Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001229-20.2003.4.03.6127/SP
2003.61.27.001229-3/SP
RELATOR : Desembargador Federal LUIZ STEFANINI
APELANTE : MARCO ANTONIO SCUDELER
: DANIEL RODRIGO JESUINO SCUDELER
: ANTONIO SCUDELER
ADVOGADO : JOAO BATISTA SIQUEIRA FRANCO FILHO e outro
APELADO : Justica Publica
No. ORIG. : 00012292020034036127 1 Vr SAO JOAO DA BOA VISTA/SP

VOTO CONDUTOR

A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL RAMZA TARTUCE:

A par do respeito e admiração que nutro pelo Ilustre Relator, Juiz Federal Convocado Rafael Margalho, dele ouso divergir, pois entendo que não merece provimento o recurso interposto pelos réus MARCO ANTÔNIO SCUDELER, DANIEL RODRIGO SCUDELER e ANTÔNIO SCUDELER para absolvê-los da prática do delito previsto no artigo 1º da Lei nº 8.137/90.

Consta da denúncia, que:"(...)De acordo com o Procedimento Administrativo 10830.009446/2003-31, da Delegacia da Receita Federal em Campinas, o contribuinte Marco Antônio Scudeler, pessoa física com domicílio fiscal em Mogi Mirim/SP, movimentou em todos os meses dos anos de 1998, 1999, 2000 e 2001, nas contas de sua titularidade nos bancos Bradesco, do Brasil, Bilbao Vizcaya, Mercantil do Brasil e CEF, valores cuja origem não logrou comprovar perante o órgão fazendário. Verificando que os rendimentos aptos a ensejar tal movimentação foram omitidos das respectivas declarações de imposto de renda do contribuinte, a Receita Federal exarou o Auto de Infração de fls. 104/107 (atinente a IR de pessoa física), no valor original de R$ 2.886.135,48 (dois milhões, oitocentos e oitenta e seis mil e cento e trinta e cinco reais e quarenta e oito centavos). Por conseguinte o crédito tributário foi devidamente constituído em 19/01/2004 e segundo informação de abril deste ano de 2007, chegava a quase cinco milhões de reais. Não bastasse, o Procedimento Administrativo de nº 10830.009473/2003-12, da Delegacia da Receita Federal em Campinas, apurou que o mesmo denunciado Marco Antônio Scudeler, em concurso de pessoas com Antônio Scudeler, na condição de sócios-gerentes da pessoa jurídica SCUDELER BAR E LANCHONETE LTDA., sediada em Mogi Mirim, informaram ao órgão fazendário valores decorrentes de fatos geradores ocorridos entre 30-11-198 e 31-7-2003, atinentes à contribuição para o financiamento da Seguridade Social (COFINS), em discrepância com os montantes registrados na escrituração da empresa. Diante das diferenças apuradas, a Receita Federal expediu o Auto de Infração de fls. 160/162, no valor original de R$ 7.025,18 (sete mil e vinte e cinco reais e dezoito centavos). O crédito tributário foi definitivamente constituído em 19-1-2004 (fl.294) e até o presente não foi pago nem parcelado (fl.311). Além disso, o Procedimento Administrativo de nº 10830.009475/2003-01, da Delegacia da Receita Federal em Campinas, apurou que o mesmo denunciado Marco Antônio Scudeler, em concurso de pessoas com Daniel Rodrigo Jesuíno Scudeler, e depois este, em concurso de pessoas com Antônio Scudeler, na condição de sócios-gerentes da pessoa jurídica SCUDELER BAR E LANCHONETE LTDA., omitiram créditos e depósitos bancários realizados entre fevereiro de 1999 e agosto de 2001 na conta titulada pela empresa no Banco Mercantil do Brasil (fls. 115/117), caracterizando uma omissão de receitas que repercutiu no imposto de renda da pessoa jurídica (IRPJ), na contribuição para o Programa de Integração Social (PIS), na contribuição para o financiamento da Seguridade Social (COFINS) e na contribuição social sobre o lucro real (CSSLR). Diante das omissões constatadas, o órgão fazendário exarou os Autos de Infração de fls. 119/121 (IRPJ, no valor original de R$ 112.255,18 (cento e doze mil, duzentos e cinqüenta e cinco reais e dezoito centavos), fls. 132/134 (PIS), no montante de R$ 5.771,40 (cinco mil, setecentos e setenta e um reais e quarenta centavos ), fls. 139/141 (COFINS), no valor de R$ 26.638,40 (vinte e seis mil, seiscentos e trinta e oito reais e quarenta centavos), e fls. 146/148 (CSSLR), no montante de R$ 66.148,76 (sessenta e seis mil, cento e quarenta e oito reais e setenta e seis centavos). Conforme se depreende da Informação de fl. 311, os quatros créditos tributários inseridos no Procedimento Administrativo nº 10830.009475/2003-01 foram inscritos na dívida ativa da União em 21-12-2004, já tendo sido, portanto, constituídos em caráter definitivo. Outrossim, consta que não houve parcelamento ou pagamento (fl.311). Quanto à autoria, há indícios suficientes contra os denunciados. Além de ser o responsável pelas declarações de imposto de renda de pessoa física em relação a si mesmo. Marco Antônio Scudeler era sócio-gerente da pessoa jurídica SCUDELER BAR E LANCHONETE, ao lado de Daniel Rodrigo Justino Scudeler, ambos assinando pela empresa, no período de agosto de 1998 a outubro de 2000 (fls. 81/82). De 26 de outubro de 2000 em diante, a gerência da empresa foi exercida por Daniel Rodrigo Justino Scudeler e Antônio Scudeler, ambos assinando por ela (fl.82). Ressalte-se que todos os três denunciados, em sede inquisitorial, aduziram informações, embora não comprovadas, atinentes à saúde financeira da empresa na época dos fatos e ao pagamento de parcelas de alguns débitos, revelando indícios bastantes de que eram eles os detentores do poder de decisão, tanto que, segundo alegaram, teriam optado pelo pagamento de fornecedores e empregados." [os negritos são no original].


Conforme se vê, os réus, ora apelantes, foram condenados pela douta juíza sentenciante [fls.698/704 e verso], no que tange ao crime capitulado nos artigos 1º, inciso I, e 12, inciso I, da L. 8.137/90, sob o fundamento de terem omitido à Receita Federal rendimentos que ensejaram movimentação em contas bancárias, acarretando a redução de tributo, além de terem prestado informações divergentes da registrada na escrituração da pessoa jurídica "Scudeler Bar e Lanchonete", da qual são sócios-gerentes.

