Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 07/11/2012
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0007603-25.2011.4.03.6110/SP
2011.61.10.007603-7/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : JOSE MOACIR ALVES DE MEIRA
ADVOGADO : RODRIGO GUSTAVO VIEIRA
APELADO : Justica Publica
CO-REU : TOSHIO GYOTOKU (desmembramento)
No. ORIG. : 00076032520114036110 1 Vr SOROCABA/SP

EMENTA

PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. ADEQUADO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DESNECESSIDADE DA COMPROVAÇÃO DO DOLO ESPECÍFICO. INEXISTÊNCIA DE CAUSA DE EXCLUSÃO DA CULPABILIDADE. REDUZIDA A MULTA IMPOSTA AO CAUSÍDICO POR ABANDONO DO PROCESSO. ARTIGO 265 DO CPP. AUMENTO DA PENA-BASE. ARTIGO 59 DO CÓDIGO PENAL. REGIME ABERTO FIXADO DE OFÍCIO. PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA DESTINADA À UNIÃO. APELOS MINISTERIAL E DA DEFESA PARCIALMENTE PROVIDOS.
1. A denúncia preencheu os requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal, contendo a exposição do fato criminoso, suas circunstâncias, a qualificação do agente e a classificação do crime. Tratando-se de crime societário, o fato da denúncia imputar a todos os corréus, sócios e administradores da empresa, a mesma conduta, não o fazendo de forma individualizada, não a torna inepta. Precedentes do STF, STJ e desta Corte.
2. Materialidade comprovada por diversos documentos que instruíram o procedimento fiscalizatório.
3. Autoria demonstrada através do contrato social, do depoimento pessoal do acusado e testemunhal, que apontam o réu como responsável pela gerência e administração da empresa.
4. Dolo configurado na vontade livre e consciente de deixar de repassar as contribuições. O tipo penal da apropriação indébita exige apenas o dolo genérico, e não o animus rem sibi habendi dos valores descontados e não repassados. A consumação do delito se dá com a mera ausência de recolhimento dessas contribuições.
5. Ausente demonstração de que as dificuldades financeiras, vivenciadas pela empresa à época das apropriações indébitas tenham sido diferentes daquelas comuns a qualquer atividade de risco de modo a caracterizar a inexigibilidade de conduta diversa.
6. Caracterizado o abandono do processo pelo causídico que, duas vezes intimado, não apresentou alegações finais, o que ensejou a aplicação de multa, com fulcro no artigo 265 do Código de Processo Penal, que foi reduzida ao mínimo por não constar dos autos prova que aponte para a capacidade econômica do patrono.
7. Pena-base acrescida em 1/6 (um sexto) em virtude das circunstâncias previstas no artigo 59 do Código Penal, notadamente a gravidade do delito e suas conseqüências deletérias aos cofres públicos.
8. Tendo em vista o quantum da pena estipulado e ausentes motivos que justifiquem a manutenção de regime mais gravoso, de acordo com o disposto no artigo 33, §º, "c" do Código Penal, foi estabelecido, de ofício, o regime aberto para cumprimento da pena.
9. Destinada, de ofício, a prestação pecuniária à União, de acordo com entendimento desta Turma.
10. Apelações da acusação e da defesa parcialmente providas.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar e dar parcial provimento à apelação da defesa para reduzir a multa imposta ao causídico com base no artigo 265 do Código de Processo Penal a 10 (dez) salários mínimos e, por maioria, dar parcial provimento ao apelo ministerial para aumentar a pena-base em 1/6 (um sexto), resultando em 02 (dois) anos, 08 (oito) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 12 (doze) dias-multa, fixando, por unanimidade, a Turma de ofício, o regime aberto e destinando a prestação pecuniária à União, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 23 de outubro de 2012.
JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0007603-25.2011.4.03.6110/SP
2011.61.10.007603-7/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : JOSE MOACIR ALVES DE MEIRA
ADVOGADO : RODRIGO GUSTAVO VIEIRA
APELADO : Justica Publica
CO-REU : TOSHIO GYOTOKU (desmembramento)
No. ORIG. : 00076032520114036110 1 Vr SOROCABA/SP

DECLARAÇÃO DE VOTO

A EXCELENTÍSSIMA SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL VESNA KOLMAR: Trata-se de apelações criminais interpostas pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e por JOSÉ MOACIR ALVES DE MEIRA, contra a r. sentença que o condenou, juntamente com Toshio Gyotoku, à pena de 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e ao pagamento de 11 (onze) dias-multa, no valor mínimo legal, pela prática do delito previsto no artigo 168-A c.c artigo 71, ambos do Código Penal.


