Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 03/09/2012
AGRAVO LEGAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0009188-75.2012.4.03.0000/MS
2012.03.00.009188-1/MS
RELATOR : Desembargador Federal CARLOS MUTA
AGRAVANTE : Estado do Mato Grosso do Sul
ADVOGADO : IVANILDO SILVA DA COSTA
AGRAVADA : DECISÃO DE FOLHAS
INTERESSADO : Uniao Federal (FAZENDA NACIONAL)
ADVOGADO : JULIO CÉSAR CASARI E CLAUDIA AKEMI OWADA
INTERESSADO : JOHNNY LUCAS DA SILVA FIGUEIREDO
ADVOGADO : FERNANDO PICANCO CABUSSU (Int.Pessoal)
: DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
ORIGEM : JUIZO FEDERAL DA 1 VARA DE CAMPO GRANDE > 1ªSSJ > MS
No. ORIG. : 00013762420124036000 1 Vr CAMPO GRANDE/MS

EMENTA

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. CONSTITUCIONAL. AGRAVO INOMINADO. FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS. SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE - SUS. LEI 8.080/1990. PRECEDENTES.
1. Comprovada a necessidade do medicamento, por prescrição feita por profissional médico, indicando sua adequação ao tratamento de pessoa sem condições financeiras para sua aquisição, e tratando-se de diagnóstico de doença grave, leucemia mielóde aguda, é cabível a discussão judicial do direito ao respectivo fornecimento.
2. A Lei 8.080/1990, com alterações dadas pela Lei 12.401/2011, orienta a conduta administrativa para assistência terapêutica e para dispensação de medicamentos, mas não excluiu a discussão judicial da garantia constitucional à ampla proteção da vida e saúde, assim comprovando não se tratar da hipótese de inconstitucionalidade de norma, a ensejar a alegação de ofensa ao artigo 97, CF.
3. As restrições sanitárias e éticas em função da falta de aprovação de tal medicamento pela ANVISA não devem prevalecer diante do risco à vida ou saúde de pacientes e, sobretudo, diante do relatório médico, atestando que "Após ter completado 4 ciclos de quimioterapia com o protocolo IDAFLAG, Johnny apresentou nova recidiva da doença necessitando fazer novos ciclos de quimioterapia com novo protocolo de tratamento utilizando a medicação CLOFARABINE 40 FRASCOS DE 20 MG. Esta medicação está sendo utilizada há vários anos em outros países para tratamento de Leucemia Mielóide Aguda recidivada, conforme artigo científico anexado. Johnny Lucas está na fila de espera para realizar transplante de Medula Óssea. O transplante só será realizado se ele estiver novamente sem doença na medula" (f. 45).
4. Tal fato, associado às demais provas coligidas, é relevante e suficiente para impor a obrigação de fornecimento ao Poder Público, mesmo porque hipossuficiente o agravante, diante do custo do produto, e inexistente comprovação de abuso, fraude ou ilegalidade na prescrição por profissional, que subscreveu sob a responsabilidade legal de seu grau e que responde, pois, pelo tratamento indicado, e eventual irregularidade, se vier a ser apurada.
5. Inviável a alegação de necessidade de estrita observância da lista de medicamentos fornecidos pelo SUS e de não fornecimento de medicamento diverso, visto que em circunstâncias tão especiais, de perigo de vida ou à saúde, deve o Poder Público primar pelo direito subjetivo essencial, relacionado à dignidade da pessoa humana, previsto e tutelado pela Constituição Federal.
6. Agravo inominado desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo inominado, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 23 de agosto de 2012.
CARLOS MUTA
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): LUIS CARLOS HIROKI MUTA:10039
Nº de Série do Certificado: 6E894C9821934059
Data e Hora: 23/08/2012 17:30:19



AGRAVO LEGAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0009188-75.2012.4.03.0000/MS
2012.03.00.009188-1/MS
RELATOR : Desembargador Federal CARLOS MUTA
AGRAVANTE : Estado do Mato Grosso do Sul
ADVOGADO : IVANILDO SILVA DA COSTA
AGRAVADA : DECISÃO DE FOLHAS
INTERESSADO : Uniao Federal (FAZENDA NACIONAL)
ADVOGADO : JULIO CÉSAR CASARI E CLAUDIA AKEMI OWADA
INTERESSADO : JOHNNY LUCAS DA SILVA FIGUEIREDO
ADVOGADO : FERNANDO PICANCO CABUSSU (Int.Pessoal)
: DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
ORIGEM : JUIZO FEDERAL DA 1 VARA DE CAMPO GRANDE > 1ªSSJ > MS
No. ORIG. : 00013762420124036000 1 Vr CAMPO GRANDE/MS

RELATÓRIO

Trata-se de agravo inominado à negativa de seguimento a agravo de instrumento contra antecipação de tutela, em ação ordinária, que determinou "que, no prazo de cinco dias, o Estado do Mato Grosso do Sul e o Município de Campo Grande -MS forneçam ao autor o medicamento denomiando "CLOFARABINE 20mg", conforme receita de fls. 16. Havendo notícia nos autos de problemas como regular fornecimento do medicamento por parte da Fazenda Pública desses entes federados, a União deverá ser intimada para que, no prazo de cinco dias, dê cumprimento à presente decisão", sob pena de multa diária no valor de R$ 1.000,00.


No recurso, foi requerida a reforma da decisão agravada, ao fundamento de que: (1) houve violação ao art. 97, CF, ao contrariar a lei 12.401/11; e (2) o medicamento não é essencial à saúde e vida do agravado, sem comprovação de eficácia, não possuindo, ademais, registro na ANVISA, o que afronta os artigos 124 do Código de Ética Médica, 10 e 12, Lei 6.360/76 e Resolução 31/CNJ.