Por sua vez, o Ilustre Relator, ao contrário do entendimento da juíza sentenciante, em seu voto, que restou vencido, absolveu os réus Daniel Rodrigo Jesuíno Scudeler e Antônio Scudeler, pois não haveria provas cabais no sentido de que eles, efetivamente, eram os responsáveis pela prática de atos de gestão da empresa, daí por que, na dúvida, deve prevalecer o princípio in dubio pro reo, em relação a eles, absolvendo-os, nos termos do artigo 386, inciso V, do CPP, mantendo a condenação imposta ao corréu Marco Antônio Scudeler, e, de ofício, reduziu a sua reprimenda penal para 02 [dois] anos e 03 [três] meses de reclusão, além do pagamento de 11 [onze] dias-multa, no valor de um quinto do salário mínimo, mantendo, no mais, a r. sentença. E, para a absolvição dos corréus Daniel e Antônio Scudeler, valeu-se dos seguintes argumentos, in verbis:

"(...)A materialidade delitiva restou comprovada por meio de procedimento administrativo fiscal (fls. 103/188), em cujo bojo constam os termos de constatação fiscal (fls. 106/108 e 124/127) e os autos de infração lavrado pelas autoridades fazendárias (fls. 113/123, 128/167 e 169/171). Entretanto, a autoria dos acusados Daniel Rodrigo Jesuíno Scudeler e Antônio Scudeler pela prática do delito em apreço não restou devidamente esclarecida, porquanto os depoimentos deles colhidos na instrução foram contraditórios, ocasionando dúvidas no julgador quanto ao real conhecimento dos fatos. Com efeito, ao ser ouvido, em sede inquisitiva, o acusado Daniel disse que a empresa passava por dificuldades financeiras, sendo que o pagamento da dívida da referida empresa era destinado preferencialmente aos fornecedores e funcionários do estabelecimento. Afirmou, ainda, que os tributos estariam sendo pagos de forma parcelada (fl. 225). No entanto, ao ser interrogado em juízo, o apelante Daniel apresentou versão diferente ao seu depoimento prestado perante a autoridade policial. A princípio, ele reiterou que a empresa encontrava-se em dificuldades financeiras. Em seguida, disse que não sabia que os valores destinados aos recolhimentos dos tributos federais eram destinados aos pagamentos dos fornecedores e dos funcionários. E por fim, asseverou que a responsabilidade pela área fiscal da empresa era de atribuição do contador Luiz Bonel (fls. 454/455). Por seu turno, na fase extrajudicial, o corréu Antônio declarou que era sócio da sobredita empresa, sendo que era responsável tão-somente pelo setor administrativo. Afirmou, ainda, que o recolhimento dos tributos competia ao seu contador Luiz Bonel (fls. 396/397 dos autos em apenso). Ao passo que, Antônio ratificou, em juízo, o seu depoimento prestado perante a autoridade policial, ressaltando que não participava efetivamente das decisões administrativas (fls. 456/457). Portanto, cotejando os depoimentos relatados acima, verifico que em momento algum os acusados Daniel e Antônio admitiram serem os responsáveis pelo recolhimento dos tributos federais da empresa. Desse modo, ainda que haja indícios de seus envolvimentos na prática delitiva, já que o contrato social os aponta como administradores da empresa, tenho que impossível, nesta fase, extrair conclusão clara e peremptória acerca da questão, pois não há provas cabais no sentido de que os acusados, efetivamente, responsabilizavam-se pela prática de atos de gestão, daí por que, na dúvida, deve prevalecer o princípio in dubio pro reo, sob pena de condenação mediante presunção, a conduzir à odiosa responsabilidade penal objetiva. Realmente, as provas carreadas em inquérito não restaram cabalmente ratificadas por aquelas produzidas perante o contraditório, de forma que, reitero, torna-se temerário lastrear édito condenatório com elementos colhidos tão somente na fase inquisitorial, vedação esta expressamente prevista no artigo 155 do Código de Processo Penal (...)Ademais, cabe salientar que muito embora conste na ficha cadastral expedida pela JUCESP (fls. 90/91) que Daniel e Antônio eram sócios-gerentes da empresa "Scudeler Bar e Restaurante Ltda." na data dos fatos, isto, por si só, não significa que, necessariamente, eles tenham sido responsáveis, junto a Marco Antônio, pelo não recolhimento dos tributos federais, sob pena de odiosa responsabilização objetiva, absolutamente vedada na seara criminal. Há de salientar que a testemunha de acusação Marcos Fernando Prado de Siqueira disse em seu depoimento que "não me recordo do Sr. Daniel e do Sr. Antônio" (fls. 552/553). (...) [fls.765 e verso].

Todos os réus, ora apelantes, foram condenados pela prática da conduta tipificada no art.1º, inciso I, da Lei nº 8.137/90 - Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional -, sendo que foram denunciados na condição de sócios-gerentes da pessoa jurídica "Scudeler Bar e Lanchonete Ltda.", por terem prestado ao órgão fazendário, informações atinentes à contribuição para o financiamento da seguridade social - COFINS, em divergência com os montantes registrados na escrituração da empresa. Os fatos ocorreram de 1998 a 2003, e, em conseqüência desses fatos, foi lavrado o auto de infração no valor original de R$ 7.025,18 (sete mil e vinte e cinco reais e dezoito centavos). Além disto, o corréu Marco Antônio Scudeler omitiu à Receita Federal rendimentos tributáveis em seu imposto de renda - IR, nos anos-calendários de 1998 a 2001, rendimentos que ensejaram movimentações em contas bancárias, acarretando a redução de tributo. E, em conseqüência desses fatos, foi lavrado o auto de infração no valor original de R$ 2.886.135,48 (dois milhões, oitocentos e oitenta e seis mil, cento e trinta e cinco reais e quarenta e oito centavos).

O E. Relator argumentou, no entanto, em seu voto vencido, que, em que pese existir provas da materialidade, não haveria provas suficientes a demonstrar que os réus Daniel e Antônio tenham cometido o crime que lhes foi imputado pela acusação - omissão de informações e prestação de declaração falsa ao órgão fazendário, reformando a r. decisão condenatória de primeiro grau, para dar parcial provimento ao recurso da defesa, absolvendo os réus supracitados, e mantendo, no entanto, a condenação do corréu Marco Antônio Scudeler.

No entanto, data venia, ao contrário do que sustenta o E. Relator, entendo que as provas apresentadas pela acusação são aptas a manutenção do decreto condenatório de primeiro grau em desfavor de todos os apelantes, por haver elementos suficientes a comprovar a autoria delitiva por parte dos ora apelantes.

Mérito

Materialidade

Inicialmente, concordo com o E. Relator, no que tange a materialidade delitiva, que restou comprovada por meio de Procedimento Administrativo Fiscal nº 10830.009446/2003-31, instaurado pela Delegacia da Receita Federal de Campinas (fls. 103/188), em cujo bojo constam os termos de constatação fiscal (fls.106/108 e 124/127) e os autos de infrações lavrados pelas autoridades fazendárias (fls. 113//123, 128/167 e 169/171).

