Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 05/09/2012
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0005972-68.2005.4.03.6106/SP
2005.61.06.005972-1/SP
RELATOR : Desembargador Federal LUIZ STEFANINI
APELANTE : Justica Publica
APELADO : JOSE ALCIR DA SILVA
ADVOGADO : JOAO MARTINEZ SANCHES (Int.Pessoal)
APELADO : MARILDA SINHORELLI PEDRAZZI
ADVOGADO : MARILDA SINHORELLI PEDRAZZI e outro
APELADO : LEILA ROSECLER DE OLIVEIRA
ADVOGADO : SUZANA HELENA QUINTANA e outro
No. ORIG. : 00059726820054036106 3 Vr SAO JOSE DO RIO PRETO/SP

EMENTA

PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO. PATROCÍNIO SIMULTÂNEO OU TEGIVERSAÇÃO. ARQUIVAMENTO DE INQUÉRITO. COISA JULGADA MATERIAL. FATOS SEMELHANTES. ILICITUDE DAS PROVAS. IMPARCIALIDADE DO JUÍZO. AFASTAMENTO. CONTINUIDADE DELITIVA. PREVENÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. CRIME FORMAL. MATERIALIDADE COMPROVADA. ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA PREMATURA. REFORMA DA SENTENÇA. ANULAÇÃO. PROSSEGUIMENTO DO FEITO CRIMINAL.
1. Conduta constatada pelo juízo trabalhista de José Bonifácio-SP, praticada por sócio-proprietário de empresa que contratou advogada, para, fazendo-se passar de procuradora de ex-funcionários, após colher suas assinaturas nas procurações, ajuizar-lhes ações trabalhistas e, com a colaboração de outra advogada ré, defender, na mesma causa, partes contrárias (empregado e empregador), visando à homologação judicial de acordos trabalhistas, de forma a causar prejuízos aos trabalhadores.
2. O arquivamento dos inquéritos e a posterior rejeição das denúncias ofertadas em feitos diversos, não ensejam coisa julgada material em relação a fatos similares apurados na presente ação. O trancamento de inquérito policial a pedido do Ministério Público Federal, fundado na atipicidade dos fatos, produz coisa julgada material, impedindo a sua reabertura, relativamente aos fatos a que se referirem.
3. Não obstante a existência de diversas ações trabalhistas e supostas lides simuladas, cada um trabalhador, a sua maneira, foi, em tese, ludibriado pelos réus, para figurarem no pólo passivo de uma demanda que não pretendiam propor, tratando-se, portanto, de fatos diversos em cada uma delas.
4. O inquérito policial que antecedeu o oferecimento da denuncia, teve início a partir das peças informativas oriundas da Procuradoria Regional da República que, por sua vez, recebera cópias do feito trabalhista em que a vítima secundária nestes autos - reclamante -, tendo sido representada por uma das rés. Tal ato não implica em constrangimento ilegal (art. 40 do CPP) ou eventual imparcialidade do Juízo do trabalho, sequer passível de ser apurada nestes autos.
5. Alegação de prova ilícita afastada com base na jurisprudência da Corte.
6. A simples constatação da continuidade delitiva não implica necessariamente no reconhecimento da conexão dos feitos e os fatos apresentados referem-se, cada um, às ações trabalhistas diversas. Precedente da Primeira Seção deste E. Tribunal Regional.
7. A conclusão de que não existe subsunção ao tipo penal previsto no parágrafo único do art. 355 do Código Penal (patrocínio simultâneo ou tergiversação), é prematura, bem como é também prematura a extinção do feito em primeiro grau em virtude da absolvição sumária.
8. Hipótese de absolvição tem aplicação apenas à evidência de inconteste atipicidade, a exemplo do trancamento da ação penal, ou do inquérito policial no âmbito de habeas corpus, em relação à prova pré-constituída, de caráter incontroverso.
9. O crime de patrocínio simultâneo ou tergiversação é formal - não exige, para sua prática, que a conduta do agente cause efetivo prejuízo às partes, mas sim que o agente, ao prestar o auxílio técnico, a quem lhe outorgar procuração, defenda, mediante a prática de atos concretos, simultânea ou sucessivamente partes contrarias. Admite a tentativa e o seu objeto é a Administração da Justiça.
10. Na espécie, apercebendo-se da suposta simulação de ações perante a Justiça do Trabalho, isto é, ao antever a fraude processual que está sob apuração nestes autos, o D. Juízo julgou extinto o feito sem exame do mérito, deixando de homologar acordo assinado e protocolizado pelas advogadas rés, dois dias após o ajuizamento da ação, sem que houvesse notificação da reclamada.
11. Da análise dos elementos dos autos é possível supor que, para obstar o ajuizamento de futura e eventual ação por parte dos funcionários, os réus já haviam entabulado um acordo por fora, possivelmente em desacordo com as normas de proteção ao trabalhador.
12. É discutível a matéria, não merecendo a denúncia ser abortada logo de início.
13. Admite-se a participação do corréu, nos termos do art. 30 do Código penal.
14. Questões como a existência do dolo devem ser verificadas no decorrer do feito, não se podendo descartá-las de plano.
15. Provimento parcial do apelo ministerial para anular a sentença de absolvição sumária, determinando-se o prosseguimento do feito.



ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao apelo ministerial, para anular a sentença de absolvição sumária, determinando-se o prosseguimento do feito, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.



