Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 12/07/2012
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0003191-52.1999.4.03.6181/SP
1999.61.81.003191-4/SP
RELATORA : Desembargadora Federal RAMZA TARTUCE
APELANTE : ROBERTO NICOLA SCHIOPPA
ADVOGADO : ANDREA SYLVIA ROSSA MODOLIN
APELADO : Justica Publica

EMENTA

PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME TIPIFICADO NO ARTIGO 19, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI Nº 7.492/86. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. MATERIALIDADE E AUTORIA DO DELITO COMPROVADAS. DOLO DEMONSTRADO. CRIME FORMAL. DOSIMETRIA DA PENA DE RECLUSÃO E RESPECTIVA SUBSTITUIÇÃO MANTIDAS. PRELIMINAR REJEITADA. RECURSO DESPROVIDO.
1. Não merece acolhimento a preliminar fundada no cerceamento de defesa. A defesa prévia cingiu-se a refutar a denúncia e apresentar o rol de testemunhas. Ressalte-se que nessa fase poderia a parte requerer o depoimento que reputasse útil para a tese defensória, inclusive dos representantes legais das mencionadas sociedades, porquanto já constava da denúncia as assertivas do acusado, de que o representante comercial da Mello S/A ofereceu serviços da empresa a fim de que fosse providenciada a documentação necessária à liberação do financiamento, e que assim foi feito (fl. 03), bem como seu desconhecimento de que seria necessária a apresentação da CND ou que o financiamento contava com recursos do FINAME. Assim, o pedido não versava sobre fato novo, por isso é viável o indeferimento da diligência. Precedente.
2. A materialidade e autoria delitivas restaram demonstradas pelos documentos de fls. 14, 15, 22/24, 25, 30/32, 34, 86/88, 110/111 e 114, bem como pela prova oral produzida, inclusive o interrogatório do acusado, bem como a presença do dolo, porquanto tanto os documentos como os depoimentos das testemunhas Cleide e Sônia apontam para o fato de que o apelante tinha conhecimento de que parte do financiamento provinha de recursos públicos, ademais, há informações explícitas no contrato firmado e na proposta apresentada à empresa, acerca da origem do recurso e da necessidade de apresentação da C.N.D., cuja inconsistência se comprovou. Assim, a obtenção do financiamento ocorreu mediante fraude, pois como o próprio réu reconheceu, não seria possível ser expedida, à época, a certidão negativa de débito.
3. A circunstância alegada acerca da ausência de prejuízo ao erário é irrelevante para a prática do delito tipificado no artigo 19, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86, porquanto se cuida de crime formal.
4. O magistrado decidiu de forma correta ao aplicar a pena privativa de liberdade em seu patamar mínimo, o que inviabiliza qualquer possibilidade de redução, pois a reprimenda não pode ser fixada aquém do mínimo legal.
5. Também não se afigura viável afastar a incidência do parágrafo único do artigo 19 da Lei nº 7.492/86, à vista da manifesta utilização dos recursos oriundos da instituição oficial.
6. No tocante às penas substitutivas, observo que não constam dos autos quaisquer circunstâncias objetivas que permitam obter segura conclusão sobre a capacidade econômica do apelante, de modo a servir de paradigma para o estabelecimento em montante menor da prestação pecuniária do que a fixada pela juíza a qua. Ademais, pleiteia-se na verdade, o esvaziamento da reprimenda, sob o argumento de o acusado não terá tempo para se dedicar à esposa e aos filhos, caso seja mantida a prestação de serviços à comunidade, mas isso sem trazer elementos que comprovem as alegações.
7. Preliminar rejeitada. Recurso desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar e negar provimento à apelação, mantendo na íntegra a decisão de primeiro grau, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 02 de julho de 2012.
RAMZA TARTUCE
Desembargadora Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0003191-52.1999.4.03.6181/SP
1999.61.81.003191-4/SP
RELATORA : Desembargadora Federal RAMZA TARTUCE
APELANTE : ROBERTO NICOLA SCHIOPPA
ADVOGADO : ANDREA SYLVIA ROSSA MODOLIN
APELADO : Justica Publica

