Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 17/09/2012
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0008470-86.2004.4.03.6102/SP
2004.61.02.008470-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : Justica Publica
APELADO : JOSE BENTO PENARIOL
ADVOGADO : AUGUSTO JULIO CESAR CAMPANA
CODINOME : JOSE BENTO PENARIOL

EMENTA

PENAL. PROCESSUAL PENAL. SONEGAÇÃO FISCAL. ART. 1º, I, DA LEI 8.137/90. VIA ADMINISTRATIVA EXAURIDA. REPASSE DE INFORMAÇÕES À RECEITA FEDERAL RELATIVAS À CPMF.. APLICABILIDADE DA LEI Nº 10.174/01 AOS ANOS ANTERIORES À SUA VIGÊNCIA. DESNECESSIDADE DE AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. LICITUDE DA PROVA PRODUZIDA. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. INCOMPATIBILIDADE ENTRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA E A RENDA DECLARADA PELO RÉU. PRESENÇA DO ELEMENTO SUBJETIVO DO TIPO. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO PROVIDO.
1- Não há que se falar em prova ilícita, vez que a constatação de que o réu suprimiu imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza ao omitir, na declaração de rendimentos do ano-calendário de 1998, valores depositados em suas contas bancárias, baseia-se em relatório de movimentação financeira com base na CPMF.
2- Exaurida a via administrativa, resta atendida a condição de procedibilidade da ação penal nos crimes contra a ordem tributária.
3- Materialidade delitiva comprovada pelos documentos que instruíram o procedimento fiscalizatório.
4- Autoria demonstrada pelo depoimento de testemunha arrolada pela defesa, em consonância com os demais elementos dos autos.
5- Não há violação ao disposto no art. 5º, X (direito à intimidade) e XII (sigilo de dados) da Constituição Federal no repasse de informações relativas à CPMF pelas instituições financeiras à Receita Federal, previsto no parágrafo 3º do artigo 11 da Lei nº 9.311/96, alterado pela Lei nº 10.174/01.
6- A solicitação de informações relativas aos anos anteriores à vigência da Lei nº 10.174/01 não vulnera o princípio da irretroatividade das leis, uma vez que se referem a procedimentos investigativos iniciados depois de sua vigência e não a nova hipótese de incidência do tributo.
7- Desnecessidade de autorização judicial para o repasse de informações bancárias na hipótese, não configurando prova ilícita no processo criminal.
8- Não comprovadas nos termos do artigo 156, primeira parte, do Código de Processo Penal, as alegações do réu de que os depósitos bancários efetuados nas suas contas são provenientes de operações de compensação de cheques realizadas em prol da pessoa jurídica da qual é sócio, que passava por dificuldades financeiras.
9- Não justificada mediante documentação hábil e idônea a incompatibilidade entre a movimentação financeira e a renda declarada pelo réu no ano-calendário respectivo, caracterizando omissão de receita, nos termos do artigo 42, da Lei nº 9.430/96.
10- Não há dúvidas quanto ao acréscimo patrimonial sofrido pelo réu, sujeito, portanto, à incidência do imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza, que foi suprimido mediante omissão às autoridades fazendárias na declaração de rendimentos do ano-calendário de 1998.
11- A figura do sócio não se confunde com a da pessoa jurídica. A movimentação de numerário desta em conta particular do sócio, ao contrário do que sustenta a defesa, dificulta a fiscalização tributária da pessoa jurídica, evidenciando o intuito fraudulento do réu.
12- É inegável a vontade livre e consciente de suprimir imposto sobre a renda ou proventos de qualquer natureza, estando demonstrado o dolo, embora o especial fim de agir não seja elemento do tipo.
13- Em que pese a primariedade e os bons antecedentes do réu, a gravidade das conseqüências do crime, notadamente o prejuízo de grande monta causado ao erário, no valor de R$1.677.817,67 (um milhão, seiscentos e setenta e sete mil, oitocentos e dezessete reais e sessenta e sete centavos) indica que a pena-base deve ser fixada acima do piso, em 3 (três) anos de reclusão em regime aberto e 15 (quinze) dias-multa, no piso legal, tornadas definitivas, e substituída a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos.
14- Apelação do Ministério Público provida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação ministerial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 04 de setembro de 2012.
JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0008470-86.2004.4.03.6102/SP
2004.61.02.008470-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : Justica Publica
APELADO : JOSE BENTO PENARIOL
ADVOGADO : AUGUSTO JULIO CESAR CAMPANA
CODINOME : JOSE BENTO PENARIOL

RELATÓRIO

O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:

Trata-se de apelação criminal interposta pela Justiça Pública em face da sentença que absolveu JOSÉ BENTO PENARIOL da prática do delito previsto no artigo 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/90.