São Paulo, 27 de agosto de 2012.
LUIZ STEFANINI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0005972-68.2005.4.03.6106/SP
2005.61.06.005972-1/SP
RELATOR : Desembargador Federal LUIZ STEFANINI
APELANTE : Justica Publica
APELADO : JOSE ALCIR DA SILVA
ADVOGADO : JOAO MARTINEZ SANCHES (Int.Pessoal)
APELADO : MARILDA SINHORELLI PEDRAZZI
ADVOGADO : MARILDA SINHORELLI PEDRAZZI e outro
APELADO : LEILA ROSECLER DE OLIVEIRA
ADVOGADO : SUZANA HELENA QUINTANA e outro
No. ORIG. : 00059726820054036106 3 Vr SAO JOSE DO RIO PRETO/SP

RELATÓRIO

Trata-se de apelação criminal interposta pelo Ministério Público Federal em face da sentença de fls. 337/339, proferida pelo MM. Juízo da 3ª Vara Federal de São José do Rio Preto/SP, que, nos termos do art. 397, III, do Código de Processo Penal, julgou improcedente a denúncia e absolveu sumariamente Marilda Sinhorelli Pedrazzi e Leila Rosecler de Oliveira, estendendo os efeitos da absolvição ao acusado José Alcir da Silva, o qual foi citado por edital.

Nas razões apresentadas, o Ministério Público Federal informa que a conduta imputada aos réus, prevista no art. 355, parágrafo único, do Código Penal (patrocínio simultâneo ou tergiversação) c.c. art. 29 do Código Penal, está devidamente comprovada e, diversamente do que concluiu o magistrado de primeiro grau, não constitui continuidade delitiva em relação aos autos que, a pedido do Ministério Público Federal, foram arquivados por atipicidade da conduta, a saber: nº 0005189-76.2005.403.6106, 0005193-16.2005.403.6106, 0005927-64.2005.403.6106, 0005932-86.2005.403.6106, 0006196-06.2005.403.6106 e 0006884-65.2005.403.6106.

Da mesma forma, o presente feito não trata de continuidade delitiva em relação aos autos que tiveram suas denúncias rejeitadas, por ser referirem à mesma situação do feito nº 0005189-76.2005.403.6106. São eles: 0002816-72.2005.403.6106, 0004275-12.2005.403.6106, 0004407-69.2005.403.6106, 0004408-54.2005.403.6106, 0004416-31.2005.403.6106, 0005194-98.2005.403.6106 e 0005415-81.2005.403.6106.

A presente ação penal envolve fatos diferentes dos processos arquivados, pois, cada um deles refere-se a uma ação trabalhista, com reclamantes diversos, nas quais, em tese, houve a indução de ex-funcionários de um mesmo grupo a contratarem a mesma advogada - que também defenderia os interesses das empresas -, para o ajuizamento de ações trabalhistas que terminariam em acordos prejudiciais aos trabalhadores.

Outrossim, o princípio da independência funcional confere aos membros do Ministério Público Federal, liberdade para atuar de acordo com as suas consciências, permitindo a continuação das investigações que acarretaram a propositura da presente ação penal.

Argumenta, por fim, o Ministério Público Federal que existe, in casu, comprovação da materialidade e autoria delitivas, ensejando a reforma da decisão de absolvição sumária, para que, devidamente processados os réus, após regular instrução, sejam os mesmos condenados pela prática do delito de patrocínio simultâneo (fl. 372).

Contrarrazões:

a) de José Alcir da silva (defensor dativo) fls. 377-390, pela manutenção da r. sentença, considerando-se a ausência de provas e o efetivo prejuízo das supostas vítimas e ausência do dolo específico.

b) de Marilda Sinhorelli Pedrazzi, às. fls. 393-432, preliminarmente, pela ocorrência de coisa julgada material sobre a atipicidade do fato, concretizada em feitos idênticos, em relação aos quais o juízo singular reconheceu a conexão ou continência e a continuidade delitiva, devendo-se reunir todos os processos que correm contra a recorrida. No mérito, pelo improvimento da apelação ministerial, por insubsistência da ação penal, por erro de pessoa, falta de prova, falta de dolo, ilicitude das provas emprestadas, e imparcialidade do MM. Juiz do Trabalho que presidiu os feitos onde tiveram origem os fatos objeto da persecução penal.

c) de Leila Rosecler de Oliveira, às fls. 433/436, versando sobre a ausência de dolo e prejuízo para a vítima, e, também, acerca da coisa julgada, produzida pela decisão que determina o arquivamento de inquérito policial a pedido do Ministério Público Federal, fundado em atipicidade da conduta.

Feito distribuído por prevenção relativamente à ACR nº 2005.61.06.005192-8.

Parecer do Ministério Público Federal às fls. 440/443, pelo provimento parcial do recurso da acusação, porquanto a conduta de Leila e Marilda amolda-se ao caput, do art. 355 do Código Penal (patrocínio infiel), o qual não depende de prejuízo da parte contrária e, sendo delito próprio do advogado ou procurador, não há como imputá-lo a Jose, não obstante seja o maior interessado na fraude perpetrada.

Ás fl. 445, importante registrar que a presente ação penal foi apensada à apelação criminal nº 0004415-46.2005.4.03.6106, conforme despacho ali proferido, e também às de nº 0004405-02.2005.4.03.6106, 0005191-46.2005.4.03.6106, 0005192-32.2005.4.03.6106, 0005197-53.2005.4.03.6106, 0005928-49.2005.4.03.6106, 0005930-19.2005.4.03.6106, 0006886-65.2005.4.03.6106, estas a serem julgadas em conjunto com o presente feito, nesta oportunidade, pela C. Quinta Turma.

De se salientar que no âmbito da primeira instancia houve o apensamento entre os feitos, todos distribuídos por dependência ao de nº 0004415-46.2005.4.03.6106 (fls. 312/313 do aludido feito).

Nos referidos autos, embora não tenha o Parquet interposto recurso contra a r. sentença absolutória, em virtude de ter se consumado a prescrição (fl. 507), manteve-se o apensamento determinado pelo Juízo, aos processos remetidos a este Tribunal para o julgamento das apelações ministeriais (fl. 587). Tal providência restou preservada por este Relator (fls. 594), deferindo-se pedido do Ministério Público Federal.

