D.E. Publicado em 21/09/2012 |
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EMENTA
PENAL - CRIME AMBIENTAL - ARTIGO 40 DA LEI 9.605/98 - DUPLA IMPUTAÇÃO - EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE - MORTE DA PESSOA FÍSICA - ARTIGO 107, I DO CÓDIGO PENAL - RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA - DUPLA IMPUTAÇÃO - INOCORRÊNCIA - RECURSO MINISTERIAL DESPROVIDO.
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ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes os acima indicados, ACORDAM os Desembargadores da Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da Terceira Região, após o voto-vista do Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW, à unanimidade, em negar provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público Federal, mantendo-se integralmente a decisão de primeiro grau.
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VOTO-VISTA
Trata-se de apelação criminal interposta pelo Ministério Público Federal contra a sentença que absolveu a empresa International Travel Services Ltda. da prática do delito do art. 40 da Lei n. 9.605/98, com fundamento na inadmissibilidade da responsabilização penal da pessoa jurídica dissociada da pessoa física, visto ter sido extinta a punibilidade da pessoa física em razão de óbito (fls. 253/254).
Alega-se, em síntese, o quanto segue:
Decorreu in albis o prazo para apresentação de contrarrazões (fl. 276).
A Ilustre Procuradora Regional da República, Dra. Maria Iraneide Olinda S. Facchini, opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 278/282v.).
Acompanho o voto da Eminente Relatora para negar provimento ao recurso.
Crimes ambientais. Responsabilidade penal da pessoa jurídica. Sistema de dupla imputação. O princípio societas delinquere non potest tem sido relativizado pelo direito penal moderno e diversos ordenamentos jurídicos estrangeiros prevêem a responsabilidade criminal dos entes coletivos.
Nesse passo, a Constituição Federal de 1988 estabeleceu no § 3º do art. 225 a responsabilidade penal da pessoa jurídica pela prática de condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente:
O art. 3º da Lei n. 9.605/98 regulamentou o dispositivo constitucional e estabeleceu como requisitos para responsabilização criminal da pessoa jurídica que a infração seja cometida em seu benefício ou interesse e por decisão do seu representante ou de órgão colegiado, sem excluir a responsabilidade das pessoas físicas pelo mesmo fato, in verbis:
Há controvérsia doutrinária e jurisprudencial sobre a responsabilidade criminal da pessoa jurídica, uma vez que exigiria a superação da teoria penal clássica fundada na culpabilidade do agente, dada a falta de consciência e vontade do ente moral, dentre outras questões, como inviabilidade de aplicação do princípio da personalidade das penas, de imposição da pena privativa de liberdade e a impossibilidade de arrependimento ou de compreensão do caráter aflitivo ou corretivo da sanção penal pela pessoa jurídica.
A despeito das divergências sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça tem reconhecido a responsabilidade penal da pessoa jurídica desde que ocorra a imputação conjunta da prática criminosa à pessoa física, que atua em benefício do ente moral:
Do caso dos autos. A empresa International Travel Services Ltda. e seu sócio-gerente Luiz Mauro Soares foram denunciados pela prática do crime descrito no art. 40 da Lei n. 9.605/90.
Consta da denúncia ter Luiz Mauro Soares, em agosto de 2005, na Fazenda Cincerro, em São José do Barreiro (SP), causado dano direto ao Parque Nacional da Serra da Bocaina, considerado unidade de conservação ambiental, tendo provocado incêndio na vegetação nativa e introduzido 17 (dezessete) cabeças de gado na área, em benefício da referida empresa e conforme decisão administrativa de exploração da Fazenda Cincerro (fls. 166/169).
A denúncia foi recebida em 08.09.08 (fl. 170).
Após, foi noticiado o óbito de Luiz Mauro Soares ocorrido em 21.09.08 (fls. 179/180).
Houve extinção da punibilidade do acusado, prosseguindo a ação penal apenas contra a pessoa jurídica (fl. 186).
Apresentada a defesa preliminar (fls. 224/244), sobreveio sentença absolutória, fundamentada na necessidade da dupla imputação, considerando ser inviável a responsabilização da pessoa jurídica sem a presença da pessoa física (fls. 253/254v.).
Recorreu o Parquet, alegando, em síntese, que a dupla imputação corresponde à dupla acusação e restou atendida no momento do recebimento da denúncia, bem como que a extinção da punibilidade em razão do óbito é pessoal e não se comunica aos demais corréus.
Não lhe assiste razão.
Apesar de ter sido observado o sistema da dupla imputação quando do oferecimento da denúncia, o falecimento da única pessoa física denunciada e apontada como responsável pela atividade delitiva supostamente desempenhada em favor da empresa ré torna inviável a responsabilização da pessoa jurídica, que não se realiza de forma independente.
Logo, não se mostra suficiente o atendimento da dupla imputação tão somente para oferecimento da denúncia ou a alegada pessoalidade da causa extintiva da punibilidade, tendo em vista a necessária vinculação da conduta criminosa atribuída à empresa à atuação de seu dirigente.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação.
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RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL RAMZA TARTUCE:
Trata-se de apelação criminal interposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL contra decisão proferida pelo MM. Juiz da 1ª Vara Federal de Guaratinguetá-SP, que absolveu a empresa INTERNACIONAL TRAVEL SERVICES LTDA da imputação contida no artigo 40 da Lei 9.605/98, com fundamento na necessidade de dupla imputação e no fato de a punibilidade do réu Luiz Mauro Soares encontrar-se extinta.
Consta da denúncia que:
Decisão do MM. Juiz a quo determinando o recebimento da denúncia, a requisição das certidões de antecedentes criminais e a remessa dos autos ao SEDI (fl. 170).
