Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 21/09/2012
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 0000205-79.2006.4.03.6117/SP
2006.61.17.000205-9/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANTONIO CEDENHO
RECORRENTE : Justica Publica
RECORRIDO : ANTONIO CARLOS PRADO LYRA
ADVOGADO : LUÍS EDUARDO DE FREITAS ARATO e outro

EMENTA

PENAL. PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CRIME DE SONEGAÇÃO FISCAL. USO DE RECIBOS MÉDICOS E ODONTOLÓGICOS FALSIFICADOS. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. ABSORÇÃO DO CRIME DE USO DE DOCUMENTO FALSO. SONEGAÇÃO FISCAL. ART. 1º, DA LEI 8.137/90. PEDIDO DE PARCELAMENTO COMUM DEFERIDO PELA AUTORIDADE ADMINISTRATIVA. SUSPENSÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA ESTATAL E DO CURSO DO LAPSO PRESCRICIONAL. POSSIBILIDADE. ARTIGO 9º, DA LEI 10.684/2003 E ARTIGOS 68 E 69, AMBOS DA LEI Nº 11.941/09. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1- Os recibos médicos e odontológicos falsificados, embora tenham sido apresentados à Receita Federal em momento posterior à declaração de imposto de renda do apelado, não possuem outra serventia que não seja a de encobrir a falsa declaração, para a efetivação do crime de sonegação fiscal. A finalidade última do agente é a de ludibriar o Fisco para suprimir ou reduzir tributo, não havendo maior lesividade da conduta praticada.
2- O crime menos grave deve ser absorvido pelo mais grave, pelo princípio da consunção. Considerando que o crime de uso de documento particular falsificado é apenado com 01 (um) a 05 (cinco) anos de reclusão, deve ser absorvido pelo delito de sonegação fiscal, que prevê pena de 02 (dois) a 05 (cinco) anos de reclusão.
3- O pagamento integral do débito fiscal configura causa extintiva da punibilidade dos crimes previstos nos artigos 1º e 2º, da Lei nº 8.137/90, e artigos 168-A e 337-A, ambos do Código Penal, e a concessão do parcelamento do débito suspende a pretensão punitiva estatal e o curso da prescrição, nos termos do artigo 9º, da Lei nº 10.684/03. Igualmente estabeleceram os artigos 68 e 69, ambos da Lei nº 11.941/09.
4- Muito embora pendente de julgamento a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.273, visando a declaração de inconstitucionalidade dos artigos 67, 68 e 69, da Lei nº 11.941/09 (correspondentes ao artigo 9º, da Lei nº 10.684/03), o Supremo Tribunal Federal tem aplicado tais normas, inclusive retroativamente, por serem mais benéficas ao réu (artigo 5º, inciso XL, da Constituição Federal e artigo 2º, parágrafo único, do Código Penal). Assentou, ainda, que a qualquer tempo, mesmo após o recebimento da denúncia, o pedido de parcelamento deferido pela autoridade administrativa suspende a pretensão punitiva estatal e o curso do lapso prescricional, extinguindo-se a punibilidade com o seu pagamento integral.
5- Não há razão para se limitar a suspensão da pretensão punitiva estatal em razão do parcelamento do débito apenas aos casos do parcelamento especial - PAES, instituído pela Lei nº 10.684/03, cujo prazo de adesão foi prorrogado até 31/08/2003 (art. 13, da Lei nº 10.743/03).
6- Efetuado qualquer parcelamento após a vigência do artigo 9º, da Lei nº 10.684/03, como no caso dos autos, é de rigor a suspensão da pretensão punitiva estatal e do curso do lapso prescricional, até o integral pagamento do débito ou até o descumprimento do parcelamento pelo contribuinte.
7- Apelação a que se nega provimento.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator, acompanhado pela Des. Fed. Ramza Tartuce, vencido o Des. Fed. André Nekastchalow que lhe dava parcial provimento para determinar o regular prosseguimento da ação penal quanto ao delito do art. 1º, I, da Lei nº8.137/90, em relação ao crédito tributário constante no Processo Administrativo nº 13827.000403/2005-08.


São Paulo, 03 de setembro de 2012.
Antonio Cedenho
Desembargador Federal


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RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 0000205-79.2006.4.03.6117/SP
2006.61.17.000205-9/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANTONIO CEDENHO
RECORRENTE : Justica Publica
RECORRIDO : ANTONIO CARLOS PRADO LYRA
ADVOGADO : LUÍS EDUARDO DE FREITAS ARATO e outro

VOTO-VISTA

Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público Federal contra a sentença de fls. 140/153, que anulou, desde o recebimento da denúncia, a ação penal proposta contra Antonio Carlos Prado Lyra pela prática dos delitos do art. 1º, I, da Lei n. 8.137/90, duas vezes, e do art. 304 do Código Penal, considerando a falta de justa causa para a demanda, uma vez que não há decisão definitiva na esfera administrativa quanto a uma parte do débito tributário e houve parcelamento da outra parte do débito antes do recebimento da denúncia, bem como por estar absorvido o delito de uso de documento falso pela sonegação fiscal.

