Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 05/09/2012
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000434-87.2006.4.03.6004/MS
2006.60.04.000434-0/MS
RELATOR : Desembargador Federal LUIZ STEFANINI
APELANTE : ANGELO IZAIAS VIEIRA reu preso
ADVOGADO : ERCIO QUARESMA FIRPE e outro
APELADO : Justica Publica
CO-REU : ANTONIO MALAQUIAS reu preso
: EDGARDO BARRIOS MALABE

EMENTA

TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO - DOSIMETRIA DA PENA - PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL - GRANDE QUANTIDADE DE ENTORPECENTE EM DISPOSITIVO ADREDEMENTE PREPARADO PARA OCULTAR A DROGA EM CILINDRO DE CAMINHÃO - FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA PARA A ELEVAÇÃO DO QUANTUM - INTERNACIONALIDADE - COMPROVAÇÃO - ASSOCIAÇÃO EVENTUAL - ABOLITIO CRIMINIS - DELAÇÃO PREMIADA - AFASTAMENTO - ART. 33§ 4º DA LEI Nº 11.343/06 - NÃO APLICAÇÃO - SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS - VEDAÇÃO - PENA DE PERDIMENTO - CABIMENTO - OBEDIÊNCIA A NORMAS CONSTITUCIONAIS E INFRACONSTITUCIONAIS - PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO PARA REDUZIR A PENA.
1. Entendo por irreparável o quantum estabelecido na sentença, que considera a expressiva quantidade de cocaína transportada com vistas ao tráfico internacional, a exigir apenação com maior rigor, diante da dimensão dos fatos e dinâmica do crime. Os fundamentos apresentam-se válidos para individualizar a pena, dado o maior grau de censurabilidade da conduta. 5. Ordem denegada".
2. Restou plenamente configurada nos autos a internacionalidade do delito, tendo sido operado o transporte via fronteiras entre países, merecendo a pena aumento a esse título. Destaque-se que para a configuração de referida majorante não há necessidade da efetiva entrega do entorpecente no local de destino, bastando a remessa ou a finalidade do agente no transporte da droga para o exterior.
3. A nova Lei de Drogas - 11.343/06 aboliu a associação eventual antes prevista no art. 18, III, da Lei nº 6368/76, não prevendo tal causa de aumento aos delitos de tráfico, devendo ser aplicada a abolitio criminis, retroativamente .
4. A aplicação da benesse em decorrência da delação premiada requer resultado na localização e identificação dos agentes integrantes do grupo criminoso, bem como os bens frutos de ilícitos. Não são premiadas as informações genéricas que não tenham sido suficientes para o desmanche da organização criminosa. A aplicação do artigo 14 da Lei nº 9.807/99 e do artigo 8º, parágrafo único, da Lei nº 8.072/90 (delação premiada) exige efetiva informação para o demantelamento da organização voltada ao crime e, no caso dos autos, o acusado, em nenhum momento, se esforçou para possibilitar tal desiderato.
5. Em recente decisão do E. Superior Tribunal de Justiça publicada no DJE de 08/06/2012, no Recurso Especial de relatoria da ministra Laurita Vaz, representativo de controvérsia, restou consolidado o entendimento de que "é vedado ao Juiz, diante de conflito aparente de normas, apenas aplicar os aspectos benéficos de uma e de outra lei, utilizando-se a pena mínima prevista na Lei nº 6368/76 com a minorante prevista na nova Lei de Drogas, sob pena de transmudar-se em legislador ordinário, criando lei nova".(STJ RESP Nº 1.117.068/PR).No corpo do voto, destacou a ministra que é cabível a aplicação retroativa da Lei nº 11.343/06, desde que o resultado da incidência das suas disposições, na íntegra, seja mais favorável ao réu do que o advindo da utilização da Lei nº 6368/76, sendo vedada a combinação de leis.
6. No caso dos autos, a mencionada causa não teria aplicação e, ainda que assim não fosse, mais favorável ao réu é a aplicação integral dos dispositivos da Lei nº 6368/76 que prevê pena menor em abstrato.
7. No que se refere à substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, considerando a pena aplicada (seis anos de reclusão), torna-se objetivamente incabível a substituição, nos termos do previsto no artigo 44 do Código Penal.Ainda que assim não fosse, não olvidando respeitosas decisões dos Tribunais Superiores a respeito do tema, a norma prevista no artigo 44 da Lei nº 11.343/2006, ao vedar a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, não fere, mas, ao contrário, cumpre a Constituição Federal, porquanto a substituição da pena corporal por restritivas de direitos é completamente incompatível com a necessidade de maior repressão e prevenção aos crimes considerados mais gravosos à sociedade, tais como o de tráfico internacional de entorpecentes.
8. No caso dos autos, a grande quantidade e potencialidade da droga transportada com o elevado número de pessoas que seriam atingidas, são circunstâncias suficientes a revelar não cumprir o acusado os requisitos subjetivos previstos nos artigos 59 e 44, inciso III, ambos do Código Penal, de maneira que, também por essa razão, não faz jus a esta substituição.
9. Houve apreensão do veículo caminhão-trator Volvo com semi-reboque Randon e um aparelho celular, o primeiro objeto de perdimento decretado na sentença, em razão da comprovação de utilização dos bens para o tráfico internacional de entorpecentes.Conforme bem observado pelo MM. Juiz, "a preparação de um fundo falso no semi-reboque que depende do caminhão bem demonstra que o veículo integrado em suas duas partes estaria a serviço do tráfico de drogas".A decisão se mostra irreparável em face da norma consagrada no art. 243 da Constituição Federal. Incide ainda sobre o perdimento, as disposições normativas infraconstitucionais do art. 46 da Lei nº 10.409/02 e do art. 91, II, "a", do Código Penal, como efeito da condenação.
10. Parcial provimento ao recurso interposto pelo réu, apenas para reduzir a pena imposta para 06 (seis) anos de reclusão, em regime inicial fechado e 100 (cem) dias-multa, à razão unitária da sentença, que, no mais, fica mantida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso interposto pelo réu, apenas para reduzir a pena imposta para 06 (seis) anos de reclusão, em regime inicial fechado e 100 (cem) dias-multa, à razão unitária da sentença, que, no mais, fica mantida, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 27 de agosto de 2012.
LUIZ STEFANINI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000434-87.2006.4.03.6004/MS
2006.60.04.000434-0/MS
RELATOR : Desembargador Federal LUIZ STEFANINI
APELANTE : ANGELO IZAIAS VIEIRA reu preso
ADVOGADO : ERCIO QUARESMA FIRPE e outro
APELADO : Justica Publica
CO-REU : ANTONIO MALAQUIAS reu preso
: EDGARDO BARRIOS MALABE