Apresento o feito em Mesa.


É o relatório.


CARLOS MUTA
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): LUIS CARLOS HIROKI MUTA:10039
Nº de Série do Certificado: 6E894C9821934059
Data e Hora: 23/08/2012 17:30:16



AGRAVO LEGAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0009188-75.2012.4.03.0000/MS
2012.03.00.009188-1/MS
RELATOR : Desembargador Federal CARLOS MUTA
AGRAVANTE : Estado do Mato Grosso do Sul
ADVOGADO : IVANILDO SILVA DA COSTA
AGRAVADA : DECISÃO DE FOLHAS
INTERESSADO : Uniao Federal (FAZENDA NACIONAL)
ADVOGADO : JULIO CÉSAR CASARI E CLAUDIA AKEMI OWADA
INTERESSADO : JOHNNY LUCAS DA SILVA FIGUEIREDO
ADVOGADO : FERNANDO PICANCO CABUSSU (Int.Pessoal)
: DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
ORIGEM : JUIZO FEDERAL DA 1 VARA DE CAMPO GRANDE > 1ªSSJ > MS
No. ORIG. : 00013762420124036000 1 Vr CAMPO GRANDE/MS

VOTO

Senhores Desembargadores, consta da decisão agravada (f. 161/8vº):



"Vistos etc.
Trata-se de agravo de instrumento contra antecipação de tutela, em ação ordinária, que determinou "que, no prazo de cinco dias, o Estado do Mato Grosso do Sul e o Município de Campo Grande -MS forneçam ao autor o medicamento denomiando "CLOFARABINE 20mg", conforme receita de fls. 16. Havendo notícia nos autos de problemas como regular fornecimento do medicamento por parte da Fazenda Pública desses entes federados, a União deverá ser intimada para que, no prazo de cinco dias, dê cumprimento à presente decisão", sob pena de multa diária no valor de R$ 1.000,00 (f. 135).
A demanda principal foi ajuizada sob a alegação de que (1) o autor é portador de "Leucemia Mielóide Aguda, com CID10: C-920" e está em tratamento oncológico, consoante laudo médico, anexado aos autos; (2) foram indicados no tratamento 40 frascos do medicamento "CLOFARABINE 20mg", para realização de 4 ciclos de quimioterapia; (3) já foram realizados inúmeros tratamentos, sem êxito, sendo que o fármaco em questão é o único capaz de evitar a progressão da doença, sendo que em caso de não uso o autor corre o risco de óbito; (4) tal medicamento não é fornecido pela Rede Pública de Saúde, é importado e de auto custo (R$ 396.000,00), sendo que a renda familiar do autor corresponde a R$ 1.300,00; (5) a Constituição Federal consagra como fundamento da República, em seu artigo 1º, III, a dignidade da pessoa humana e no caput do artigo 5º, garante à todos o direito à vida, que se encontra em risco, no caso concreto; (6) a Constituição Federal impõe, ainda, como prestação positiva do Estado, o acesso à saúde, previsto em seu artigo 196, e no artigo 198 lança as diretrizes que norteiam a atuação do Estado na efetivação do acesso ao serviço; e (7) o artigo 2º da Lei 8.080/90 prevê que "A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício" (f. 30).
Assim, a antecipação de tutela foi deferida nos seguintes termos (f. 134/5):
"Trata-se de pedido de antecipação dos efeitos da tutela, através do qual o autor busca o fornecimento, pelos réus, do medicamento "CLOFARABINE 20mg", na quantidade receitada por seu médico. Como causa de pedir, alega ser portador de Leucemia Mielóide Aguda Refratária, cujo tratamento indicado, na atual fase da doença, é feito através do referido medicamento. Alega não possuir condições financeiras para custear o tratamento e que a rede pública de saúde não fornece o aludido fármaco. Com a inicial vieram os documentos de fls. 8-24.Instados, os requeridos manifestaram-se acerca do pedido de antecipação de tutela (fls. 30-40 - Município de Campo Grande; 41-83 - Estado de Mato Grosso do Sul e 90-107 - União).É o relatório. Decido.Antes de tratar do pedido de tutela antecipada, faz-se necessário analisar a questão da legitimidade dos réus.A esse respeito, cumpre registrar que, diante da responsabilidade solidária dos entes federados em assegurar às pessoas desprovidas de recursos financeiros o acesso à medicação necessária ao controle das enfermidades de que sejam portadoras, os réus estão legitimados para figurar no pólo passivo da presente demanda. Aliás, é nesse sentido o entendimento pacífico da jurisprudência .Reconheço, assim, a legitimidade passiva dos réus e, consequentemente, a competência deste Juízo para processar e julgar a presente demanda. Passo à análise do pedido de antecipação dos efeitos da tutela.Vislumbro, nesta fase de cognição sumária, a plausibilidade do direito alegado pelo autor.O artigo 196 da Constituição Federal prevê que "a saúde é direito de todos e dever do Estado (...)". Da mesma forma, o artigo 2º da Lei n 8.080/90 dispõe que "a saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício".No caso dos autos, o Relatório Médico (fls. 17-19), os exames (fls. 20-21) e o receituário (fl. 16) encartados à inicial comprovam que o autor é portador de Leucemia Mielóide Aguda Refratária, e que necessita do medicamento "CLOFARABINE 20mg" para o tratamento complementar da doença que, indiscutivelmente, é grave. Além disso, restou comprovado que o autor e a sua família são hipossuficientes (fls. 10), e não têm condição econômica de comprar o referido medicamento, o qual não é fornecido pela rede pública, conforme atestado às fls. 22-24.