Alega-se, em síntese, o seguinte:

a) o acusado realizou o parcelamento ordinário do débito, que não pode ser equiparado ao parcelamento especial previsto na Lei n. 10.684/03 - Paes, a qual é excepcional e temporária, tendo aplicação restrita aos casos nela previstos;
b) o tributo foi constituído em 19.04.05 e o pedido do acusado para inclusão em parcelamento ocorreu em 10.06.05, quando já estava encerrado o prazo para adesão ao parcelamento da Lei n. 10.684/03, que terminou em 31.08.03;
c) não é aplicável a regra do art. 9º da Lei n. 10.684/03, pois o acusado não está no programa especial de parcelamento, devendo prosseguir a ação penal;
d) os crimes de sonegação fiscal e uso de documento falso são autônomos, foram praticados em contextos e momentos distintos e tutelam bens jurídicos diferentes, sendo, respectivamente, o erário e a fé pública (fls. 159/172).

O Eminente Desembargador Federal Antonio Cedenho votou para negar provimento ao recurso (fls. 219/225).

Com a devida vênia, acompanho o Eminente Relator apenas quanto à questão da absorção do delito de uso de documento falso pela sonegação fiscal e, no mais, divirjo por entender que não está caracterizada a suspensão da pretensão punitiva estatal com base no parcelamento ordinário.

Parcelamento diverso do Paes. Suspensão da pretensão punitiva. Inadmissibilidade. A suspensão da pretensão punitiva depende de previsão legal, como sucede com a Lei n. 10.684/03, que instituiu o Paes. Não sendo tal o parcelamento e não havendo previsão legal, não se verifica a suspensão da pretensão punitiva (TRF da 3ª Região, ACr n. 2008.03.99.022388-4, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, j. 29.09.08).

Parcelamento. Comprovação. Exigibilidade. Conforme estabelece o § 2° do art. 1° da Lei n. 11.491/09, as dívidas objeto do pedido de parcelamento devem ser "consolidadas pelo sujeito passivo". Para efeito de lograr a suspensão da pretensão punitiva, cumpre ficar demonstrado que os créditos objeto da denúncia foram efetivamente consolidados no parcelamento, razão por que é insuficiente o mero termo de opção e o início do pagamento sem que se tenha nos autos do processo-crime elementos idôneos de que aludidos créditos fizeram parte do parcelamento fiscal:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. (...) PARCELAMENTO DO DÉBITO. INDISPENSABILIDADE DE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA. VALOR PROBANTE DE EXTRATOS ELETRÔNICOS (...).
1. O fundamento desta impetração é a suposta adesão do paciente a programa de parcelamento de débito fiscal, o que, quando cotejados o montante do débito, objeto da denúncia oferecida na ação penal n.º 2008.61.05.001604-0, e os documentos juntados pelo impetrante a título de prova do efetivo deferimento do parcelamento (fls. 30/89 e 132/141), não se evidencia de plano.
(...).
3. (...) caberia ao impetrante demonstrar, mediante documento emitido pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, o qual trouxesse o cotejamento analítico dos débitos objetos da ação penal com aqueles recobertos pelo parcelamento efetivamente deferido, haver obtido a suspensão da exigibilidade do crédito tributário.
(...).
5. Enfim os documentos de fls. 132/141 não têm o valor probante que, a eles, quer dar o impetrante, pois resumem-se a extratos obtidos eletronicamente e da cópia impressa de telas de programas de computador, não sendo claros nem concludentes acerca da prova a que se julgam prestar.
6. Nesse passo, em razão da complementariedade sistêmica havida entre os códigos de processo civil e de processo penal, por força do art. 3º do Decreto-lei n.º 3.689/1941, é oportuno ressaltar que a disciplina do art. 365 do Código de Processo Civil brasileiro, na redação que, ao dispositivo, deu a Lei federal n.º 11.382/2006, ao reger a força probante dos extratos digitais de bancos de dados públicos e privados, assevera que estes fazem a mesma prova que os originais, desde que atestado pelo seu emitente, sob as penas da lei, que as informações conferem com o que consta na origem.
(...).
(TRF 3ª Região, HC n. 2009.03.00.042691-0, Rel. Des. Fed. Ramza Tartuce, j. em 08.02.10)

No mesmo sentido:

(...). PARCELAMENTO. COMPROVAÇÃO. EXIGIBILIDADE. APROPRIAÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA (...).
2. Conforme estabelece o § 2° do art. 1° da Lei n. 11.941/09, as dívidas objeto do pedido de parcelamento devem ser "consolidadas pelo sujeito passivo". Para efeito de lograr a suspensão da pretensão punitiva, cumpre ficar demonstrado que os créditos objeto da denúncia foram efetivamente consolidados no parcelamento, razão por que é insuficiente o mero termo de opção e o início do pagamento sem que se tenha nos autos do processo-crime elementos idôneos de que aludidos créditos fazem parte do parcelamento fiscal (...).
(TRF da 3ª Região, ACr n. 2007.61.19.002638-4, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, j. 30.08.10)

Do caso dos autos. Narra a denúncia que Antonio Carlos Prado Lyra reduziu tributo, mediante inserção de elementos inexatos nas declarações do Imposto de Renda Pessoa Física, referentes aos exercícios de 2002 e 2003, anos-calendário 2001 e 2002, originando o Procedimento Fiscal n. 10825.000725/2005-71 e o auto de infração no valor de R$ 36.491,51 (trinta e seis mil quatrocentos e noventa e um reais e cinqüenta e um centavos). Após, ao ser intimado para comprovar os tratamentos médicos e odontológicos declarados ao Fisco, apresentou recibos inidôneos (fls. 2/4).

O acusado impugnou parte do referido débito, prosseguindo a impugnação no Procedimento Fiscal n. 10825.000725/2005-71, tendo sido transferida a outra parte para o Processo Administrativo n. 13827.000403/2005-08, em que houve deferimento do pedido de parcelamento formalizado em 10.06.05 (fls. 92/94).