É o relatório.

Dispensada a revisão, nos termos do art. 34, IV, do Regimento Interno da E. Corte.


LUIZ STEFANINI
Desembargador Federal


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Data e Hora: 29/08/2012 18:50:04



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0005972-68.2005.4.03.6106/SP
2005.61.06.005972-1/SP
RELATOR : Desembargador Federal LUIZ STEFANINI
APELANTE : Justica Publica
APELADO : JOSE ALCIR DA SILVA
ADVOGADO : JOAO MARTINEZ SANCHES (Int.Pessoal)
APELADO : MARILDA SINHORELLI PEDRAZZI
ADVOGADO : MARILDA SINHORELLI PEDRAZZI e outro
APELADO : LEILA ROSECLER DE OLIVEIRA
ADVOGADO : SUZANA HELENA QUINTANA e outro
No. ORIG. : 00059726820054036106 3 Vr SAO JOSE DO RIO PRETO/SP

VOTO

Os fatos. José Alcir da Silva, sócio-proprietário da empresa Aliança Tubos e Conexões Ltda. e administrador da empresa S.C. dos Reis - Nova Aliança, contratou Marilda Sinhorelli Pedrazzi, advogada, para fazendo-se passar de procuradora de ex-funcionários das empresas e, após colher suas assinaturas nas procurações, ajuizar-lhes ações trabalhistas e, com a colaboração de Leila Rosecler de Oliveira, também advogada, defender na mesma causa, partes contrárias (empregado e empregador), visando a homologação judicial de acordos trabalhistas, de forma a causar prejuízos aos trabalhadores.

Segundo a denuncia, Marilda Sinhorelli, assim agindo, defendeu na mesma causa, simultaneamente partes contrárias, tudo com a participação dos demais acusados.

Consta dos autos que, em 15.12.2004, tal fato fora constatado pelo juízo trabalhista de José Bonifácio-SP, em sede de ação trabalhista movida por Miguel da Silva Junior (procuração outorgada à segunda ré à fl. 16).

A capitulação jurídica. Os réus foram denunciados pela prática do delito previsto no parágrafo único do art. 355, norma legal assim descrita no Código Penal Brasileiro:


Patrocínio infiel
Art. 355 - Trair, na qualidade de advogado ou procurador, o dever profissional, prejudicando interesse, cujo patrocínio, em juízo, lhe é confiado:
Pena - detenção, de seis meses a três anos, e multa.
Patrocínio simultâneo ou tergiversação
Parágrafo único - Incorre na pena deste artigo o advogado ou procurador judicial que defende na mesma causa, simultânea ou sucessivamente, partes contrárias.

A fundamentação da r. sentença absolutória - art. 397, III, do CPP. O Ministério Público Federal, reconhecendo a atipicidade de condutas idênticas à narrada nos presentes, requereu o arquivamento dos autos dos inquéritos policiais nº 0005189-76.2005.403.6106, 0005193-16.2005.403.6106, 0005927-64.2005.403.6106, 0005932-86.2005.403.6106, 0006196-06.2005.403.6106 e 0006884-65.2005.403.6106. Fundamentou-se por não comprovada a traição, pelas advogadas rés, do dever profissional, que causaria prejuízo às partes.

Os feitos nº 0004275-12.2005.403.6106, 0004407-69.2005.403.6106, 0004408-54.2005.403.6106, 0004416-31.2005.403.6106, 0005194-98.2005.403.6106 e 0005415-81.2005.403.6106, pelo mesmo motivo, tiveram as denúncias rejeitadas.

As condutas aqui tratadas são semelhantes, remetendo à possível continuidade delitiva, ou bis in idem, não existindo justificativa plausível para que não se decida da mesma forma no caso em exame, sob pena de contradição, impondo-se, inclusive a unidade de julgamento, face à conexão ou continência entre os feitos.

Nesse contexto, registrou o magistrado a quo que, quando o arquivamento de inquérito se dá a pedido do Ministério Público Federal, pelo fato não constituir crime, perfaz-se a coisa julgada material, impedindo instauração de processos em que haja o mesmo episódio.

Os fatos apurados no inquérito policial nº 0005189-76.2005.403.6106. No dia 15.12.2004, o Juízo Trabalhista de José Bonifácio constatou que, contratadas pelo réu José, as rés Marilda e Leila, defenderam simultaneamente, partes contrárias, quais sejam, Claudio Carvalho de Souza (reclamante) e Aliança Tubos e Conexões Ltda. (reclamada).

O próprio Ministério Público Federal, que havia requerido o arquivamento dos autos por atipicidade da conduta, em virtude de não comprovada a traição do dever profissional, pediu o desarquivamento, face a existência de novas provas. Entretanto, a denúncia oferecida restou rejeitada, haja vista que as ditas provas novas já eram de conhecimento do órgão acusador, quando do pedido de arquivamento dos autos, não se referindo, outrossim, ao reclamante em questão, vítima secundária do delito, sequer indicada como testemunha de acusação.

Tais informações são extraídas dos autos em apenso - 0004415-46.2005.4.03.6106 - às fls. 198/204, onde consta cópia da decisão que rejeitou a denúncia no feito 0005189-76.2005.403.6106 e nos demais já mencionados, todas calcadas nos mesmos argumentos (fls. 206/285).

Nas razões de recurso (fls. 370, dos presentes autos), afirma a acusação que, nos referidos feitos, não havia comprovação da tipicidade, já, nestes autos, a materialidade foi comprovada, uma vez que o reclamante - Miguel da Silva Junior, em seu depoimento perante a autoridade policial (fl. 42/43), deu conta da fraude engedrada para firmar o acordo que seria levado apenas para homologação judicial.