Na sessão realizada em 23 de outubro de 2012, a Egrégia 1ª Turma proferiu a seguinte decisão: A Turma, por unânimidade, rejeitou a preliminar e deu parcial provimento à apelação da defesa para reduzir a multa imposta ao causídico com base no artigo 265 do Código de Processo Penal a 10 (dez) salários mínimos, e, por maioria, deu parcial provimento ao apelo ministerial para aumentar a pena-base em 1/6 (um sexto), resultando em 02 (dois) anos, 08 (oito) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 12 dias-multa, nos termos do voto do Relator, acompanhado pelo voto do Juiz Federal Convocado MÁRCIO MESQUITA, vencida a Desembargadora Federal VESNA KOLMAR que negava provimento à apelação do Ministério Público Federal mantendo a pena fixada na sentença e, prosseguindo, a Turma, por unanimidade, fixou, de ofício, o regime aberto e destinou a prestação pecuniária à União. Declarará voto a Des. Fed. VESNA KOLMAR. Lavrará acórdão o Relator.


Os autos vieram a este gabinete para declaração de voto.


Proferi voto, divergindo do E. relator, apenas, no sentido de negar provimento à apelação ministerial que pretendia o aumento da pena-base em razão da existência de circunstância judicial desfavorável ao réu, qual seja, as consequências do crime, representadas pela lesão aos cofres públicos no valor de R$ 133.692,60 (cento e trinta e três mil, seiscentos e noventa e dois reais e sessenta centavos), corrigido em 09/2007.


Com efeito, entendo que, in casu, o valor da lesão aos cofres públicos é insuficiente para justificar a majoração da pena-base, pelo que a mantenho no mínimo legal, tal qual fixado pelo magistrado sentenciante.


Ausentes agravantes e atenuantes, na terceira fase, fica mantida a razão de aumento decorrente da continuidade delitiva aplicada na r. sentença, em 1/6 (um sexto), à falta de recurso da acusação neste ponto, o que totaliza a pena definitiva em 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão e 11(onze) dias-multa.


No mais, acompanho o voto do Eminente Relator.


Por estes fundamentos, rejeito a preliminar, dou parcial provimento à apelação da defesa para reduzir a pena de multa imposta ao causídico, com fulcro no artigo 265 do Código de Processo Penal, para 10 (dez) salários mínimos, nego provimento ao recurso ministerial e, de ofício, fixo o regime inicial aberto e reverto a prestação pecuniária em favor da União.


É o voto.


Vesna Kolmar
Desembargadora Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0007603-25.2011.4.03.6110/SP
2011.61.10.007603-7/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : JOSE MOACIR ALVES DE MEIRA
ADVOGADO : RODRIGO GUSTAVO VIEIRA
APELADO : Justica Publica
CO-REU : TOSHIO GYOTOKU (desmembramento)
No. ORIG. : 00076032520114036110 1 Vr SOROCABA/SP

RELATÓRIO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:

Trata-se de apelações interpostas pelo Ministério Público Federal e pelo réu JOSÉ MOACIR ALVES DE MEIRA em face da sentença que o condenou, juntamente com o corréu, Toshio Gyotoku como incursos no artigo 168-A, combinado com o artigo 71, ambos do Código Penal.

De acordo com a denúncia os réus, na qualidade de sócios-gerentes da empresa "INDÚSTRIA DE PISOS TATUÍ LTDA." deixaram de recolher, no prazo legal, contribuições destinadas à Previdência Social e que foram descontadas dos salários de seus empregados, referentes aos períodos de janeiro ao 13º salário de 2002. Os fatos originaram as Notificações Fiscais de Lançamento de Débito - NFLDs nº 35.580.167-1 e 35.580.169-8, cujos débitos totalizam a cifra, em 30/05/2003, de R$75.961,00 (setenta e cinco mil, novecentos e sessenta e um reais).

A denúncia foi recebida 22 de setembro de 2004 (fl.416).

Após regular instrução, sobreveio sentença (fls.879/884) que condenou os réus à pena de 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de reclusão em regime semi-aberto e 11 (onze) dias-multa no mínimo legal.

A pena foi substituída por prestação de serviços a entidade de assistência social e prestação pecuniária única de 30 (trinta) salários mínimos a entidade social cadastrada na Vara das Execuções Penais.

Em sede de agravo regimental interposto pela Procuradoria Regional da República (fls.1003/1009), determinou-se o desmembramento do feito em relação ao ora apelante José Moacir Alves de Meira para que fosse intimado da sentença condenatória (fl.1011).

Embargos de declaração do ora apelante e de seu defensor Rodrigo Gustavo Vieira (fls.1038/1050) rejeitados (fl.1052).

Em suas razões recursais (fls.891/893) postula o Ministério Público Federal o aumento da pena-base dos réus, com seus reflexos na pena definitiva.

Contrarrazões da defesa de José Moacir Alves de Meira às fls.983/988 no sentido de ser negado provimento à apelação do Parquet Federal.

Insurge-se também a defesa de JOSÉ MOACIR ALVES DE MEIRA (fls.1066/1086). Contra a decisão condenatória, defende a inépcia da denúncia por não estarem delineadas as atuações dos sócios; quanto ao mérito, pugna pela absolvição diante da ausência de prova da autoria e de demonstração da inversão da posse com a utilização das contribuições em proveito pessoal; ausência de dolo; inexigibilidade de conduta diversa diante das dificuldades financeiras enfrentadas pela empresa.

