D.E. Publicado em 12/11/2012 |
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EMENTA
PENAL - PROCESSUAL PENAL - RECURSO EM SENTIDO ESTRITO CONTRA DECISÃO QUE NÃO RECEBEU A DENÚNCIA - CRIME DE SONEGAÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA - LESÃO AOS COFRES PÚBLICOS - TIPIFICAÇÃO PROVISÓRIA INDICADA NA DENÚNCIA - IMPOSSIBILIDADE NA FASE DO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA - JULGAMENTO ANTECIPADO DO MÉRITO DA AÇÃO PENAL - NÃO PREVISÃO NO SISTEMA PROCESSUAL PENAL - INDEPENDÊNCIA DAS INSTÂNCIAS ADMINISTRATIVA E PENAL - COMPROVAÇÃO OU NÃO DO DOLO SOMENTE APÓS O TÉRMINO DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL PENAL - MATERIALIDADE DELITIVA COMPROVADA - INDÍCIOS DE AUTORIA - DENÚNCIA RECEBIDA - RECURSO PROVIDO - DECISÃO REFORMADA.
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ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes os acima indicados, ACORDAM os Desembargadores da Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da Terceira Região, nos termos do relatório e voto da Senhora Relatora, constantes dos autos, e na conformidade da ata de julgamento, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado, por unanimidade, em dar provimento ao recurso ministerial, para, presente a justa causa para a ação penal, receber a denúncia de fls. 324/325 proposta em face do denunciado FRANZ ACKERMANN, devendo os autos retornar ao Juízo de origem para prosseguimento da ação penal.
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VOTO-VISTA
Pedi vista dos autos para melhor aquilatar a fundamentação da r. decisão que rejeitou a denúncia em face de ausência de justa causa para a ação penal, com fulcro no art. 395, inciso III, do Código de Processo Penal.
Consignou o MM. Juiz que o débito correspondente à LCD nº 35.826.331-0 foi objeto de parcelamento e, em parte, pago no período de 10/7/2005 e 20/9/2007, consubstanciado na importância de R$ 335.139,45, sendo que o valor originário totalizado por diversas rubricas era de R$ 494.612,38.
Considerou o Magistrado que a acusação contida na denúncia diz respeito apenas às contribuições sobre o pro labore e as remunerações pagas a autônomos, contidas na mesma LCD, num total de R$26.992,53, bem como que o débito, globalmente considerado, estaria acobertado por aquele pagamento.
Ainda que assim não se entendesse, diante da inviabilidade de se saber qual parte foi considerada como quitada, já que as parcelas não discriminam a que título são, houve por bem rejeitar a denúncia, apoiado ainda no entendimento de que o valor da sonegação previdenciária seria pequeno (R$26.992,53) em comparação com o montante da dívida, a ensejar a aplicação dos princípios da insignificância e favor rei.
Acenou, por fim, com a possibilidade de o Estado receber o que resta da dívida por intermédio de processo de execução fiscal, não se justificando atuação no Direito Penal.
A eminente Desembargadora Federal Ramza Tartuce deu provimento ao recurso para receber a denúncia substancialmente em razão da comprovação da materialidade delitiva e indícios de autoria e teceu considerações sobre juízo hipotético de impossibilidade de discriminar a dívida, independência das esferas civil e criminal, cerceamento do direito da acusação e in dubio pro societate que vigora quando do oferecimento da denúncia.
Analisando os elementos constantes dos autos, tenho que razão assiste à eminente Desembargadora relatora.
Por primeiro, verifico que o débito apurado ultrapassa o montante de R$20.000,00 (vinte mil reais), valor que a Fazenda Pública considera como sendo suscetível de inscrição na dívida ativa para fins de execução fiscal.
Para além disso, a rejeição de denúncia não pode estar embasada em elementos hipotéticos. Se dúvida há em torno da abrangência do pagamento, tal fato não se presta a ceifar, desde logo, a pretensão acusatória, mister sendo necessária a real apuração do quanto sonegado e pago, o que somente seria esclarecido com o decorrer da instrução processual.