RELATÓRIO

Trata-se de apelação criminal interposta por Roberto Nicola Schioppa contra decisão proferida pela MM. Juíza Federal Substituta da 2ª Vara Federal em São Paulo/SP, que julgou procedente a denúncia, para condenar o apelante, como incurso no artigo 19, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86, às penas de 02 (dois) anos e 08 (oito) meses de reclusão e 15 (quinze) dias-multa, a serem atualizados no momento da execução, no valor unitário de 01 (um) salário mínimo, regime inicial aberto, com substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos e multa, consistentes na prestação pecuniária, fixada no valor de 20 (vinte) salários mínimos, em favor de instituição de amparo a idosos carentes, a ser especificada na execução, bem como prestação de serviços, observado o disposto no artigo 46, § 3º, do Código Penal.

Consta da denúncia que:

"Em 10 de janeiro de 1997, a empresa Direção S/A Crédito, Financiamento e Investimento encaminhou ao INSS, para verificação de autenticidade, cópia da CND n.° 446899, série G, emitida em 17/10/96, para a empresa Metalúrgica Schioppa Ltda. Entretanto, após verificações realizadas, apurou-se que a CND n.° 446899, série G, foi emitida em 14/02/97, para a empresa Conesp Construtora Ltda.
Mário Schioppa, às fls. 74, declarou ser um dos sócios da empresa Metalúrgica Schioppa juntamente com seu irmão Roberto. Esclareceu ser responsável pela área de produção enquanto seu irmão é o responsável pelo gerenciamento. Deste modo, nada pode esclarecer a respeito da CND em questão.
Roberto Nicola Schioppa, às fls. 75/76, ratificou os termos do depoimento de Mário. Afirmou estar interessado na compra de maquinário para a empresa quando procurou pela Mello S/A Máquinas e Equipamentos. Referida empresa apresentou-lhe uma proposta de compra e venda (fls. 82) onde as condições de pagamento incluíam financiamento a ser obtido junto à Direção S/A Crédito, Financiamento e Investimento. Declarou que o representante comercial da Mello S/A ofereceu os serviços da empresa a fim de que fosse providenciada a documentação necessária à liberação do financiamento, o que de fato foi feito. Disse que em nenhum momento soube que seria necessário a apresentação da CND ou que o financiamento utilizava-se de recursos advindos do FINAME.
Apesar de Roberto afirmar não saber a origem dos recursos do empréstimo, na oferta apresentada pela Mello S/A consta, no item CONDIÇÕES DE PAGAMENTO, a informação de que 80% do valor seria com recursos do Finame. Também consta na 15ª cláusula do contrato de financiamento firmado com a Direção S/A, a informação de que era necessária a apresentação de CND para liberação das parcelas do crédito. Estando tal contrato assinado por Roberto, custa crer que não tenha lido as cláusulas.
Tendo o Chefe do Posto de Arrecadação, Valdir Sanches, declarado (fls. 25) não ser sua a assinatura aposta na CND apresentada pela Metalúrgica Schioppa Ltda., foi realizada perícia técnica a fim de corroborar a inautenticidade de referido documento. Apesar de não ter sido localizada a CND original, foi realizado exame documentoscópico na cópia autenticada apresentada à Direção S/A. O Laudo de fls. 106/107 ratificou a inautenticidade do lançamento aposto em nome de Valdir." (fls. 03/04)

Recebimento da denúncia, em 05.04.2000 (fl. 124).

O réu foi interrogado (fls. 146/147), e ofereceu defesa prévia (fls. 150/151).

Folhas de antecedentes, às fls. 138, 140/141 e 143.

Depoimentos das testemunhas de acusação, às fls. 171/172 e 200, e da defesa, às fls. 251/252, 282/283 e 333/334.

Alegações finais do Parquet, às fls. 367/370, e da defesa, às fls. 374/384.

Sentença condenatória, às fls. 389/398, publicada em 06.04.2006 (fl. 399).


