D.E. Publicado em 05/09/2012 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao apelo ministerial, para anular a sentença de absolvição sumária, determinando-se o prosseguimento do feito, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
Trata-se de apelação criminal interposta pelo Ministério Público Federal em face da sentença de fls. 337/339, proferida pelo MM. Juízo da 3ª Vara Federal de São José do Rio Preto/SP, que, nos termos do art. 397, III, do Código de Processo Penal, julgou improcedente a denúncia e absolveu sumariamente Marilda Sinhorelli Pedrazzi e Leila Rosecler de Oliveira, estendendo os efeitos da absolvição ao acusado José Alcir da Silva, o qual foi citado por edital.
Nas razões apresentadas, o Ministério Público Federal informa que a conduta imputada aos réus, prevista no art. 355, parágrafo único, do Código Penal (patrocínio simultâneo ou tergiversação) c.c. art. 29 do Código Penal, está devidamente comprovada e, diversamente do que concluiu o magistrado de primeiro grau, não constitui continuidade delitiva em relação aos autos que, a pedido do Ministério Público Federal, foram arquivados por atipicidade da conduta, a saber: nº 0005189-76.2005.403.6106, 0005193-16.2005.403.6106, 0005927-64.2005.403.6106, 0005932-86.2005.403.6106, 0006196-06.2005.403.6106 e 0006884-65.2005.403.6106.
Da mesma forma, o presente feito não trata de continuidade delitiva em relação aos autos que tiveram suas denúncias rejeitadas, por ser referirem à mesma situação do feito nº 0005189-76.2005.403.6106. São eles: 0002816-72.2005.403.6106, 0004275-12.2005.403.6106, 0004407-69.2005.403.6106, 0004408-54.2005.403.6106, 0004416-31.2005.403.6106, 0005194-98.2005.403.6106 e 0005415-81.2005.403.6106.
A presente ação penal envolve fatos diferentes dos processos arquivados, pois, cada um deles refere-se a uma ação trabalhista, com reclamantes diversos, nas quais, em tese, houve a indução de ex-funcionários de um mesmo grupo a contratarem a mesma advogada - que também defenderia os interesses das empresas -, para o ajuizamento de ações trabalhistas que terminariam em acordos prejudiciais aos trabalhadores.
Outrossim, o princípio da independência funcional confere aos membros do Ministério Público Federal, liberdade para atuar de acordo com as suas consciências, permitindo a continuação das investigações que acarretaram a propositura da presente ação penal.
Argumenta, por fim, o Ministério Público Federal que existe, in casu, comprovação da materialidade e autoria delitivas, ensejando a reforma da decisão de absolvição sumária, para que, devidamente processados os réus, após regular instrução, sejam os mesmos condenados pela prática do delito de patrocínio simultâneo (fl. 372).
Contrarrazões:
a) de José Alcir da silva (defensor dativo) fls. 377-390, pela manutenção da r. sentença, considerando-se a ausência de provas e o efetivo prejuízo das supostas vítimas e ausência do dolo específico.
b) de Marilda Sinhorelli Pedrazzi, às. fls. 393-432, preliminarmente, pela ocorrência de coisa julgada material sobre a atipicidade do fato, concretizada em feitos idênticos, em relação aos quais o juízo singular reconheceu a conexão ou continência e a continuidade delitiva, devendo-se reunir todos os processos que correm contra a recorrida. No mérito, pelo improvimento da apelação ministerial, por insubsistência da ação penal, por erro de pessoa, falta de prova, falta de dolo, ilicitude das provas emprestadas, e imparcialidade do MM. Juiz do Trabalho que presidiu os feitos onde tiveram origem os fatos objeto da persecução penal.
c) de Leila Rosecler de Oliveira, às fls. 433/436, versando sobre a ausência de dolo e prejuízo para a vítima, e, também, acerca da coisa julgada, produzida pela decisão que determina o arquivamento de inquérito policial a pedido do Ministério Público Federal, fundado em atipicidade da conduta.
Feito distribuído por prevenção relativamente à ACR nº 2005.61.06.005192-8.
Parecer do Ministério Público Federal às fls. 440/443, pelo provimento parcial do recurso da acusação, porquanto a conduta de Leila e Marilda amolda-se ao caput, do art. 355 do Código Penal (patrocínio infiel), o qual não depende de prejuízo da parte contrária e, sendo delito próprio do advogado ou procurador, não há como imputá-lo a Jose, não obstante seja o maior interessado na fraude perpetrada.