É certo que os réus têm o dever de atender à pretensão do autor, em atenção ao princípio da dignidade da pessoa humana e do direito à vida e à saúde. Sobre o assunto, segue decisão do Superior Tribunal de Justiça (ROMS 17425, Relatora Min. Eliana Calmon):"ADMINISTRATIVO - MOLÉSTIA GRAVE - FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTO - DIREITO À VIDA E À SAÚDE - DEVER DO ESTADO - DIREITO LÍQUIDO E CERTO DO IMPETRANTE.1. Esta Corte tem reconhecido que os portadores de moléstias graves, que não tenham disponibilidade financeira para custear o seu tratamento, têm o direito de receber gratuitamente do Estado os medicamentos de comprovada necessidade. Precedentes.2. O direito à percepção de tais medicamentos decorre de garantias previstas na Constituição Federal, que vela pelo direito à vida (art. 5º, caput) e à saúde (art. 6º), competindo à União, Estados, Distrito Federal e Municípios o seu cuidado (art. 23, II), bem como a organização da seguridade social, garantindo a "universalidade da cobertura e do atendimento" (art. 194, parágrafo único, I).3. A Carta Magna também dispõe que "A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação" (art. 196), sendo que o "atendimento integral" é uma diretriz constitucional das ações e serviços públicos de saúde (art. 198).4. In casu, não havendo prova documental de que o remédio fornecido gratuitamente pela administração pública tenha a mesma aplicação médica que o prescrito ao impetrante - declarado hipossuficiente -, fica evidenciado o seu direito líquido e certo de receber do Estado o remédio pretendido.5. Recurso provido." (DJ de 22/11/2004 - pág. 00293).O receio de dano irreparável ou de difícil reparação também se mostra evidente, pois, segundo os documentos que instruem a inicial, o autor necessita da droga para o efetivo tratamento da doença e evitar, inclusive, risco de vida.Diante do exposto, defiro o pedido de antecipação dos efeitos da tutela para determinar que, no prazo de cinco dias, o Estado de Mato Grosso do Sul e o Município de Campo Grande-MS forneçam ao autor o medicamento denominado "CLOFARABINE 20mg", conforme receita de fls. 16. Havendo notícia nos autos de problemas com o regular fornecimento do medicamento por parte da Fazenda Pública desses entes federados, a União deverá ser intimada para que, no prazo de cinco dias, dê cumprimento à presente decisão.Fixo, nos termos do art. 461, 4º, do Código de Processo Civil, multa diária no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), para o caso de descumprimento da presente decisão por parte dos réus.Com a vinda das contestações, se for o caso, intime-se o autor para a réplica.Intimem-se. Cumpra-se, com urgência".
Contra tal decisão o presente agravo de instrumento, alegando, em suma, o ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL, que: (1) o autor fez pedido contrário à Lei 12.401/11 que está em pleno vigor e é constitucional, pelo que deve ser indeferido o pleito; tampouco, pode o relator deste recurso, julgá-lo monocraticamente, devendo, antes, declarar a inconstitucionalidade da referida lei, nos termos do artigo 97 da CF; (2) de acordo com os artigos 198, II da CF e 6º, I, d, da Lei 8.080/90, "a integralidade é um dos princípios estabelecidos legalmente para a efetiva concretização da política que orientou a criação do Sistema Único de Saúde - SUS" [...] "o sistema judicial brasileiro interpreta o princípio constitucional como um dever do Estado, independentemente de critérios clínicos e/ou orçamentários. No cenário atual, não é pequeno o volume de recursos que tem sido despendido por um grupo pequeno de indivíduos que se arriscam a enfrentar os trâmites judiciais para garantir o financiamento e acesso a uma terapêutica ou medicamento não predefinido na oferta planejada do SUS" [...] "visando por um parâmetro à questão, editou-se a Lei Federal nº 12.401, de 28/04/2011, que alterou a Lei Federal nº 8.080/90 (Lei Orgânica de Saúde, e consignou, dentre outras prescrições, o que seria 'assistência terapêutica integral para fins de saúde pública" [...] "trata-se de diploma normativo regularmente aprovado pelos representantes do povo brasileiro. Logo, tem legitimidade para definir que o SUS somente pode ser obrigado a fornecer os medicamentos/tratamentos padronizados pelo sistema público de saúde." (f. 04/6); (3) a impossibilidade de atendimento, pelo SUS, de pacientes que optaram pelo serviço privado de saúde, devendo ser observadas as disposições do artigo 28 do Decreto Federal nº 7.508/11, que regulamentou a Lei 8.080/90; (4) devem ser observados os conceitos de refratariedade e integralidade, destacando-se que "se o paciente quer receber assistência farmacêutica do SUS, deve ser tratado pelo SUS com médico deste sistema. Deste modo, o sistema pode ter acesso ao prontuário do paciente e saber se é verdadeira a afirmação do médico de que há refratariedade , conformando-se o quanto dito no atestado e na prescrição" (f. 09); (5) "premissa inescapável de toda e qualquer padronização é a não arbitrariedade. Para tanto somente devem ser padronizadas tecnologias avaliadas. Esta avaliação basicamente deve ser dar quanto aos aspectos clínicos quanto aos aspectos farmacoeconômicos" (f. 09); (6) o medicamento em questão não pode ser comercializado no Brasil, por não possuir registro na ANVISA, não havendo qualquer prova nos autos de que seja seguro ou eficaz; (7) a prescrição de medicamento não registrado na ANVISA, viola o artigo 124 do Código de Ética Médica, o parecer técnico 05/2007 do CRM/MS, a recomendação 31 do Conselho Nacional de Justiça e os artigos 10 e 12 da Lei 6.360/76; (8) a tutela pleiteada afronta a ordem econômica e orçamentária, por vir a somar-se com outras tantas que já foram concedidas, neste ano, comprometendo mais da metade do orçamento público, o que obriga o poder Executivo a deixar de atender as prioridades de gastos previstas na lei orçamentária; (9) não há justificativa jurídica para que somente o Estado e o Município tenham que arcar com o ônus do cumprimento da tutela antecipada; e (10) quanto à divisão de competências do SUS, deve ser adotada a subsidiariedade da competência, pela qual a responsabilidade é do Município, depois do Estado e por fim da União.