Além disso, afirma o recorrente, que a ex-funcionária da S.C. dos Reis Nova Aliança, Ednéia Simonato, nos autos de outro inquérito policial (nº 6-370/05), ao ser reinquirida, confirmou que a ré Marilda havia dito aos funcionários sobre o acordo fechado com a empresa, que seria apenas homologado na Justiça do Trabalho (fl. 122/125).

Com isso, ressalta a acusação, os réus ajuizaram ação trabalhista para conseguir acordo lesivo aos interesses dos empregados, o qual, com o trânsito em julgado, impediria que os mesmos, legitimamente representados por advogados de sua confiança, pudessem pleitear em nova ação os direitos trabalhistas desrespeitados durante a relação de emprego.

As questões que antecedem o mérito. O arquivamento dos inquéritos e a posterior rejeição das denúncias ofertadas em feitos diversos, não ensejam coisa julgada material em relação a fatos similares apurados na presente ação.

Não há nos autos, cópia dos pedidos ministeriais de arquivamento dos inquéritos policiais tratando de fatos semelhantes aos que se apuram nestes autos, nem mesmo cópia da decisão que os acatou, mas apenas das decisões que arquivaram os aludidos procedimentos, pela ausência de provas sobre a deslealdade praticada pelas rés, no exercício da profissão (encartadas no processo nº 004415-46.2005.4.03.6106 em apenso).

Assim, não se trata de irrelevante penal, gerando coisa julgada material em relação a outros feitos, os quais envolvem vítimas (trabalhadores/reclamantes) diversos, como é o caso da presente ação penal.

O trancamento de inquérito policial a pedido do Ministério Público Federal, fundado na atipicidade dos fatos, produz coisa julgada material, impedindo a sua reabertura, relativamente aos fatos a que se referirem.

Isto quer dizer que não pode Parquet, por meio do mesmo, ou de novo representante legal, efetuando reinterpretação dos fatos, adotar conclusão diversa da que determinou o arquivamento do inquérito, utilizando-se, para tanto, de uma nova qualificação jurídica.

Como bem asseverou o Ministério Público Federal em parecer lançado nos autos - fl. 441 -, cada um trabalhador, a sua maneira, foi ludibriado pelos réus, para figurarem no pólo passivo de uma demanda que não pretendiam propor. Assim, ainda que seja possível o acatamento da continuidade delitiva (art. 71 do CP), tal não implica no reconhecimento da coisa julgada material.

Ainda na seara das questões prévias, verifica-se que a ré Marilda, advogada atuando em causa própria, alega que a denúncia baseia-se em prova ilícita, emprestada dos autos da ação trabalhista onde o juiz do trabalho concluiu a existência de suposta lide simulada, figurando como reclamante José Antonio Belentani, em causa patrocinada por advogada diversa (Adriana Cristina Borges).

Com base nisso, também afirma a ocorrência do erro de pessoa, já que não figurou como advogada naqueles autos, além da imparcialidade do juiz do trabalho que feriu competência do Ministério Público Federal, ao proceder à oitiva da esposa do reclamante, fatos que deram origem aos diversos inquéritos e ações penais que pendem contra a ré Marilda.

Esclareça-se que o inquérito policial que antecedeu o oferecimento da denuncia, teve início a partir das peças informativas oriundas da Procuradoria Regional da República que, por sua vez, recebera cópias do feito trabalhista em que a vítima secundária nestes autos, Miguel da Silva Júnior, foi o reclamante, tendo sido representado pela advogada ré, Marilda - fls. 21/26. Tal ato não implica em constrangimento ilegal (art. 40 do CPP) ou eventual imparcialidade do Juízo do trabalho, sequer passível de ser apurada nestes autos.

Observe-se que Juízo do Trabalho ressaltou a grande quantidade de reclamações trabalhistas em face das empresas objeto dos autos, patrocinadas pelas mesmas advogadas rés, Marilda (pelos reclamantes) e Leila (pelas reclamadas), todas com acordo protocolizado antes da notificação. Além disso e os depoimentos dos reclamantes dando conta da simulação da lide, notadamente o depoimento de Maria José Caetano Belentani, esposa do reclamante José Antônio Belentani, no processo nº 00379-2004-110-15.00-3 RST, o qual teria revelado toda a fraude perpetrada pela reclamada em prejuízo dos empregados.

Sobre as questões postas, a C. Quinta Turma já se pronunciou pela ausência de ilegalidade das provas, bem como do ato que determinou o envio de cópias para o Ministério Público Federal.