Em razões de apelação (fls. 416/431), Roberto Nicola Schioppa alega que:

a) houve afronta ao direito da ampla defesa, à vista do indeferimento do pleito de expedição de ofício à Junta Comercial do Estado de São Paulo, a fim de perquirir sobre os representantes legais das empresas Mello S.A. Máquinas e Equipamentos e Direção S.A. Crédito Financiamento e Investimento;

b) o requerimento justifica-se pela existência de indícios de que a falsificação da Certidão Negativa de Débitos foi engendrada pelas mencionadas sociedades, de modo que seria imprescindível a oitiva dos seus sócios;

c) o pedido foi renovado em alegações finais e se pleiteou a conversão do julgamento em diligência, seguido de novo indeferimento, de modo que a sentença deve ser anulada e determinada a realização do ato requerido;

d) no ato da contratação com as mencionadas empresas, o recorrente foi informado de que o financiamento seria obtido mediante a utilização de recursos do próprio agente fiduciário, e não com recursos provenientes do FINAME;

e) o entendimento de que teria sido demonstrada a vinculação do apelante ao resultado delitivo não se sustenta, em face da prova oral produzida;

f) o apelante cooperou para a elucidação dos fatos e esclareceu que não pediu a CND, pois sabia que não poderia obtê-la, já que a empresa encontra-se em débito com o INSS;

g) as circunstâncias relativas à negociação para a aquisição do maquinário também foram esclarecidas pelo acusado no curso do inquérito policial;

h) inexistiu o dolo;

i) a empresa Mello S.A., a maior interessada na realização da avença, responsabilizou-se pela obtenção do crédito necessário à realização da transação junto à empresa Direção S.A., a qual, segundo informações, exercia o papel de agente fiduciário dos produtos alienados pela mencionada fabricante de máquinas;

j) a participação do réu na obtenção do financiamento foi somente a de autorizar que seus funcionários fornecessem ao agente fiduciário cópias de documentos e, posteriormente, assinar a documentação necessária para a formalização;

k) a equivocada afirmação da testemunha Cleide Pereira da Silva Alves (fls. 252), acerca do conhecimento da origem dos recursos creditícios, decorreu de mera suposição;

l) o documento de fl. 86 é mero orçamento para eventual compra, por isso não tem o valor probante que lhe foi atribuído, e quanto ao de fl. 88, não leu as cláusulas contratuais por adesão inseridas no verso;

m) a obtenção do financiamento não causou prejuízo ao erário, porquanto foi integralmente quitado;

n) a autoria delitiva não restou comprovada;

o) a pena comporta diminuição, com fundamento no artigo 66 do Código Penal, à vista da presença de circunstâncias atenuantes consistentes na ausência de prejuízo ao erário e na regularidade fiscal da empresa, a qual está incluída no REFIS;

p) as sanções restritivas de direitos devem ser substituídas por moderada multa e por prestação pecuniária inferior ao elevado valor arbitrado, em observância do § 2° do artigo 44 c.c. artigo 43, inciso I, do Código Penal, com exclusão da prestação de serviços à comunidade, já que essa imposição irá onerá-lo excessivamente, em relação ao tempo de dedicação à esposa e filhos;

q) a multa cominada revela-se exacerbada, motivo pelo qual deve ser reduzida.

Com contrarrazões, subiram os autos (fls.436/440). Nesta Corte, o parecer ministerial foi pelo desprovimento do recurso da defesa (fls. 442/445).

O feito foi submetido à revisão, na forma regimental.

É O RELATÓRIO.


RAMZA TARTUCE
Desembargadora Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0003191-52.1999.4.03.6181/SP
1999.61.81.003191-4/SP
RELATORA : Desembargadora Federal RAMZA TARTUCE
APELANTE : ROBERTO NICOLA SCHIOPPA
ADVOGADO : ANDREA SYLVIA ROSSA MODOLIN
APELADO : Justica Publica

