Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 12/07/2012
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0005345-31.2000.4.03.6109/SP
2000.61.09.005345-0/SP
RELATORA : Desembargadora Federal RAMZA TARTUCE
APELANTE : ROBERTO CARLOS SANTOS
ADVOGADO : EUNICE DO NASCIMENTO FRANCO OLIVEIRA (Int.Pessoal)
APELADO : Justica Publica

EMENTA

PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. MOEDA FALSA. MATERIALIDADE E AUTORIA DO DELITO COMPROVADAS. DOLO NÃO DEMONSTRADO. RECURSO PROVIDO. ABSOLVIÇÃO.
1. A materialidade do delito restou devidamente demonstrada, por meio do Auto de Exibição e Apreensão (fl. 10), dos laudos nº 3.067/2000 (fl. 12/15) e complementar (fls. 71/77), o qual consignou que "As características apresentadas pela cédula, por ocasião dos exames, sugerem aos Peritos, ter sido a contrafação, produto de impressão por processo mecânico, após lavagem química de cédula de outro valor. Em assim sendo, não obstante seja falsa, possuiu qualidades gráficas, bastante assemelhadas às cédulas autênticas, circunstância esta que pode iludir o "homem comum", não afeito ao manuseio de papel moeda." (fl. 14).
2. A autoria do delito também restou comprovada pela prova levada a efeito nos autos. De fato, o próprio acusado reconhece que estava em posse da cédula objeto do presente delito.
3. Em que pesem as contradições assinaladas pela magistrada, em relação às declarações do apelante, apresentadas no inquérito policial e em juízo, relativamente à quantidade das cédulas recebidas e à marca do veículo objeto do serviço mecânico realizado, sua justificativa é harmônica quanto a ter recebido o dinheiro em pagamento pelo trabalho prestado. Por outro lado, a única prova produzida sob o contraditório foi o interrogatório do réu, já que o Parquet desistiu da oitiva de José Valdir da Silva (fls. 234), cujas declarações colhidas no inquérito policial não foram ratificadas em juízo ou confirmadas pelos agentes que participaram da diligência, o que, a meu entendimento, não basta para embasar um juízo seguro acerca do conhecimento da falsidade da cédula pelo apelante, ainda que ostente maus antecedentes.
4. Recurso provido para absolver o réu do crime que lhe foi imputado.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação do acusado para absolvê-lo do delito previsto no artigo 289, § 1º, do Código Penal, reformando a decisão de primeiro grau, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 02 de julho de 2012.
RAMZA TARTUCE
Desembargadora Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0005345-31.2000.4.03.6109/SP
2000.61.09.005345-0/SP
RELATORA : Desembargadora Federal RAMZA TARTUCE
APELANTE : ROBERTO CARLOS SANTOS
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APELADO : Justica Publica

RELATÓRIO

Trata-se de apelação criminal interpostas por Roberto Carlos Santos contra decisão proferida pelo MM. Juiz Federal da 2ª Vara Federal em Piracicaba/SP, que julgou procedente a denúncia, para condenar o apelante, como incurso no artigo 289, § 1º, c.c. o artigo 14, inciso I, ambos do Código Penal, às penas de 04 (quatro) anos de reclusão e 13 (treze) dias-multa, à razão de 1/10 do salário mínimo vigente na data do delito, regime inicial semiaberto, com substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, consistente na prestação de serviços à comunidade, a ser fixada na fase de execução.


Consta da denúncia que:

"em 27de fevereiro de 2000, por volta das 17:00 h., no estabelecimento comercial localizado na Avenida Corifeu de Azevedo Marques, esquina com Avenida Cillus, no Bairro Belo Horizonte II, no Município de Santa Bárbara D'Oeste - SP, o denunciado tentou introduzir em circulação uma nota falsa de R$ 50,00 (cinqüenta reais), descrita no Auto de Exibição e Apreensão a fls. 06.
Conforme restou apurado nos autos, na data dos fatos, o denunciado Roberto Carlos dos Santos dirigiu-se ao estabelecimento comercial supra citado onde entregou a nota para efetuar o pagamento de uma dívida no valor de R$ 15,00 (quinze reais), no momento em que o proprietário desse bar desconfiou da autenticidade da cédula em questão, acionando a Guarda Civil. No momento em que a viatura da Guarda Civil aproximou-se do local dos fatos, o denunciado tentou evadir-se, sendo, porém encaminhado, juntamente com a nota inidônea, ao plantão policial para lavratura do boletim de ocorrência.
A materialidade do delito restou comprovada no laudo pericial a fls. 08/11, que constatou a falsidade da cédula de R$ 50,00 (cinqüenta reais)." (fls. 02/03)

Recebimento da denúncia, em 06.05.2002 (fl. 69).