RELATÓRIO

Trata-se de apelação criminal interposta por Ângelo Izaias Vieira contra a r. sentença (fls. 319/353) que, julgando procedente a denúncia, o condenou ao cumprimento das penas de 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de reclusão, em regime inicial fechado e 112 (cento e doze) dias-multa, à razão unitária de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, como incurso no art. 18, I e III, ambos da Lei º 6368/76 e art. 65, II, "b", do Código Penal.

Em razões recursais (fls. 396/423) requer o apelante:

1. Aplicação da pena no mínimo legal, aos comandos do art. 59 do Código Penal;

2. A aplicação do benefício da delação premiada para fins de redução da pena além do mínimo legal, em grau máximo, qual seja, dois terços;

3. A aplicação da diminuição de pena prevista no § 4º, do art. 33 da Lei 11.343/06 - novatio legis in mellius;

4. Afastamento do aumento de pena previsto no art. 18, inc.III, da Lei nº 6368/76, figura não prevista na nova Lei de Drogas;

5. Afastamento da majorante do art. 18, inc.I, da Lei nº 6368/76 - tráfico internacional;

6. Substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos;

7. Afastamento da pena de perdimento de bens em prol da União.

Contrarrazões de apelação pelo Ministério Público Federal pelo improvimento do recurso (fls. 434/447).

Parecer do Ministério Público Federal opina pelo improvimento do recurso (fls. 451458).

É o relatório.