DECIDO.
A hipótese comporta julgamento na forma do artigo 557 do Código de Processo Civil.
Preliminarmente, cabe afastar a arguição de responsabilidade subsidiária, pois consagrada a jurisprudência no sentido da existência de responsabilidade solidária entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios quanto ao dever de fornecimento de medicamentos a pacientes portadores de moléstias consideradas graves.
A propósito, dentre outros, os seguintes precedentes:
RE 195.192, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, DJU 31.03.00: "MANDADO DE SEGURANÇA - ADEQUAÇÃO - INCISO LXIX, DO ARTIGO 5º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Uma vez assentado no acórdão proferido o concurso da primeira condição da ação mandamental - direito líquido e certo - descabe concluir pela transgressão ao inciso LXIX do artigo 5º da Constituição Federal. SAÚDE - AQUISIÇÃO E FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS - DOENÇA RARA. Incumbe ao Estado (gênero) proporcionar meios visando a alcançar a saúde, especialmente quando envolvida criança e adolescente. O Sistema Único de Saúde torna a responsabilidade linear alcançando a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios."
AGA 886.974, Rel. Min. OTÁVIO DE NORONHA, DJU 29.10.07: "ADMINISTRATIVO. SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS). FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERATIVOS. RECURSO QUE NÃO LOGRA INFIRMAR OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. 1. Sendo o Sistema Único de Saúde (SUS) composto pela União, Estados-Membros, Distrito Federal e Municípios, impõe-se o reconhecimento da responsabilidade solidária dos aludidos entes federativos, de modo que qualquer um deles tem legitimidade para figurar no pólo passivo das demandas que objetivam assegurar o acesso à medicação para pessoas desprovidas de recursos financeiros. 2. Mantém-se na íntegra a decisão agravada quando não infirmados seus fundamentos. 3. Agravo regimental improvido."
RESP 527.356, Rel. Min. ELIANA CALMON, DJU 15.08.05: "ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL - FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS - SUS - OFENSA AO ART. 535 DO CPC - INEXISTÊNCIA - RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERATIVOS - HONORÁRIOS DEVIDOS PELO ESTADO À DEFENSORIA PÚBLICA - JURISPRUDÊNCIA REVISTA PELA PRIMEIRA SEÇÃO - RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Em nosso sistema processual, o juiz não está adstrito aos fundamentos legais apontados pelas partes. Exige-se, apenas, que a decisão seja fundamentada, aplicando o magistrado ao caso concreto a legislação considerada pertinente. Inocorrência de violação ao art. 535 do CPC. 2. O funcionamento do Sistema Único de Saúde - SUS é de responsabilidade solidária da União, Estados-membros e Municípios, de modo que, qualquer dessas entidades têm legitimidade ad causam para figurar no pólo passivo de demanda que objetiva a garantia do acesso à medicação para pessoas desprovidas de recursos financeiros. 3. A Primeira Seção, julgando o REsp 596.836/RS por afetação da Segunda Turma, em decisão datada de 14/04/2004 e publicada em 02/08/2004, uniformizou o entendimento, no sentido de que a Defensoria Pública é órgão do Estado, motivo pelo qual não pode recolher honorários sucumbenciais decorrentes de condenação contra a Fazenda em causa patrocinada por Defensor Público. 4. Ressalva de entendimento pessoal. 5. Recurso especial parcialmente provido."
RESP 507.205, Rel. Min. JOSÉ DELGADO, DJU 17.11.03: "RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. OFENSA AO ART. 535, II, DO CPC. INEXISTÊNCIA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS PARA PESSOA CARENTE. LEGITIMIDADE DA UNIÃO, DO ESTADO E DO MUNICÍPIO PARA FIGURAREM NO PÓLO PASSIVO DA DEMANDA. 1. Inexiste ofensa ao art. 535, II, do CPC, quando as questões levadas ao conhecimento do Órgão Julgador foram por ele apreciadas. 2. Recurso no qual se discute a legitimidade passiva da União para figurar em feito cuja pretensão é o fornecimento de medicamentos imprescindíveis à manutenção de pessoa carente, portadora de atrofia cerebral gravíssima (ausência de atividade cerebral, coordenação motora e fala). 3. A Carta Magna de 1988 erige a saúde como um direito de todos e dever do Estado (art. 196). Daí, a seguinte conclusão: é obrigação do Estado, no sentido genérico (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), assegurar às pessoas desprovidas de recursos financeiros o acesso à medicação necessária para a cura de suas mazelas, em especial, as mais graves. 4. Sendo o SUS composto pela União, Estados e Municípios, impõe-se a solidariedade dos três entes federativos no pólo passivo da demanda 5. Recurso especial desprovido."