Laudos periciais, às fls. 12/15 e 71/77.

O réu foi interrogado (fls. 210/211), e ofereceu defesa prévia (fl. 218).

Folhas de antecedentes, às fls. 85/86, 88, 90, 92/96, 243, 248/253, 279, 287, 289, 292, 295, 297, 300 e 304.

O Ministério Público Federal desistiu da oitiva de José Valdir da Silva (fl. 234).

Alegações finais do Parquet, às fls. 307/312, e da defesa, às fls. 318/322.

Sentença condenatória, às fls. 324/329, publicada em 18.05.2006 (fl. 330).


Em razões de apelação (fls. 335/338), Roberto Carlos dos Santos alega que:

a) não se discute a autenticidade ou não da nota apreendida, mas se o acusado tinha conhecimento da inautenticidade da cédula que portava;

b) a decisão recorrida fundou-se apenas no depoimento de uma única testemunha, ouvida apenas na fase de Inquérito Policial, José Valdir da Silva;

c) o apelante conhecia o proprietário da Lanchonete Beira Rio, pois residia nas proximidades do estabelecimento, e jamais usaria a cédula falsa se deste fato tivesse conhecimento, muito menos para quitar compras junto a um conhecido, próximo a sua casa;

d) a cédula foi recebida de boa-fé de terceira pessoa, como pagamento de serviços de mecânica que havia prestado;

e) não bastasse a ausência de dolo por parte do recorrente, a falsificação não era grosseira e plenamente capaz de enganar o homem comum, conforme atestou o laudo pericial;

f) ninguém pode ser condenado por meras suposições, e diante da insuficiência de provas, caracteriza-se situação duvidosa, por isso a condenação é temerária, a atrair a incidência do princípio "in dubio pro reo";

g) a decisão baseou-se apenas na prova oral colhida na fase de inquérito policial e na vida pregressa do acusado.

Com contrarrazões, subiram os autos (fls.347/351). Nesta Corte, o parecer ministerial foi pelo desprovimento do recurso da defesa (fls. 355/365).

O feito foi submetido à revisão, na forma regimental.

É O RELATÓRIO.


RAMZA TARTUCE
Desembargadora Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0005345-31.2000.4.03.6109/SP
2000.61.09.005345-0/SP
RELATORA : Desembargadora Federal RAMZA TARTUCE
APELANTE : ROBERTO CARLOS SANTOS
ADVOGADO : EUNICE DO NASCIMENTO FRANCO OLIVEIRA (Int.Pessoal)
APELADO : Justica Publica

VOTO

A materialidade do delito restou devidamente demonstrada, por meio do Auto de Exibição e Apreensão (fl. 10), dos laudos nº 3.067/2000 (fl. 12/15) e complementar (fls. 71/77), o qual consignou que "As características apresentadas pela cédula, por ocasião dos exames, sugerem aos Peritos, ter sido a contrafação, produto de impressão por processo mecânico, após lavagem química de cédula de outro valor. Em assim sendo, não obstante seja falsa, possuiu qualidades gráficas, bastante assemelhadas às cédulas autênticas, circunstância esta que pode iludir o "homem comum", não afeito ao manuseio de papel moeda." (fl. 14).

A autoria do delito também restou comprovada, pela prova levada a efeito nos autos. De fato, o próprio acusado reconhece que estava em posse da cédula objeto do presente delito.

Todavia, a acusação não conseguiu produzir, na fase judicial, prova segura e incontroversa acerca da ciência da falsificação, estando os elementos coligidos nos autos a favorecer a tese de absolvição.