Autoria

No entanto, discordo do E. Relator no que tange a autoria delitiva, que, do mesmo modo, entendo que restou plenamente comprovada, pela ficha cadastral expedida pela Junta Comercial do Estado de São Paulo [fls.90/91], em que consta que eram os réus os responsáveis pela administração da empresa, evidenciando-se, assim, a inquestionável responsabilidade penal dos ora apelantes. Tudo isso acabou sendo corroborado pela própria versão oferecida pelos acusados, que admitiram serem os sócios administradores da empresa, dando informações precisas a respeito da situação e saúde financeira da empresa "Scudeler Bar e Lanchonete Ltda", tanto na fase inquisitorial [fls. 394/395; 396/397 e 399/400 - volume 02 dos autos em apenso]; quanto na fase judicial [fls. 452/453, 454/455 e 456/457], e, portanto, foram eles os responsáveis pela omissão, supressão e redução de tributos federais.

Confira-se os seguintes excertos de seus interrogatórios prestados, inicialmente, na fase inquisitiva.

Interrogatório de Daniel Rodrigo Jesuíno Scudeler, in verbis:

"(...)é sócio-proprietário da empresa denominada Scudeler Bar e Lanchonete Ltda., (...)a qual tinha atividade de bingo; que seu genitor Antônio Scudeler é seu único sócio atualmente, porém de início o declarante era sócio juntamente com seu irmão Marco Antônio Scudeler e, após um tempo, que não sabe declinar quando exatamente, seu irmão saiu da sociedade e seu genitor acabou firmando uma nova sociedade com seu pai; que há dois anos aludida empresa encontra-se fechada por ordem do Ministério Público de Mogi Mirim; que durante as atividades da empresa, ou seja, funcionamento da mesma, o declarante e seu genitor tinham a função de gerente; que somente efetuava o pagamento das aludidas taxas para seu contador Luiz Bonel Delgado Neto, sendo o recolhimento efetuado pelo mesmo; que Luiz Bonel Delgado Neto faleceu há aproximadamente dois anos, ou seja, um mês após aludida empresa ter sido fechada por ordem judicial; que aludido contador trabalhava na aludida empresa como técnico contábil e, como não poderia assinar o que fazia, o mesmo encaminhava os trabalhos para o escritório de Contalegis, sito neste município, pois, tinha vínculo com o mesmo; que não tem conhecimento se o montante de R$ 210.813,74 apurado pela Receita Federal foi efetivamente pago após a fiscalização, pois o contador Luiz Bonel Delgado Neto era quem tinha conhecimento acerca dos recolhimentos; que não tem conhecimento se existem arquivos que comprovem o pagamento da citada quantia, possivelmente podem existir no escritório de contabilidade Contalegis; que não sabe declinar acerca das providências tomadas após a lavratura do auto de infração, pois toda a parte administrativa ficava por conta de Luiz Bonel Delgado Neto; que acredita que seja o declarante a pessoa responsável pela empresa Scudeler perante a Receita Federal(...)" [a fl. 394 dos autos]. [destaquei].

Interrogatório de Antônio Scudeler:

"(...)é sócio da empresa denominada Scudeler Bar e Lanchonete Ltda., (...)a qual tinha como ramo de atividade bingo; que inicialmente tinha como sócios seus filhos Marco Antônio Scudeler e Daniel Rodrigo Jesuíno Scudeler, porém após algum tempo, Marco Antônio saiu da sociedade, permanecendo somente a pessoa de Daniel; que não recorda-se quando exatamente Marco Antônio saiu da sociedade; que afirma que sua função era de supervisor na administração da empresa, porém os recolhimentos de taxas e declaração de imposto de renda era de responsabilidade de seu contador Luiz Bonel Delgado Neto, o qual faleceu no ano passado; que afirma que quem era responsável pelo recolhimento das taxas, PIS, COFINS, Contribuição Social e Imposto de Renda de Pessoa Jurídica era de fato seu contador Luiz Bonel Delgado Neto; que como tinha muita amizade com Luiz Bonel, nunca se preocupou em conferir os comprovantes de recolhimentos das citadas taxas, portanto, não pode afirmar se o montante de R$210.813,74 foi realmente pago após a fiscalização; que não recorda-se de nenhum Auto de Infração lavrado pela Receita Federal alusivo ao montante citado; que todos os sócios são responsáveis pela empresa Scudeler Bar e Lanchonete Ltda. perante a Receita Federal; que afirma não ser sócio de outros estabelecimentos que explorem atividades de bingo e caça-níquel(...)." [às fls.396/397]. [destaquei].

Interrogatório de Marco Antônio Scudeler:

"(...)atuou como sócio da empresa denominada Scudeler Bar e Lanchonete Ltda. de 1998 e 1999 e, após este período, vendeu a sua parte para seu genitor e para seu irmão Daniel Rodrigo Jesuíno Scudeler; que durante a sociedade, o declarante tinha a função de gerente operacional, ou seja, cuidava dos funcionários, no tocante a orientá-los de como preparar os jogos; que não era responsável pelos recolhimentos dos PIS, COFINS, Contribuição Social e Imposto de Renda de Pessoa Jurídica, nem mesmo os demais sócios; que não era responsável que quem era responsável por tais recolhimentos era o contador Luis Bonel, o qual faleceu há dois anos; que não tem ciência de que tal montante fora efetivamente pago; que não teve conhecimento algum sobre a lavratura do Auto de Infração, motivo pelo qual não sabe informar se foram ou não tomadas providências, posto que afirma não ter recebido qualquer tipo de notificação; que não tem conhecimento de qual sócio é responsável pela empresa Scudeler perante a Receita Federal; que afirma não ser sócio de qualquer outra empresa que explore máquinas de caça-níquel e atividades de bingo.(...)". [a fl.399]. [destaquei].

Já, em Juízo:

Interrogatório de Marco Antônio:

"(...)São parcialmente verdadeiros os fatos narrados na denúncia. O interrogando integrou o quadro societário da pessoa jurídica Scudeler Bar e Lanchonete Ltda no período compreendido entre 1999 a 2001. Embora tivesse poder de gerência, sempre confiou a solução das questões contábeis ao contador Luiz Bonel. Não se inteirava daqueles assuntos e, por isso mesmo, não tinha conhecimento dos fatos narrados na denúncia até o recebimento das notificações emitidas pelos órgãos fazendários. Tão logo deixou o quadro societário da empresa acima referida, deu-se o ingresso dos demais acusados. A empresa funcionou até meados de 2004. O fato que lhe foi imputado na condição de pessoa física (não como sócio da empresa já nomeada) também não é de seu conhecimento, pois sempre delegou a formalização das declarações de imposto de renda ao contador acima referido.(...)Conhece a testemunha arrolada na denúncia, pois recebeu dela algumas notificações,; nada tem a alegar contra o auditor fiscal(...)" [a fl.453] [destaquei].