PENAL - PROCESSUAL PENAL - RECURSO EM SENTIDO ESTRITO CONTRA DECISÃO QUE NÃO RECEBEU A DENÚNCIA QUANTO AO DELITO DE PATROCÍNIO INFIEL POR AUSÊNCIA DE DESCRIÇÃO, NA DENÚNCIA, DO EFETIVO PREJUÍZO SUPORTADO PELA VÍTIMA, E DECLINOU DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL PARA PROCESSAR E JULGAR O FEITO QUANTO A SUPOSTA PRÁTICA DO DELITO DESCRITO NO ART. 203 DO CP - REJEIÇÃO DA PRELIMINAR DE NULIDADE DO PROCESSO POR VÍCIO NA PROVA COLHIDA POR JUIZ DO TRABALHO E REMETIDA AO MPF, SUSCITADA EM CONTRARRAZÕES - JULGAMENTO ANTECIPADO DO MÉRITO DA AÇÃO PENAL - NÃO PREVISÃO NO SISTEMA PROCESSUAL PENAL - A PEÇA EXORDIAL ACUSATÓRIA DESCREVE CONDUTA DE CRIME DE PATROCÍNIO SIMULTÂNEO OU TERGIVERSAÇÃO E NÃO DE PATROCÍNIO INFIEL - O RÉU SE DEFENDE DOS FATOS DESCRITOS NA DENÚNCIA E NÃO DE SUA CAPITULAÇÃO LEGAL - COMPROVAÇÃO OU NÃO DE EFETIVO PREJUÍZO DEVE OCORRER SOMENTE APÓS O TÉRMINO DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL PENAL - EXISTÊNCIA DE MATERIALIDADE E INDÍCIOS DE AUTORIA DELITIVA - CRIMES, EM TESE, DE FRUSTRAÇÃO DE DIREITO ASSEGURADO POR LEI TRABALHISTA EM CONJUNTO COM O DE PATROCÍNIO INFIEL - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL PARA PROCESSAR E JULGAR O FEITO POR FORÇA DA VIS ATRACTIVA DA JUSTIÇA FEDERAL SOBRE A JUSTIÇA ESTADUAL - DENÚNCIA RECEBIDA EM RELAÇÃO A AMBOS OS DELITOS - RECURSO MINISTERIAL PROVIDO - DECISÃO REFORMADA. 1. Antes de adentrar na análise da decisão recorrida, é dever tratar da preliminar suscitada pelas defesas em suas contrarrazões ao recurso ministerial interposto, nos autos. 2. Como é cediço, constatando o juiz do trabalho, em audiência, autos ou papéis de que conhecer, a ocorrência de delito tipificado no Código Penal, deverá, por força do disposto no art. 40 do CPP, remeter ao Ministério Público Federal (Súmula 165 do STJ) cópias dos documentos necessários à instauração da devida ação penal. 3. Este juízo de verificação da ocorrência do delito, naturalmente, não precisa ser conclusivo no sentido da efetiva prática do crime, bastando o convencimento pessoal do magistrado ou até mesmo a dúvida razoável, pois, nesse caso, vigora o princípio in dubio pro societatis. Assim como a opinio delictis é do Ministério Público Federal, que, recebendo as peças de informações do juiz, poderá denunciar diretamente ou requerer o arquivamento das peças de informação, ou requisitar ou empreender diretamente diligências complementares, ou, até mesmo, requisitar a instauração de inquérito policial, não há razão para o Juiz do Trabalho na condição de autoridade coatora. 4. Tal ato praticado pelo Juiz Trabalhista é meramente administrativo e correcional - função jurisdicional anômala - não se tratando de ato de jurisdição. O que não poderia ocorrer é o Juiz do Trabalho "ameaçar" de prisão o empregador (reclamado) e as advogadas, por suspeita de fraude por ele perpetrada em detrimento de seus empregados, com a suposta colaboração destas que, em conluio com a parte reclamada, teriam realizado acordos extra-judiciais, sem o conhecimento dos seus clientes (parte reclamante), para frustrar direitos assegurados pela legislação trabalhista. O Juiz trabalhista também não poderia prendê-los, ele próprio, em flagrante delito, por mais afrontoso que pudesse ser o delito por eles então praticado. 5. No caso em apreço, o MPF recebeu as peças informativas do Juiz Trabalhista (fls.24/25), que descreviam suposta prática de crime de patrocínio infiel, e, em seguida, requisitou a instauração de inquérito policial (fls.29/30), onde foram colhidos os depoimentos das testemunhas e dos indiciados (fls.37/38 - por carta precatória, fls.41/43, 56/58, 59/61, 76//79 e 85/87), sendo que todas as peças informativas colhidas pelo Juiz Trabalhista e todos os atos praticados no inquérito, serão posteriormente introduzidos no ambiente processual, onde estarão à disposição das partes, dando a defesa ampla oportunidade de produzir provas e de se contrapor àquelas coligidas aos autos pela acusação. 6. Destarte, não houve prova emprestada, realizada às escondidas pelo Juiz do trabalho, ao arrepio da lei e com violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa, e posteriormente remetidas ao MPF, dando origem a uma denúncia baseada em provas obtidas por meios ilícitos, como quer fazer crer as defesas. 7. O Juiz do Trabalho, como dito, simplesmente obedeceu ao comando cogente disposto no art. 40 do CPP, ao vislumbrar a existência de crime de ação penal pública incondicionada, remetendo ao MPF as cópias e documentos necessários ao oferecimento da denúncia, ficando a cargo do Parquet, como titular da ação penal pública, tomar ou não as medidas judiciais pertinentes ao caso. Resta assim, rejeitada a preliminar de nulidade argüida pelas defesas em sede de contra-razões. 8. A denúncia teve início mediante encaminhamento de peças enviadas pela Justiça do Trabalho de José Bonifácio/SP, noticiando que a empregada Roseli Aparecida Sanches da Silva, representada pela advogada Marilda Sinhorelli Pedrazzi, ingressou com reclamação trabalhista perante a Vara do Trabalho de José Bonifácio/SP, em face da reclamada empresa "S.C dos Reis Nova Aliança" pertencente ao empregador José Alcir da Silva, representado pela advogada Leila Rosecler de Oliveira, ambas as advogadas na realidade contratadas pelo empregador, para mover ações trabalhistas em face da sua própria empresa e, em conluio, entabular acordos extrajudiciais, sem o conhecimento dos reclamantes, para que fossem apenas homologadas pelo Juiz da Vara do Trabalho, para que seus empregados não mais pudessem exercer o seu direito de ação, através de advogados por eles mesmos constituídos, frustrando a busca em juízo de direitos assegurados na lei trabalhista e que não foram devidamente pagos ou pagos a menor pelo empregador. O MM. Juiz da Vara do Trabalho de José Bonifácio/SP constatou os fatos acima transcritos, através de vários reclamantes que confessaram, durante a audiência trabalhista, que assinaram a procuração na sede da própria empresa reclamada, o que o levou a desconfiar de que se tratava, na verdade, de lide simulada. 9. A denúncia imputa aos recorridos a prática dos delitos previstos no artigo 203, em sua forma tentada, e art. 355, caput, c.c. o art. 29, todos do Código Penal. A denúncia ofertada às fls. 147/150 atende os requisitos previstos no artigo 41 do Código de Processo Penal. E não se vislumbra qualquer uma das hipóteses do artigo 43 do Código de Processo Penal, a justificar a rejeição da inicial acusatória. 10. O MM. Juiz a quo rejeitou a denúncia por inépcia, entendendo que, em relação ao crime tipificado no artigo 355 do Código Penal (patrocínio infiel), não houve a descrição, na peça exordial acusatória, do prejuízo suportado pela vítima Roseli Aparecida Sanches. E, em sede de embargos, o Juiz prolator da decisão foi provocado pelo Parquet Federal, por ter sido omisso ao deixar de analisar o recebimento ou rejeição da denúncia no que tange ao delito tipificado no art. 203 do CP, também descrito na denúncia, tendo o MM. Juiz, quanto a este crime, declinado da competência da Justiça Federal para processar e julgar o feito, sob a fundamentação de que não houve lesão a bens ou interesse da União, suas autarquias ou empresas públicas, e, ainda, entendeu que não se verificou a existência de ofensa à organização geral do trabalho como um todo, concluindo pela competência da Justiça Estadual para processar e julgar o feito (fls.158/160). 11. A rejeição sumária da denúncia, com base na inexistência de descrição do prejuízo sofrido pela ex-empregada da empresa "S.C. dos Reis Nova Aliança", parte reclamante na ação trabalhista, não tendo o órgão acusador a preocupação de descrever na peça exordial acusatória o crime de tergiversação ou patrocínio infiel, não estando evidenciados todos os elementos do tipo penal, o que equivaleria esta omissão, à descrição de fato atípico pelo Ministério Público Federal, sem se ter dado início à instrução criminal, equivale a uma absolvição sem processo, configurando verdadeiro julgamento antecipado da lide, sem permitir que a acusação produza provas em juízo, em violação aos princípios constitucionais de acesso à jurisdição e do contraditório - art. 5º, incisos XXV e LV da Lei Maior. 12. Acerca da fundamentação da decisão de rejeição da denúncia de fls.147/153, no sentido de que não houve descrição do delito de patrocínio infiel (art. 355 do CP) ou de tergiversação (art.355, parágrafo único do mesmo diploma legal), merece ser revista. 13. Como se observa do confronto entre os tipos penais, por meio de uma simples leitura, o único a tratar expressamente do efetivo prejuízo do cliente causado por seu procurador judicial ou advogado é o de patrocínio infiel, que só se consuma com o efetivo prejuízo de natureza material ou moral oriundo da traição, não se contentando com a mera traição do dever profissional (é crime material). Para o delito de patrocínio sucessivo ou tergiversação, no entanto, o crime se consuma, sem a exigência do chamado resultado naturalístico, bastando a realização do ato processual destinado a beneficiar a parte contrária, para consumar o delito; o resultado, ou seja, o eventual prejuízo ou dano sofrido pelo patrocinado decorrente da ação do profissional por ele contratado, é mero exaurimento do crime, sendo desnecessária a sua ocorrência (é crime formal). 