Consta da denúncia que o réu suprimiu imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza ao omitir, na declaração de rendimentos do ano-calendário de 1998, valores depositados em suas contas bancárias da monta de R$2.243.423,56 (dois milhões, duzentos e quarenta e três mil, quatrocentos e vinte e três reais e cinqüenta e seis centavos), incompatíveis com a renda declarada de R$3.600,00 (três mil e seiscentos reais).

A denúncia foi recebida em 24 de fevereiro de 2006 (fls.952/953).

A sentença julgou improcedente a ação penal, absolvendo o réu com fulcro no artigo 386, VI do Código de Processo Penal (fls.1024/1045).

O Ministério Público Federal, em suas razões recursais (fls. 1052/1056), postula condenação do denunciado, vez que as provas foram obtidas licitamente, com base na Lei Complementar 105/2001.

O réu apresenta contrarrazões (fls.1063/1065) pela manutenção da sentença recorrida.

O parecer da Procuradoria Regional da República é pelo provimento do recurso do Ministério Público Federal (fls. 1070/1082).

É o relatório.

Ao revisor.


JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0008470-86.2004.4.03.6102/SP
2004.61.02.008470-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : Justica Publica
APELADO : JOSE BENTO PENARIOL
ADVOGADO : AUGUSTO JULIO CESAR CAMPANA
CODINOME : JOSE BENTO PENARIOL

VOTO

O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:

O Juízo a quo absolveu o réu com base na ilicitude das provas obtidas através da quebra do sigilo bancário sem a intervenção do Judiciário. No entanto, o recurso do Ministério Público Federal comporta provimento.

1. Da licitude das provas.

Não há que se falar em prova ilícita, vez que a constatação de que o réu suprimiu imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza ao omitir, na declaração de rendimentos do ano-calendário de 1998, valores depositados em suas contas bancárias, baseia-se em relatório de movimentação financeira com base na CPMF (fl.50).

Conforme bem apontado no parecer ministerial, verbis (fl.1074):

"Ocorre que a Receita Federal enviou ao órgão ministerial as informações fiscais obtidas a partir dos dados da CPMF debitadas das contas bancárias do réu. Assim, pode-se concluir que no âmbito administrativo, de maneira lícita, foram colhidas estas informações, sem que fosse quebrado o sigilo bancário, qual seja, com o conhecimento dos créditos e débitos ocorridos na conta corrente do apelado. Pelo montante da CPMF incidente, foi possível aquilatar o montante de recursos movimentados, volume esse que se mostrou incompatível com o montante da renda auferida no mesmo período. Ou seja, não foi engendrada qualquer violação de sigilo bancário ou fiscal pelo Ministério Público."

Dessa forma, no caso em tela não se vislumbra qualquer violação ao disposto no art. 5º, X (direito à intimidade) e XII (sigilo de dados) da Constituição Federal no repasse de informações relativas à CPMF pelas instituições financeiras à Receita Federal, previsto no parágrafo 3º do artigo 11 da Lei nº 9.311/96, alterado pela Lei nº 10.174/01.

Verificada a existência de incompatibilidade entre a movimentação financeira do contribuinte e as informações constantes de sua Declaração de Imposto de Renda, a autoridade fiscal deve instaurar o procedimento fiscal, de modo a apurar a existência de eventual crédito tributário. O sigilo bancário não é absoluto, pois a proteção aos direitos individuais deve ceder diante do interesse público, observados os procedimentos fixados em lei.