Postula, ainda, o afastamento da multa estipulada ao defensor, ante o desrespeito ao devido processo legal e por afronta aos preceitos constitucionais ou, subsidiariamente, a redução ao patamar mínimo.

Contrarrazões do Ministério Público Federal pela rejeição das preliminares argüidas e não provimento da apelação da defesa (fls.1119/1123).

Parecer da Procuradoria Regional da República (fls.1126/1145) pelo desprovimento do apelo defensivo.

É o relatório.

À revisão.


JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0007603-25.2011.4.03.6110/SP
2011.61.10.007603-7/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : JOSE MOACIR ALVES DE MEIRA
ADVOGADO : RODRIGO GUSTAVO VIEIRA
APELADO : Justica Publica
CO-REU : TOSHIO GYOTOKU (desmembramento)
No. ORIG. : 00076032520114036110 1 Vr SOROCABA/SP

VOTO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:

I - O recurso da defesa prospera parcialmente.

1. Da inépcia da denúncia. Rejeito a preliminar de inépcia feita pela defesa ao argumento de que a peça inicial não individualizou as condutas nem estabeleceu um vínculo com o delito imputado

Com efeito, tratando-se de crime societário, como o do artigo 168-A do Código Penal, não se pode exigir que o órgão de acusação tenha, no momento de oferecimento da denúncia, condições de individualizar a conduta de cada corréu, eis que tal participação somente será delineada ao cabo da instrução criminal, sendo devidamente considerada na r. sentença apelada.

Bem por isso, a jurisprudência tem admitido, nos crimes societários, a mitigação dos requisitos da inicial acusatória, não se impondo a narração pormenorizada da conduta de cada um dos agentes. Nesse sentido:

I. Habeas-corpus: recurso ordinário ou impetração substitutiva dele: exigência de fundamentação pertinente. II. Omissão de recolhimento de contribuições previdenciárias descontadas de empregados: denúncia: aptidão. Tratando-se de crimes societários em que não se verifica, de plano, que "as responsabilidades de cada um dos sócios ou gerentes são diferenciadas, em razão do próprio contrato social relativo ao registro da pessoa jurídica envolvida", não há inépcia da denúncia pela ausência de indicação individualizada da conduta de cada indiciado, sendo suficiente a de que "os acusados sejam de algum modo responsáveis pela condução da sociedade sob a qual foram supostamente praticados os delitos" (HC 85.579, 2ª T., 24.5.05, Gilmar, DJ 24.6.05). A condição de gestores da empresa, nos sucessivos períodos da prática dos fatos delituosos, basta a fundar a imputação inicial feita a cada um dos pacientes, não se prestando o habeas corpus à verificação do efetivo exercício da gestão, no período em que por ela responsável.
STF - 1a Turma - HC 85549-SP - DJ 14/10/2005 pg.12
1. Habeas Corpus. Crimes contra a ordem tributária (Lei no 8.137, de 1990). Crime societário. 2. Alegada inépcia da denúncia, por ausência de indicação da conduta individualizada dos acusados. 3. Tratando-se de crimes societários, não é inepta a denúncia em razão da mera ausência de indicação individualizada da conduta de cada indiciado. 4. Configura condição de admissibilidade da denúncia em crimes societários a indicação de que os acusados sejam de algum modo responsáveis pela condução da sociedade comercial sob a qual foram supostamente praticados os delitos. Precedentes (HC no 80.812-PA, DJ de 05.03.2004; RHC no 65.369-SP, Rel. Min. Moreira Alves, DJ de 27.10.1987; HC no 73.903-CE, Rel. Min. Francisco Rezek, DJ de 25.04.1997; HC no 74.791-RJ, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJ de 09.05.1997; e RHC no 59.857-SP, Rel. Min. Firmino Paz, DJ de 10.12.1982). 5. No caso concreto, a denúncia é apta porque comprovou que todos os denunciados eram responsáveis pela representação legal da sociedade comercial envolvida. 6. Habeas corpus indeferido.
STF - 2a Turma - HC 86294-SP - DJ 03/02/2006 pg.89
PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ARTS. 168-A DO CÓDIGO PENAL. INÉPCIA DA DENÚNCIA. AUSÊNCIA DE DESCRIÇÃO PORMENORIZADA DA CONDUTA. ALEGAÇÃO DE QUE O RECORRENTE À ÉPOCA DOS FATOS, NÃO FIGURAVA NO CONTRATO SOCIAL DA EMPRESA. ELEMENTO SUBJETIVO DO TIPO. ESPECIAL FIM DE AGIR. PRESCINDIBILIDADE DE SUA DEMONSTRAÇÃO. DIFICULDADES FINANCEIRAS. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE EM RAZÃO DO PARCELAMENTO DO DÉBITO FISCAL. EXCLUSÃO DA EMPRESA DO REFIS. I - Em se tratando de crime societário, não há, necessariamente, nulidade na denúncia que deixa de detalhar as condutas dos acusados, sendo prescindível a descrição pormenorizada da participação de cada um, desde que não haja prejuízo para a ampla defesa. (Precedentes do STJ e do Pretório Excelso). II - Somente a partir do exame acurado do material probatório colhido durante a instrução criminal poderá concluir se o paciente realmente participou do esquema de sonegação fiscal descrito na denúncia e durante qual período. (Precedentes)...
STJ - 5a Turma - RHC 17668-SP - DJ 20/03/2006 pg.305
CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. APROPRIAÇÃO INDÉBITA DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. DENÚNCIA GENÉRICA EM CRIME SOCIETÁRIO. INEXISTÊNCIA DE OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO. AUSÊNCIA DE INQUÉRITO POLICIAL. DENÚNCIA EMBASADA EM PEÇAS DE INFORMAÇÃO. SUSPENSÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA (ART. 9º DA LEI Nº 10.684/03). PARCELAMENTO DO DÉBITO NÃO COMPROVADO. O trancamento de ação penal só é possível na estreita via do habeas corpus quando não demandar dilação probatória, restando inequívoco que o fato criminoso não existiu ou que o Paciente não é seu autor; Não é inepta a denúncia que, conquanto não individualize a conduta de cada um dos imputados, em hipótese de crime marcado por pluralidade de agentes, permita perfeita compreensão da imputação e abre oportunidade à ampla defesa. Isto não importa violação ao princípio do nullum crimen sine culpa...
STJ - 6a Turma - HC 32233-SP - DJ 01/08/2005 pg.564
PROCESSUAL PENAL - HABEAS CORPUS - TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL - APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA - ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA - AUTUAÇÃO FISCAL IMPUGNADA MEDIANTE RECURSO ADMINISTRATIVO PENDENTE DE JULGAMENTO - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO ACERCA DA PERSISTÊNCIA DO RECURSO - DENÚNCIA GENÉRICA - INEXISTÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO - ORDEM DENEGADA. 1. Paciente denunciado pela suposta prática do crime previsto no art. 168-A do Código Penal porque, sendo um dos gerentes da empresa deixou de repassar ao Instituto Nacional do Seguro Social contribuições sociais descontadas dos salários dos empregados... 6. Denúncia com a imputação regular de fato criminoso. Tratando-se de crime societário, urdido às ocultas em gabinetes fechados, pode ser tratado genericamente na denúncia sem que seja necessário minudenciar a conduta de cada suposto partícipe. 7. O denunciado, ora paciente, era um dos gerentes da empresa e, portanto, responsável pelos atos e omissões da pessoa jurídica. 8. Ordem denegada.
TRF - 3a Região - 1a Turma - HC 17870 - Relator Des.Fed. Johonsom di Salvo - DJ 15/05/2005 pg.213