Referido parcelamento não observa as disposições da Lei n. 10.684/03 - Paes e, portanto, não enseja a suspensão da pretensão punitiva estatal, visto ser necessária previsão legal específica para tanto.

Outrossim, a posterior inclusão do saldo devedor remanescente no Parcelamento Excepcional da Lei n. 11.941/09 também não enseja a suspensão da pretensão punitiva, considerando estar pendente a consolidação do parcelamento (fl. 211).

Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso para determinar o regular prosseguimento da ação penal quanto ao delito do art. 1º, I, da Lei n. 8.137/90, em relação ao crédito tributário constante Processo Administrativo n. 13827.000403/2005-08.

É o voto.


Andre Nekatschalow


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RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 0000205-79.2006.4.03.6117/SP
2006.61.17.000205-9/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANTONIO CEDENHO
RECORRENTE : Justica Publica
RECORRIDO : ANTONIO CARLOS PRADO LYRA
ADVOGADO : LUÍS EDUARDO DE FREITAS ARATO e outro

RELATÓRIO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:


Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pela Justiça Pública, em face da sentença (fls. 141/153) que, em sede de ação penal ajuizada em face de Antonio Carlos Prado Lyra pela prática dos delitos previstos no artigo 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/90 (por duas vezes), e artigo 304, do Código Penal, aplicou o princípio da consunção, entendendo que o crime de uso de documento falso deve ser absorvido pelo delito de sonegação fiscal, e anulou o processo desde o recebimento da denúncia, determinando o trancamento do feito.

Narra a denúncia que:

"Nos dias 30.04.2002, às 8h57min, e 30.04.2003, às 0h09min, o denunciado, voluntária e conscientemente, reduziu tributo mediante inserção de elementos inexatos em declarações de imposto de renda pessoa física exercícios 2002 e 2003, referente aos anos-calendário de 2001 e 2002, conforme positiva a presente representação fiscal para fins penais (fls.01/02).

Segundo apurado nos presentes autos, após análise das declarações de imposto de renda pessoa física exercícios 2002 e 2003, objeto do procedimento fiscal nº 10825.000725/2005-71, a fiscalização da Receita Federal constatou que o denunciado inseriu em sua declaração despesas odontológicas sem que as mesmas tivessem efetivamente ocorrido.

As declarações de imposto de renda pessoa física de fls. 38/45 indicam que o denunciado gastou R$ 15.562,00 (quinze mil, quinhentos e sessenta e dois reais) no ano de 2001 e R$ 11.831,00 (onze mil, oitocentos e trinta e um reais) no ano de 2002 em tratamentos médicos odontológicos.

Ocorre que, em relação aos tratamentos realizados pelo dentista Sydney Carlos Ceschini, conforme Ato Declaratório Executivo nº 17, de 22.11.2004 (fl.16), todos os recibos de tratamento odontológico emitidos por ou em nome de Sidney no período de 01.01.1999 a 31.12.2002 foram considerados inidôneos para fins tributários, tornando-se imprestáveis e ineficazes para fins de dedução a título de despesa médica da base de cálculo do imposto de renda.

Já em relação aos tratamentos realizados pelos profissionais liberais Leopoldino Capelozza Filho, Nilcea Campesi, Evandro José Borgo, Valéria A A Prado Rochi, Luiz Augusto Negrão, Luiz Alfredo Teixeira Netto, após ser notificado a apresentar comprovantes do efetivo pagamento das despesas, o denunciado também não conseguiu desincumbir-se desta obrigação, tornando-as inexistentes para fins fiscais, motivo pelo qual as mesmas foram glosadas pela Receita Federal conforme se verifica no Termo de Verificação Fiscal de fls.07/09.

Diante disso, foi lavrado o competente auto de infração, no valor de R$ 36.491,51 (trinta e seis mil, quatrocentos e noventa e um reais e cinqüenta e um centavos) (fls.04/06).

Ressurte dos autos que em dezembro de 2003 o denunciado, voluntária e conscientemente, fez uso de documentos ideologicamente falsos, consistentes em recibos de tratamento médicos e odontológicos fornecidos pelos profissionais liberais Sidney Carlos Ceschini, Leopoldino Capelozza Filho, Nilcea Campesi, Evandro José Borgo, Valéria A A Prado Rochi, Luiz Augusto Negrão, Luiz Alfredo Teixeira Netto, conforme positivam os documentos de fls.19.

Segundo apurado, conforme já declinado anteriormente, no procedimento fiscal nº 10825.001365/2005-24, após regularmente intimado a comprovar o tratamento odontológico que havia sido declarado ao Fisco e seu pagamento (v. Intimação fiscal de fl.18), o denunciado apresentou à Delegacia da Receita Federal os recibos de tratamentos médicos e odontológicos de fls.20/38, os quais foram considerados inidôneos para fins tributários, tornando-se imprestáveis e ineficazes para fins de dedução a título de despesa médica da base de cálculo do imposto de renda."


A denúncia foi recebida em 25 de janeiro de 2006 (fl. 97).

Na audiência designada para o interrogatório do acusado, foi proferida sentença que aplicou o princípio da consunção, entendendo que o crime de uso de documento falso deve ser absorvido pelo delito de sonegação fiscal, e anulou o processo desde o recebimento da denúncia, determinando o trancamento do feito, tendo em vista a ausência de esgotamento da via administrativa quanto a uma parte do débito, e o deferimento do pedido de parcelamento em relação ao débito remanescente, sem prejuízo de futura ação penal após o término do procedimento fiscal, dependendo de seu resultado, ou caso haja descumprimento do parcelamento.