No caso dos autos, a par demonstração da materialidade delitiva e indícios de autoria, a denúncia atende os requisitos formais previstos no art. 41, do CPP, com a presença das sete circunstâncias: quem?, quando?, onde?, por quê meios?, que?, por quê?, de que modo?:"Quis", "Quando", "Ubi", "Quibus auxiliis", "Quid", "Cur" e "Quomodo".
O que se vê no caso dos autos é que a rejeição da inicial equivaleu a absolvição sumária, sem a presença dos requisitos elencados no art. 397 do Código de Processo Penal: a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato, a existência manifesta de causa excludente de culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade, que o fato evidentemente não constitui crime e quando extinta a punibilidade do agente.
Note-se que a absolvição requer medida que somente advém de certeza que extrai da mens legis, ao se reportar a norma às palavras manifesta e evidente, de modo que ao intéprete resta o entendimento de haver justa causa para a ação penal quando tal não se dá.
Por fim, anoto que no juízo de prelibação não é possível coarctar o direito da acusação de obter a apreciação da pretensão punitiva, sob pena de haver o fim prematuro do processo com um contraditório incipiente, devendo nessa ocasião prevalecer o princípio in dubio pro societatis.
Com essas considerações, acompanho o voto da eminente relatora.
É como voto.
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RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL RAMZA TARTUCE:
Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público Federal contra a decisão proferida pelo MM. Juiz Federal da 6ª Vara de Santos - SP, que rejeitou a denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal contra FRANZ ACKERMANN, por ausência de justa causa, nos termos do artigo 395, III do Código de Processo Penal.
Consta da denúncia que:
Às fls. 327/330, o MM Juiz de primeiro grau rejeitou a inicial acusatória, sob os seguintes argumentos:
a)- A LCD n.º 35.826.331-0, citada na denúncia, foi objeto de parcelamento, com pagamentos entre 10.07.2005 e 20.09.2007, tendo o denunciado pago a importância de R$ 335.139,45 do valor original de R$ 494.612,38.
b)- O valor do débito que caracterizaria a sonegação previdenciária é de R$ 26.992,53, sendo inviável a distinção da parte do débito que já estaria quitada, já que as parcelas não discriminam quais rubricas estão sendo objeto do pagamento.
c)- É forçoso reconhecer que há fundada dúvida sobre a existência do débito descrito na denúncia, sendo de aplicação o princípio do favor rei.
d)- Como grande parte do débito já foi paga e a parte não paga vai ser objeto de inscrição em dívida ativa, invoca o princípio da intervenção mínima, não se justificando aqui a intervenção do Direito Penal.
Inconformado, o Ministério Público Federal pugnou pela reforma da decisão monocrática, argumentando, em apertada síntese que:
a)- Na peça exordial acusatória encontram-se todas as condições de procedibilidade da ação penal, quais sejam: possibilidade jurídica do pedido, interesse de agir e legitimidade.
b)- Há indícios da materialidade e autoria delitivas.
c)- A denúncia não padece de qualquer vício formal ou processual, eis que delineia com precisão tanto o ilícito penal quanto a materialidade delitiva, pautada em provas coligidas durante o inquérito policial e o processo administrativo.
d)- O valor amortizado é grande, mas o subsistente ultrapassa 60 (sessenta) salários mínimos, deixando claro que não se trata de questão que não mereça a atenção do direito penal.
e)- A punibilidade para o crime se extingue com o pagamento integral do débito previdenciário, o que não ocorreu no presente caso. O valor só pode ser considerado pequeno se comparado com o valor inicialmente devido pelo réu.
f)- Alega, por fim, que o valor de R$ 27.000,00 (vinte e sete mil reais) traduz-se em valor extremamente alto para o nosso país, cabendo ao Judiciário não permitir que interpretações desta natureza levem a conclusões errôneas por parte da sociedade civil quanto a fatos da mesma natureza (fls. 333/335).
Em contra-razões, a defesa dos acusados (fls. 342/349), requereu a manutenção da decisão recorrida.
A decisão restou mantida em sede de juízo de retratação (fl. 350).
Após, subiram os autos a esta E. Corte, onde a douta Representante do Ministério Público Federal opinou pelo provimento do recurso, alegando que não ocorreu o pagamento integral do débito por parte do réu, não havendo como aceitar a argumentação do Douto Magistrado, invoca a inaplicabilidade do princípio in dúbio pro reu neste momento processual e, por fim, diz não ser aplicável, ao presente caso, o princípio da insignificância (fls. 351/357).