14. Sem adentrar numa análise mais profunda do tipo penal em questão (patrocínio infiel ou tergiversação), entendo que não se deva antecipar um julgamento a respeito da tipificação do delito descrito na peça acusatória, por se afigurar prematura sua análise neste momento da persecutio criminis, quando sequer se deu início à instrução processual criminal. Deve-se permitir aos órgãos encarregados da fase inicial do processo o livre exercício das atribuições constitucionais que lhes são destinadas, sem a imposição de quaisquer embaraços injustificados, sobretudo em relação ao Ministério Público Federal, que, como titular da ação penal pública, no caso em apreço, deve exercer sua opinio delicti após o regular término da fase de instrução judicial. 15. Ademais, somente após o encerramento da instrução processual, após realizada a produção de provas e antes da prolação da sentença, poderá o Juiz conferir nova definição jurídica ao fato delituoso. 16. Eventualmente, o próprio Ministério Público Federal, ao final da instrução probatória, poderá propor definição jurídica diversa daquela constante da denúncia (tergiversação e não patrocínio infiel) - conforme artigos 383 e 384 do CPP. 17. O Juiz, se entender que o fato provado é distinto do narrado na denúncia, acarretando mudança de sua classificação jurídica, deverá conceder prazo para que o Parquet adite a peça acusatória, abrindo novo prazo para a continuação da instrução processual, com a realização de inquirição de testemunhas, novo interrogatório do acusado, debates e julgamento, conforme preconiza a nova Lei 11.719/08 que alterou o Código de Processo Penal - artigo 384 e § § 1º ao 5º. 18. Assim, a definição jurídica final do fato só pode ocorrer após o término da instrução processual, sob pena de se impedir o órgão acusador de produzir as provas com as quais pretende demonstrar a procedência da imputação, acarretando verdadeiro julgamento de mérito antecipado da ação penal, o que é defeso em nosso sistema processual penal. 19. Ademais, o réu defende-se dos fatos a ele imputados, e não da capitulação jurídica sugerida pelo órgão ministerial na inicial acusatória. Precedentes deste E. Corte Regional. 20. A denúncia imputa aos ora recorridos o fato de o denunciado JOSÉ ALCIR DA SILVA, valendo-se de sua qualidade de sócio-administrador da empresa "S.C. dos Reis - Nova Aliança", ter tentado frustrar direito assegurado por legislação trabalhista, com a participação das co-denunciadas e advogadas MARILDA SINHORELLI e LEILA ROSECLER, sendo que MARILDA na condição de advogada da reclamante Roseli Aparecida Sanches, defendeu, com a colaboração da co-denunciada LEILA, na mesma causa, simultaneamente, partes contrárias, restando demonstrado que o acordo extrajudicial de fls.12/13, deveu-se a um conluio de MARILDA SINHORELLI (advogada da reclamante) com a co-denunciada LEILA ROSECLER, que, na condição de advogada da parte reclamada, não se opunha, obviamente, aos termos do referido acordo. O próprio empregador contratou a co-denunciada MARILDA SINHORELLI para que representasse seus ex-empregados, promovendo reclamações trabalhistas contra a própria empresa por ele administrada, visando a homologação judicial de acordos, o que, conseqüentemente, acarretaria a renúncia destes empregados à integralidade dos seus direitos trabalhistas. Agindo assim, a denunciada MARILDA SINHORELLI traiu, na qualidade de advogada ou procuradora, o dever profissional, prejudicando interesse cujo patrocínio em juízo havia lhe sido confiado, com a participação dos co-denunciados JOSÉ ALCIR e LEILA ROSECLER. 21. Como se observa, a bem da verdade a denúncia tipifica a conduta das acusadas Marilda e Leila no artigo 355, caput, do CP (patrocínio infiel), mas na realidade descreve a prática delituosa prevista no parágrafo único do mesmo artigo e codex (patrocínio simultâneo ou tergiversação) e, por fim, descreve os fatos delituosos imputados ao co-acusado José José Alcir como tipificados no artigo 203 do CP. 22. Destarte, constatada a presença de provas da materialidade delitiva (ocorrência do fato típico e ilícito), e havendo indícios suficientes de sua autoria, outra não poderia ser a providência do magistrado, que não a de receber a denúncia, em homenagem ao princípio que vige nesse momento processual, in dubio pro societatis, até porque não se apresenta nítida qualquer excludente de tipicidade, de ilicitude, ou mesmo de culpabilidade. 23. A decisão proferida pelo magistrado, de rejeição da denúncia, representa verdadeiro cerceamento do direito de acusação, de que é dotado órgão ministerial. Precedentes do STJ e desta E. Corte. 24. Assim sendo, presente a justa causa para a ação penal, é imperioso o recebimento da inicial acusatória, permitindo-se que o parquet, durante a instrução penal, possa produzir as provas visando demonstrar a materialidade e a autoria do delito. 25. Portanto, a denúncia ofertada às fls. 147/150 atende os requisitos previstos no artigo 41 do Código de Processo Penal. E não se vislumbra qualquer uma das hipóteses do artigo 43 do Código de Processo Penal, a justificar a rejeição da inicial acusatória. 26. E, por fim, também não agiu com acerto o douto magistrado, ao declinar de sua competência para processar e julgar o suposto delito cometido pelo empregador, que violou, em tese, direito de seus empregados assegurado pela legislação trabalhista, em sede de embargos declaratórios interpostos pelo MPF (fls.158/160), mantendo a rejeição da denúncia de fls. 147/150, quanto a imputação do delito tipificado no artigo 355, caput, do CP, e deslocando a competência para a Justiça Estadual, quanto a imputação do delito tipificado no artigo 203 do mesmo diploma legal repressivo (fls.158/160). 27. É bem verdade que compete a Justiça Estadual, e não à Justiça Federal, processar e julgar delito praticado por empregador, que violou, em tese, direitos trabalhistas de seus empregados assalariados. De fato, como foi colocado pelo douto juiz, o que estabelece a competência da Justiça Federal são os crimes contra a organização do trabalho como um todo (Súmula 115 do extinto Tribunal Federal de Recursos e precedentes do STJ), ou seja, os crimes que afrontam o chamado sistema de órgãos e instituições que preservam coletivamente os direitos e deveres dos trabalhadores, e não um trabalhador individualmente (Roseli Aparecida Sanches) ou um pequeno grupo de trabalhadores de empresa de pequeno porte, como é o caso em exame nestes autos. 28. Mas, data venia, o douto magistrado laborou em evidente equívoco ao se olvidar de que o delito do art. 355, do CP, tem como objeto jurídico a administração da Justiça e a conduta imputada aos recorridos ocorreu perante a Justiça do Trabalho, consumando-se em delito praticado em detrimento de direitos trabalhistas. E como é cediço, a Justiça do Trabalho pertence à Justiça da União, atraindo a competência da Justiça Federal para o processamento e julgamento desse delito e, de outros a ele conexos, como no caso concreto, o do art. 203, do CP, em sua forma tentada, por força da vis atractiva da Justiça Federal, que dá ensejo ao deslocamento da Justiça Estadual para a Federal. 29. Sendo assim, não assiste razão ao Juiz Federal, ao declinar da competência da Justiça Federal para processar e julgar o feito quanto a prática do delito tipificado no artigo 203 do CP, em sua forma tentada, pois, neste caso concreto, de acordo com a peça exordial acusatória, há conexão entre a tentativa do delito de frustração de direito trabalhista individual da ex-empregada e parte reclamante Roseli Aparecida Sanches, mediante conluio entre os denunciados, ora recorridos, que, de fato, é da competência da Justiça Estadual, e o de patrocínio sucessivo ou tergiversação (tal como descrito na denúncia) em reclamatória trabalhista simulada, ajuizada perante a Justiça do Trabalho, delito este que atrai a competência da Justiça Federal, prevalecendo, destarte, a competência desta sobre àquela, a teor da Súmula 122 do STJ: Compete à Justiça Federal o processo e julgamento unificado dos crimes conexos de competência federal e estadual, não se aplicando a regra do Art. 78, II, "a", do Código de Processo Penal. Precedentes desta E. Corte Regional e de outros Tribunais Regionais Federais. 30. Preliminar suscitada pelas defesas rejeitada. Recurso ministerial provido. Denúncia recebida em relação a ambos os delitos.
(RSE 00044137620054036106, DESEMBARGADORA FEDERAL RAMZA TARTUCE, TRF3 - QUINTA TURMA, TRF3 CJ1 DATA:28/10/2011..FONTE_REPUBLICACAO:.)