Em suas razões recursais (fls. 162/172), sustenta o Ministério Público Federal que o crime de uso de documento falso constitui delito autônomo e, portanto, não pode ser absorvido pelo crime de sonegação fiscal. Aduz, ainda, que o parcelamento comum, realizado pelo acusado, não está abrangido pelo disposto no artigo 9º, da Lei nº 10.684/03, vez que requerido e concedido após o término do prazo legal para adesão ao parcelamento especial.

O recorrido apresentou contrarrazões (fls. 180/185).

A Procuradoria Regional da República opina seja dado provimento ao recurso (fls. 189/201).

É o relatório.

Dispensada a revisão, nos termos regimentais.


Antonio Cedenho
Desembargador Federal


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Data e Hora: 03/07/2012 17:03:21



RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 0000205-79.2006.4.03.6117/SP
2006.61.17.000205-9/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANTONIO CEDENHO
RECORRENTE : Justica Publica
RECORRIDO : ANTONIO CARLOS PRADO LYRA
ADVOGADO : LUÍS EDUARDO DE FREITAS ARATO e outro

VOTO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:


O Juízo "a quo" anulou o feito desde o recebimento da denúncia, pois "(...) o réu comprova, pelos documentos de fls. 131/139, que: a) obteve parcelamento de parte do crédito constituído pelo auto de infração que originou a presente ação, junto à Secretaria da Receita Federal, em outubro de 2005 (fl.131) e que se encontra com nenhuma prestação em atraso (fl.137); b) a outra parte do crédito constituído foi impugnada por meio de recurso administrativo, estando com a exigibilidade suspensa, o que significa que não houve ainda lançamento definitivo do respectivo crédito" e, quanto ao crime de uso de documento falso, decidiu que "a suspensão da pretensão punitiva atinge a imputação da prática de crime de uso de documentos ideologicamente falsos (art. 304, do Código Penal), pois, pela simples leitura da peça acusatória, percebe-se que tal fato narrado constitui mera fase de realização da infração de sonegação fiscal, sendo, assim, absorvido por esta, pela aplicação do princípio da consunção. Trata-se, portanto, da hipótese de absorção do crime-meio pelo crime-fim, em que a jurisprudência dominante posicionou-se no sentido de que somente cabe punição pelo crime-fim."

A sentença deve ser mantida.

No caso, os recibos médicos e odontológicos falsificados, embora tenham sido apresentados à Receita Federal em momento posterior à declaração de imposto de renda do apelado, não possuem outra serventia que não seja a de encobrir a falsa declaração, para a efetivação do crime de sonegação fiscal. A finalidade última do agente é a de ludibriar o Fisco para suprimir ou reduzir tributo, não havendo maior lesividade da conduta praticada. Desta forma, o crime menos grave deve ser absorvido pelo mais grave, pelo princípio da consunção.

Considerando que o crime de uso de documento particular falsificado é apenado com 01 (um) a 05 (cinco) anos de reclusão, deve ser absorvido pelo delito de sonegação fiscal, que prevê pena de 02 (dois) a 05 (cinco) anos de reclusão.

Nesse sentido, julgado do Superior Tribunal de Justiça:

"RECURSO ESPECIAL. PENAL. CRIME DE FALSIDADE IDEOLÓGICA. VERBETES SUMULARES N.ºS 284 DO STF E 211 DO STJ. NÃO CONHECIMENTO. USO DE DOCUMENTO FALSO E SONEGAÇÃO FISCAL. CONSUMAÇÃO DO CRIME FISCAL SOMENTE COM O LANÇAMENTO DEFINITIVO DO DÉBITO. FALSIDADE PRATICADA COM FIM EXCLUSIVO DE LESAR O FISCO, VIABILIZANDO A SONEGAÇÃO DO TRIBUTO. FALSO EXAURIDO NA SONEGAÇÃO. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA PARTE, DESPROVIDO.

1. Observa-se que o acórdão recorrido não se referiu ao crime do art. 299 do Código Penal (falsidade ideológica), até porque a denúncia imputa ao Réu a prática do delito do art. 304 (uso de documento falso) em combinação com o do art. 298 (falsificação de documento particular) do Código Penal. Incidem, assim, os verbetes sumulares n.ºs 282 e 284 do Supremo Tribunal Federal.

2. O delito previsto no art. 1.º, inciso IV, da Lei n.º 8.137/90 não se consuma com a mera inserção de informações falsas, mas com o lançamento definitivo do débito.

3. No caso, constata-se que o crime de uso de documento falso - crime meio - foi praticado para facilitar ou encobrir a falsa declaração, com vistas à efetivação do crime de sonegação fiscal - crime fim -, localizando-se na mesma linha de desdobramento causal de lesão ao bem jurídico, integrando, assim, o iter criminis do delito-fim.

4. Constatado que o uso do documento falso ocorreu com o fim único e específico de burlar o Fisco, visando, exclusivamente, à sonegação de tributos, e que lesividade da conduta não transcendeu o crime fiscal, incide, na espécie, mutatis mutandis, o comando do Enunciado n.º 17 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça, ad litteram: "Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido", aplicando-se, portanto, o princípio da consunção ou da absorção. Precedentes.

5. Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, desprovido."