VOTO

Não merece acolhimento a preliminar fundada no cerceamento de defesa, à vista do indeferimento de expedição de ofício à Junta Comercial do Estado de São Paulo, a fim de perquirir sobre os representantes legais das empresas Mello S.A. Máquinas e Equipamentos e Direção S.A. Crédito Financiamento e Investimento, em relação aos quais se pretendia que fosse apurado seu envolvimento em casos análogos ao deste feito. Observo que a defesa prévia cingiu-se a refutar a denúncia e apresentar o rol de testemunhas (fls. 150/151). Ressalte-se que, nessa fase, poderia a parte requerer o depoimento que reputasse útil para a tese defensória, inclusive dos representantes legais das mencionadas sociedades, porquanto já constava da denúncia as assertivas do acusado, de que o representante comercial da Mello S/A ofereceu serviços da empresa a fim de que fosse providenciada a documentação necessária à liberação do financiamento, e que assim foi feito (fl. 03), bem como seu desconhecimento de que seria necessária a apresentação da CND, ou de que o financiamento contava com recursos do FINAME. Outrossim, consta da exordial que houve utilização de CND, cuja inautenticidade restou apurada nos autos, bem como a menção de que a 15ª cláusula do contrato de financiamento firmado com a Direção S/A continha a informação de que era necessária a apresentação do indicado documento para liberação das parcelas de crédito. Assim, o pedido indeferido, à fl. 366 e mantido, à fl. 387, apresentado na fase do artigo 499 CPP e nas alegações finais, não versava sobre fato novo que veio a lume somente com os depoimentos das testemunhas ou interrogatório do réu, porquanto tais circunstâncias ventiladas pelo denunciado e mencionadas na inicial acusatória já poderiam, desde o início, ensejar à defesa a respectiva produção probatória nesse sentido. Em recente julgado, o Superior Tribunal de Justiça entendeu viável o indeferimento de diligência requerida na fase do artigo 499 CPP, quando não se cuida de fato novo surgido durante a instrução processual, in verbis:

HABEAS CORPUS. CRIME DE RESPONSABILIDADE. PREFEITO. APROPRIAÇÃO E UTILIZAÇÃO INDEVIDA DE RENDA PÚBLICA. TESTEMUNHA ARROLADA NÃO LOCALIZADA. FALTA DE INDICAÇÃO DE NOVO ENDEREÇO PELA DEFESA. INEXISTÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA PELO INDEFERIMENTO DE PEDIDO DE PERÍCIA DE OBRA REALIZADA 6 ANOS ANTES E JUNTADA DE DOCUMENTOS REQUERIDA COMO DILIGÊNCIA COMPLEMENTAR, NA FASE DO ART. 499 DO CPP. INDEFERIMENTO DEVIDAMENTE FUNDAMENTADO NO FATO DE NÃO SE TRATAR DE PROVA NOVA, SURGIDA NO DECORRER DA INSTRUÇÃO CRIMINAL, E QUE A DEFESA NÃO TIVESSE CONHECIMENTO NA ÉPOCA OPORTUNA. NÃO HÁ AUSÊNCIA DE DEFESA TÉCNICA SE O ACUSADO E REPRESENTADO COM ESMERO PELA DEFENSORIA PÚBLICA, DIANTE DA INÉRCIA DO ADVOGADO CONSTITUÍDO. ALEGAÇÃO DE DEFICIÊNCIA DA DEFESA. AUSÊNCIA D PREJUÍZO. SÚMULA 523 DO STF. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE FIXADA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL (4 ANOS). CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS CULPABILIDADE, PERSONALIDADE, MOTIVOS E CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME, MERA UTILIZAÇÃO DE REFERÊNCIAS VAGAS. ANTECEDENTES E CONSEQUÊNCIAS DO CRIME QUE JUSTIFICAM O AUMENTO DA PENA-BASE EM APENAS 1 ANO. PARECER MINISTERIAL PELA DENEGAÇÃO DO WRIT. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA, APENAS PARA REDIMENSIONAR A PENA PARA 3 ANOS E 9 MESES DE RECLUSÃO. 1. A não inquirição de testemunha declarada como imprescindível não caracteriza nulidade no julgamento, quando a parte não fornece dados para a sua localização. Precedentes do STJ e STF. 2. O pedido de diligência complementar, feito na fase do art. 499 do CPP, pode ser indeferido pelo douto Magistrado, conforme sua convicção, caso as julgue, fundamentadamente, impertinentes, desnecessárias ou protelatórias ao julgamento do feito. Precedentes do STJ. 3. In casu, em que pese a argumentação defensiva de que se trata de diligência indispensável à busca da verdade real, o pleito foi indeferido, fundamentadamente, pelo Juízo processante, por não se tratar de prova nova, surgida no decorrer da instrução criminal, e que a defesa não tivesse conhecimento na época oportuna a juntada de documentos, a fim de afastar a preclusão, e por ser impertinente a realização de perícia em obra realizada 6 anos antes. 4. Infirmar a assertiva constante do acórdão impugnado de que o paciente foi intimado pessoalmente da ausência de apresentação das alegações finais por seu Advogado enseja o reexame do conjunto fático-probatório o que é incompatível com a via do Habeas Corpus que exige prova pré-constituída do alegado. 5. Não há que se falar em ausência de defesa técnica se o paciente é representado com esmero pela Defensoria Pública, diante da inércia do Advogado constituído. 6. Da mesma forma, o exame da alegada deficiência da defesa técnica a ponto de eivar de nulidade a Ação Penal dependeria de acurada avaliação da real importância de cada uma das intervenções defensivas no resultado final da persecução penal, bem como da análise da justiça da decisão condenatória, tudo a implicar exame aprofundado da prova dos autos, medida inadequada nesta estreita via mandamental. 7. No processo penal, a falta de defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu (Súmula 523/STF). 8. A pena deve ser fixada com estrita observância dos arts. 59 e 68 do CPB, porquanto a fuga dos parâmetros estabelecidos legalmente ou a ausência de fundamentação válida no momento da dosimetria da pena constitui constrangimento ilegal passível de ser sanado por meio de Habeas Corpus, sempre que não houver necessidade de dilação probatória, pois pode submeter o apenado à prisão por tempo superior ou inferior ao que seria admissível e adequado para a prevenção e reprovação do delito. 9. In casu, houve a mera utilização de referências vagas quando do aumento da pena-base com relação à valoração da culpabilidade, personalidade, motivos e circunstâncias do crime. Assim, a pena-base mínima de 2 anos deve ser aumentada em apenas 1 ano diante dos antecedentes e das consequências do crime, tornando-se definitiva em 3 anos e 9 meses, após o acréscimo de 1/4 pela continuidade delitiva. 10. Ordem parcialmente concedida, para redimensionar a pena para 3 anos e 9 meses de reclusão, em que pese o parecer ministerial em sentido contrário. (HC 200801351894, NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, STJ - QUINTA TURMA, DJE DATA:30/08/2010.-grifei)