Feito sujeito à revisão.


LUIZ STEFANINI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000434-87.2006.4.03.6004/MS
2006.60.04.000434-0/MS
RELATOR : Desembargador Federal LUIZ STEFANINI
APELANTE : ANGELO IZAIAS VIEIRA reu preso
ADVOGADO : ERCIO QUARESMA FIRPE e outro
APELADO : Justica Publica
CO-REU : ANTONIO MALAQUIAS reu preso
: EDGARDO BARRIOS MALABE

VOTO

O Ministério Público Federal denunciou Ângelo Izaias Vieira, Antonio Malaquias e Edgardo Barrios Malabe.

No dia 25 de abril de 2006, Ângelo e Antonio transportavam, pela BR-262, no Posto Fiscal Lampião Aceso, em Corumbá/MS, escondidos em compartimento preparado (cilindro de ar), embaixo de um caminhão VOLVO/N 10, placas BWF-1725, dirigido por Ângelo, doze pacotes, envoltos em fita adesiva de cor bege, contendo, ao total, expressivos 12.500 g (doze mil e quinhentos gramas) de cocaína, obtidos na fronteiriça Bolívia, pelo boliviano Edgardo. Suas intenções eram transportá-los da Bolívia até Presidente Prudente/SP.

Na data e local, durante barreira policial realizada por Policiais Federais, foi abordado um caminhão branco identificado na denúncia conduzido por Ângelo, acompanhado por Malaquias, coincidindo, desse modo, com a informação anônima recebida horas antes no plantão policial. Assim, após breve vistoria no veículo, diante de fundadas suspeitas, o caminhão foi levado para uma oficina mecânica, para uma busca minuciosa, resultando na apreensão do entorpecente.

Interrogado em sede policial, Ângelo confessou o transporte do entorpecente encontrado no caminhão de sua propriedade, com a intenção de entregar para uma pessoa de nome "Gil de Tal', na cidade de Presidente Prudente/SP. Afirmou que receberia a expressiva quantia de R$12.000,00 (doze mil reais), por quilo de cocaína transportada. Declarou que recebeu a droga do seu comparsa Antonio Malaquias, pessoa quem o convidou para a empreitada criminosa. Revelou ainda que o esconderijo preparado para abrigar a cocaína foi confeccionado por ele próprio (Ângelo). Alegou desconhecer a propriedade da substância entorpecente apreendida, declarando apenas que a droga estava na residência de Malaquias.

Já, Antonio Malaquias, em sede policial, confessou o transporte da cocaína apreendida, indicando ainda o proprietário da droga como sendo Edgardo Barrios Malabe. Afirmou que Edgardo adquiriu a droga em território boliviano, levando para Corumbá/MS. Declarou que convidou Ângelo para transportar cocaína adquirida por Edgardo na Bolívia, mediante promessa de recompensa. Por fim, alegou que receberia R$2.000,00 (dois mil reais) para transportar a droga.

Desse modo, os denunciados se associaram para a prática do crime e transportaram, de maneira livre e consciente, substância entorpecente, cujo uso pode causar dependência físico/psíquica, proscrita no território nacional, mediante tráfico com o exterior.

A materialidade do tráfico ilícito de entorpecentes está demonstrada pelo Laudo de Exame em Substância que confirmou ser cocaína a substância apreendida. Mister lembrar que o entorpecente estava na forma de base, o que possibilita o aumento considerável de sua quantidade, ampliando o número de vítimas de seus nefastos efeitos.

Quanto ao elemento subjetivo, agiram com dolo intenso e intuito monetário, tendo pleno conhecimento do caráter delituoso de suas condutas, mormente quando se considera o modus operandi com que pretendiam enviar a droga procedente do território boliviano para Presidente Prudente/SP, adredemente acondicionada e ocultada no interior de um cilindro de ar de caminhão, local de difícil acesso, em manifesto intuito de despistar a ação policial.

O veículo foi vistoriado pela perícia que elaborou o Laudo de fls. 305/307, atestando que foi encontrado no veículo um reservatório do tipo cilindro para ar comprimido que possuía uma janela que permitiria a ocultação de objetos, inclusive substâncias entorpecentes.