(RESP 200900819991, relª. Min. Laurita Vaz, 5ª Turma, DJE 26/10/2009).


E, ainda, julgados dos Tribunais Federais:

"PROCESSUAL PENAL E PENAL: HABEAS CORPUS. ARTIGO 1º, INCISO I, DA LEI 8.137/90. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. USO DE DOCUMENTO FALSO. ADITAMENTO À DENÚNCIA. DESMEMBRAMENTO DO FEITO. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. ORDEM CONCEDIDA.

I - Em princípio, o crime de uso de documento falso apresenta existência autônoma.

II - O delito previsto no artigo 304 do CP somente é absorvido pelo crime de sonegação fiscal se teve como finalidade a sonegação, constituindo, em regra, meio necessário para a sua consumação.

III - Haure-se do aditamento à denúncia que os recibos inquinados de falso foram apresentados pelo paciente em cumprimento à ordem da autoridade administrativa, o que afasta a imputação do delito de uso de documento falso.

IV - Forçoso concluir que o crime previsto no art. 304 do Código Penal, eventualmente praticado, o foi com o propósito de iludir o fisco, não podendo ser tratado como delito autônomo, porquanto absorvido pelo suposto crime contra a ordem tributária.

V - Ordem concedida para trancar a ação penal nº 0004850-70.2008.403.6120."

(TRF 3ª Região, HC 00373926620114030000, relª. Desembargadora Federal Cecilia Mello, 2ª Turma, CJ1 15/03/2012).

"PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. USO DE DOCUMENTO FALSO. FALSIDADE IDEOLÓGICA. ARTIGOS 299 E 304 DO CÓDIGO PENAL. CRIME DO ARTIGO 1º, I, DA LEI 8.137/90. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. APLICABILIDADE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. OCORRÊNCIA. SUSPENSÃO DA AÇÃO PENAL. ORDEM CONCEDIDA.

1. Habeas Corpus impetrado contra ato de Juiz Federal, que mantém o processamento da ação penal nº 0000149-27.2007.403.6112, em que Luiz Gustavo Ciambelli está sendo acusado por utilizar-se fraudulentamente de recibos médicos fornecidos por Maria Alice Mendes Sanches, para suprimir/reduzir tributo, em infração ao artigo 1º, I, da Lei 8.137/90 e ao artigo 304 do Código Penal.

2. Suspensão da ação penal em relação ao crime do artigo 1º da Lei 8.137/90 decretada pelo juízo a quo. Pedido idêntico não conhecido nesta impetração.

3. A co-denunciada Maria Alice Mendes Sanches foi incursa pelo Ministério Público Federal no artigo 299 do Código Penal e no artigo 1º, I, da Lei 8.137/90.

4. Infere-se da norma do artigo 1º, I, da Lei 8.137/90 que o fornecimento, emissão ou utilização de documento falso constitui o meio fraudulento utilizado para a consecução da sonegação fiscal.

5. Na própria denúncia aponta-se que a fraude empregada na sonegação fiscal foi a prestação de declaração falsa à Receita Federal, com relação a despesas com tratamento ideológico. Os documentos tidos por falsos referem-se aos mesmos fatos objetos da declaração falsa. Ou seja, constituem o mesmo meio fraudulento empregado para a sonegação fiscal.

6. É certo que a declaração tida por falsa foi prestada quando da entrega da declaração de imposto de renda, enquanto os documentos somente foram apresentados anos depois, quando o contribuinte foi intimado a tanto pela Receita Federal.

7. Tal circunstância decorre da própria sistemática da declaração de imposto de renda, hoje feita de modo eletrônico.

8. Não é crível que o contribuinte, ao apresentar a declaração de imposto de renda com a declaração tida por falsa, não detivesse consigo os recibos alegadamente falsos.

9. Não se mostra relevante o momento da apresentação dos documentos, para afastar da possibilidade de consunção, já que, como visto, a declaração tida por falsa e os documentos tidos por falsos referem-se aos mesmos fatos: despesas com tratamentos fisioterápicos que não teriam sido efetivamente realizadas. Precedentes.

10. Impetração conhecida em parte. Na parte conhecida, ordem concedida."

(TRF 3ª Região, HC 00185157820114030000, relª. Juíza Federal Convocada Silvia Rocha, 1ª Turma, TRF3 CJ1 29/02/2012).

"PENAL. PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. LEI N. 8.137/90, ARTIGO 1º, INCISO IV. USO DE DOCUMENTO FALSO. ARTIGO 304, CÓDIGO PENAL. REJEIÇÃO DA DENÚNCIA. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO E DA ESPECIALIDADE. CRIME ÚNICO. ABSORÇÃO. EXAURIMENTO DO CRIME. PROFISSIONAL QUE FORNECEU RECIBO. EXTENSÃO DA AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. PRECEDENTES .

1. Recibos falsos apresentados ao Fisco Federal com o fim exclusivo de justificar dados inseridos na declaração de ajuste anual, sem mais potencialidade lesiva para além da ordem tributária, configura crime único contra esta, não havendo falar em crimes de falso ou estelionato.

2. Em casos tais, aplica-se o princípio da consunção, tendo em vista que o crime de falso foi absorvido pela conduta consistente na prática do crime contra a ordem tributária.

3. A apresentação de recibos materialmente ou ideologicamente falsos perante a Receita Federal não constitui delito autônomo, pois visa garantir a redução ou supressão do tributo (imposto de renda), sendo, portanto, mero exaurimento do crime. Precedentes.