Os fatos descritos na denúncia evidenciam a ocorrência de fato típico, qual seja, a apropriação das contribuições previdenciárias descontadas dos funcionários da empresa, nos períodos indicados, causando prejuízo ao INSS. A acusação encontra suporte probatório no procedimento administrativo fiscal encartado aos autos.

Descabe falar-se em responsabilidade penal objetiva, eis que os requisitos para que a denúncia seja recebida são a prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria, servindo o contrato social, no caso, para a satisfação deste último requisito.

Demonstrados indícios suficientes de autoria e da materialidade delitiva, não há que se falar em inépcia da denúncia, falta de justa causa ou em nulidade da ação penal, eis que a denúncia preencheu satisfatoriamente os requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal, contendo a exposição do fato criminoso, suas circunstâncias, a qualificação do agente e a classificação do crime.

Preliminar rejeitada.

2. Da materialidade do delito. Diversos documentos comprovam a materialidade delitiva: notificação fiscal de lançamento do débito, discriminativos do débito, relatório fiscal da infração, folhas de pagamento da empresa e representação fiscal para fins penais, todos constantes do procedimento fiscal que instrui os autos.

O crime tipificado no artigo 168-A do Código Penal é delito de natureza formal, que se consuma com o não repasse, à Previdência Social, das contribuições descontadas dos segurados empregados, não havendo necessidade de inversão da posse e utilização do montante em proveito pessoal pelo agente para sua configuração. Nesse sentido:

PENAL - APELAÇÃO CRIMINAL - ARTIGO 168-A DO CP - MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS - CRIME FORMAL - DESCABIDA A EXIGÊNCIA DO ANIMUS REM SIBI HABENDI... 9. O artigo 168-A, § 1º, inciso I, do Código penal descreve a conduta de "deixar de recolher, no prazo legal, contribuições ou outras importâncias destinadas à previdência social que tenha sido descontada de pagamento efetuado a segurados, a terceiros ou arrecadada ao público". Cuida-se, portanto, de crime formal, omissivo próprio, que se perfaz com a mera abstenção de um ato ao qual o substituto tributário está legalmente obrigado. A intenção de causar prejuízo a terceiro é irrelevante para a consumação criminosa. Na mesma esteira, também é descabida a exigência da vontade de apropriar-se do numerário que deixou de repassar ao INSS. O delito em que se enquadra a conduta da recorrente não possui elementos subjetivos, ou seja, a norma não demanda nenhuma finalidade especial agente. A qualificação de um crime independe de sua titulação ou topografia no Código Penal. O fato de o artigo 168-A do Código penal estar inserido no capítulo que trata da apropriação indébita não confere, per si, a necessidade de inversão da posse das quantias descontadas das folhas de salários. Para sua configuração, basta a simples conduta omissiva, descrita do núcleo do tipo penal . Precedentes do STJ e desta Corte...
TRF-3ª Região - 1a Turma - ACR 1999.61.81.007403-2 - Rel.Des.Fed. Johonsom di Salvo - j. 29.04.2008 - DJF3 26.05.2008

3. Da autoria. A autoria do delito restou plenamente comprovada nos autos.

Cópias do contrato social e suas respectivas alterações encontram-se acostadas às fls.57/72 e 619/626, onde se verifica que em 14 de junho de 2002 JOSÉ MOACIR ingressou no quadro societário, passando a administrar isoladamente a empresa, permanecendo o corréu Toshio na posição de sócio majoritário.

Em seu interrogatório em Juízo o acusado declara (fl.600):

"O interrogando assumiu a função de gerente da referida empresa em junho de 2002. Antes disso, ela era administrada, tão somente, por Toshio Gyotoku. Tinha ciência de que as contribuições devidas ao INSS estavam sendo descontadas dos funcionários (...)".

A testemunha José Tarcísio Ferri (fl.768), contratado para prestar serviços à empresa na área financeira, declarou:

"(...) Neste período, o acusado JOSÉ MOACIR permaneceu como representante legal da empresa e também a administrava, ele era um dos donos. (...)".

Tais fatos demonstram que JOSÉ MOACIR possuía amplos poderes como administrador, inclusive para efetuar o repasse das contribuições previdenciárias, não se eximindo, pois, da culpabilidade do delito em tela.

4. Do dolo. Verifico, também, o dolo na conduta do denunciado, consubstanciado na vontade livre e consciente no sentido de deixar de repassar as contribuições, o que se extrai de seu interrogatório, onde se constata que foram priorizados o pagamento de algumas dívidas, dentre elas o salário de empregados e a matéria-prima, em função dos alegados problemas enfrentados pela empresa (fl.600).

A conduta descrita no artigo 168-A, caput, do Código Penal é "deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no prazo e forma legal ou convencional".

Pela dicção legal, trata-se crime omissivo próprio (omissivo puro), que se consuma com a mera transgressão da norma ("deixar de repassar/recolher"), independentemente do resultado da conduta do agente ou qualquer outro efeito distinto da omissão em si mesma (v.g., auferir proveito patrimonial pessoal). Não se exige o dolo específico, consistente na vontade livre e consciente de ter a coisa para si (animus rem sibi habendi)

Daí ser lícito concluir que o elemento subjetivo do tipo descrito no artigo 168-A do Código Penal é o dolo genérico, assim entendido a vontade livre e consciente de descontar contribuição previdenciária da folha de salário dos empregados e deixar de repassar os valores à Previdência Social.

Esse entendimento encontra amparo na jurisprudência do E. Supremo Tribunal Federal:

"RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. INÉPCIA DA DENÚNCIA: DESCRIÇÃO GENÉRICA. FALTA DE JUSTA CAUSA. EXIGÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO (ANIMUS REM SIBI HABENDI). OFENSA AO PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE DA LEI. ALEGAÇÕES IMPROCEDENTES. (...) 2. Ao contrário do crime de apropriação indébita comum, o delito de apropriação indébita previdenciária não exige, para sua configuração, o animus rem sibi habendi. 3. Inocorrência de ofensa ao princípio da anterioridade da lei: a jurisprudência desta corte firmou-se no sentido de que "[o] artigo 3º da Lei n. 9.983/2000 apenas transmudou a base legal da imputação do crime da alínea 'd' do artigo 95 da Lei n. 8.212/1991 para o artigo 168-A do Código Penal, sem alterar o elemento subjetivo do tipo, que é o dolo genérico'. É dizer: houve continuidade normativo-típica. Recurso ordinário em habeas corpus a que se nega provimento."
(STF, RHC 88144, Relator Ministro Eros Grau, j. 04/04/2006, DJ 16/06/2006, p. 28).

Portanto, perfeitamente caracterizado o elemento subjetivo na conduta do réu.

5. Da inexigibilidade de conduta diversa. Melhor sorte não assiste ao apelante ao alegar a inexigibilidade de conduta diversa como causa supralegal de exclusão da punibilidade em razão de dificuldades financeiras. Para que caracterizem a excludente, essas aperturas devem ser de tal ordem que coloquem em risco a própria existência do negócio, uma vez que apenas a impossibilidade financeira devidamente comprovada nos autos poderia justificar a omissão nos recolhimentos.