Feitas essas ponderações em torno dos fatos, passo ao exame do recurso.

Impende consignar que as razões recursais cingem-se à dosimetria da pena, de modo que a defesa se conformou com a condenação.

Assim, desde logo, a examino.


PENA-BASE

Não procede o pedido de aplicação no mínimo legal.

Veja-se a fundamentação que a sustenta:

"Apreciando as circunstâncias judiciais contidas no artigo 59 do Código Penal, observo que a censura da conduta do réu apresenta-se maior do que aquela verificada na maioria dos casos registrados nesta região, onde o transportador da droga, vulgarmente chamado de "mula", em geral, é flagrado na posse de pequena quantidade de cocaína (menos de um quilo).

No caso concreto, o próprio réu esclareceu que fez uma viagem anterior a Corumbá apenas "para conhecer o lugar e estudar a questão" (fl. 176), acenando positivamente à proposta de tráfico de cocaína, desde que se tratasse de uma "partida" considerável, que lhe proporcionasse um bom retorno financeiro.

Por conseguinte, a natureza e a quantidade do entorpecente apreendido (12.500 gramas de cocaína) devem ser considerados na fixação da pena-base. Cumpre assinalar, ainda, que a droga encontrava-se em pasta-base (fl. 91), vale dizer, em sua forma pura, o que certamente permitiria a multiplicação de seu peso, após batizada (misturada).

Ângelo não possui antecedentes criminais (fls. 67, 145, 166, 189 e 219).

Conduta social e personalidade sem nota distintiva, conforme assinaturas coletadas entre as pessoas que conhecem o réu (fls. 191/214).

Os motivos do crime são comuns ao tráfico ilícito de entorpecentes e se direcionam para a obtenção de lucro fácil. As circunstâncias também são compatíveis à espécie. As consequências deste tipo de delito são sérias, afetando toda a saúde pública e colocando em risco potencial a incolumidade pública, a vida e a saúde individual de cada um dos componentes do corpo social.

No caso em questão, sopesando todos estes fatores, verifico que a pena mínima não se apresenta suficiente para retribuição do crime praticado e prevenção de novos delitos" (...).

A pena-base restou fixada em 6 (seis) anos de reclusão e 100 (cem) dias-multa.

Entendo por irreparável esse quantum, que considera a expressiva quantidade de cocaína transportada com vistas ao tráfico internacional, a exigir apenação com maior rigor, diante da dimensão dos fatos e dinâmica do crime.

A respeito, destaco jurisprudência análoga ao caso:


"PENAL. HABEAS CORPUS. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTE E ASSOCIAÇÃO AO TRÁFICO. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. OBSERVÂNCIA DOS CRITÉRIOS LEGAIS QUE REGEM A MATÉRIA. ORDEM DENEGADA. 1. Eventual constrangimento ilegal na aplicação da pena, passível de ser sanado por meio de habeas corpus, depende, necessariamente, da demonstração inequívoca de ofensa aos critérios legais que regem a dosimetria da resposta penal, de ausência de fundamentação ou de flagrante injustiça. 2. Malgrado haja certa discricionariedade na fixação da pena-base, a sua exasperação acima do mínimo deve ser devidamente fundamentada, sob pena de nulidade (art. 93, X, CF). 3. Encontrando-se a sentença adequadamente fundamentada no dado concreto, qual seja, a grande quantidade de entorpecentes apreendida (mais de 16 Kg , de cocaína, além de maconha e harxixe), mostra-se altamente reprovável a conduta praticada. 4. A quantidade e a variedade do entorpecente devem ser consideradas na fixação da pena-base, amparada no art. 59 do Código Penal, uma vez que, atendendo à finalidade da Lei 6.368/76, que visa coibir o tráfico ilícito de entorpecentes, esses fundamentos apresentam-se válidos para individualizar a pena, dado o maior grau de censurabilidade da conduta. 5. Ordem denegada".

(STJ HC 114592, REL. Min.Laurita VAZ, 5ª T, Dje 29/06/2009).