4. O delito de falsidade somente restaria caracterizado se a conduta não se adequasse ao delito previsto no art. 1º, inciso IV, da Lei nº 8.137/90, hipótese não ocorrente na espécie. Princípio da especialidade.

5. A suspensão da pretensão punitiva, nos termos do art. 9º da Lei 10684/03, impede a instauração ou o prosseguimento da ação penal e estende-se a todos os denunciados por crimes tipificados no art. 1º da Lei 8.137/90, tendo em vista tratar-se de efeito do parcelamento do crédito fiscal, circunstância que não é de caráter exclusivamente pessoal (art. 580 do Código de Processo Penal).

6. Não havendo justa causa para persecução penal do delito fiscal, que absorveu o crime de uso de documento falso, em razão do parcelamento do crédito tributário em relação ao denunciado pelo crime de sonegação, o corréu que forneceu o documento falso não pode responder por nenhum crime.

7. Recurso em sentido estrito desprovido."

(TRF 1ª Região, RSE 0000751-37.2011.4.01.3815, rel. Desembargador Federal Carlos Olavo, 3ª Turma, e-DJF1 31/01/2012)

"PENAL. PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. USO DE DOCUMENTO FALSO. SONEGAÇÃO FISCAL. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO.

1. Denúncia que não foi oferecida em face do crime contra a ordem tributária, cuja punibilidade fora extinta por conta do pagamento do tributo, nos termos do art. 9°, parágrafo 2°, da Lei n° 10.684/2002, mas tão-somente, em face dos delitos previstos nos arts. 299 c/c 304, ambos do Código Penal.

2. A utilização de documentos falsos, a fim de justificar as deduções de despesas médicas nas declarações do Imposto sobre a Renda, constitui "delito-meio", eis que utilizado com o objetivo único de consumar a sonegação, motivo pelo qual aplica-se o princípio da consunção (TRF - 5ª Região, HC 2775-PE, Rel. Des. Luis Alberto Gurgel. Julgado em 29.05.2007).

3. Trancamento da ação que se faz necessária ante a ausência de justa causa. Ordem concedida."

(TRF 5ª Região, HC 00192794420104050000, rel. Desembargador Federal Geraldo Apoliano, 3ª Turma, DJE 19/01/2011).


O pagamento integral do débito fiscal configura causa extintiva da punibilidade dos crimes previstos nos artigos 1º e 2º, da Lei nº 8.137/90, e artigos 168-A e 337-A, ambos do Código Penal, e a concessão do parcelamento do débito suspende a pretensão punitiva estatal e o curso da prescrição, nos termos do artigo 9º, da Lei nº 10.684/03. Igualmente estabeleceram os artigos 68 e 69, ambos da Lei nº 11.941/09, verbis:

"Art. 68. É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos nos arts. 1o e 2º da Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168-A e 337-A do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, limitada a suspensão aos débitos que tiverem sido objeto de concessão de parcelamento, enquanto não forem rescindidos os parcelamentos de que tratam os arts. 1o a 3o desta Lei, observado o disposto no art. 69 desta Lei.

Parágrafo único. A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da pretensão punitiva.

Art. 69. Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos no art. 68 quando a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e contribuições sociais, inclusive acessórios, que tiverem sido objeto de concessão de parcelamento.

Parágrafo único. Na hipótese de pagamento efetuado pela pessoa física prevista no § 15 do art. 1o desta Lei, a extinção da punibilidade ocorrerá com o pagamento integral dos valores correspondentes à ação penal."

Muito embora pendente de julgamento a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.273, visando a declaração de inconstitucionalidade dos artigos 67, 68 e 69, da Lei nº 11.941/09 (correspondentes ao artigo 9º, da Lei nº 10.684/03), o Supremo Tribunal Federal tem aplicado tais normas, inclusive retroativamente, por serem mais benéficas ao réu (artigo 5º, inciso XL, da Constituição Federal e artigo 2º, parágrafo único, do Código Penal).

Ainda, aquele Tribunal Superior assentou que a qualquer tempo, mesmo após o recebimento da denúncia, o pedido de parcelamento deferido pela autoridade administrativa suspende a pretensão punitiva estatal e o curso do lapso prescricional, extinguindo-se a punibilidade com o seu pagamento integral:


"AÇÃO PENAL. Crime tributário. Não recolhimento de contribuições previdenciárias descontadas aos empregados. Condenação por infração ao art. 168-A, cc. art. 71, do CP. Débito incluído no Programa de Recuperação Fiscal - REFIS. Parcelamento deferido, na esfera administrativa pela autoridade competente. Fato incontrastável no juízo criminal. Adesão ao Programa após o recebimento da denúncia. Trânsito em julgado ulterior da sentença condenatória. Irrelevância. Aplicação retroativa do art. 9º da lei nº 10.684/03. Norma geral e mais benéfica ao réu. Aplicação do art. 2º, § único, do CP, e art. 5º, XL, da CF. Suspensão da pretensão punitiva e da prescrição. HC deferido para esse fim. Precedentes. No caso de crime tributário, basta, para suspensão da pretensão punitiva e da prescrição, tenha o réu obtido, da autoridade competente, parcelamento administrativo do débito fiscal, ainda que após o recebimento da denúncia, mas antes do trânsito em julgado da sentença condenatória."

(RHC 85048, Relator Ministro Cezar Peluso, DJ 01/09/2006).