RESP 656.979, Rel. Min. CASTRO MEIRA, DJU 07.03.05: "ADMINISTRATIVO. MEDICAMENTO OU CONGÊNERE. PESSOA DESPROVIDA DE RECURSOS FINANCEIROS. FORNECIMENTO GRATUITO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DA UNIÃO, ESTADOS-MEMBROS, DISTRITO FEDERAL E MUNICÍPIOS. 1. Em sede de recurso especial, somente se cogita de questão federal, e não de matérias atinentes a direito estadual ou local, ainda mais quando desprovidas de conteúdo normativo. 2. Recurso no qual se discute a legitimidade passiva do Município para figurar em demanda judicial cuja pretensão é o fornecimento de prótese imprescindível à locomoção de pessoa carente, portadora de deficiência motora resultante de meningite bacteriana. 3. A Lei Federal n.º 8.080/90, com fundamento na Constituição da República, classifica a saúde como um direito de todos e dever do Estado. 4. É obrigação do Estado (União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios) assegurar às pessoas desprovidas de recursos financeiros o acesso à medicação ou congênere necessário à cura, controle ou abrandamento de suas enfermidades, sobretudo, as mais graves. 5. Sendo o SUS composto pela União, Estados-membros e Municípios, é de reconhecer-se, em função da solidariedade, a legitimidade passiva de quaisquer deles no pólo passivo da demanda. 6. Recurso especial improvido."
RESP 656.296, Rel. Min. FRANCISCO FALCÃO, DJU 29.11.04: "ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. TRATAMENTO MÉDICO. SUS. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. ART. 17 DA LEI ORGÂNICA DE SAÚDE. SÚMULAS Nºs 282 E 356 DO STF. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO CONFIGURADA. ACÓRDÃOS PARADIGMAS E JULGADO RECORRIDO DO MESMO TRIBUNAL. SÚMULA Nº 13/STJ. LEGITIMIDADE PASSIVA SOLIDÁRIA DO MUNICÍPIO, DO ESTADO E DA UNIÃO. ARTS. 196 E 198, § 1º, DA CF/88. FIXAÇÃO DA COMPETÊNCIA. MOMENTO DA PROPOSITURA DA AÇÃO. ART. 87 DO CPC. ANTECIPAÇÃO DA TUTELA. REQUISITOS. ART. 273 DO CPC. APRECIAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ. I - A matéria inserta no art. 17 da Lei Orgânica de Saúde carece do necessário prequestionamento, não tendo sido apreciada pelo Tribunal a quo, nem explícita nem implicitamente. Não tendo o recorrente oposto embargos declaratórios buscando declaração acerca da referida matéria, incidem na hipótese, as Súmulas n.ºs 282 e 356, do STF. II - É inviável a configuração da divergência jurisprudencial quando os acórdãos paradigmas colacionados são do mesmo Tribunal em que foi proferido o acórdão recorrido. Súmula nº 13/STJ. III - É da competência solidária entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios a responsabilidade pela prestação do serviço de saúde à população, sendo o Sistema Único de Saúde composto pelos referidos entes, conforme pode se depreender do disposto nos arts. 196 e 198, § 1º, da Constituição Federal. IV - A jurisprudência desta Corte encontra-se pacificada no sentido de que a competência é fixada no momento da propositura da ação, sendo que, ainda que o réu mude de domicílio, não há o deslocamento da competência, ex vi do teor do art. 87 do CPC. V - Na hipótese presente, a análise dos requisitos legais previstos no art. 273 do CPC conduz ao reexame dos fundamentos do conjunto fático-probatório contidos no decisum atacado, incidindo, na espécie, a Súmula n° 07 deste Tribunal. VI - Recurso especial parcialmente provido, para determinar a inclusão do Estado do Rio Grande do Sul no pólo passivo da demanda."
No mérito, encontra-se firmada a interpretação constitucional da matéria, no sentido da prevalência da garantia de tutela à saúde do cidadão hipossuficiente sobre eventual custo financeiro imposto ao Poder Público, pois o Sistema Único de Saúde - SUS deve prover os meios para o fornecimento de medicamento e tratamento que sejam necessários, segundo prescrição médica, a pacientes sem condições financeiras de custeio pessoal ou familiar, sem o que se afasta o Estado da sua concepção de tutela social, reconhecida e declarada pela Constituição de 1988.
Nesse sentido, os seguintes precedentes do Supremo Tribunal Federal:
AI-AgR 553.712, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, sessão de 19.05.09: "AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL. DIREITO À SAÚDE. MEDICAMENTOS. FORNECIMENTO A PACIENTES CARENTES. OBRIGAÇÃO DO ESTADO. I - O acórdão recorrido decidiu a questão dos autos com base na legislação processual que visa assegurar o cumprimento das decisões judiciais. Inadmissibilidade do RE, porquanto a ofensa à Constituição, se existente, seria indireta. II - A disciplina do art. 100 da CF cuida do regime especial dos precatórios, tendo aplicação somente nas hipóteses de execução de sentença condenatória, o que não é o caso dos autos. Inaplicável o dispositivo constitucional, não se verifica a apontada violação à Constituição Federal. III - Possibilidade de bloqueio de valores a fim de assegurar o fornecimento gratuito de medicamentos em favor de pessoas hipossuficientes. Precedentes. IV - Agravo regimental improvido."
AI-AgR 604949, Rel. Min. EROS GRAU, DJU 24.11/06: "AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS A PACIENTE HIPOSSUFICIENTE. OBRIGAÇÃO DO ESTADO. Paciente carente de recursos indispensáveis à aquisição dos medicamentos de que necessita. Obrigação do Estado em fornecê-los. Precedentes. Agravo regimental a que se nega provimento."