Contudo, a defesa não se desincumbiu do ônus de provar o quanto alegado, nos termos do artigo 156, primeira parte, do Código de Processo Penal.

Embora o réu tenha sustentado que a empresa enfrentava problemas financeiros, não foi trazida aos autos a documentação comprobatória de que as dificuldades financeiras vivenciadas pela empresa, à época, tenham sido diferentes daquelas comuns a qualquer atividade de risco de modo a caracterizar a inexigibilidade de conduta diversa.

Os documentos de fls.627/628 e 686/697 demonstram a existência de ações de cobrança e execuções fiscais ajuizadas contra a empresa, pedidos de concordata e falência. Contudo, não são suficientes para comprovar que não havia outro modo de continuar funcionando, devendo considerar-se, ainda, que constituem fato normal na atividade empresarial. Na verdade, comprovam a inadimplência, não a ausência de recursos para o pagamento dessas obrigações.

Saliente-se que sequer foi comprovado que o réu tenha disposto de patrimônio particular com o fim de aplicar recursos na recuperação da empresa, mas optou por reter reiteradamente os valores descontados do pagamento de seus empregados, ao invés de destiná-los à Previdência Social.

Acerca do tema bem fundamentou a sentença recorrida:

"Ainda que as dificuldades financeiras tenham afetado a empresa dos réus, também afetou de forma indireta toda a economia do país, principalmente pelo fato da restrição de consumo de energia elétrica a todas as empresas e cidadãos.
(...) Apesar das alegações de dificuldades financeiras, nenhuma prova robusta, nem mesmo documental, foi trazida aos autos nesse sentido."

Na mesma linha é como vem entendendo o Colendo Superior Tribunal de Justiça:

"CRIMINAL. RESP. OMISSÃO NO RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. DOLO GENÉRICO. ANIMUS REM SIBI HABENDI. COMPROVAÇÃO DESNECESSÁRIA. ONUS PROBANDI. FACULDADE DA PARTE PROVAR. DIFICULDADES FINANCEIRAS DA EMPRESA. EXCLUSÃO DA CULPABILIDADE POR INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. ÔNUS DA DEFESA. PROVA NÃO PRODUZIDA. ABSOLVIÇÃO DOS ACUSADOS. CRISE FINANCEIRA DA EMPRESA. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
A conduta descrita no tipo penal do art. 95, "d", da Lei 8.212/95 é centrada no verbo "deixar de recolher", sendo desnecessária, para a configuração do delito, a comprovação do fim específico de apropriar-se dos valores destinados à Previdência Social. Precedentes. II Cabe à defesa e não à acusação a prova dessa circunstância, na medida em que o onimus probandi é a faculdade da parte demonstrar a ocorrência de fato alegado em seu favor. III. Não tendo sido comprovada a insolvência da empresa, não pode o Tribunal a quo absolver os acusados com base em meros indícios de que a mesma foi atingida por dificuldades financeiras, como ocorrido in casu. IV. Infere-se que os acusados foram absolvidos tão-somente em virtude do entendimento adotado pelo Tribunal a quo de que haveria a necessidade de comprovação do dolo específico de fraudar a Previdência Social, em desacordo com a jurisprudência dominante nesta Corte. V. Recurso conhecido e provido, nos termos do voto do relator. "(STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Classe: RESP - RECURSO ESPECIAL - 612367 Processo: 200301885499 UF: RJ Órgão Julgador: QUINTA TURMA Data da decisão: 28/04/2004 Documento: STJ000550139 Fonte DJ DATA:14/06/2004 PÁGINA:276 Relator(a) GILSON DIPP)

Como é cediço o bem jurídico protegido é o patrimônio público, o patrimônio dos cidadãos que compõem o Sistema Previdenciário, não se admitindo o uso de dinheiro destinado ao custeio da Previdência Social como escusa para eventual dificuldade financeira do particular.

Comprovadas a materialidade e a autoria delitiva e ausente causa legal excludente de culpabilidade, a manutenção da condenação pela prática do crime descrito no artigo 168-A do Código Penal é de rigor.

6. Da multa prevista no artigo 265 do Código de Processo Penal. Irresigna-se a defesa quanto à multa imposta ao defensor em virtude do abandono do processo, alegando sua ilegalidade por desrespeito ao devido processo legal e afronta aos preceitos constitucionais.

Depreende-se dos autos que o causídico, Dr. Rodrigo Gustavo Vieira, no curso do processo nº 2004.61.10.004827-0, do qual o presente feito foi desmembrado, atuava sozinho na defesa de ambos os réus, até que Toshio Gyotoku outorgou procuração aos advogados Salmen Carlos Zauhy e Bruno Nunes de Medeiros (fls.831/832).