O indício mais robusto de que o acusado tinha conhecimento da falsidade da cédula assenta-se, a meu juízo, no depoimento prestado por José Valdir da Silva na fase policial, no sentido de que ele fugiu do local quanto viu a viatura da Guarda Civil aproximar-se. Confira-se:

"Que, a respeito dos fatos tratados na Carta Precatória oriunda da Policia Federal de Campinas-SP, esclarece que: na época dos fatos o declarante era proprietário da Lanchonete Beira Rio, localizada na Av. Corifeu de Azevedo Marques, atrás da empresa COFACO; Que, por volta das 16h45min compareceu no local um freguês, conhecido por ROBERTO CARLOS, o qual estava devendo para o declarante a quantia de R$ 15,00 (quinze reais); Que, ROBERTO CARLOS pagou a dívida com uma nota de R$ 50,00 (cinquenta reais), nota esta, que ao pegar em suas mãos, o declarante notou ser a mesma falsa; Que, o declarante pediu para um colega chamar a Guarda Civil para ir até o local, informado a ROBERTO CARLOS que havia mandado trocar a nota; Que, quando os guardas estavam próximos ROBRTO CARLOS ao ver a viatura saiu correndo, sendo detido mais a frente pela própria guarda; Que, ROBERTO CARLOS foi conduzido ao Plantão Policial sendo a nota apreendida." (fl. 28)

O acusado, por sua vez, declarou no inquérito policial que se retirou do local quando soube que o proprietário da lanchonete havia solicitado a presença da polícia e, na metade do trajeto para sua residência, encontrou com um veículo da guarnição civil, diferentemente, portanto, da afirmação de José Valdir da Silva, de que o réu se evadiu quando viu os policiais. Transcreve-se:

"na data dos fatos foi até a Lanchonete BEIRA RIO, localizada nesta cidade, a fim de pagar uma dívida no valor de R$ 10,00 (dez reais), para tanto, utilizou-se de uma nota de R$ 50,00 (cinquenta reais); Que, o proprietário da lanchonete pediu para um funcionário trocar a nota no posto de gasolina e como demorava a voltar, o declarante questionou sobre o que estava acontecendo; Que, outra pessoa que estava no bar disse ao declarante que o proprietário havia chamado a polícia, sendo que o declarante deixou o bar com destino a sua casa; Que, no meio do caminho encontrou uma viatura da Guarda Civil local, sendo que chegou a acenar para esta viatura a fim de que ela parasse; Que, os guardas embarcaram o declarante e voltaram na lanchonete, apresentando todos no Plantão Policial; Que, somente no Plantão o declarante tomou conhecimento que a nota poderia ser falsa; Que, o declarante pegou a referida nota, juntamente com outras duas, de um individuo, que não sabe declinar o nome e endereço, em troca de um serviço efetuado num veículo VW/Fusca, bege, pelo declarante; Que, as outras notas já haviam sido trocadas, sem nenhum problema." (fl. 27)

Os integrantes da Guarda Civil, Moraes e Assis, que efetuaram a apreensão da moeda falsa e conduziram o réu ao plantão policial (fl. 09) não foram ouvidos.

Em juízo, o acusado declarou:

"Atualmente tem trinta e um anos; trabalha desde os doze anos de idade; dos doze aos dezessete trabalhou na lavoura; depois disso foi mecânico de autos e motorista de ônibus; é casado e tem três filhas, de 15, 13 e dois anos; está preso no presídio de Santo André há um ano e sete meses por crime de estelionato; já respondeu por outros três crimes de estelionato; foi condenado nestes processos; o motivo destes crimes foi porque não tinha dinheiro para sustentar o vício de crack e cocaína; atualmente já se livrou das drogas; quando foi preso exercia a função de mecânico de auto em Santa Barbara do Oeste; Recorda-se dos fatos descritos na inicial, mas alega que não são verdadeiros; recebeu a quantia de duzentos e cinqüenta reais, em cinco notas de cinqüenta, de um serviço mecânico que fez para o proprietário de um corsa, cujo nome não se recorda e nem sabe quem é esta pessoa; gastou uma nota de cinquenta reais no abastecimento de seu veículo e não se recorda o que fez com outras três notas; não sabia que a nota apreendida na lanchonete era falsa; conhecia anteriormente a testemunha, que é o proprietário da lanchonete, pois reside próximo a esta lanchonete; após ser dirigido à delegacia e posteriormente liberado, retornou a lanchonete e pagou a quantia de quinze reais que estava devendo ao sr. Waldir; nunca pegou qualquer outra nota falsa anteriormente; Facultado às partes algum esclarecimento, por estas foi dito que não havia necessidade." (fls. 210/211)