"AÇÃO PENAL. Crime tributário. Tributo. Pagamento após o recebimento da denúncia. Extinção da punibilidade. Decretação. HC concedido de ofício para tal efeito. Aplicação retroativa do art. 9º da Lei federal nº 10.684/03, cc. art. 5º, XL, da CF, e art. 61 do CPP. O pagamento do tributo, a qualquer tempo, ainda que após o recebimento da denúncia, extingue a punibilidade do crime tributário."

(HC 81929, 1ª Turma, Rel. p/ Acórdão: Min. Cezar Peluso, DJ 27.02.2004)


Assim, não há razão para se limitar a suspensão da pretensão punitiva estatal em razão do parcelamento do débito apenas aos casos do parcelamento especial - PAES, instituído pela Lei nº 10.684/03, cujo prazo de adesão foi prorrogado até 31/08/2003 (art. 13, da Lei nº 10.743/03).

Efetuado qualquer parcelamento após a vigência do artigo 9º, da Lei nº 10.684/03, como no caso dos autos (29/09/2005 - fl. 92), é de rigor a suspensão da pretensão punitiva estatal e do curso do lapso prescricional, até o integral pagamento do débito ou até o descumprimento do parcelamento pelo contribuinte.

Nesse sentido é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

"PENAL E PROCESSUAL PENAL. AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. ART. 1° DA LEI 8.137/90. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA A AÇÃO PENAL. CONSTITUIÇÃO DEFINITIVA DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. INOCORRÊNCIA. FALTA DE JUSTA CAUSA PARA A AÇÃO PENAL. PARCELAMENTO DO DÉBITO COM BASE NA LEI 10.684/2003. SUSPENSÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. ART. 312 DO CÓDIGO PENAL. PECULATO. COTA DE PASSAGENS. VERBA PÚBLICA. MATERIALIDADE E INDÍCIOS DE AUTORIA COMPROVADOS. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. INOCORRÊNCIA. DENÚNCIA PARCIALMENTE RECEBIDA. DENÚNCIA EM FACE DE DUAS DAS ACUSADAS BASEADA EM SIMPLES CONSTATAÇÃO DE FIGURAR, À ÉPOCA DOS FATOS, COMO REPRESENTANTES LEGAIS DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA. DENÚNCIA GENÉRICA. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL, DA AMPLA DEFESA, DO CONTRADITÓRIO E DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. PEÇA GENÉRICA QUE NÃO NARRA SATISFATORIAMENTE AS CONDUTAS DAS DENUNCIADAS. IMPOSSIBILIDADE. INÉPCIA DA DENÚNCIA. RESPONSABILIDADE PENAL OBJETIVA REPUDIADA PELO ORDENAMENTO JURÍDICO PÁTRIO.

(...)

5. O parcelamento do débito tributário com fulcro na Lei n° 10.684/03 resulta tão somente na suspensão do processo, ficando a extinção da punibilidade condicionada ao seu pagamento integral. Precedentes: HC 90591, Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Primeira Turma, julgado em 27/02/2007, DJ 27-04-2007; HC 86465, Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julgado em 06/02/2007, DJ 29-06-2007; RHC 89618, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 06/02/2007, DJ 09-03-2007; RHC 89152, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 29/08/2006, DJ 22-09-2006; HC 86.049/MG, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 23/02/2010, DJe 15/03/2010; RHC 23.741/SC, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 26/11/2009, DJe 15/12/2009; HC 118.736/BA, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 15/12/2009, DJe 19/04/2010.

6. Sob esse ângulo, o procedimento administrativo fiscal de n.° 11522.000047/2003-51, objeto da presente ação penal, nos termos do informado pela Receita Federal e que versa sobre os "débitos contidos no processo n° 11522.00047/2003-51, o contribuinte RONALD POLANCO RIBEIRO, CPF n° 095.882.992-68, está com o parcelamento de sua dívida em dia através do PAES (Parcelamento Especial), instituído pela Lei n° 10.684, de 30 de maio de 2003".

7. O art. 9° da Lei 10.684/03 dispõe que "Art. 9o É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos nos arts. 1o e 2º da Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168A e 337A do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, durante o período em que a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no regime de parcelamento. (...) § 2o Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos neste artigo quando a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e contribuições sociais, inclusive acessórios."

8. Deveras, a Terceira Seção desta Corte, interpretando o art. 34 da Lei nº 9.249/95, firmou o entendimento de que o simples parcelamento do débito tributário leva à extinção da punibilidade, desde que efetuado na vigência da mencionada norma e que "Tratando-se de crimes praticados no período de junho de 1998 a maio de 2002, tendo sido efetivado o parcelamento somente em 23.05.06, quando já em vigor o artigo 9º da Lei 10.684/03, o parcelamento do débito tributário resulta tão somente na suspensão do processo, ficando a extinção da punibilidade condicionada ao seu pagamento integral. (HC 86.049/MG, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 23/02/2010, DJe 15/03/2010).

(...)". (grifo nosso)

(APn 459/AC, rel. Ministro Luiz Fux, Corte Especial, DJe 17/12/2010)

E, ainda, julgado desta E. Turma:

"PENAL - PROCESSUAL PENAL - APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA - ARTIGO 168-A DO CP - ARTIGO 9, PARÁGRAFO 2º, DA LEI 10.684/03 - CAUSA EXTINTIVA DA PUNIBILIDADE - APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEI MAIS BENÉFICA - DECISÃO QUE DECRETOU EXTINTA A PUNIBILIDADE MANTIDA - RECURSO MINISTERIAL DESPROVIDO.