Rejeito, assim, a preliminar arguida pelo acusado.

A materialidade e autoria delitivas restaram demonstradas pelos documentos de fls. 14, 15, 22/24, 25, 30/32, 34, 86/88, 110/111 e 114, bem como pela prova oral produzida, inclusive o interrogatório do acusado.

A administração da empresa Metalúrgica Schioppa Ltda cabia ao apelante, conforme esclareceu no interrogatório perante a autoridade policial, in verbis:

"é sócio da empresa METALURGICA SCHIOPPA juntamente com seu irmão MÁRIO SCHIOPPA JUNIOR; QUE como sócio, é responsável pela administração e gerência da empresa; QUE seu irmão MÁRIO é responsável pela área de produção; QUE com relação a CND n° 446.899, série G, datada de 17/10/1996, desconhece o paradeiro do original do documento; QUE necessitando comprar uma máquina para sua empresa procurou pela MELLO S.A MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS, sendo que esta empresa apresentou-lhe urna proposta para venda de tal máquina, que incluía um financiamento a ser obtido junto à DIREÇÃO S.A, CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO; QUE o representante comercial da MELLO S.A ofereceu os serviços da empresa para providenciar a documentação necessária a fim de obter financiamento para a compra de tal máquina, como de fato foi feito; QUE recebeu uma relação de documentos, cópia entregue neste ato para ser juntada nestes autos, para serem entregues à Direção S.A. a fim de viabilizar o empréstimo bancário; QUE nesta relação não constava certidão negativa de débito do INSS; QUE em nenhum momento soube que seria necessário certidão negativa emitida pelo INSS para o citado financiamento; QUE desconhecia a existência da CND n° 446.899, série G, utilizada no processo de financiamento; QUE desconhecia que o financiamento junto ao BANCO DIREÇÃO S.A utilizava-se de recursos públicos provenientes do FINAME; QUE por este motivo não sabia da necessidade de apresentação de certidão negativa, QUE para obtenção do financiamento assinou vários documentos e em nenhum deles constava qualquer menção à utilização de recursos provenientes do FINAME; QUE todo o tempo acreditou que o financiamento foi feito pelo BANCO DIREÇÃO S.A com recursos deste próprio; QUE a máquina financiada com tais recursos foi integralmente quitada, o que prova cópia de declaração emitida pela Direção S.A., entregue neste ato; QUE anteriormente à CND, objeto deste inquérito, nunca houve qualquer outro problema desta natureza; QUE nunca foi preso nem processado." (fls. 79/80)