Interrogatório de Daniel Scudeler:

"(...)São parcialmente verdadeiros os fatos narrados na denúncia. O interrogando integrou mesmo o quadro societário da empresa Scudeler Bar e Lanchonete Ltda. Nunca se inteirou, contudo, das questões fiscais da empresa. Sua atividade sempre se limitou aos cuidados do "salão". A parte contábil sempre foi confiada a Luiz Bonel. Não tinha conhecimento, portanto, daquelas omissões indicadas na denúncia.(...)A empresa da qual foi sócio sempre passou por dificuldades financeiras. Tanto assim o é que a empresa já foi fechada e reaberta incontáveis vezes. Não sabe informar se parte dos valores destinados ao Fisco eram utilizados para pagamento de funcionários e fornecedores. Conforme mencionado no início de seu interrogatório, tais questões sempre foram entregues ao contador da empresa."[a fl.455] [destaquei].

Interrogatório de Antônio Scudeler:

"(...)São parcialmente verdadeiros os fatos narrados na denúncia. O interrogando integrou mesmo o quadro societário da pessoa jurídica Scudeler Bar e Lanchonete Ltda no período compreendido entre 1999 a 2004. Embora tivesse poder de gerência, jamais participou efetivamente das decisões administrativas. Não se inteirava dos assuntos fiscais, por tais temas sempre foram entregues ao contador da empresa. Nada sabe, portanto, sobre eventuais omissões capazes de caracterizar algum crime contra a ordem tributária.(...)" [a fl.457] [destaquei].

E, em que pese a negativa de autoria em seus interrogatórios supra-transcritos, não merece credibilidade a alegação no sentido de que, embora sócios-proprietários da empresa Scudeler Bar e Lanchonete Ltda, não tinham conhecimento da administração e contabilidade da empresa, sob o argumento de que não exerciam funções de natureza técnica e administrativa, que ficavam a cargo de seu contador Luiz Bonel, pessoa já falecida, transferindo de forma cômoda e conveniente a responsabilidade penal a ele que, como contador, controlava os documentos e livros fiscais da empresa. Ora, os apelantes eram os sócios-gerentes da empresa, e todos os sócios eram responsáveis por sua administração, na época dos fatos. Sob a responsabilidade de todos os apelantes estavam todas as obrigações da sociedade, inclusive as de natureza fiscal e tributária.

As obrigações tributárias, tanto a principal como a acessória, neste caso, decorrem da lei, repousando de forma direta sobre os ombros do sujeito passivo da obrigação tributária, de forma que pouco importa a Administração Pública saber quem era o responsável pelo setor administrativo, financeiro ou contábil da empresa.

É certo que todos tinham poder de mando e administravam conjuntamente a empresa, não sendo crível que eles não tivessem ciência das irregularidades fiscais e ilícitos tributários cometidos no âmago da própria empresa que lhes pertencia, não podendo ser aceita a singela alegação de que a contabilidade e responsabilidade pela regularização fiscal cabia única e exclusivamente ao contador da empresa - Luis Bonel - pois o controle da regularidade da contabilidade da empresa compete precisamente aos seus administradores, no caso os apelantes, aos quais cabe a responsabilidade pela fiscalização de todas as operações comercias e contábeis da empresa, sendo que a omissão, redução e supressão do pagamento de expressivo montante de tributos por parte da empresa só interessava aos seus sócios-administradores, que seriam os únicos beneficiários com a sonegação fiscal, sendo que Luis Bonel - que, segundo a tese da defesa, prestava serviços contábeis à empresa, na condição de contador contratado e subordinado às ordens dos apelantes, não iria praticar tal conduta delituosa para beneficiar os ora apelantes, sem a anuência dos mesmos, até porque era comandado e obedecia ordens ditadas pelos apelantes.

E, como bem lembrado pela douta Juíza "a qua", em sua decisão, constante de fls. 699/verso:

"(...)Sobre a materialidade, a Defesa limitou-se a informar que quem cuidava da escrita da empresa era o contador que já faleceu. A esse respeito, sequer eventual contrato de prestação de serviços foi trazida aos autos. O que importa para a caracterização do delito em comento é o fato de existir movimentação financeira sem a correspondente declaração ao Fisco, omissão de créditos e depósitos e informações em desconformidade com a escrituração, fatos devidamente comprovado nos autos. As testemunhas de Defesa nada informaram acerca da inexistência dos crimes (fls. 600/601)." [fls.699/verso] [destaquei].

E, ainda, como bem argumentou a douta Procuradora Regional da República, em seu parecer a fl.753, in verbis:

"(...)Em juízo, nos interrogatórios de fls. 452/453, 454/455 e 456/457, os réus atribuíram toda a responsabilidade ao contador da empresa Luiz Bonel, tese reproduzida no presente recurso de apelação. Ora, não é aceitável que os réus, para se eximir de suas responsabilidades, imputem ao seu contador o pleno gerenciamento dos negócios fiscais da empresa, da qual eles eram os gerentes e os responsáveis. Segundo consta nos autos, os réus sequer cogitaram de convocar o contador para apresentar explicações ao tempo dos fatos, nem mesmo o arrolaram como testemunha na defesa prévia, o que indica o seu desinteresse na oitiva. Em verdade, a versão dos recorrentes não encontra qualquer respaldo no conjunto probatório constante dos autos. Além de não terem demonstrado suficientemente a negativa de autoria, tiveram suas versões completamente descreditadas pela prova produzida no curso da instrução processual." [destaquei].

E, por fim, como bem colocado pelo E. Relator no bojo de seu voto vencido:

"(...)Com efeito, os apelantes afirmaram que o responsável pela evasão dos tributos foi o contador. No entanto, não é crível atribuir à terceira pessoa contratada a responsabilidade pelo recolhimento dos tributos, tendo em vista que a Ficha Cadastral da sociedade empresária em questão, deixa clara a responsabilidade de Marco Antônio pela gestão social [acrescento também de responsabilidade de Daniel Rodrigo e Antônio Scudeler], ou seja, pela área financeira da empresa. Ademais é cediço em nossas Cortes de Justiça, ser incabível a exclusão da culpabilidade, com a imputação da responsabilidade pela evasão do tributo à terceira pessoa contratada. (...)Desse modo, considerando que o contrato social, apontando o apelante como sócio-gerente [leia-se: os apelantes como sócios-gerentes] da empresa, restou corroborado pela sua confissão em juízo no sentido de ser responsável pela gestão social, e, não tendo a defesa produzido qualquer prova em sentido contrário, ônus que lhe competia, nos termos do artigo 156 do CPP, concluo pela integral consciência do acusado Marco Antônio Scudeler [leia-se: dos acusados Marco Antônio, Daniel Rodrigo e Antônio Scudeler] acerca da conduta omissiva de não recolhimento dos tributos federais, restando, dessa forma, comprovada a autoria.