Dispensada a revisão, na forma regimental.
É O RELATÓRIO.
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VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL RAMZA TARTUCE:
A denúncia ofertada às fls. 324/325 atende aos requisitos previstos no artigo 41 do Código de Processo Penal. E não se vislumbra qualquer uma das hipóteses do artigo 43 do Código de Processo Penal, a justificar a rejeição da inicial acusatória.
O MM. Juiz "a quo" rejeitou a denúncia, entendendo que, em relação ao denunciado FRANZ ACKERMANN, não haveria justa causa para a ação penal, tendo em vista o pagamento de grande parte da dívida que lastreia a acusação e a impossibilidade de individualização dos valores, não se justificando o processo penal em respeito ao princípio da intervenção mínima (fls. 327/330).
Entendo que não agiu com acerto o magistrado, senão vejamos.
A rejeição sumária da denúncia, com base apenas em eventual impossibilidade de se discriminar as dívidas que poderiam constituir fato criminoso, sem se ter dado início à instrução criminal, equivale a uma absolvição sem processo, configurando verdadeiro julgamento antecipado da lide, sem permitir que a acusação produza provas em juízo, em violação aos princípios constitucionais de acesso à jurisdição e do contraditório - art. 5º, incisos XXV e LV da Lei Maior.
Ademais, é preciso consignar que, em um juízo hipotético, mesmo que o recorrido obtenha êxito na busca da absolvição criminal, com base no artigo 386, III, do Código de Processo Penal, ainda assim não conseguiria afastar a execução fiscal, o que só ocorreria se a decisão absolutória viesse embasada nos incisos I ou V, do artigo 386 do Código de Processo Penal, ou seja, a decisão teria que reconhecer a inexistência do fato ou de sua autoria. Na verdade, no Direito Penal só se pune por fato tipificado como crime, corolário lógico do Princípio da Legalidade (art. 1º do Código Penal e art. 5º, inciso XXXIX da Carta Magna).
E, por derradeiro, o ato punitivo na esfera administrativa, que tem por base o ilícito administrativo, difere do ato punitivo penal, que visa reprimir o ilícito criminal. Assim, nenhum efeito a decisão proferida na esfera administrativa poderá produzir nestes autos, dada a autonomia das instâncias administrativa e penal, o que permite a aplicação da sanção penal, independentemente do desfecho do processo administrativo.
Ressalto que apenas há comunicabilidade e influência da decisão penal na esfera administrativa, como dito, quando da ocorrência da sentença penal absolutória com supedâneo legal nos incisos I e V do Código de Processo Penal (inexistência do fato e negativa da autoria), sendo que o contrário não poderá ocorrer, ou seja, a decisão administrativa nenhuma influência pode exercer no processo criminal.
Neste sentido, colaciono a lição da professora Maria Sylvia Zanella Di Pietro:
Destarte, constatada a presença de provas da materialidade delitiva (ocorrência do fato típico e ilícito), e havendo indícios suficientes de sua autoria, outra não poderia ser a providência do magistrado, que não a de receber a denúncia, em homenagem ao princípio que vige nesse momento processual, in dubio pro societate, até porque não se apresenta nítida qualquer excludente de tipicidade, de ilicitude, ou mesmo de culpabilidade.
A decisão proferida pelo magistrado, de rejeição da denúncia, representa verdadeiro cerceamento do direito de acusação de que é dotado o órgão ministerial.
Nesse sentido, temos os seguintes julgados, cujas ementas transcrevo abaixo:
Assim sendo, presente a justa causa para a ação penal, é imperioso o recebimento da inicial acusatória, permitindo-se que o parquet, durante a instrução penal, possa produzir as provas visando demonstrar a materialidade e a autoria do delito.
Diante do exposto, dou provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público Federal para, presente a justa causa para a ação penal, receber a denúncia de fls. 324/325 proposta em face do denunciado FRANZ ACKERMANN, devendo os autos retornar ao Juízo de origem para prosseguimento da ação penal.
É COMO VOTO.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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