Manifestação do Ministério Público Federal reiterando os pedidos constantes na denúncia (fls. 175/176).
Petição acostada às fls. 179/180 dos autos informando o óbito do acusado LUIZ MAURO SOARES, determinando o MM. Juízo de Primeira Instância a manifestação do Ministério Público Federal (decisão de fl. 181).
Manifestação do Ministério Público Federal pelo reconhecimento da extinção da punibilidade de LUIZ MAURO SOARES, tendo em vista o seu falecimento em 21/09/2008, informando, ainda, não ser possível propor à co-ré International Travel Services Ltda. a suspensão condicional do processo nos moldes do artigo 89 da Lei 9.099/95 (fls. 182/183).
Decisão de fl. 186 decretando a extinção da punibilidade do correu Luiz Mauro Soares.
A ré apresentou defesa preliminar às fls. 224/244.
O MM. Juiz a quo determinou a manifestação do Ministério Público Federal quanto ao pedido de apensamento dos autos ao processo 0001459-08.2001.4.03.6103 (fl. 246).
Manifestação contrária ao pedido de apensamento às fls. 247/249.
Sentença absolutória da empresa International Travel Services Ltda proferida em 12 de setembro de 2001 (fls. 253/254v), e disponibilizada em 29/09/2011 (fls. 263).
O Ministério Público Federal interpôs recurso de apelação, pleiteando a reforma da sentença para que o feito prossiga na fase instrutória, argumentando, essencialmente, que existe nos autos dupla imputação na denúncia, o que basta para que a pessoa jurídica possa ser condenada, sendo certo, ainda, que a morte de um dos agentes não impede a condenação dos demais (fls.265/273)
Sem contra-razões, vieram os autos a esta Egrégia Corte, onde a Ilustre Procuradora Regional da República, Dra. Maria Iraneide Olinda S. Facchini, opinou pelo desprovimento do recurso de apelação (fls. 278/282v).
À revisão, na forma regimental.
É O RELATÓRIO.
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VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL RAMZA TARTUCE:
Observo que a prova da materialidade do delito e os indícios de autoria foram claros e suficientes para o início da persecução penal, nos presentes autos.
A materialidade do delito encontra-se bem demonstrada pelos Autos de Infração de fls. 09 e 87, bem como pelo Laudo de Exame de Meio Ambiente (ocupação em área protegida) acostado às fls. 112/125.
Também existem fortes indícios de autoria, como se verifica do termo de declarações de Luiz Mauro Soares Júnior, acostado às fls. 149/150 dos autos, que assim se pronunciou:
No caso dos autos, foram denunciados a pessoa física - Luiz Mauro Soares, e o ente moral - Internacional Travel Services Ltda., pela prática de crime ambiental, sobrevindo, ao recebimento da denúncia, sentença de extinção da punibilidade do denunciado Luiz Mauro Soares, nos termos do artigo 107, inciso I, do Código Penal.
O MM. Juízo de primeira instância absolveu a empresa, corré sob o fundamento de que, com a extinção de punibilidade do corréu Luiz Mauro Soares, deixou de existir a dupla imputação entre pessoa física e pessoa jurídica, condição para responsabilização penal desta (fls. 253/254v).
Apela o Ministério Público Federal para que o feito tenha seu regular prosseguimento quanto à pessoa jurídica de direito privado.
Passemos à análise da legislação aplicável ao caso.
O artigo 225, §3º da Constituição Federal dispõe que:
Por sua vez, o artigo 3º da Lei 9.605/98 possui a seguinte redação:
Defende o apelante que, pela redação dos dispositivos legais em comento, que positivaram no direito pátrio a teoria da dupla imputação, a pessoa jurídica só pode ser responsabilizada criminalmente (ou seja, só pode figurar na condição de ré em uma ação penal) nos crimes ambientais que foram praticados por seus representantes legais em seu beneficio, sendo estas as condições legalmente previstas para a sua inclusão no pólo passivo da ação penal.
Desse modo, o Parquet federal entende que a chamada dupla imputação significaria que a acusação deve abranger a conduta delituosa da pessoa física que é responsável pela pessoa jurídica, conduta esta que deverá ter sido praticada em benefício da pessoa jurídica, no que tange aos crimes ambientais, ou seja, referida dupla imputação seria apenas uma dupla acusação, sendo que a extinção da punibilidade da pessoa física não afetaria a acusação, mas sim os seus efeitos, sendo de rigor o reconhecimento da responsabilidade do ente moral, após regular instrução criminal a ser realizada após a reforma da sentença levada a efeito nos autos.
Não assiste razão ao Ministério Público Federal, conforme se verá.
Para a análise do mérito da imputação dirigida à empresa, seria necessário se proceder á análise da imputação direcionada ao seu sócio, o que, in casu, seria impossível, tendo em vista seu falecimento, e a extinção de sua punibilidade.
Assim, tenho que a extinção da punibilidade fez desaparecer a imputação dirigida à pessoa física, desaparecendo, assim, a dupla imputação, não sendo possível falar-se em imputação da pessoa jurídica, no caso em comento.
Como bem colocado pelo MM. Juiz de primeira instância (fls. 253/254vº):
Outro não é o entendimento da Ilustre Procuradora Regional da República, Dra. Maria Iraneide Olinda S. Facchini, in verbis:
Cumpre assinalar, por fim, que referido entendimento é adotado pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça, nos seguintes termos:
Desta feita, extinta a punibilidade da pessoa física desaparece a imputação dirigida à pessoa jurídica, sendo de rigor a manutenção da r. sentença, nos exatos termos em que lançada.
Diante do exposto, nego provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público Federal, mantendo integralmente a sentença.
É COMO VOTO.
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