1. De início, o próprio órgão acusador, quando do oferecimento da denúncia, afirmou que sequer foi lavrada NFLD ou LDC, tendo em vista que a empresa efetuou o recolhimento dos valores devedores após o início da mencionada ação fiscal.

2. O artigo 34 da Lei 9.249/95 previa a extinção da punibilidade do agente mediante o pagamento integral da dívida antes do recebimento da denúncia.

3. Ocorre que, com o advento da Lei nº 10.684/2003, os efeitos penais do pagamento dos tributos passaram a ser regidos pelo seu o artigo 9º. Nele, o parágrafo segundo não fixa um termo final para o pagamento do débito, com vista a extinção da punibilidade.

4. As disposições contidas na Lei nº 10.684/03, por serem mais benéficas, retroagem para alcançar fatos pretéritos, nos termos preceituados pelo parágrafo único do art. 2º do Código Penal.

5. É possível a aplicação da Lei 10.684/03 ao caso em tela, mostrando-se acertada a decisão que extinguiu a punibilidade do delito imputado aos réus, adotando interpretação a eles mais favorável.

6. Não constitui óbice à decretação da extinção da punibilidade do delito o veto presidencial ao parágrafo 2º do artigo 5º da Lei 10.684. Precedentes.

7. O artigo 9º, §2º da aludida lei, que trata da extinção da punibilidade, não se caracteriza como norma temporária em razão de se aplicar somente ao parcelamento que se estabelece no prazo de adesão ao programa, como pretende fazer crer a acusação. Como vem decidindo nossos Tribunais, é aplicável a todo e qualquer parcelamento, e vige até os dias atuais.

8. Recurso ministerial desprovido." (grifo nosso)

(RSE 2008.61.14.000167-0, relª. Desembargadora Federal Ramza Tartuce, DJF3 CJ1 15/06/2010).

A sentença deve ser mantida também na parte em que anulou o feito desde o recebimento da denúncia, pois a peça acusatória foi recebida em 25/01/06 (fl. 97), momento em que já estava suspensa a pretensão da pretensão punitiva pelo parcelamento do débito (concedido em 29/09/2005 - fl. 92), que se opera ex lege, sem necessidade de intervenção do Poder Judiciário, conforme entendimento jurisprudencial:

"HABEAS CORPUS. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. PARCELAMENTO DO DÉBITO. SUSPENSÃO DA AÇÃO PENAL. ORDEM CONCEDIDA.

1. Nos termos do art. 9º da Lei n° 10.684/2003, o parcelamento do crédito tributário implica, automaticamente, a suspensão da sua inexigibilidade. Assim, se o crédito não é exigível, não há de se falar em sonegação ou redução de tributo, o que impede, por via de conseqüência, a persecução penal. Precedentes.

2. Existência, nos autos, de cópia de ofício da Receita Federal que informa estarem os débitos do paciente incluídos no Programa de Parcelamento Especial (PAES), bem como de documentos que comprovam estar o paciente em dia com suas obrigações.

3. Embora tramite, na Corte, ação direta de inconstitucionalidade contra o art. 9º da Lei n° 10.684/03, pesa a favor deste dispositivo presunção de constitucionalidade, razão pela qual ele deve ser aplicado até que sobrevenha a eventual declaração de inconstitucionalidade.

4. Ordem concedida para que a ação penal de origem seja suspensa, até que ocorra a quitação integral do débito, quando, então, deverá ser declarada extinta a punibilidade do paciente."

(STF, HC 86465, rel. Min. Joaquim Barbosa, 2ª Turma, DJe 29-06-2007)

"PENAL. PROCESSUAL PENAL. PROCEDIMENTO CRIMINAL DIVERSO. SUSPENSÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. SUSPENSÃO DA PRESCRIÇÃO. PRESCINDIBILIDADE.

(...)

2. A suspensão da pretensão punitiva e da prescrição, quando cabível, decorre do fato jurígeno respectivo, não do provimento jurisdicional. Não é necessária prévia intervenção do Poder Judiciário para que o Ministério Público Federal logre a suspensão da pretensão punitiva. Por outro lado, o Parquet dispõe de meios próprios para acompanhar extrajudicialmente o parcelamento.

3. Preliminar rejeitada. Apelação desprovida."

(TRF 3ª Região, ACR 200861260056224, rel. Des. Fed. André Nekatschalow, 5ª Turma, DJF3 CJ2 05/11/2009).


Por fim, observo que o Ofício encaminhado pela Secretaria da Receita Federal do Brasil em 02 de maio de 2011 registra que, tanto o débito não contestado administrativamente, quanto aquele impugnado (que foi parcialmente extinto pelo pagamento e por decisão da Delegacia da Receita Federal do Brasil de Julgamento em Belém/PA), estão com a cobrança suspensa por adesão ao parcelamento da Lei nº 11.941/09 (fl. 211), que se encontra com as parcelas de antecipação em dia, aguardando consolidação.

Verifico, ainda, que o feito permanecerá suspenso até o pagamento integral do débito, hipótese em que deverá ser reconhecida a extinção da punibilidade do acusado pelo Juízo a quo. Por outro lado, se houver o descumprimento do parcelamento administrativo, o feito retomará o seu curso, inclusive em relação à parte do débito impugnado administrativamente que não foi extinta, com o oferecimento de nova denúncia pelo Ministério Público Federal, estando suspenso o curso do lapso prescricional desde 29/09/05.

Com tais considerações, NEGO PROVIMENTO ao recurso.

É o voto.


Antonio Cedenho
Desembargador Federal


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