Aliás, a corroborar a materialidade e autoria delitivas foram elucidativos os esclarecimentos fornecidos pelo Auditor-Fiscal da Receita Federal, Marcos Fernando Prado de Siqueira, ao trazer as explicações técnicas sobre os procedimentos fiscais adotados e a forma como se deram os autos de infrações, em decorrência de inúmeras fraudes perpetradas visando a omissão, redução ou supressão de tributos [IRPJ, CSSL e PIS] e contribuições sociais devidas à Previdência Social [COFINS], como se vê de seu depoimento em juízo, de fls. 552/553, in verbis:

"(...)Acerca dos fatos descritos na denúncia, a testemunha informou: no ano de 2003 foram dois procedimentos fiscais distintos, um em relação à pessoa física do Sr. Marco Antonio e outro da pessoa jurídica, do qual ele era sócio, Scudeler Bar e Lanchonete. Os procedimentos foram iniciados em razão de demanda da própria Justiça Federal que autorizou a Receita Federal, se fosse preciso, solicitar diretamente aos bancos os extratos bancários, em razão de valores incompatíveis tanto da pessoa física quanto da pessoa jurídica. O Sr. Marco Antonio foi intimado a apresentar os extratos da pessoa física e da pessoa jurídica, bem como a apresentar os livros e a escrituração contábil da pessoa jurídica. Foi apresentado tão somente os livros da pessoa jurídica e escrituração bancaria, mas não apresentou os extratos bancários da pessoa física e jurídica. Foi então solicitado aos bancos que enviassem a movimentação bancária da pessoa física e jurídica. O Sr. Marco Antonio foi intimado uma vez mais a justificar os valores, bem como a origem dos depósitos havidos nas contas bancárias, o mesmo ocorrendo em relação à pessoa jurídica. O Sr. Marco Antonio foi intimado três vezes, salvo engano, para apresentar a documentação com a respectiva justificativa, porém não logrou comprovar. Somente após o envio dos extratos pelos bancos é que o Sr. Marco Antonio apresentou a documentação que tinha disponível. Após várias intimações a lei permite que se presuma referidos valores como omissão da receita, então foi lavrado o auto de infração. Foram cinco autos de infração, um do imposto de renda pessoa física do Sr. Marco Antonio, e quatro para a pessoa jurídica, do IRPJ, COFINS, PIS e CSSL. Na época eu tinha por prática intimar pessoalmente o contribuinte entregando-lhe o termo de início de fiscalização, o que possivelmente foi feito no caso do Sr. Marco Antonio, mas não me recordo ao certo. Após ele constituiu um procurador, um advogado, que passou a responder as intimações feitas após o termo de início de fiscalização. As infrações referem-se aos anos calendários de 1998, 1999, 2000 e 2001." [destaquei].

E, ainda, consigno, por outro lado, que as testemunhas de defesa ouvidas em juízo [fls. 600 e 601], nada souberam dizer sobre os fatos narrados na denúncia e nada acrescentaram ao material probatório coligido nos autos.

Desta forma, concluo que as provas contidas nos autos conduzem, de forma lógica e harmônica, à existência do ilícito penal, e à autoria do delito, imputada não somente ao correu Marco Antônio, mas a todos os réus, ora apelantes, sendo a manutenção da r. decisão condenatória de primeiro grau, medida que se impõe.

Já no que tange a tese defensiva de excludente da culpabilidade por inexigibilidade de conduta diversa - dificuldades financeiras, acompanho o voto do Ilustre Relator no sentido de que não restou demonstrada a precariedade econômico-financeira da empresa por meio de prova documental robusta, que corroborasse os demais elementos colhidos nos autos, perfilhando os mesmos fundamentos já expostos por ele em seu voto.

Por fim, no que toca a dosimetria da pena, uma vez mais, data venia, divirjo do Ilustre Relator, e mantenho a pena do réu Marco Antônio Scudeler e a dos demais réus, tal como fixadas em primeiro grau.

O E. Relator havia absolvido os réus Daniel e Antônio e reduzido a reprimenda imposta ao corréu Marco Antônio, sob os seguintes fundamentos:

"(...)Passo, então, à análise da dosimetria das penas fixada na r. sentença, à luz do artigo 68 do estatuto repressivo. Observadas as circunstâncias judiciais previstas no artigo 59 do Código Penal, mantenho a pena-base fixada acima do mínimo legal em razão de que o acusado Marco Antônio Scudeler não é primário e ostenta maus antecedentes (cf. folha de antecedentes de fls. 651/654 e certidão de fls. 629/630), as quais apontam que o acusado ostenta duas condenações definitivas pela prática da contravenção penal prevista no artigo 58 do Decreto-Lei nº 6.259/44. Desse modo, mantenho a reprimenda em 02 (dois) anos e 03 (três) meses de reclusão e 11 (onze) dias-multa. Com efeito, tanto a doutrina quanto a jurisprudência pátrias são no sentido de que a prática de contravenção penal anterior ao cometimento de crime, apesar de não gerar reincidência, fundamenta a majoração da pena-base à título de maus antecedentes. [Cita precedentes jurisprudenciais] (...) Ausentes agravantes e atenuantes. Na terceira fase, não reconheço a causa especial de aumento de pena do artigo 12, inciso I, da Lei nº 8.137/90, tendo em vista que a fundamentação utilizada pelo magistrado de primeiro grau de que o acusado mantinha o estabelecimento comercial para a prática da contravenção do jogo do bicho não estabelece relação aos Crimes contra a Ordem Tributária. Assim, a reprimenda deverá ser reduzida, de ofício, para 02 (dois) anos e 03 (três) meses de reclusão para o apelante Marco Antônio Scudeler. No que tange à pena de multa, reduzo a reprimenda aplicada, de ofício. Na primeira fase, o MM. Juiz a quo fixou a pena-base acima do mínimo legal em 02 (dois) anos e 03 (três) meses de reclusão e 20 (vinte) dias-multa. Entretanto, por questão de simetria e proporcionalidade, a pena de multa deve corresponder ao mesmo patamar fixado na pena corporal. Tendo em vista que a pena privativa de liberdade foi majorada na proporção de 1/8 (um oitavo), a multa será fixada em 11 (onze) dias-multa. Outrossim, ausentes circunstâncias agravantes e atenuantes, bem como causa de aumento e de diminuição de pena. A pena de multa será fixada em 11 (onze) dias-multa. Neste caso, será mantido o valor do dia-multa fixado no decisum. No que se refere às penas substitutivas, nenhum reparo deve ser feito, porquanto proporcionalmente aplicadas, nos termos do artigo 44 do Código Penal. Por tudo que foi exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação defensiva, a fim de absolver os acusados Daniel Rodrigo Jesuíno Scudeler e Antônio Scudeler, com fundamento no artigo 386, inciso V, do Código de Processo Penal, e, de, oficio, reduzo a reprimenda imposta ao corréu Marco Antônio Scudeler para 02 (dois) anos e 03 (três) meses de reclusão e 11 (onze) dias-multa, no valor de um quinto do salário, mantendo-se, no mais, a r. sentença "a quo"." [fls.768/769 e verso] [os destaques são no original].