Em juízo, o recorrente declarou que não tinha conhecimento de que o financiamento originava-se de recursos do BNDES ou que era necessária a apresentação de CND, a qual, entretanto, não era passível de ser obtida, em razão da existência de débitos para com o INSS, in verbis:

"que tem conhecimento da acusação que lhe é imputada, registrando que tem conhecimento dos fatos desde que foi intimado para comparecer perante o Posto do lNSS próximo à sua empresa, declarando que jamais viu a certidão que teria sido emitida, informando ainda que sua empresa nunca solicitou qualquer tipo de financiamento por meio do BNDES. O réu declarou ainda que não tem a menor idéia sobre a origem da certidão negativa de débitos que ensejou a presente ação penal, informando que na época sua empresa tinha débitos com o INSS e em razão disso não seria possível obter uma certidão negativa. O réu declarou ainda que adquiriu a máquina por intermédio de financiamento do Banco Direção, o qual foi indicado pela própria MELO que era a fabricante da máquina. O réu declarou que se utilizava dos bancos Bradesco, Itaú e do Brasil, ressaltando que nunca teve nenhum negócio com o Banco Direção S/A., mencionado na denúncia. O réu declarou que honrou o financiamento e que quitou a máquina adquirida com o financiamento do Banco Direção. O réu declarou que não conhece as testemunhas arroladas na denúncia. O réu declarou jamais foi processado criminalmente. O réu declarou que recebeu a máquina e que começou logo a pagar as prestações, ressaltando que não leu o contrato e que não tinha conhecimento de que era indispensável a apresentação da CND." (fl. 147-grifei)

No contrato de abertura de crédito fixo (fls. 88/88 vº), firmado com a empresa, consta cláusula expressa acerca da necessidade de apresentação da CND. Transcreve-se:

"15ª Para habilitar-se à liberação de cada parcela do crédito deverá a CREDITADA comprovar, mediante declaração formada por seus representantes legais, que acha-se quite com a Fazenda Federal, quanto aos tributos e contribuições federais, inclusive com os recolhimentos das condições relativas ao Finsocial, FGTS e aos Programas de Integração Social e de Patrimônio do Servidor Público-PIS/PASEP, bem como apresentar Certidão Negativa de Débito-CND, fornecida pelo INSS, ocorrendo o vencimento antecipado deste contrato, com a exigibilidade do crédito e imediata sustação de qualquer liberação, se for comprovada a falsidade das declarações prestadas pela CREDITADA." (fl. 88 vº)

Na oferta apresentada pela empresa Mello S.A. Máquinas e Equipamentos à empresa do acusado, relativa ao equipamento objeto do financiamento, consta a concordância, mediante assinatura. Nela se explicita a condição de pagamento: 20% com recursos próprios e 80 % com recursos Finame (fl. 86).

A testemunha de acusação Valdir Sanches respondeu em juízo que reconhecia sua assinatura na declaração de fl. 30, na qual afirma que não assinou a CND de fl. 03 (fl. 15 nesta autuação), onde há carimbo com seu nome, a evidenciar a irregularidade do documento, in verbis:

"(...) A testemunha declarou que reconhece sua assinatura as fls. 30 dos autos, declarando que assinou na presença de seu chefe as declarações constantes no referido documento." (fl. 171)

Sua declaração tem o seguinte teor:

"2 - Declaro para os devidos fins, que não é minha a assinatura utilizada na CND de fls. 3, em atendimento ao item 3 letras "c".
3 - As folhas 19, declaro com aposição de 20 (vinte) assinaturas de que não é minha a assinatura referente a CND de fls. 03." (fl. 30)

O laudo de exame documentoscópico confirmou a inautenticidade da assinatura:

"Resposta: Em conformidade com o exposto no item IV deste laudo, os Peritos concluem que o lançamento aposto à guisa de assinatura de VALDIR SANCHES é inautêntico." (fl. 111)

Regina Célia Barbosa afirmou:

"Não se recordou dos fatos narrados na denúncia, somente informando que estivera em São Paulo, em julho ou agosto de 1998, prestando serviços. (...) não se lembrou da empresa Conesp Construtora Limitada. Respondeu que fora para São Paulo, no período acima citado, para trabalhar com processos de fraude. Afirmou que despachou, aproximadamente, cento e vinte processos - correspondente a uma gaveta e meia, onde eram guardados." (fl. 200)

Cleide Pereira da Silva Alves respondeu que era do conhecimento do apelante que a máquina seria financiada pelo FINAME, in verbis:

"J: A senhora tem o compromisso de dizer somente a verdade sob as penas da lei e dentro desse compromisso, eu gostaria de saber se a senhora conhece Roberto Nicola Schioppa e se sabe alguma coisa a respeito do porquê ele está sendo processado em São Paulo, na Justiça Federal, por problema de certidão do I.N.S.S., coisa assim. O que pode esclarecer?
D:. No geral?
J:. Sim.
D:. Na época, noventa e seis, já trabalhava na empresa. Foi feito financiamento pela Mello juntamente com o Banco Direção, o papel meu na empresa, sou assistente contábil, era de tá levando ficha, documento, R.G., contrato social.
J:. Sabe dizer se era de conhecimento do senhor Roberto que a máquina seria financiada pelo FINAME?
D:. Pela FINAME sim." (fls. 251/252)

Sônia Estela Cwejgorn Victorino afirmou que parte da origem do financiamento provinha do FINAME e que acreditava que a empresa sabia da procedência dos recursos do financiamento. Confira-se:

"Declara que é funcionária da Metalúrgica Schioppa Ltda. há dezesseis anos, razão pela qual conhece o réu. Tendo em vista a sua função de contadora na empresa teve conhecimento de que foi obtido um financiamento no qual utilizou-se recursos do FINAME. Tal negociação se deu para compra de uma máquina. Recorda-se que na ocasião dessa negociação que era presidida pelo Sr. Roberto foi enviada uma relação de documentos que seriam necessários para concretização do negócio. Tais documentos deveriam ser entregues ao Banco Direção. Recorda-se de terem sido providenciadas cópias de contrato social, dos documentos dos sócios. No tocante a Certidão Negativa de Débitos não se recorda se tal documento teria sido requisitado. Entretanto, pode dizer que à época seria impossível a obtenção de tal certidão pois a empresa tinha débitos com o INSS. Os documentos providenciados pela depoente foram enviados à empresa Direção. Não tem conhecimento de qualquer negociação envolvendo a certidão negativa de débito referida no presente feito". Dada a palavra ao defensor do réu, às reperguntas respondeu que: "A empresa Melo da qual a Metalúrgica Schioppa Ltda. comprou os maquinários indicou o Banco Direção a fim de que a metalúrgica então obtivesse o financiamento desejado." Dada a palavra ao representante do MPF, às reperguntas respondeu: "Recorda-se que no caso parte da origem do montante financiado advinha da FINAME, isto é, BNDES, e a outra parte da própria instituição Direção. Pelo que se recorda acredita que a metalúrgica tinha conhecimento da origem dos recursos do financiamento". (fls. 282/283)

José Alberto Pinto De Magalhães declarou que o que sabia sobre os fatos decorria de comentários do acusado, além de prestar informação abonatória a respeito dele. Transcreve-se:

"conhece o acusado há uns quinze anos. Quanto aos fatos, ouviu comentários a respeito dos mesmos, do próprio acusado. O depoente trabalha na empresa do acusado, a METALÚRGICA SCHIOPPA LTDA. já há quinze anos, é de lá que o conhece. Atualmente, é o encarregado do setor financeiro. Não tem ciência da existência de alguma CND utilizada para obtenção de financiamento junto ao BNDES. Quanto à pessoa do acusado, pode informar que o mesmo é idôneo e nada sabe que o desabone. Dada a palavra à defesa, às reperguntas respondeu que lembra-se que por volta de 1996 ou 1997 o acusado comentou que iria comprar uma máquina (retífica) para ampliar a capacidade industrial da empresa. O acusado disse também que havia uma empresa intermediária que iria arrumar recursos para comprar esse equipamento. O depoente não participou dessa operação. Tudo o que ficou sabendo sobre essa operação foi somente por comentários do próprio acusado. O acusado comentou que essa empresa intermediária era o BANCO DIREÇÃO. Essa operação não passou pelo crivo do depoente. O depoente sabe que esse financiamento foi quitado. O acusado pediu para o depoente fornecer a documentação (ficha cadastral e outros) para o BANCO DIREÇÃO para formalizar o financiamento. Dentre esses documentos não havia CND. Pode informar que a empresa vem recolhendo regularmente as contribuições previdenciárias. A empresa aderiu ao REFIS. Dada a palavra ao Ministério Público Federal não houve reperguntas." (fls. 333/334)

Como visto, a materialidade e autoria delitivas, bem como a presença do dolo, estão demonstradas pelas provas dos autos, porquanto tanto os documentos como os depoimentos das testemunhas Cleide e Sônia apontam para o fato de que o apelante tinha conhecimento de que parte do financiamento provinha de recursos públicos, e, ademais, há informações explícitas no contrato firmado e na proposta apresentada à empresa, acerca da origem do recurso e da necessidade de apresentação da C.N.D., cuja falsidade restou demonstrada, à vista da inautenticidade da assinatura nela firmada. Assim, a obtenção do financiamento ocorreu mediante fraude, pois, como o próprio réu reconheceu, não seria possível ser expedida, à época, a certidão negativa de débito. Nesse sentido ponderou o Parquet, in verbis:

"Com efeito, o réu tinha plena ciência de que o financiamento contratado se daria pelo FINAME/BNDES e, portanto, com recursos públicos (conforme assinatura no documento de fls. 86). Sabia, também, que deveria apresentar a Certidão Negativa de Débitos para a obtenção do financiamento, o que, aliás, é exigência recorrente em grande parte, se não em todos os contratos que envolvem empréstimos financeiros.
Não é razoável que um homem que se intitula empresário de longa data, responsável e diligente, olvidar-se de ler os contratos que assina. Tampouco pode usar tal argumento como justificativa para ilicitudes cometidas no âmbito de seus negócios." (fl. 439)

A circunstância alegada acerca da ausência de prejuízo ao erário é irrelevante para a prática do delito tipificado no artigo 19, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86, porquanto se cuida de crime formal.

A sentença condenatória, portanto, merece ser mantida.

No que se refere à dosimetria da reprimenda, verifica-se que a pena-base foi fixada no mínimo legal, 2 (dois) anos de reclusão, sobre a qual incidiu a causa de aumento prevista no parágrafo único do artigo 19 da Lei nº 7.492/86, em razão de o financiamento obtido ter origem no FINAME/BNDES, de forma que em detrimento de instituição financeira oficial.

Como visto, o magistrado decidiu de forma correta ao aplicar a pena privativa de liberdade em seu patamar mínimo, o que inviabiliza qualquer possibilidade de redução, pois a reprimenda não pode ser fixada aquém do mínimo legal, sendo irretocável, portando, a decisão de primeiro grau, quanto a essa questão, de modo que não merece prosperar o pedido de abrandamento da reprimenda. Também não se afigura viável afastar a incidência do parágrafo único do artigo 19 da Lei nº 7.492/86, à vista da manifesta utilização dos recursos oriundos da instituição oficial.

No tocante às penas substitutivas, observo que não constam dos autos quaisquer circunstâncias objetivas que permitam obter segura conclusão sobre a capacidade econômica do apelante, de modo a servir de paradigma para o estabelecimento em montante menor da prestação pecuniária do que a fixada pela juíza a qua. Ademais, pleiteia-se na verdade, o esvaziamento da reprimenda, sob o argumento de que o acusado não terá tempo para se dedicar à esposa e aos filhos, caso seja mantida a prestação de serviços à comunidade, mas isso sem trazer elementos que comprovem as alegações.

Diante do exposto, rejeito a preliminar e nego provimento à apelação.

É COMO VOTO.


RAMZA TARTUCE
Desembargadora Federal


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