À vista desses elementos coligidos, a sentença concluiu que:

"Passo a análise do mérito.
Em que pese ter o acusado negado a prática delitiva afirmando desconhecer a falsidade da nota quando houve a apreensão, o que se constata do exame dos autos é a veracidade dos fatos descritos na denúncia e a falta de verossimilhança de suas alegações, que carecem de credibilidade já que eivadas de contradições e dissociadas das demais provas trazidas aos autos.
Ouvido durante a fase inquisitorial, asseverou o acusado que "pegou a referida nota, juntamente com outras duas, de um indivíduo que não sabe declinar o nome e endereço, em troca de um serviço efetuado num veículo VW/Fusca, bege", afirmou ainda que ciente de que o proprietário do bar havia chamado a polícia, deixou o local com destino a sua casa, mas no caminho encontrou uma viatura da Guarda Municipal e "chegou a acenar para esta viatura a fim de que ela parasse" (fl. 27). Em juízo, todavia, afirmou ter recebido a quantia de duzentos e cinquenta reais, em cinco notas de R$ 50,00 (cinqüenta reais), de um serviço de mecânico que fez para o proprietário de um corsa" (fl. 210).
De outro lado, José Valdir da Silva, proprietário do estabelecimento comercial onde o acusado tentou realizar o pagamento da divida, em suas declarações noticiou que desconfiando da autenticidade da nota chamou a guarda civil informando ao réu que apenas havia mandado trocar a nota, bem como que "Roberto Carlos ao ver a viatura saiu correndo" (fl. 28).
Depreende-se, ademais, das folhas de antecedentes e certidões de feitos criminais juntadas aos autos, que o acusado é afeito à prática de delitos, tendo inclusive sido condenado três vezes pela prática de estelionato, consoante afirmado em seu próprio interrogat6rio (fls. 248/253, 279, 262, 267, 289, 295, 297, 300 e 304).
Demonstrado, portanto, de maneira inquestionável, que o acusado guardou e tentou introduzir em circulação a cédula falsa tendo prévio conhecimento da falsidade desta, dolo exigido pelo legislador." (fls. 326/327)

Em que pesem as contradições assinaladas pela magistrada, em relação às declarações do apelante, apresentadas no inquérito policial e em juízo, relativamente à quantidade das cédulas recebidas e à marca do veículo objeto do serviço mecânico realizado, sua justificativa é harmônica quanto a ter recebido o dinheiro em pagamento pelo trabalho prestado. Por outro lado, a única prova produzida sob o contraditório foi o interrogatório do réu, já que o Parquet desistiu da oitiva de José Valdir da Silva (fls. 234), cujas declarações colhidas no inquérito policial não foram ratificadas em juízo ou confirmadas pelos agentes que participaram da diligência, o que, a meu entendimento, não basta para embasar um juízo seguro acerca do conhecimento da falsidade da cédula pelo apelante, ainda que ostente maus antecedentes.

Não obstante a atual redação do artigo 155 do Código de Processo Penal tenha sido introduzida pela Lei nº 11.690/2008, a vedação de condenação apenas com base nos elementos informativos colhidos no inquérito policial já é entendimento assentado na doutrina e jurisprudência pátrias.

Diante do exposto, dou provimento à apelação do acusado para absolvê-lo do delito previsto no artigo 289, § 1º, do Código Penal.

É COMO VOTO.


RAMZA TARTUCE
Desembargadora Federal


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Signatário (a): RAMZA TARTUCE GOMES DA SILVA:10027
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Data e Hora: 06/06/2012 16:10:32