Ás fl. 445, importante registrar que a presente ação penal foi apensada à apelação criminal nº 0004415-46.2005.4.03.6106, conforme despacho ali proferido, e também às de nº 0004405-02.2005.4.03.6106, 0005191-46.2005.4.03.6106, 0005192-32.2005.4.03.6106, 0005197-53.2005.4.03.6106, 0005928-49.2005.4.03.6106, 0005930-19.2005.4.03.6106, 0006886-65.2005.4.03.6106, estas a serem julgadas em conjunto com o presente feito, nesta oportunidade, pela C. Quinta Turma.
De se salientar que no âmbito da primeira instancia houve o apensamento entre os feitos, todos distribuídos por dependência ao de nº 0004415-46.2005.4.03.6106 (fls. 312/313 do aludido feito).
Nos referidos autos, embora não tenha o Parquet interposto recurso contra a r. sentença absolutória, em virtude de ter se consumado a prescrição (fl. 507), manteve-se o apensamento determinado pelo Juízo, aos processos remetidos a este Tribunal para o julgamento das apelações ministeriais (fl. 587). Tal providência restou preservada por este Relator (fls. 594), deferindo-se pedido do Ministério Público Federal.
É o relatório.
Dispensada a revisão, nos termos do art. 34, IV, do Regimento Interno da E. Corte.
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VOTO
Os fatos. José Alcir da Silva, sócio-proprietário da empresa Aliança Tubos e Conexões Ltda. e administrador da empresa S.C. dos Reis - Nova Aliança, contratou Marilda Sinhorelli Pedrazzi, advogada, para fazendo-se passar de procuradora de ex-funcionários das empresas e, após colher suas assinaturas nas procurações, ajuizar-lhes ações trabalhistas e, com a colaboração de Leila Rosecler de Oliveira, também advogada, defender na mesma causa, partes contrárias (empregado e empregador), visando a homologação judicial de acordos trabalhistas, de forma a causar prejuízos aos trabalhadores.
Segundo a denuncia, Marilda Sinhorelli, assim agindo, defendeu na mesma causa, simultaneamente partes contrárias, tudo com a participação dos demais acusados.
Consta dos autos que, em 15.12.2004, tal fato fora constatado pelo juízo trabalhista de José Bonifácio-SP, em sede de ação trabalhista movida por Miguel da Silva Junior (procuração outorgada à segunda ré à fl. 16).
A capitulação jurídica. Os réus foram denunciados pela prática do delito previsto no parágrafo único do art. 355, norma legal assim descrita no Código Penal Brasileiro:
A fundamentação da r. sentença absolutória - art. 397, III, do CPP. O Ministério Público Federal, reconhecendo a atipicidade de condutas idênticas à narrada nos presentes, requereu o arquivamento dos autos dos inquéritos policiais nº 0005189-76.2005.403.6106, 0005193-16.2005.403.6106, 0005927-64.2005.403.6106, 0005932-86.2005.403.6106, 0006196-06.2005.403.6106 e 0006884-65.2005.403.6106. Fundamentou-se por não comprovada a traição, pelas advogadas rés, do dever profissional, que causaria prejuízo às partes.
Os feitos nº 0004275-12.2005.403.6106, 0004407-69.2005.403.6106, 0004408-54.2005.403.6106, 0004416-31.2005.403.6106, 0005194-98.2005.403.6106 e 0005415-81.2005.403.6106, pelo mesmo motivo, tiveram as denúncias rejeitadas.
As condutas aqui tratadas são semelhantes, remetendo à possível continuidade delitiva, ou bis in idem, não existindo justificativa plausível para que não se decida da mesma forma no caso em exame, sob pena de contradição, impondo-se, inclusive a unidade de julgamento, face à conexão ou continência entre os feitos.
Nesse contexto, registrou o magistrado a quo que, quando o arquivamento de inquérito se dá a pedido do Ministério Público Federal, pelo fato não constituir crime, perfaz-se a coisa julgada material, impedindo instauração de processos em que haja o mesmo episódio.
Os fatos apurados no inquérito policial nº 0005189-76.2005.403.6106. No dia 15.12.2004, o Juízo Trabalhista de José Bonifácio constatou que, contratadas pelo réu José, as rés Marilda e Leila, defenderam simultaneamente, partes contrárias, quais sejam, Claudio Carvalho de Souza (reclamante) e Aliança Tubos e Conexões Ltda. (reclamada).