A solicitação de informações relativas aos anos anteriores à vigência da Lei nº 10.174/01 não vulnera o princípio da irretroatividade das leis, uma vez que se referem a procedimentos investigativos iniciados depois de sua vigência e não a nova hipótese de incidência do tributo:

"PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. MEDIDA CAUTELAR PARA EMPRESTAR EFEITO SUSPENSIVO A RECURSO ESPECIAL. REQUISITOS. NORMAS DE CARÁTER PROCEDIMENTAL. APLICAÇÃO INTERTEMPORAL. UTILIZAÇÃO DE INFORMAÇÕES OBTIDAS A PARTIR DA ARRECADAÇÃO DA CPMF PARA A CONSTITUIÇÃO DE CRÉDITO REFERENTE A OUTROS TRIBUTOS. RETROATIVIDADE PERMITIDA PELO ART. 144, § 1º DO CTN.
1. A concessão de efeito suspensivo a Recurso Especial é de "excepcionalidade absoluta" (AGRPET 1859, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 28.04.00), dependente de: a) instauração da jurisdição cautelar do STJ; b) viabilidade recursal, pelo atendimento de pressupostos recursais específicos e genéricos, e não incidência de óbices sumulares e regimentais; e c) plausibilidade da pretensão recursal formulada contra eventual error in judicando ou error in procedendo.
2. O resguardo de informações bancárias era regido, ao tempo dos fatos que permeiam a presente demanda (ano de 1998), pela Lei 4.595/64, reguladora do Sistema Financeiro Nacional, e que foi recepcionada pelo art. 192 da Constituição Federal com força de lei complementar, ante a ausência de norma regulamentadora desse dispositivo, até o advento da Lei Complementar 105/2001.
3. O art. 38 da Lei 4.595/64, revogado pela Lei Complementar 105/2001, previa a possibilidade de quebra do sigilo bancário apenas por decisão judicial.
4. Com o advento da Lei 9.311/96, que instituiu a CPMF, as instituições financeiras responsáveis pela retenção da referida contribuição, ficaram obrigadas a prestar à Secretaria da Receita Federal informações a respeito da identificação dos contribuintes e os valores globais das respectivas operações bancárias, sendo vedado, a teor do que preceituava o § 3º da art. 11 da mencionada lei, a utilização dessas informações para a constituição de crédito referente a outros tributos.
5. A possibilidade de quebra do sigilo bancário também foi objeto de alteração legislativa, levada a efeito pela Lei Complementar 105/2001, cujo art, 6º dispõe: "Art. 6º As autoridades e os agentes fiscais tributários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios somente poderão examinar documentos, livros e registros de instituições financeiras, inclusive os referentes a contas de depósitos e aplicações financeiras, quando houver processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso e tais exames sejam considerados indispensáveis pela autoridade administrativa competente."
6. A teor do que dispõe o art. 144, § 1º do Código Tributário Nacional, as leis tributárias procedimentais ou formais têm aplicação imediata, ao passo que as leis de natureza material só alcançam fatos geradores ocorridos durante a sua vigência
7. Norma que permite a utilização de informações bancárias para fins de apuração e constituição de crédito tributário, por envergar natureza procedimental, tem aplicação imediata, alcançando mesmo fatos pretéritos.
8. A exegese do art. 144, § 1º do Código Tributário Nacional, considerada a natureza formal da norma que permite o cruzamento de dados referentes à arrecadação da CPMF para fins de constituição de crédito relativo a outros tributos, conduz à conclusão da possibilidade da aplicação dos artigos 6º da Lei Complementar 105/2001 e 1º da Lei 10.174/2001 ao ato de lançamento de tributos cujo fato gerador se verificou em exercício anterior à vigência dos citados diplomas legais, desde que a constituição do crédito em si não esteja alcançada pela decadência.
9. Inexiste direito adquirido de obstar a fiscalização de negócios tributários, máxime porque, enquanto não extinto o crédito tributário a Autoridade Fiscal tem o dever vinculativo do lançamento em correspondência ao direito de tributar da entidade estatal.
10. Medida Cautelar improcedente."
(STJ, MC 7513, 1ª Turma, Relator Ministro Luiz Fux, DJ 30/08/2004, p. 199)

Ademais, as informações relativas à CPMF prestadas à Receita Federal prescindem de autorização judicial, não configurando prova ilícita no processo criminal:

"CRIMINAL. RHC. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. TRANCAMENTO DE INQUÉRITO POLICIAL. ILEGALIDADE PROBATÓRIA. LEI Nº 10.174/01. RETROATIVIDADE. UTILIZAÇÃO DAS PROVAS NA SEARA PENAL. POSSIBILIDADE. DECISÕES JUDICIAIS QUE IMPEDIRIAM O FORNECIMENTO DE DADOS À RECEITA FEDERAL. IMPROCEDÊNCIA. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA A INVESTIGAÇÃO NÃO EVIDENCIADA. CARÁTER ARRECADATÓRIO E INTIMIDATÓRIO DA REPRESENTAÇÃO FISCAL PARA FINS PENAIS. INSUBSISTÊNCIA. LEI COMPLEMENTAR Nº 970/05, DO ESTADO DE SÃO PAULO. IRRELEVÂNCIA. RECURSO DESPROVIDO.
I. No campo tributário, esta Corte tem se orientado pela possibilidade de retroação da Lei nº 10.174/01, para atingir fatos geradores verificados anteriormente à sua vigência, não havendo que se falar, na seara penal, em ilegalidade das provas obtidas por meio dessa diligência, as quais teriam justificado a instauração do inquérito policial.
II. Constituindo-se a conduta do recorrente, consolidada ainda no ano de 1998, em tese, crime, o conhecimento posterior desse fato pelo Parquet, em decorrência de atividade legalmente autorizada à
fiscalização tributária, não pode ser considerado ilícito, a inquinar de nulidade todas as provas posteriores e inviabilizar a investigação policial.
III. Tendo a Lei nº 10.174/01 autorizado a utilização de certas informações bancárias do contribuinte para efeitos fiscais, mesmo que de forma retroativa, o uso destes dados na seara penal prescinde de autorização judicial, eis que a conduta, à época, já configurava, em tese, crime contra a ordem tributária.
(...)"
(STJ, RHC 17689, Relator Ministro Gilson Dipp, DJ 03/10/2005, p. 287).

Não se olvida que no bojo do procedimento fiscal foram requisitadas e prestadas informações atinentes aos extratos bancários do réu (fls.55/153 e 300/799), mas as tais somente vieram corroborar o quanto já apurado através dos informes relativos à CPMF incidente sobre a movimentação bancária, não configurando mácula a onerar o conjunto probatório, vez que prescindíveis.

2. Da materialidade. Diversos documentos comprovam a materialidade: representação fiscal para fins penais (fl.12), termo de início de ação fiscal (fl.51), termo de encerramento de ação fiscal (fl.802), auto de infração (fl.41), informações e extratos bancários (fls. 55/153 e 300/799), declaração de ajuste anual do ano-calendário de 1.998 (fls.47/49).

Além disso, presente o exaurimento da via administrativa, condição de procedibilidade da ação penal nos crimes contra a ordem tributária, vez que através do ofício de fl.845 a Receita Federal informa que não houve o pagamento ou pedido de parcelamento na área administrativa, e que o processo foi encaminhado à Procuradoria Seccional da Fazenda nacional em 07/04/2003 para inscrição em dívida ativa, ao passo que a denúncia foi recebida somente em 24/02/2006 (fl.953).

3. Da autoria. A autoria resta igualmente comprovada.

O réu, como sói acontecer, em seu interrogatório judicial (fls.981/982) nega a prática delitiva. Mas demonstrado nos autos ser de sua titularidade as contas bancárias impugnadas.

O apelado confirmou em Juízo que não apresentou a documentação solicitada pela Receita Federal.

O réu alega que os depósitos bancários efetuados nas suas contas são provenientes de operações de compensações de cheques realizadas em prol da pessoa jurídica da qual é sócio, que passava por dificuldades financeiras:

"Que a quantia mencionada refere-se à transferência de contas para contas. Que os depósitos tratam-se de tipo BDN do Banco Bradesco, sendo que o depoente é proprietário da firma "Da Terra". Que o depoente utiliza-se da prática de depositar um cheque para ser compensado no dia seguinte, pelo que ocasiona o grande volume de movimentação em sua conta. Que o depoente trocava cheques com o "Chioda", com o "Secato". Que o depoente chegava a pedir dinheiro emprestado (...)".