RE-AgR 271.286, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJU 24.11.00: "PACIENTE COM HIV/AIDS - PESSOA DESTITUÍDA DE RECURSOS FINANCEIROS - DIREITO À VIDA E À SAÚDE - FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS - DEVER CONSTITUCIONAL DO PODER PÚBLICO (CF, ARTS. 5º, CAPUT, E 196) - PRECEDENTES (STF) - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. O DIREITO À SAÚDE REPRESENTA CONSEQÜÊNCIA CONSTITUCIONAL INDISSOCIÁVEL DO DIREITO À VIDA. - O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República (art. 196). Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular - e implementar - políticas sociais e econômicas idôneas que visem a garantir, aos cidadãos, inclusive àqueles portadores do vírus HIV, o acesso universal e igualitário à assistência farmacêutica e médico-hospitalar. - O direito à saúde - além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas - representa conseqüência constitucional indissociável do direito à vida. O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional. A INTERPRETAÇÃO DA NORMA PROGRAMÁTICA NÃO PODE TRANSFORMÁ- LA EM PROMESSA CONSTITUCIONAL INCONSEQÜENTE. - O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política - que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado brasileiro - não pode converter-se em promessa constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado. DISTRIBUIÇÃO GRATUITA DE MEDICAMENTOS A PESSOAS CARENTES. - O reconhecimento judicial da validade jurídica de programas de distribuição gratuita de medicamentos a pessoas carentes, inclusive àquelas portadoras do vírus HIV/AIDS, dá efetividade a preceitos fundamentais da Constituição da República (arts. 5º, caput, e 196) e representa, na concreção do seu alcance, um gesto reverente e solidário de apreço à vida e à saúde das pessoas, especialmente daquelas que nada têm e nada possuem, a não ser a consciência de sua própria humanidade e de sua essencial dignidade. Precedentes do STF."
AI-AgR 238.328, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, DJU 18.02.00: "COMPETÊNCIA - AGRAVO DE INSTRUMENTO - TRÂNSITO DO EXTRAORDINÁRIO. A teor do disposto no § 2º do artigo 544 do Código de Processo Civil, cabe ao relator proferir decisão em agravo de instrumento interposto com a finalidade de alcançar o processamento do extraordinário. O crivo do Colegiado ocorre uma vez acionada a norma do artigo 545, também do Código de Processo Civil, no que previsto agravo inominado contra a decisão prolatada. SAÚDE - PROMOÇÃO - MEDICAMENTOS. O preceito do artigo 196 da Constituição Federal assegura aos necessitados o fornecimento, pelo Estado, dos medicamentos indispensáveis ao restabelecimento da saúde, especialmente quando em jogo doença contagiosa como é a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida."
RE-AgR 255.627, Rel. Min. NELSON JOBIM, DJU 23.02.01: "EMENTA: Saúde. Medicamentos. Fornecimento. Hipossuficiência do paciente. Obrigação do Estado. Regimental não provido."
RE-AgR 273.042, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, DJU 21.09.01: "CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. MEDICAMENTOS: FORNECIMENTO A PACIENTES CARENTES: OBRIGAÇÃO DO ESTADO. I. - Paciente carente de recursos indispensáveis à aquisição dos medicamentos de que necessita: obrigação do Estado em fornecê-los. Precedentes do S.T.F. II. - Negativa de seguimento ao RE. Agravo não provido."
O Superior Tribunal de Justiça firmou precedentes no mesmo sentido:
AGRESP 1.136.549, Rel. Min. HUMBERTO MARTINS, DJE 21/06/2010: "ADMINISTRATIVO - CONTROLE JUDICIAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS - POSSIBILIDADE EM CASOS EXCEPCIONAIS - DIREITO À SAÚDE - FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS - MANIFESTA NECESSIDADE - OBRIGAÇÃO DO PODER PÚBLICO - AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES - NÃO OPONIBILIDADE DA RESERVA DO POSSÍVEL AO MÍNIMO EXISTENCIAL. 1. Não podem os direitos sociais ficar condicionados à boa vontade do Administrador, sendo de fundamental importância que o Judiciário atue como órgão controlador da atividade administrativa. Seria uma distorção pensar que o princípio da separação dos poderes, originalmente concebido com o escopo de garantia dos direitos fundamentais, pudesse ser utilizado justamente como óbice à realização dos direitos sociais, igualmente fundamentais. 2. Tratando-se de direito fundamental, incluso no conceito de mínimo existencial, inexistirá empecilho jurídico para que o Judiciário estabeleça a inclusão de determinada política pública nos planos orçamentários do ente político, mormente quando não houver comprovação objetiva da incapacidade econômico-financeira da pessoa estatal. 3. In casu, não há empecilho jurídico para que a ação, que visa a assegurar o fornecimento de medicamentos, seja dirigida contra o município, tendo em vista a consolidada jurisprudência desta Corte, no sentido de que "o funcionamento do Sistema Único de Saúde (SUS) é de responsabilidade solidária da União, Estados-membros e Municípios, de modo que qualquer dessas entidades têm legitimidade ad causam para figurar no pólo passivo de demanda que objetiva a garantia do acesso à medicação para pessoas desprovidas de recursos financeiros" (REsp 771.537/RJ, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, DJ 3.10.2005). Agravo regimental improvido."