Portanto, pelo que se viu, na primeira fase da dosimetria da pena atento às diretrizes do art. 59 do Código Penal, o E. Relator manteve a pena-base acima do mínimo legal, pelas mesmas razões adotadas pela douta juíza sentenciante. No entanto, entendeu que, por questão de simetria e proporcionalidade, a pena de multa deveria corresponder ao mesmo patamar fixado na pena corporal, tendo em vista que a pena privativa de liberdade foi majorada na proporção de 1/8 (um oitavo), e aplicou a pena pecuniária de 11 (onze) dias-multa, sendo que o montante fixado em primeiro grau foi de 20 (vinte) dias-multa. Na segunda fase da dosimetria da pena, ausentes as circunstâncias atenuantes ou agravantes, bem como causas de aumento ou diminuição de pena, foi mantido, no voto vencido, o montante de dias-multa então fixado. Já na terceira fase da dosimetria da pena, porém, o Relator do voto vencido não reconheceu a causa especial de aumento de pena do art. 12, inciso I, da L. nº 8.137/90, por não concordar com a fundamentação utilizada pela magistrada no bojo de sua sentença, in verbis: "Na terceira fase, não há causas especiais de diminuição de pena. Por outro lado, reconheço a incidência da causa especial de aumento da pena prevista do artigo 12, inciso I, da Lei n. 8.137/90: "ocasionar grande dano à coletividade", inclusive porque há indícios de que mantinha o bar para fins ilícitos, como local da prática para o jogo do bicho - fl. 03 do Inquérito em apenso. Com efeito, as conseqüências do crime são efetivamente danosas à coletividade, não tendo, ademais, o réu reparado o dano, posteriormente, com o pagamento da exação tributária devida ao Erário Público [fls.700-verso e 701] [o destaque é no original].

O E. Relator entendeu que o fato de o acusado ter mantido estabelecimento comercial para a prática de contravenção penal do jogo do bicho não estabelece nenhuma relação com os Crimes contra a Ordem Econômica e Tributária, reduzindo a pena, ex officio, para 02 anos e 03 meses de reclusão para o apelante Marco Antônio Scudeler.

Data venia, divirjo desse entendimento, pois a magistrada fundamentou sua decisão, como se viu acima, no grave dano ocasionado à coletividade, por expressa previsão normativa do inciso I, do art. 12 da Lei dos Crimes contra a Ordem Econômica e Tributária. Assim sendo, mantenho a elevação da pena em razão da causa especial de aumento de pena do artigo 12, inciso I, da L. 8.137/91, no seu patamar mínimo legal [1/3], o que resultou na pena definitiva de 03 anos de reclusão, para cada réu, bem como o montante de dias-multa fixado em primeiro grau, ou seja, 20 dias-multa, sendo cada dia-multa arbitrado no valor de 1/5 (um quinto) do salário mínimo vigente à época dos fatos, valores esses que devem ser corrigidos na data do pagamento, nos termos do artigo 49, § 2º do CP.

E, por fim, o Insigne Relator manteve as penas alternativas substitutivas das penas privativas de liberdade, tal como consignado em primeiro grau.

Observo que a pena fixada é inferior a 04 (quatro) anos e o delito não foi cometido com utilização de violência ou grave ameaça. Por outro lado, os réus não são reincidentes e as circunstâncias previstas no artigo 44, inciso III indicam que a substituição da pena corporal por penas restritivas de direitos será suficiente. Assim sendo, mantenho as penas restritivas de direitos aplicadas em primeiro grau, além de manter a pena pecuniária acima fixada, para cada um dos réus.

Destarte, ouso divergir, data venia, do Eminente Relator, para negar provimento à apelação da defesa dos réus e manter a condenação dos apelantes MARCO ANTÔNIO SCUDELER, DANIEL RODRIGO JESUÍNO SCUDELER e ANTÔNIO SCUDELER, pela prática do delito previsto nos artigos 1º, inciso I e 12, inciso I, da Lei dos Crimes contra a Ordem Econômica e Tributária - L. 8.137/90, às penas de 03 (três) anos de reclusão, para cada réu, em regime inicial aberto, além do pagamento de 20 (vinte) dias-multa, no valor de 1/5 [um quinto] do salário mínimo vigente à época dos fatos, com a substituição das penas corporais por duas penas restritivas de direitos, tal como explicitado na sentença.

É COMO VOTO.



RAMZA TARTUCE
Desembargadora Federal


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D.E.

Publicado em 04/07/2012
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001229-20.2003.4.03.6127/SP
2003.61.27.001229-3/SP
RELATOR : Desembargador Federal LUIZ STEFANINI
REL. ACÓRDÃO : Desembargadora Federal RAMZA TARTUCE
APELANTE : MARCO ANTONIO SCUDELER
: DANIEL RODRIGO JESUINO SCUDELER
: ANTONIO SCUDELER
ADVOGADO : JOAO BATISTA SIQUEIRA FRANCO FILHO e outro
APELADO : Justica Publica
No. ORIG. : 00012292020034036127 1 Vr SAO JOAO DA BOA VISTA/SP

EMENTA

PENAL - CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA (ARTIGOS 1º, INCISO I, E 12, INCISO I DA LEI 8.137/90) - MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS COMPROVADAS - EXCLUDENTE DA CULPABILIDADE - DIFICULDADES FINANCEIRAS NÃO DEMONSTRADAS - RECURSO DA DEFESA A QUE SE NEGA PROVIMENTO - SENTENÇA CONDENATÓRIA E DOSIMETRIA DAS PENAS IMPOSTAS AOS RÉUS INTEGRALMENTE MANTIDAS.