Contudo, a defesa não se desincumbiu do ônus de provar o quanto alegado, nos termos do artigo 156, primeira parte, do Código de Processo Penal.

Dessa forma, se a incompatibilidade entre a movimentação financeira e a renda declarada pelo réu no ano-calendário respectivo não foi justificada mediante documentação hábil e idônea, está caracterizada a omissão de receita, nos termos do artigo 42, da Lei nº 9.430/96.

Por outro lado, não há dúvidas quanto ao acréscimo patrimonial sofrido pelo réu no período, sujeito, à incidência do imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza, que foi suprimido mediante omissão às autoridades fazendárias na declaração de rendimentos (fls.47/49), configurando o delito previsto no artigo 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/90.

Ainda que tivesse sido comprovada a tese defensiva, a figura do sócio não se confunde com a da pessoa jurídica. A movimentação de numerário desta em conta particular do sócio, ao contrário do que sustenta a defesa, dificulta a fiscalização tributária da pessoa jurídica, evidenciando o intuito fraudulento do réu que, inclusive, confirmou em seu interrogatório que negociava cheques com "terceiros", que seriam empresários do mesmo ramo. Assim, mesmo que verdadeiras as alegações de defesa, restaria caracterizado o crime.

O tipo penal descrito no artigo 1º da Lei nº 8.137/90 exige apenas o dolo genérico. Não é essencial o dolo específico ou especial fim de agir. O crime de sonegação fiscal consiste em reduzir ou suprimir tributo por meio de uma das condutas arroladas, e não em adotar uma daquelas condutas com o fim de suprimir ou reduzir tributo.

Nessa linha, julgado desta Corte:

PENAL. PROCESSO PENAL. ART. 1º, I DA LEI N. 8.137 /90. DECRETAÇÃO DE NULIDADE. NECESSIDADE DE COMPROVAR O PREJUÍZO SOFRIDO. PRELIMINAR. NULIDADE DA SENTENÇA. INOCORRÊNCIA. MATERIALIDADE. MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA. OMISSÃO DE RECEITA. TIPICIDADE. AUTORIA. DOSIMETRIA.
(...) Está comprovada a materialidade do delito pela prova documental.
(...) Considerando que o apelante tinha o dever de declarar os valores auferidos em 1998 e não o fez, houve a consumação do delito do art.1 º da Lei n. 8.137 /90.
(...) A existência de valores creditados em conta corrente ou investimentos instituição financeira, sem a adequada comprovação de origem e não declarados ao Fisco configura o delito de sonegação fiscal.
(...) A autoria do delito resta comprovada. A defesa não logrou êxito em apresentar elementos aptos a infirmar a o procedimento administrativo-fiscal, do qual consta o auto de infração, que é claro e preciso no sentido de que o réu praticara o crime previsto no art. 1º, I, da Lei n. 8.137 /90 c. c. o art. 71 do Código Penal (...).
( ACR - APELAÇÃO CRIMINAL 0000023-74.2003.4.03.6125 UF: SP, QUINTA TURMA, Relator: JUÍZA CONVOCADA LOUISE FILGUEIRAS, CJ1 DATA:07/02/2012 ).

4. Da dosimetria. Em que pese a primariedade e os bons antecedentes do réu, a gravidade das conseqüências do crime, notadamente o prejuízo de grande monta causado ao erário, no valor de R$1.677.817,67 (um milhão, seiscentos e setenta e sete mil, oitocentos e dezessete reais e sessenta e sete centavos) - fl.802, revela ser a pena-base mínima insuficiente para a repressão e a prevenção do crime.

Assim, fixo a pena-base em 03 (três) anos de reclusão em regime aberto, nos termos do artigo 33 do Código Penal e 15 (quinze) dias-multa, no piso unitário, ante a ausência de indicação nos autos da situação econômica do réu, tornando-as definitivas.

Nos termos do artigo 44 do diploma penal, substituo a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária de 5 (cinco) salários mínimo .

Com tais considerações, DOU PROVIMENTO à apelação ministerial.

É o voto.

JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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Data e Hora: 06/09/2012 12:07:18