal fornece exemplos - cargo público, isenção de ônus, isenção de serviço de caráter público - para depois generalizar, através do processo de semelhança. Portanto, quando, em virtude do atestado ou da certidão falsa, a pessoa obtiver qualquer vantagem relativa ao setor público, configura-se o crime." Acerca da falsificação de certidão ou atestado emitido por escola, o doutrinador esclarece: "cremos estar configurada a falsidade de documento público e não o delito do art. 301 (certidão ou atestado ideologicamente falso e falsidade material de atestado ou certidão-§ 1º). Este último tipo penal prevê que o atestado, ou a certidão, seja destinado à habilitação de alguém a obter cargo público, isenção de ônus ou serviço público ou qualquer outra vantagem semelhante, o que não é necessariamente a finalidade do atestado ou da certidão escolar. Por isso, melhor é a aplicação da figura típica genérica do art. 297. (...)" (Guilherme de Souza Nucci, in Código Penal Comentado, 10 ed. rev. atual. e ampl.-São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, pp. 1076 e 1064). Nesse mesmo sentido o seguinte julgado indicado pelo Procurador Regional da República:
A defesa também se insurge contra a pena aplicada pelo magistrado, nos seguintes termos:
Quanto à dosimetria da pena, entendo que foi bem avaliada pelo juízo a quo. Cabe ressaltar que, ao fixar as penas acima do mínimo legal, o magistrado apontou as circunstâncias judiciais, conforme previsão do art. 59 do Código Penal, em que baseava sua decisão. Em relação à assertiva de que houve reconhecimento de que "o réu demonstrou sentimento de arrependimento pelo crime que cometeu", como que fazer crer a defesa, denota-se claro erro material da decisão, com a exclusão da palavra "não", o que se verifica de plano, pela leitura completa da frase, que perdeu o sentido sem a expressão negativa. Ademais, verifica-se que o julgador adotou posicionamento que se coaduna com o entendimento do E. Superior Tribunal de Justiça, porquanto a exasperação da pena fundou-se em condenação por crime praticado antes do fato delitivo versado nestes autos e com trânsito em julgado posterior ao respectivo delitivo (fl. 215), o que não configura reincidência, mas caracteriza mau antecedente, conforme se extrai de recentes julgados do STJ. Confira-se:
Destaco que a defesa não trouxe aos autos qualquer prova que pudesse alterar a conclusão a que chegou o magistrado a quo, a qual, conforme acima demonstrado, foi devidamente fundamentada. Assim, a dosimetria das penas não merece qualquer revisão.
Diante do exposto, rejeito as preliminares e nego provimento à apelação, mantendo, integralmente, a sentença.
É COMO VOTO.
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Data e Hora: | 29/05/2012 12:27:09 |