Todos os defensores foram regularmente intimados, por duas vezes, através da imprensa oficial (fls.841-verso e 843), para apresentarem alegações finais, quedando-se inertes.

Por fim, a peça foi apresentada por defensora dativa (fls.864/877).

A sentença guerreada condenou o advogado Rodrigo Gustavo Vieira, OAB/SP202.302-A à multa de 50 (cinqüenta) salários mínimos, nos termos do artigo 265, "caput" do Código de Processo Penal, por abandono do processo e por ter deixado indefeso seu cliente.

Não há que se falar em qualquer ilegalidade ou violação a preceito constitucional, eis que houve a regular intimação, por duas vezes, por meio da imprensa oficial, com o aviso de incidência nas sanções do artigo 265 do CPP.

O próprio defensor assente, nas razões de apelação, que, embora intimado pela imprensa oficial, não atentou para seu teor, tomando ciência apenas quando da intimação da sentença. Dessa forma, está patente sua desídia.

O pretenso vício na publicação da sentença foi sanado com o desmembramento do processo, possibilitando nos autos atuais o pleno exercício do direito de defesa.

De acordo com a redação trazida pela norma processual, o defensor não poderá abandonar o processo senão por motivo imperioso, comunicado previamente o juiz, sob pena de multa de 10 (dez) a 100 (cem) salários mínimos, sem prejuízo das demais sanções cabíveis.

O abandono do processo, além de prejudicar a parte, causa considerável atraso na marcha processual.

Nesse sentido:

PROCESSO PENAL. MANDADO DE SEGURANÇA. ART. 265, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. CONSTITUCIONALIDADE. ADVOGADO. ABANDONO DO PROCESSO. MULTA. DENEGAÇÃO DA ORDEM. 1. "Não se vislumbra inconstitucionalidade do art. 265, caput, do CPP, ou ofensa aos princípios do juiz natural, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, em se tratando de sanção de natureza processual, incluindo-se na esfera de discricionariedade regrada do juiz natural do processo, sendo exercidos a ampla defesa e o contraditório através da possibilidade de impugnar a decisão atacada por pedido de reconsideração ou mandado de segurança" (STJ - RMS 31966/PR, Relator Ministro Adilson Vieira Macabu (Desembargador Convocado do TJ/RJ), 5ª Turma, julgado por unanimidade em 14/04/2011, publicado no DJe de 18/05/2011). 2. No caso em comento, o ora impetrante, apesar de ter sido, por duas vezes, regularmente intimado, não apresentou as alegações finais nos autos do processo nº 2007.38.15.000903-5/MG e, além disso, não apresentou nenhuma justificativa, o que levou o MM. Juízo Federal a quo a aplicar-lhe multa no valor de 10 (dez) salários mínimos, por abandono de causa. Dessa forma, a decisão impugnada encontra respaldo no art. 265, caput, do CPP, que é expresso ao afirmar que "O defensor não poderá abandonar o processo senão por motivo imperioso, comunicado previamente o juiz, sob pena de multa de 10 (dez) a 100 (cem) salários mínimos, sem prejuízo das demais sanções cabíveis". 3. A decisão impugnada se encontra suficientemente fundamentada, não apresentando eiva de ilegalidade ou abuso de poder que pudesse justificar a concessão do writ. 4. Mandado de segurança denegado.
(MS , JUÍZA FEDERAL CLEMÊNCIA MARIA ALMADA LIMA DE ÂNGELO (CONV.), TRF1 - SEGUNDA SEÇÃO, e-DJF1 DATA:07/10/2011 PAGINA:21.)
E ainda, decisão desta Corte:
PENAL - APELAÇÃO CRIMINAL - APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA - PRELIMINAR - NULIDADE DA SENTENÇA RECONHECIDA - NOMEAÇÃO DE DEFENSOR AD HOC PARA APRESENTAR ALEGAÇÕES FINAIS SEM DAR AO RÉU A CHANCE DE CONSTITUIR NOVO DEFENSOR, CONFORME ARTIGO 263, CPP - PREJUÍZO INEQUÍVOCO DIANTE DA CONDENAÇÃO PROLATADA - PRECEDENTES REITERADOS DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - DESPACHO ANULADO, ASSIM COMO ATOS DECISÓRIOS SUBSEQUENTES, EM RELAÇÃO AO RÉU APELANTE, SEM AFETAR O CORRÉU ABSOLVIDO, NÃO AFETADO PELO LAPSO ORA SANADO - CARACTERIZADO O ABANDONO DE CAUSA, IMPÕE-SE A APLICAÇÃO DA MULTA PREVISTA NO ARTIGO 265 DO CPP, EM VALOR COMPATÍVEL COM A IMPORTÂNCIA DO ATO OMITIDO E DA FASE PROCESSUAL EM QUE SE APUROU O ABANDONO. 1. Réu condenado pela prática do crime de apropriação indébita previdenciária. 2. Recurso da defesa argüindo nulidade decorrente da nomeação de defensor ad hoc para apresentação de alegações finais, sem intimação prévia do réu para constituir novo defensor. 3. Nulidade patente. Constatado o abandono de causa por parte do defensor constituído, a providência adequada era determinar a intimação do réu para lhe dar ciência do ocorrido e a chance de constituir um novo defensor, de sua confiança e em prazo razoável. Ao nomear diretamente o defensor para o ato de apresentação de alegações finais, o MM. Juízo incorreu em nulidade, violando o artigo 263 do CPP, nos termos do artigo 564, IV, do mesmo Estatuto, revelando-se inequívoco o prejuízo diante da condenação do apelante. 4. Reiterados precedentes do Superior Tribunal de Justiça, reconhecendo a nulidade em situações análogas. 5. Por outro lado, comprovado o abandono de causa pelo anterior causídico, impõe-se a aplicação de multa, nos termos do artigo 265 do CPP, em valor que seja compatível com a fase processual e com a importância do ato omitido. Neste caso concreto, tratando-se de alegações finais de defesa, peça da mais alta relevância no processo penal, por ter o condão de definir os rumos do feito e sem a qual não se pode dar cabo do procedimento, gerando mais lentidão no processamento e relativa demora para sua ausência ser devidamente equacionada pelo condutor do processo, a multa deve ser de 50 salários mínimos, vigentes à época do abandono, corrigidos monetariamente. 6. Feito anulado a partir, inclusive, da nomeação da defesa ad hoc, com a urgente baixa dos autos ao Juízo monocrático, cabendo aos atuais defensores constituídos a apresentação das alegações finais, para a prolação de nova sentença. 7. Preliminar de nulidade acolhida. Aplicação de multa por abandono do processo. Expedição de ofício à Procuradoria da Fazenda Nacional. Exame do mérito recursal prejudicado.
(ACR 00095740720034036181, JUIZ CONVOCADO ALESSANDRO DIAFERIA, TRF3 - PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/04/2012 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)