SEGUNDA FASE


Na segunda fase, aplicada a confissão espontânea a pena restou fixada em 5 (cinco) anos de reclusão e 84 (oitenta e quatro) dias-multa, ficando ora mantida.


TERCEIRA FASE


DA INTERNACIONALIDADE E ASSOCIAÇÃO EVENTUAL


Restou plenamente configurada nos autos a internacionalidade do delito, tendo sido operado o transporte via fronteiras entre países, merecendo a pena aumento a esse título.

Destaco que para a configuração de referida majorante não há necessidade da efetiva entrega do entorpecente no local de destino, bastando a remessa ou a finalidade do agente no transporte da droga para o exterior.


Nesse sentido os acórdãos a seguir colacionados, que expõem casos análogos ao destes autos:


RECURSO ESPECIAL. PENAL. TRÁFICO INTERNACIONAL. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AO ART. 18, INCISO I, DA LEI N.º 6.368/76. NÃO-OCORRÊNCIA. INCIDÊNCIA DA MAJORANTE DA INTERNACIONALIZAÇÃO. TRANSPORTE DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE PARA O EXTERIOR. 1. A incidência da causa de aumento de pena da internacionalização do tráfico não exige a presença de agentes brasileiros e estrangeiros, ou que exista um conluio internacional. Imprescindível, para a caracterização da majorante, é que a operação realizada introduza substâncias entorpecentes no território nacional ou a busca de sua difusão para o exterior. 2. Na hipótese vertente, o agente oriundo de Manaus/AM transportava na mala, com fundo falso, 2.926,42 gramas de alcalóide de cocaína, tendo como destino final a cidade de Barcelona/Espanha, sendo preso em flagrante delito no aeroporto internacional de Brasília. Em sendo assim, afigura-se correta a incidência da majorante pelo tráfico internacional de drogas. 3. Recurso não conhecido (STJ - RESP - nº 593297/DF, Órgão Julgador: QUINTA TURMA, DJ 05/04/2004, p. 321, Rel. Laurita Vaz) - grifo nosso.


CONFLITO DE COMPETÊNCIA. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. REMESSA PELA VIA POSTAL. CONSUMAÇÃO. APREENSÃO ALFANDEGÁRIA. APLICAÇÃO DO ART. 70 DO CPP. 1. O disposto no art. 12 da Lei n.º 6.368/76 tipifica dezoito ações identificadas por diversos verbos ou núcleos do tipo, sendo que o delito se consuma com a prática de qualquer das condutas elencadas, por se tratar de crime de perigo abstrato e de ação múltipla. 2. Na hipótese vertente, restou caracterizada a conduta de remeter cocaína para o exterior, podendo ser enquadrada na modalidade remeter ou exportar, conforme análise do juízo competente. Não há falar em tentativa, mas em consumação do crime de tráfico, pois houve a completa realização do ato de execução com a remessa da droga. Ressalte-se ser desnecessária para a consumação do crime que a substância entorpecente enviada chegue ao seu destinatário, o que configuraria mero exaurimento do delito. Aplicação do art. 70 do Código de Processo Penal. 3. Conflito conhecido para declarar competente o Juízo Federal Vara Criminal de Porto Alegre/RS, ora suscitante (STJ - CONFLITO DE COMPETENCIA - 41775/RS, Órgão Julgador: TERCEIRA SEÇÃO, DJ 14/06/2004, p. 158, Rel. Min. Laurita Vaz) - grifo nosso.


Destarte, entendo que está efetivamente demonstrada a internacionalidade do tráfico.

Verifico ainda que, nessa fase, o MM. Juiz procedeu ao aumento de um terço da pena, em razão da incidência de duas causas de aumento - internacionalidade e associação - aplicando a norma do art. 68 do Código Penal.

Contudo, a nova Lei de Drogas - 11.343/06 aboliu a associação eventual, não prevendo tal causa de aumento aos delitos de tráfico, devendo ser aplicada a abolitio criminis, retroativamente .