RESP 658.323, Rel. Min. LUIZ FUX, DJU 21.03.05: "RECURSO ESPECIAL. SUS. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. PACIENTE COM HEPATITE C . DIREITO À VIDA E À SAÚDE. DEVER DO ESTADO. UNIÃO. LEGITIMIDADE. 1. Ação objetivando a condenação da entidade pública ao fornecimento gratuito dos medicamentos necessários ao tratamento de Hepatite C. 2. O Sistema Único de Saúde-SUS visa a integralidade da assistência à saúde, seja individual ou coletiva, devendo atender aos que dela necessitem em qualquer grau de complexidade, de modo que, restando comprovado o acometimento do indivíduo ou de um grupo por determinada moléstia, necessitando de determinado medicamento para debelá-la, este deve ser fornecido, de modo a atender ao princípio maior, que é a garantia à vida digna. 3. Configurada a necessidade do recorrente de ver atendida a sua pretensão posto legítima e constitucionalmente garantida, uma vez assegurado o direito à saúde e, em última instância, à vida. A saúde, como de sabença, é direito de todos e dever do Estado. 4. A União é parte legítima para figurar no pólo passivo nas demandas cuja pretensão é o fornecimento de medicamentos imprescindíveis à saúde de pessoa carente. 5. Recurso especial desprovido."
ROMS 17.425, Rel. Min. ELIANA CALMON, DJU 22.11.04: "ADMINISTRATIVO - MOLÉSTIA GRAVE - FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTO - DIREITO À VIDA E À SAÚDE - DEVER DO ESTADO - DIREITO LÍQUIDO E CERTO DO IMPETRANTE. 1. Esta Corte tem reconhecido que os portadores de moléstias graves, que não tenham disponibilidade financeira para custear o seu tratamento, têm o direito de receber gratuitamente do Estado os medicamentos de comprovada necessidade. Precedentes. 2. O direito à percepção de tais medicamentos decorre de garantias previstas na Constituição Federal, que vela pelo direito à vida (art. 5º, caput) e à saúde (art. 6º), competindo à União, Estados, Distrito Federal e Municípios o seu cuidado (art. 23, II), bem como a organização da seguridade social, garantindo a "universalidade da cobertura e do atendimento" (art. 194, parágrafo único, I). 3. A Carta Magna também dispõe que "A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação" (art. 196), sendo que o "atendimento integral" é uma diretriz constitucional das ações e serviços públicos de saúde (art. 198). 4. In casu, não havendo prova documental de que o remédio fornecido gratuitamente pela administração pública tenha a mesma aplicação médica que o prescrito ao impetrante - declarado hipossuficiente -, fica evidenciado o seu direito líquido e certo de receber do Estado o remédio pretendido. 5. Recurso provido."
A Turma reconheceu a supremacia de tal direito fundamental, como revela, entre outros, o acórdão, de que fui relator, proferido no julgamento do AG nº 2004.03.00.041755-8, sessão de 19.10.05:
"DIREITO PROCESSUAL CIVIL. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. SUS. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. PATOLOGIA GRAVE. HIPOSSUFICIENTE. DIREITO CONSTITUCIONAL À VIDA DIGNA E À SAÚDE. PROTEÇÃO SUMÁRIA DO BEM JURÍDICO DE MAIOR VALOR. PRECEDENTES. 1. Embora apenas em juízo cognitivo sumário, cabe apreciar para o fim de rejeitar a preliminar de ilegitimidade passiva da agravante, em face da ação originária, pois firmada a interpretação, pela jurisprudência adotada, de que as obrigações do SUS podem ser cobradas por qualquer dos entes que o integram, em regime de solidariedade, assim, pois, da UNIÃO FEDERAL, ESTADO ou MUNICÍPIO, isolada ou concorrentemente. 2. No mais, cabe salientar que, no exame da medida requerida, o que se teve como preponderante, acima do interesse econômico, orçamentário e administrativo, do ente público onerado, foi o direito social à saúde, invocado em favor da autora que, para controle e tratamento de doença grave, necessita de medicamento especial, de custo além de suas posses, e não fornecido, voluntária e gratuitamente, pelo Poder Público. 3. A irreversibilidade da medida não é questão a ser definida, em cálculo ou peso comum, quando em disputa valor jurídico e social que, em muito supera, qualquer risco ou dano de eventual reconhecimento, ao final, da improcedência do pedido. Nem mesmo a tese da licitação, cuja legislação conhece hipóteses de dispensa e inexigibilidade, pode impor-se em circunstâncias tão especiais, de perigo de vida ou à saúde. Cabe ao Poder Público garantir a saúde, de forma gratuita aos que dela necessitem, e provendo tratamentos e medicamentos, que não se limitam aos disponíveis segundo os critérios da Administração, senão que de acordo com a comprovada necessidade do hipossuficiente, e ainda segundo as prescrições médicas de cada caso concreto, ficando relegada ao julgamento do mérito a discussão de eventuais controvérsias técnicas, em termos de adequação ou eficiência dos meios de cura ou melhoria da saúde do paciente, se, como no caso, tenha sido a prescrição médica fornecida como meio emergencial de tutela da condição digna de vida. 4. A multa diária, cominação decorrente de lei, por violação da obrigação de fazer, é igualmente aplicável ao Poder Público, cuja prerrogativa de precatório não impede a imposição da sanção pecuniária, cuja execução, esta sim, deve observar, porém, o devido processo legal. 5. Precedentes: agravo de instrumento desprovido, e agravo regimental prejudicado."
Assim igualmente decidiram outras Turmas desta Corte:
AI 2010.03.00032307-2, Rel. Des. Fed. MARLI FERREIRA, DJF3 03/03/201: "AGRAVO DE INSTRUMENTO - FORNECIMENTO DIRETO DE MEDICAÇÃO NECESSÁRIA AO TRATAMENTO DE BENEFICIÁRIOS DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE - SUS. LEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO. 1 - Compete ao Estado a garantia da saúde mediante a execução de política de prevenção e assistência à saúde, com a disponibilização dos serviços públicos de atendimento à população, tendo a Constituição Federal delegado ao Poder Público competência para editar leis objetivando a regulamentação, fiscalização e controle dos serviços e ações da saúde. 2 - Há expressa disposição constitucional sobre o dever de participação da União no financiamento do Sistema Único de Saúde, nos termos do art. 198, parágrafo único, da Constituição Federal. 3 - A autora, ora agravada, é portadora de carcinoma de células renais, em estágio clínico de metástases ósseas, tendo realizado cirurgia de nefrectomia direita no dia 30.08.10. 4 - Em face do alto custo do medicamento indicado para o tratamento, e não tendo a agravada condições de comprá-los, socorreu-se da via judicial. 5 - Os medicamentos solicitados pela agravada mostram-se de suma importância para sua sobrevivência em condições dignas, porquanto a melhora de seu estado geral de saúde depende atualmente dessas ações profiláticas. 6 - Negar à agravada o fornecimento pretendido implica desrespeito às normas constitucionais que garantem o direito à saúde e à vida. 7 - Agravo de instrumento desprovido."
AI 2008.03.00005908-8, Rel. Des. Fed. REGINA COSTA, DJF3 06/12/2010: "PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO ORDINÁRIA. ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO EM DOSES SEMANAIS. ILEGITIMIDADE PASSIVA. MEDICAMENTO SOLICITADO POSSUI UM CUSTO ELEVADO. EFEITO SUSPENSIVO NEGADO. MANUTENÇÃO DA SITUAÇÃO FÁTICA. I - Hipótese em que foi negado o efeito suspensivo visando afastar a decisão que concedeu a antecipação dos efeitos da tutela, para determinar ao Estado do Mato Grosso do Sul e ao Município de Campo Grande-MS, no prazo de 5 (cinco) dias, o fornecimento ao Autor, portador de mucopolissacaridose do tipo II, o fornecimento do medicamento indicado para o seu tratamento, em doses semanais de forma contínua, bem como determinou a intimação da União Federal, para que dê cumprimento à decisão, na hipótese de existência de problemas no regular fornecimento do medicamento, por parte da Fazenda Pública dos entes federados, tendo em vista a presença dos pressupostos para a concessão da medida nos autos originários. II - Afastada a alegação de ilegitimidade passiva do Agravante, haja vista caber ao Poder Público, obrigatoriamente, zelar pela saúde de todos, não cabendo a nenhum dos entes políticos eximir-se de tal preceito. III - Inexistência de elementos novos capazes de modificar o entendimento adotado por esta Relatora no momento em que proferida a decisão acerca do pedido de efeito suspensivo ativo. IV - Agravo de instrumento improvido."
Na espécie, houve receita indicando a necessidade do medicamento e sua adequação ao tratamento (f. 41/2), além do relatório médico trazendo razões objetivas da indicação: "Após ter completado 4 ciclos de quimioterapia com o protocolo IDAFLAG, Johnny apresentou nova recidiva da doença necessitando fazer novos ciclos de quimioterapia com novo protocolo de tratamento utilizando a medicação CLOFARABINE 40 FRASCOS DE 20 MG. Esta medicação está sendo utilizada há vários anos em outros países para tratamento de Leucemia Mielóide Aguda recidivada, conforme artigo científico anexado. Johnny Lucas está na fila de espera para realizar transplante de Medula Óssea. O transplante só será realizado se ele estiver novamente sem doença na medula" (f. 45), o que é, associado às demais provas coligidas, relevante e suficiente para impor a obrigação de fornecimento ao Poder Público, mesmo porque hipossuficiente o agravante, diante do custo do produto, e inexistente comprovação de abuso, fraude ou ilegalidade na prescrição por profissional, que subscreveu sob a responsabilidade legal de seu grau e que responde, pois, pelo tratamento indicado, e eventual irregularidade, se vier a ser apurada.
As alegações de que o pedido viola a Lei 12.401/11, por não fazer o medicamento parte do rol de produtos e procedimentos padronizados do sistema público; da impossibilidade de atendimento, pelo SUS, de pacientes que optaram pelo serviço privado de saúde; falta de registro do medicamento na ANVISA; tais questões e restrições são dirigidas e aplicáveis à Administração Pública, em si, a qual não pode proceder, por sua própria iniciativa, de forma diversa, o que, no entanto, não exclui o direito subjetivo de postular, em Juízo, medicamento ou tratamento essencial à respectiva saúde ou vida.
Acerca de temas como a afronta à ordem econômico-orçamentária, e demais relacionadas, não podem ser acolhidas diante da farta jurisprudência e comprovada configuração do direito do agravante à tutela judicial específica que se requereu para fornecimento de medicamento essencial à garantia da respectiva saúde.
Ante o exposto, com esteio no artigo 557 do Código de Processo Civil, nego seguimento ao recurso."


Como se observa, a decisão agravada foi fartamente motivada, com exame de aspectos fáticos do caso concreto e aplicação da legislação específica e jurisprudência consolidada, sendo que o agravo inominado apenas reiterou o que havia sido antes deduzido, e já enfrentado e vencido no julgamento monocrático, não restando, portanto, espaço para a reforma postulada.


Ante o exposto, nego provimento ao agravo inominado.


CARLOS MUTA
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): LUIS CARLOS HIROKI MUTA:10039
Nº de Série do Certificado: 6E894C9821934059
Data e Hora: 23/08/2012 17:30:12