Salienta-se que não obstante o julgamento do recurso em sentido estrito, não há prevenção da relatora daquele feito, para o julgamento das apelações de que se trata, porquanto, simples constatação da continuidade delitiva não implica necessariamente no reconhecimento da conexão dos feitos, e os fatos apresentados referem-se cada um às ações trabalhistas diversas.


CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. AÇÕES PENAIS EM ANDAMENTO. INEXISTÊNCIA DE CONEXÃO PROBATÓRIA E INSTRUMENTAL ENTRE OS FATOS. MERA POSSIBILIDADE DE CONTINUIDADE DELITIVA. INOCORRÊNCIA DA PREVENÇÃO. CONFLITO IMPROCEDENTE. Trata-se de conflito de competência negativo suscitado pelo Juízo Federal da 2ª Vara de São José dos Campos/SP, nos autos da ação penal n.º 2008.61.03.006534-3, distribuída originariamente ao Juízo Federal da 3ª Vara de São José dos Campos/SP, ora suscitado, e que apura a prática do delito descrito no artigo 168-A, §1º, inciso I, do Código Penal. Mera possibilidade de se reconhecer a continuidade delitiva entre os fatos abordados nos referidos processos, uma vez que a ação penal nº 2006.61.03.002455-1 trata dos delitos praticados nos anos de 2004 a dezembro de 2005, ao passo que o feito nº 2008.61.03.006534-3 abarca as condutas supostamente cometidas nos anos de janeiro de 2006 a 2007, pelo mesmo réu, na gerência da mesma empresa. A simples constatação da continuidade delitiva não implica necessariamente no reconhecimento da conexão dos feitos. O conjunto probatório produzido em um dos autos não influi na prova referente à outra ação penal. Embora as condutas tenham sido cometidas pelo mesmo réu, na gerência da mesma empresa, as infrações foram praticadas em circunstâncias de tempo diferentes. As provas a serem produzidas nos autos referir-se-ão a períodos distintos e específicos, nos limites das denúncias oferecidas pela acusação. O fato dos processos correrem em varas distintas não induz na assertiva de que haverá sentenças contraditórias porquanto pode acontecer do réu comprovar sua inocência em determinado período e por conseguinte ser absolvido, bem como não ter a mesma sorte nas demais competências e ser condenado. Caso seja reconhecida a continuidade delitiva, posteriormente, preceder-se-á a unificação das penas em sede de execução penal. Prevenção do juízo suscitante não configurada. Conflito de competência procedente. Declarada a competência do Juízo suscitado da 3ª Vara Federal de São José dos Campos/SP.
(CJ 201003000232649, DESEMBARGADORA FEDERAL VESNA KOLMAR, TRF3 - PRIMEIRA SEÇÃO, DJF3 CJ1 DATA:08/02/2011 PÁGINA: 34.)