Veja-se o seguinte julgado do E. Supremo Tribunal Federal, de relatoria do e. Min. Cezar Peluso, RHC 83708, em 02/02/2010:


"AÇÃO PENAL. Tráfico de drogas. Exame toxicológico. Indeferimento fundamentado. Nulidade. Inocorrência. Compete ao juízo decidir acerca da viabilidade, relevância e imprescindibilidade da realização de provas requeridas pelas partes, inexistindo constrangimento ilegal em caso de indeferimento justificado. 2. AÇÃO PENAL. Condenação. Sentença condenatória. Pena. Individualização. Fixação no triplo do mínimo legal. Crime formal. Abuso do poder discricionário do magistrado. Capítulo da sentença anulado. Recurso a que se dá parcial provimento, para esse fim. Precedente. Inteligência do art. 59 do CP. No caso de crime de guarda de substância entorpecente, não pode a pena-base ser fixada no triplo do mínimo pela só quantidade da droga apreendida. 3. AÇÃO PENAL. Tráfico de drogas. Causa de aumento de pena pelo concurso de pessoas. Art. 18, III, da Lei nº 6.368/76. Abolitio criminis. Ocorrência. Retroatividade da lei penal mais benéfica ao réu. Exclusão da majorante. Ordem concedida de ofício para esse fim. A Lei nº 11.343/06 revogou a majorante da associação eventual para a prática do crime de tráfico de entorpecentes, prevista na Lei nº 6.368/76" (grifo nosso).


Tomando-se, pois, apenas uma majorante (internacionalidade) aumento a pena em 1/5 (um quinto), a resultar a reprimenda de 06 (seis) anos de reclusão, em regime inicial fechado e 100 (cem) dias-multa.

Ainda nessa fase, afasto o benefício de delação premiada requerido pela defesa, o que resultou também afastado na sentença.

Com efeito, a aplicação da benesse requer resultado na localização e identificação dos agentes integrantes do grupo criminoso, bem como os bens frutos de ilícitos.

Conforme bem destacou o MM. Juiz, não são premiadas as informações genéricas que não tenham sido suficientes para o desmanche da organização. Alegou a defesa que Ângelo teria colaborado para a elucidação da autoria por parte de outros membros do grupo criminoso, informando à Polícia Federal o nome de outros três integrantes, John Anunciação e Gil de Tal, sendo que em relação a Edgardo, a sua não localização pela Polícia Federal não pode ser imputada ao apelante.

Contudo, o apelante reconheceu em Juízo que a acusação a John foi equivocada e injusta e em relação a "Gil de Tal", confirmou o seu envolvimento momento em que estava em poder dos policiais o pedaço de papel contendo esse nome. A aplicação do artigo 14 da Lei nº 9.807/99 e do artigo 8º, parágrafo único, da Lei nº 8.072/90 (delação premiada) exige efetiva informação para o demantelamento da organização voltada ao crime e, no caso dos autos, o acusado, em nenhum momento, se esforçou para possibilitar tal desiderato, nem mesmo para a prisão dos respectivos agentes, tendo apenas mencionado, genericamente, os nomes de "John" e "Gil de Tal", porém, sem maiores detalhes.

Nada impediria que o acusado se beneficiasse por referido benefício legal, mas desde que, voluntariamente, cumprisse todas as determinações impostas pelos textos normativos, isto é, fornecesse, efetivamente, às autoridades, maiores subsídios para a identificação e prisão dos demais membros.

Assim sendo, não há suporte para aplicação da benesse.


DA APLICAÇÃO DA DIMINUIÇÃO DE PENA PREVISTA NO § 4º DO ARTIGO 33 DA LEI 11.343/06.


A pretendida aplicação não encontra guarida.

Em recente decisão do E. Superior Tribunal de Justiça publicada no DJE de 08/06/2012, no Recurso Especial de relatoria da ministra Laurita Vaz, representativo de controvérsia, restou consolidado o entendimento de que "é vedado ao Juiz, diante de conflito aparente de normas, apenas aplicar os aspectos benéficos de uma e de outra lei, utilizando-se a pena mínima prevista na Lei nº 6368/76 com a minorante prevista na nova Lei de Drogas, sob pena de transmudar-se em legislador ordinário, criando lei nova".