O próprio Ministério Público Federal, que havia requerido o arquivamento dos autos por atipicidade da conduta, em virtude de não comprovada a traição do dever profissional, pediu o desarquivamento, face a existência de novas provas. Entretanto, a denúncia oferecida restou rejeitada, haja vista que as ditas provas novas já eram de conhecimento do órgão acusador, quando do pedido de arquivamento dos autos, não se referindo, outrossim, ao reclamante em questão, vítima secundária do delito, sequer indicada como testemunha de acusação.
Tais informações são extraídas dos autos em apenso - 0004415-46.2005.4.03.6106 - às fls. 198/204, onde consta cópia da decisão que rejeitou a denúncia no feito 0005189-76.2005.403.6106 e nos demais já mencionados, todas calcadas nos mesmos argumentos (fls. 206/285).
Nas razões de recurso (fls. 370, dos presentes autos), afirma a acusação que, nos referidos feitos, não havia comprovação da tipicidade, já, nestes autos, a materialidade foi comprovada, uma vez que o reclamante - Miguel da Silva Junior, em seu depoimento perante a autoridade policial (fl. 42/43), deu conta da fraude engedrada para firmar o acordo que seria levado apenas para homologação judicial.
Além disso, afirma o recorrente, que a ex-funcionária da S.C. dos Reis Nova Aliança, Ednéia Simonato, nos autos de outro inquérito policial (nº 6-370/05), ao ser reinquirida, confirmou que a ré Marilda havia dito aos funcionários sobre o acordo fechado com a empresa, que seria apenas homologado na Justiça do Trabalho (fl. 122/125).
Com isso, ressalta a acusação, os réus ajuizaram ação trabalhista para conseguir acordo lesivo aos interesses dos empregados, o qual, com o trânsito em julgado, impediria que os mesmos, legitimamente representados por advogados de sua confiança, pudessem pleitear em nova ação os direitos trabalhistas desrespeitados durante a relação de emprego.
As questões que antecedem o mérito. O arquivamento dos inquéritos e a posterior rejeição das denúncias ofertadas em feitos diversos, não ensejam coisa julgada material em relação a fatos similares apurados na presente ação.
Não há nos autos, cópia dos pedidos ministeriais de arquivamento dos inquéritos policiais tratando de fatos semelhantes aos que se apuram nestes autos, nem mesmo cópia da decisão que os acatou, mas apenas das decisões que arquivaram os aludidos procedimentos, pela ausência de provas sobre a deslealdade praticada pelas rés, no exercício da profissão (encartadas no processo nº 004415-46.2005.4.03.6106 em apenso).
Assim, não se trata de irrelevante penal, gerando coisa julgada material em relação a outros feitos, os quais envolvem vítimas (trabalhadores/reclamantes) diversos, como é o caso da presente ação penal.
O trancamento de inquérito policial a pedido do Ministério Público Federal, fundado na atipicidade dos fatos, produz coisa julgada material, impedindo a sua reabertura, relativamente aos fatos a que se referirem.
Isto quer dizer que não pode Parquet, por meio do mesmo, ou de novo representante legal, efetuando reinterpretação dos fatos, adotar conclusão diversa da que determinou o arquivamento do inquérito, utilizando-se, para tanto, de uma nova qualificação jurídica.
Como bem asseverou o Ministério Público Federal em parecer lançado nos autos - fl. 441 -, cada um trabalhador, a sua maneira, foi ludibriado pelos réus, para figurarem no pólo passivo de uma demanda que não pretendiam propor. Assim, ainda que seja possível o acatamento da continuidade delitiva (art. 71 do CP), tal não implica no reconhecimento da coisa julgada material.
Ainda na seara das questões prévias, verifica-se que a ré Marilda, advogada atuando em causa própria, alega que a denúncia baseia-se em prova ilícita, emprestada dos autos da ação trabalhista onde o juiz do trabalho concluiu a existência de suposta lide simulada, figurando como reclamante José Antonio Belentani, em causa patrocinada por advogada diversa (Adriana Cristina Borges).
Com base nisso, também afirma a ocorrência do erro de pessoa, já que não figurou como advogada naqueles autos, além da imparcialidade do juiz do trabalho que feriu competência do Ministério Público Federal, ao proceder à oitiva da esposa do reclamante, fatos que deram origem aos diversos inquéritos e ações penais que pendem contra a ré Marilda.