A conduta dos réus. Mérito. A conclusão de que não existe subsunção ao tipo penal previsto no parágrafo único do art. 355 do Código Penal (patrocínio simultâneo ou tergiversação), é prematura, bem como é também prematura a extinção do feito em primeiro grau em virtude da absolvição sumária. Entendemos que essa hipótese de absolvição tem aplicação apenas à evidência de inconteste atipicidade, a exemplo do trancamento da ação penal, ou do inquérito policial no âmbito de habeas corpus, em relação à prova pré-constituída, de caráter incontroverso.

O crime de patrocínio simultâneo ou tergiversação é formal - não exige, para sua prática, que a conduta do agente cause efetivo prejuízo às partes, mas sim que o agente, ao prestar o auxílio técnico, a quem lhe outorgar procuração, defenda, mediante a prática de atos concretos, simultânea ou sucessivamente partes contrarias. Admite a tentativa e o seu objeto é a Administração da Justiça.

Na espécie, apercebendo-se da suposta simulação de ações perante a Justiça do Trabalho, isto é, ao antever a fraude processual que está sob apuração nestes autos, o D. Juízo julgou extinto o feito sem exame do mérito, deixando de homologar acordo assinado e protocolizado pelas advogadas rés em 12.04.2004, dois dias após o ajuizamento da ação, sem que houvesse notificação da reclamada.

Miguel, que figurou como reclamante nos autos da ação trabalhista nº 01002-2004-110-15-00-1 RTS, disse que um dos proprietários da empresa, de nome Alcir disse aos empregados que "se precisar mandar embora a gente manda", a fim de que fossem firmados acordos para pagamento das verbas honorárias de forma parcelada (fls. 42/43).

No caso em exame, como se vê, está presente a materialidade do delito e é discutível a matéria, não merecendo a denúncia ser abortada logo de início. Por não restar cristalina a atipicidade, deve prosseguir a ação, para que, ao final da instrução processual os réus sejam condenados ou absolvidos da conduta que lhes é imputada na denúncia.

Se restar provado que o réu José Alcir contratou a ré Marilda para, representando os empregados, defender os interesses de suas empresas, deverá haver condenação, inclusive da ré Leila, cuja participação teria sido fundamental para a prática delitiva, mercê da classificação como crime próprio, cujo sujeito ativo é o advogado.

Em tese, admite-se a participação, nos termos do art. 30 do Código penal.

Questões como a existência do dolo devem ser verificadas no decorrer do feito, não se podendo descartá-las de plano.

Ante o exposto, dou provimento à apelação ministerial, para anular a sentença de absolvição sumária dos réus, determinando-se o prosseguimento da ação penal.




LUIZ STEFANINI
Desembargador Federal


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