Em consonância com o decidido por esta Corte nos autos principais em relação aos demais defensores do corréu, observo que o quntum fixado, em 50 (cinqüenta) salários mínimos por abandono do processo, efetivamente revela-se exacerbado, vez que não consta dos autos elementos que permitam mensurar a capacidade financeira do patrono do réu.

Dessa forma, dou parcial provimento ao apelo da defesa para reduzir a pena de multa imposta ao defensor ao piso legal, resultando em 10 (dez) salários mínimos.

II - O apelo da acusação, aqui analisado exclusivamente no que concerne ao réu JOSÉ MOACIR ALVES DE MEIRA, já que em relação ao corréu Toshio Gyotoku foi apreciado em autos próprios, prospera parcialmente. Vejamos:

7. Da dosimetria. Apela o Ministério Público Federal a fim de que seja majorada a pena-base do réu em função das circunstâncias previstas no artigo 59 do Código Penal serem desfavoráveis ao acusado, notadamente as conseqüências do crime.

Observo que nesse aspecto a apelação ministerial comporta provimento pois, de fato, as conseqüências deletérias do crime, lesando os cofres públicos em R$133.692,60 (duzentos e noventa mil, seiscentos e quatorze reais e vinte e um centavos), valor este corrigido em 09/2007 (fls.719/720), apontam para a reprovabilidade da conduta do réu e para a necessidade da majoração pleiteada.

Com tais considerações, fixo a pena-base 1/6 (um sexto) acima do piso, em 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de reclusão e 11 (onze) dias-multa.

Considerando que as omissões no recolhimento das contribuições perduraram, ao total, por 08 (oito) meses, de junho ao 13º de 2002, e dada a ausência de recurso por parte da acusação nesta seara, mantenho o patamar (1/6) utilizado pela sentença recorrida em função da continuidade delitiva, prevista no artigo 71 do Código Penal, tornando definitiva a pena em 02 (dois) anos, 08 (oito) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 12 (doze) dias-multa.

Tendo em vista o quantum da pena estipulada e ausentes motivos que justifiquem a manutenção de regime mais gravoso, de acordo com o disposto no artigo 33, §º, "c" do Código Penal, fixo, de ofício, o regime aberto para cumprimento da pena.

Mantenho o valor do dia-multa, bem como a substituição da sanção corporal por restritivas de direitos, pelo tempo da nova pena substituída e demais termos entabulados pela sentença recorrida, exceto quanto à prestação pecuniária, que destino, de ofício, à União, de acordo com o entendimento desta Turma.

Com tais considerações, rejeito a preliminar e dou parcial provimento à apelação da defesa para reduzir a multa imposta ao causídico com base no artigo 265 do Código de Processo Penal a 10 (dez) salários mínimos, e dou parcial provimento ao apelo ministerial para aumentar a pena-base em 1/6 (um sexto), resultando em 02 (dois) anos, 08 (oito) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 12 (doze) dias-multa, fixando, de ofício, o regime aberto e destinando a prestação pecuniária à União.

É o voto.



JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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