Esclareça-se que o inquérito policial que antecedeu o oferecimento da denuncia, teve início a partir das peças informativas oriundas da Procuradoria Regional da República que, por sua vez, recebera cópias do feito trabalhista em que a vítima secundária nestes autos, Miguel da Silva Júnior, foi o reclamante, tendo sido representado pela advogada ré, Marilda - fls. 21/26. Tal ato não implica em constrangimento ilegal (art. 40 do CPP) ou eventual imparcialidade do Juízo do trabalho, sequer passível de ser apurada nestes autos.
Observe-se que Juízo do Trabalho ressaltou a grande quantidade de reclamações trabalhistas em face das empresas objeto dos autos, patrocinadas pelas mesmas advogadas rés, Marilda (pelos reclamantes) e Leila (pelas reclamadas), todas com acordo protocolizado antes da notificação. Além disso e os depoimentos dos reclamantes dando conta da simulação da lide, notadamente o depoimento de Maria José Caetano Belentani, esposa do reclamante José Antônio Belentani, no processo nº 00379-2004-110-15.00-3 RST, o qual teria revelado toda a fraude perpetrada pela reclamada em prejuízo dos empregados.
Sobre as questões postas, a C. Quinta Turma já se pronunciou pela ausência de ilegalidade das provas, bem como do ato que determinou o envio de cópias para o Ministério Público Federal.
Salienta-se que não obstante o julgamento do recurso em sentido estrito, não há prevenção da relatora daquele feito, para o julgamento das apelações de que se trata, porquanto, simples constatação da continuidade delitiva não implica necessariamente no reconhecimento da conexão dos feitos, e os fatos apresentados referem-se cada um às ações trabalhistas diversas.
A conduta dos réus. Mérito. A conclusão de que não existe subsunção ao tipo penal previsto no parágrafo único do art. 355 do Código Penal (patrocínio simultâneo ou tergiversação), é prematura, bem como é também prematura a extinção do feito em primeiro grau em virtude da absolvição sumária. Entendemos que essa hipótese de absolvição tem aplicação apenas à evidência de inconteste atipicidade, a exemplo do trancamento da ação penal, ou do inquérito policial no âmbito de habeas corpus, em relação à prova pré-constituída, de caráter incontroverso.
O crime de patrocínio simultâneo ou tergiversação é formal - não exige, para sua prática, que a conduta do agente cause efetivo prejuízo às partes, mas sim que o agente, ao prestar o auxílio técnico, a quem lhe outorgar procuração, defenda, mediante a prática de atos concretos, simultânea ou sucessivamente partes contrarias. Admite a tentativa e o seu objeto é a Administração da Justiça.
Na espécie, apercebendo-se da suposta simulação de ações perante a Justiça do Trabalho, isto é, ao antever a fraude processual que está sob apuração nestes autos, o D. Juízo julgou extinto o feito sem exame do mérito, deixando de homologar acordo assinado e protocolizado pelas advogadas rés em 12.04.2004, dois dias após o ajuizamento da ação, sem que houvesse notificação da reclamada.
Miguel, que figurou como reclamante nos autos da ação trabalhista nº 01002-2004-110-15-00-1 RTS, disse que um dos proprietários da empresa, de nome Alcir disse aos empregados que "se precisar mandar embora a gente manda", a fim de que fossem firmados acordos para pagamento das verbas honorárias de forma parcelada (fls. 42/43).
No caso em exame, como se vê, está presente a materialidade do delito e é discutível a matéria, não merecendo a denúncia ser abortada logo de início. Por não restar cristalina a atipicidade, deve prosseguir a ação, para que, ao final da instrução processual os réus sejam condenados ou absolvidos da conduta que lhes é imputada na denúncia.
Se restar provado que o réu José Alcir contratou a ré Marilda para, representando os empregados, defender os interesses de suas empresas, deverá haver condenação, inclusive da ré Leila, cuja participação teria sido fundamental para a prática delitiva, mercê da classificação como crime próprio, cujo sujeito ativo é o advogado.
Em tese, admite-se a participação, nos termos do art. 30 do Código penal.
Questões como a existência do dolo devem ser verificadas no decorrer do feito, não se podendo descartá-las de plano.
Ante o exposto, dou provimento à apelação ministerial, para anular a sentença de absolvição sumária dos réus, determinando-se o prosseguimento da ação penal.
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