1. A par do respeito e admiração que nutro pelo Ilustre Relator, dele ouso divergir, pois entendo que não merece provimento o recurso interposto pelos réus MARCO ANTÔNIO SCUDELER, DANIEL RODRIGO SCUDELER e ANTÔNIO SCUDELER para absolvê-los da prática do delito previsto no artigo 1º da Lei nº 8.137/90.
2. Conforme se vê, os réus, ora apelantes, foram condenados pela douta juíza sentenciante [fls.698/704 e verso], no que tange ao crime capitulado nos artigos 1º, inciso I e 12, inciso I, da L. 8.137/90, sob o fundamento de terem omitido a Receita Federal rendimentos que ensejaram movimentação em contas bancárias, acarretando a redução de tributo, além de terem prestado informações divergentes da registrada na escrituração da pessoa jurídica "Scudeler Bar e Lanchonete", da qual são sócios-gerentes.
3. O Ilustre Relator, ao contrário, do entendimento da juíza sentenciante, em seu voto, que restou vencido, absolveu os réus Daniel Rodrigo Jesuíno Scudeler e Antônio Scudeler, pois não haveria provas cabais no sentido de que eles, efetivamente, eram os responsáveis pela prática de atos de gestão, daí por que, na dúvida, deveria prevalecer o princípio in dubio pro reo, em relação a eles, absolvendo-os, nos termos do artigo 386, inciso V, do CPP, e mantendo a condenação imposta ao corréu Marco Antônio Scudeler. Ele, ainda, de ofício reduziu a reprimenda penal imposta a este réu para 02 [dois] anos e 03 [três] meses de reclusão, além do pagamento de 11 [onze] dias-multa, no valor de um quinto do salário mínimo, mantendo, no mais, a sentença.
4. Em primeiro grau, todos os réus foram condenados pela prática da conduta tipificada no art.1º, inciso I, da Lei nº 8.137/90 - Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional -, sendo que foram denunciados na condição de sócios-gerentes da pessoa jurídica "Scudeler Bar e Lanchonete Ltda.", por terem prestado, ao órgão fazendário, informações atinentes à contribuição para o financiamento da seguridade social - COFINS, em divergência com os montantes registrados na escrituração da empresa. Os fatos ocorreram de 1998 a 2003, e, em conseqüência desses fatos, foi lavrado o auto de infração no valor original de R$ 7.025,18 (sete mil e vinte e cinco reais e dezoito centavos). Além disto, o corréu Marco Antônio Scudeler omitiu a Receita Federal rendimentos tributáveis em seu imposto de renda - IR, nos anos-calendários de 1998 a 2001, rendimentos que ensejaram movimentações em contas bancárias, acarretando a redução de tributo. E, em conseqüência desses fatos, foi lavrado o auto de infração no valor original de R$ 2.886.135,48 (dois milhões, oitocentos e oitenta e seis mil, cento e trinta e cinco reais e quarenta e oito centavos).
5. O E. Relator argumentou, em seu voto vencido, que, em que pese existir provas da materialidade, não há provas suficientes nos autos a demonstrar que os réus Daniel e Antônio tenham cometido o crime que lhes foi imputado pela acusação - omissão de informações e prestação de declaração falsa ao órgão fazendário, reformando a decisão condenatória de primeiro grau, para dar parcial provimento ao recurso da defesa, e absolver os réus supracitados, mantendo, no entanto, a condenação do corréu Marco Antônio Scudeler.
6. No entanto, data venia, ao contrário do que sustenta o E. Relator, entendo que as provas apresentadas pela acusação são aptas a manutenção do decreto condenatório de primeiro grau em desfavor de todos os apelantes, por haver elementos suficientes da autoria delitiva, por parte deles.
7. Do mérito. Materialidade. Concordo com o E. Relator, no que tange a materialidade delitiva, que restou comprovada por meio do Procedimento Administrativo Fiscal nº 10830.009446/2003-31, instaurada pela Delegacia da Receita Federal de Campinas (fls. 103/188), em cujo bojo constam os termos de constatação fiscal (fls.106/108 e 124/127) e os autos de infrações lavrados pelas autoridades fazendárias (fls. 113//123, 128/167 e 169/171).
8. Autoria. No entanto, discordo do E. Relator no que tange a autoria delitiva, que, do mesmo modo, entendo que restou plenamente comprovada, pela ficha cadastral expedida pela Junta Comercial do Estado de São Paulo [fls.90/91], em que consta que eram os réus os responsáveis pela administração da empresa, evidenciando-se, assim, a inquestionável responsabilidade penal dos ora apelantes. Tudo isso acabou sendo corroborado pela própria versão oferecida pelos acusados, que admitiram serem os sócios administradores da empresa, dando informações precisas a respeito da situação e saúde financeira da empresa "Scudeler Bar e Lanchonete Ltda", tanto na fase inquisitorial [fls. 394/395; 396/397 e 399/400 - volume 02 dos autos em apenso]; quanto na fase judicial [fls. 452/453, 454/455 e 456/457], e, portanto, foram os responsáveis pela omissão, supressão e redução de tributos federais.
9. E, em que pese a negativa de autoria em seus interrogatórios supra-transcritos, não merece credibilidade a alegação no sentido de que, embora sócios-proprietários da empresa Scudeler Bar e Lanchonete Ltda, não tinham conhecimento da administração e contabilidade da empresa, alegando que não exerciam funções de natureza técnica e administrativa, que ficavam a cargo de seu contador Luiz Bonel, pessoa já falecida, transferindo, de forma cômoda e conveniente, a responsabilidade penal a ele, que, como contador, controlava os documentos e livros fiscais da empresa. Ora, os apelantes eram os sócios-gerentes da empresa, e todos os sócios eram responsáveis por sua administração na época dos fatos. Sob a responsabilidade de todos os apelantes estavam todas as obrigações da sociedade, inclusive as de natureza fiscal e tributária.
10. As obrigações tributárias, tanto a principal como a acessória, neste caso, decorrem da lei, repousando de forma direta sobre os ombros do sujeito passivo da obrigação tributária, de forma que pouco importa a Administração Pública saber quem era o responsável pelo setor administrativo, financeiro ou contábil da empresa.
11. É certo que todos tinham poder de mando e administravam, conjuntamente, a empresa, não sendo crível que eles não tivessem ciência das irregularidades fiscais e ilícitos tributários cometidos no âmago da própria empresa que lhes pertencia, não podendo ser aceita a singela alegação de que a contabilidade e a responsabilidade pela regularização fiscal cabiam, exclusivamente, ao contador da empresa - Luis Bonel - pois o controle da regularidade da contabilidade da empresa compete, precisamente, aos seus administradores, no caso os apelantes, aos quais cabia a responsabilidade pela fiscalização de todas as operações comercias e contábeis da empresa, sendo que a omissão, redução e supressão do pagamento de expressivo montante de tributos por parte da empresa só interessava aos seus sócios-administradores, que seriam os únicos beneficiários com a sonegação fiscal, sendo que Luis Bonel, que prestava serviços contábeis à empresa, na condição de contratado e subordinado às ordens dos apelantes, não iria praticar tal conduta delituosa para beneficiar os ora apelantes, sem a sua anuência, sendo que era comandado e obedecia ordens ditadas pelos apelantes.
12. Aliás, a corroborar a materialidade e autoria delitivas foram elucidativos os esclarecimentos fornecidos pelo Auditor-Fiscal da Receita Federal, Marcos Fernando Prado de Siqueira, ao trazer as explicações técnicas sobre os procedimentos fiscais adotados e a forma como se deram os autos de infrações em decorrência de inúmeras fraudes, visando a omissão, redução ou supressão de tributos [IRPJ, CSSL e PIS] e contribuições sociais devidas à Previdência Social [COFINS], como se vê de seu depoimento em juízo, de fls. 552/553 dos autos.