(STJ RESP Nº 1.117.068/PR).


No corpo do voto, destacou a ministra que é cabível a aplicação retroativa da Lei nº 11.343/06, desde que o resultado da incidência das suas disposições, na íntegra, seja mais favorável ao réu do que o advindo da utilização da Lei nº 6368/76, sendo vedada a combinação de leis.

No caso dos autos, verifico, em primeiro lugar, que a mencionada causa não teria aplicação e, ainda que assim não fosse, mais favorável ao réu é a aplicação integral dos dispositivos da Lei nº 6368/76 que prevê pena menor em abstrato.


DA SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE


No que se refere à substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, considerando a pena aplicada (seis anos de reclusão), torna-se objetivamente incabível a substituição, nos termos do previsto no artigo 44 do Código Penal.

Ainda que assim não fosse, não olvidando respeitosas decisões dos Tribunais Superiores a respeito do tema, a norma prevista no artigo 44 da Lei nº 11.343/2006, ao vedar a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, não fere, mas, ao contrário, cumpre a Constituição Federal, porquanto a substituição da pena corporal por restritivas de direitos é completamente incompatível com a necessidade de maior repressão e prevenção aos crimes considerados mais gravosos à sociedade, tais como o de tráfico internacional de entorpecentes.

No caso dos autos, a grande quantidade e potencialidade da droga transportada com o elevado número de pessoas que seriam atingidas, são circunstâncias suficientes a revelar não cumprir o acusado os requisitos subjetivos previstos nos artigos 59 e 44, inciso III, ambos do Código Penal, de maneira que, também por essa razão, não faz jus a esta substituição.


DA PENA DE PERDIMENTO E PEDIDO DE RESTITUIÇÃO DOS BENS EM PROL DA UNIÃO


Houve apreensão do veículo caminhão-trator Volvo com semi-reboque Randon e um aparelho celular, o primeiro objeto de perdimento decretado na sentença, em razão da comprovação de utilização dos bens para o tráfico internacional de entorpecentes.

Conforme bem observado pelo MM. Juiz, "a preparação de um fundo falso no semi-reboque que depende do caminhão bem demonstra que o veículo integrado em suas duas partes estaria a serviço do tráfico de drogas".

A decisão se mostra irreparável em face da norma consagrada no art. 243 da Constituição Federal, verbis:


"Todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins será confiscado e reverterá em benefício de instituições e pessoal especializados no tratamento e recuperação de viciados e no aparelhamento e custeio a atividades de fiscalização, controle, prevenção e repressão do crime de tráfico dessas substâncias".


Incide ainda sobre o perdimento, as disposições normativas infraconstitucionais do art. 46 da Lei nº 10.409/02 e do art. 91, II, "a", do Código Penal, como efeito da condenação.

Trago à colação o seguinte julgado:


"PENAL. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. APLICAÇÃO DA CAUSA ESPECIAL DE DIMINUIÇÃO DE PENA DO ARTS. 33, § 4o DA LEI Nº 11.343/2006 EM PATAMAR MÁXIMO. PERDIMENTO DE BENS EM FAVOR DA UNIÃO.

1 a 3 (omissis).

4. Constitui efeito secundário da condenação, nos termos do art. 92, inciso II, do CP, a perda, em favor da União, dos instrumentos do crime cuja fabricação, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito, ou do produto do crime ou de qualquer bem ou valor auferido pelo agente com a prática do fato delituoso. 5. Apelação parcialmente provida". (TRF2, ACR 7927, DJF 06/09/2010, PÁG.37 REL. Des. Fed. Marcelo Leonardo Tavares.).


Ante tais fundamentos, dou parcial provimento ao recurso interposto por Ângelo Izaias Vieira, apenas para reduzir a pena imposta para 06 (seis) anos de reclusão, em regime inicial fechado e 100 (cem) dias-multa, à razão unitária da sentença, que, no mais, fica mantida.

É como voto.


LUIZ STEFANINI
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): LUIZ DE LIMA STEFANINI:10055
Nº de Série do Certificado: 47D97696E22F60E3
Data e Hora: 28/08/2012 18:22:28