13. Por outro lado, as testemunhas de defesa ouvidas em juízo [fls. 600 e 601], não sabiam sobre os fatos narrados na denúncia e nada acrescentaram ao material probatório coligido.
14. Concluo que as provas contidas nos autos conduzem, de forma lógica e harmônica, à existência do ilícito penal, e à autoria do delito, imputada não somente ao correu Marco Antônio, mas a todos os réus, ora apelantes, sendo a manutenção da r. decisão condenatória de primeiro grau, medida que se impõe.
15. Das dificuldades financeiras. No que se refere à alegação da defesa acerca do reconhecimento da inexigibilidade de conduta diversa, ante as dificuldades financeiras por que teria passado a empresa do réu, tenho que, in casu, não restou comprovada a alegada penúria financeira aduzida pela defesa. De fato, as dificuldades financeiras acarretadoras de inexigibilidade de outra conduta (excludente de culpabilidade) devem ser de tal monta que ponham em risco a própria sobrevivência da empresa, cabendo ao acusado cabal demonstração de tal circunstância, trazendo aos autos elementos concretos de que a existência da empresa estava comprometida, caso recolhesse os tributos devidos, e, assim, não lhe restando outra alternativa que não a omissão dos recolhimentos.
16. Entendimento contrário, ou seja, se meros indícios de percalços econômicos vivenciados circunstancialmente por dada empresa, e cuja gravidade e intensidade não são aferíveis ou não restaram demonstradas, possibilitasse a configuração da denominada inexigibilidade de conduta diversa, estaríamos a banalizar um instrumento de exclusão da culpabilidade que deve incidir em casos especialíssimos, vale dizer, nas hipóteses raras em que o recolhimento do tributo geraria a bancarrota da empresa ou a demissão de funcionários, eis que não seria lícito exigir o cumprimento da norma legal em detrimento da existência da própria empresa.
17. Há que se ressaltar que qualquer estabelecimento comercial ou industrial, ou mesmo, pessoas físicas, passam por dificuldades financeiras, principalmente no país em que vivemos, onde a história recente incorporou a inflação e a ambição na cultura dos cidadãos. Porém, desejar justificar a prática reiterada de atos ilícitos previstos como crime, em face dessas eventuais situações críticas por que passam todos os cidadãos, não se coaduna com o estado de necessidade, cujos limites legais são da maior importância para que não se reverta na porta aberta à impunidade.
18. Insta observar, também, que era dos acusados o ônus de comprovar que a situação da sociedade empresária por eles administrada era efetivamente precária e que, por tal razão, outra não poderia ter sido sua conduta senão a de deixar de recolher aos cofres do Tesouro os tributos, em prejuízo da sociedade.
19. Deveriam, portanto, ter comprovado em juízo todas as formas que adotaram a fim de superar a crise, e não apenas limitarem-se a fazer alegações vagas, ou por meio de testemunhas, sem trazer, porém, prova documental mais robusta aos autos.
20. Outrossim, deveria a defesa ter trazido maiores elementos de convencimento aos autos, o que, porém, não foi feito, de forma que entendo não tenha ficado demonstrado nos autos os requisitos para a aplicação da exculpante, já que simples afirmações de dificuldades financeiras não têm, por si só, o condão de demonstrar não pudessem os acusados agir de forma diversa. Precedentes de nossos Tribunais Regionais e do Colendo STJ.
21. Destarte, não tendo os acusados demonstrado a precariedade econômico-financeira de sua empresa por meio de prova documental robusta que corroborasse as demais colhidas nos autos, impossível a aplicação da excludente de culpabilidade requerida pela defesa, devendo ser mantida a condenação deles, como incursos nas penas dos artigos 1º, inciso I e 12, inciso I, da Lei nº 8.137/90.
22. Da dosimetria da pena. Por fim, no que toca a dosimetria da pena, uma vez mais, divirjo do Ilustre Relator, e mantenho a pena do corréu Marco Antônio Scudeler e dos demais réus, tal como fixadas em primeiro grau.
23. O E. Relator reduziu a reprimenda imposta ao corréu Marco Antônio, da seguinte forma: na primeira fase da dosimetria da pena, atento às diretrizes do art. 59 do Código Penal, o E. Relator manteve a pena-base acima do mínimo legal, pelas mesmas razões adotadas pela douta juíza sentenciante, no entanto, entendeu que por questão de simetria e proporcionalidade, a pena de multa deveria corresponder ao mesmo patamar fixado na pena corporal, tendo em vista que a pena privativa de liberdade foi majorada na proporção de 1/8 (um oitavo), fixou a valor do dia-multa em 11 (onze) dias-multa, sendo que o valor fixado em primeiro grau foi de 20 (vinte) dias-multa. Na segunda fase da dosimetria da pena ausentes circunstâncias atenuantes ou agravantes, bem como causas de aumento ou diminuição de pena, foi mantido no voto vencido o valor do dia-multa ora fixado. Já na terceira fase da dosimetria da pena, porém, o Relator do voto vencido não reconheceu a causa especial de aumento de pena do art. 12, inciso I, da L. nº 8.137/90, por não concordar com a fundamentação utilizada pela magistrada no bojo de sua sentença, entendendo que o fato do acusado ter mantido estabelecimento comercial para a prática de contravenção penal do jogo do bicho não estabelecia nenhuma relação com os Crimes contra a Ordem Econômica e Tributária, reduzindo a pena, ex officio, para 02 anos e 03 meses de reclusão para o apelante Marco Antônio Scudeler.
24. Divirjo desse entendimento, pois a magistrada fundamentou seu entendimento no grave dano ocasionado à coletividade, por expressa previsão normativa do inciso I, do art. 12 da Lei dos Crimes contra a Ordem Econômica e Tributária. Assim sendo, mantenho a elevação da pena em razão da causa especial de aumento de pena do artigo 12, inciso I, da L. 8.137/91, no seu patamar mínimo legal [1/3], o que resultou na pena definitiva de 03 anos de reclusão, para cada réu, bem como mantenho o montante dos dias-multa, fixado em primeiro grau, ou seja, 20 dias-multa, mantido o seu valor unitário como fixado em primeiro grau.
25. O Relator manteve as penas alternativas substitutivas das penas privativas de liberdade, tal como consignado em primeiro grau.
26. Neste passo, observo que a pena fixada é inferior a 04 (quatro) anos e o delito não foi cometido com utilização de violência ou grave ameaça. Por outro lado, os réus não são reincidentes e as circunstâncias previstas no artigo 44, inciso III indicam que a substituição da pena corporal por penas restritivas de direitos será suficiente. Assim sendo, é de se manter as penas restritivas de direitos aplicadas em primeiro grau.
27. Recurso da defesa desprovido. Sentença condenatória e dosimetria das penas mantidas.


ACÓRDÃO

A Turma, por maioria, negou provimento à apelação da defesa, nos termos do voto da Des. Fed. RAMZA TARTUCE. Vencido o Relator que dava parcial provimento à apelação defensiva, a fim de absolver os acusados Daniel Rodrigo Jesuíno Scudeler e Antonio Scudeler, com fundamento no art. 386, inciso V, do Código de Processo Penal e, de ofício, reduzia a reprimenda imposta ao correu Marco Antonio Scudeler para 02 (dois) anos e 03 (três) meses de reclusão e 11 (onze) dias-multa, no valor de um quinto do salário, mantendo, no mais, a r. sentença "a quo".

São Paulo, 11 de junho de 2012.
RAMZA TARTUCE
Relatora para o acórdão


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Data e Hora: 28/06/2012 22:42:43