Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 24/09/2012
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0003618-86.2008.4.03.6002/MS
2008.60.02.003618-6/MS
RELATOR : Juiz Convocado MÁRCIO MESQUITA
APELANTE : ANTONIO BATISTA LIMA JUNIOR
: RAIMUNDO DE SOUZA VIEIRA reu preso
ADVOGADO : LUIZ DUARTE RAMOS e outro
APELADO : Justica Publica

EMENTA

PENAL. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUÍZ: INOCORRÊNCIA. DESCAMINHO: ATIPICIDADE DA CONDUTA. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. CONTRABANDO: IMPORTAÇÃO DE MUNIÇÃO, SEM AUTORIZAÇÃO DA AUTORIDADE COMPETENTE: MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS. DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA DO ARTIGO 18 PARA O ARTIGO 14 DA LEI 10.826/2003: IMPOSSIBILIDADE.
1. Cm a mudança no sistema processual penal brasileiro, por meio da Lei n º 11.719/2008, passou a vigorar, no âmbito do processo penal, o princípio da identidade física do juiz, consubstanciada no artigo 399, §2º, do Código de Processo Penal, que deve ser aplicado analogicamente com o artigo 132 do Código de Processo Civil.
2. Não viola o princípio da identidade física do juiz a prolação de sentença por outro juiz em razão das férias do juiz que presidiu a instrução. Precedentes da Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região.
3. Os acusados foram denunciados e condenados como incursos na pena do artigo 334 do Código Penal, em concurso material com as penas do artigo 18 da Lei 10.826/2003.
4. O valor dos tributos devidos em razão da importação das mercadorias apreendidas é inferior a R$ 20.000,00 (vinte mil reais). O valor dos tributos sonegados, para fins de aplicação do princípio da insignificância, deve ser determinado na forma do artigo 65 da Lei 10.833/2003. Precedentes da Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região.
5. Reconhecida a ausência de lesividade à bem jurídico relevante e aplicar à espécie o princípio da insignificância. O crime é de bagatela e a incidência do princípio da insignificância leva à atipicidade fática. Precedentes. Ressalva do ponto de vista pessoal do Relator.

6. Aplicabilidade do princípio da insignificância, independente das circunstâncias de caráter pessoal, como a habitualidade delitiva. Ressalva do ponto de vista pessoal do Relator.
7. Quanto ao crime do artigo 18 da Lei nº 10.826/2003, a materialidade delitiva restou demonstrada pelo termo de exibição e apreensão, laudo de exame pericial e pelo tratamento tributário da Receita Federal, que apontam que foi apreendido em poder dos réus uma caixa de uma caixa de munição de uso permitido contendo 50 cartuchos .25 da marca Águila, "de procedência de fabricação mexicana.
8. A autoria delitiva em relação ao corréu ANTONIO sequer foi questionada em sede de apelação. De qualquer forma, restou comprovada pelos depoimentos das testemunhas, que confirmaram a apreensão da munição no veículo de ANTONIO. Este, em seu interrogatório, admitiu que adquiriu a munição, com finalidade de revenda.
10. A autoria delitiva em relação ao corréu RAIMUNDO também encontra-se demonstrada pelas provas produzidas nos autos, sob o crivo do contraditório e ampla defesa. Todos os depoimentos foram uníssonos no sentido de que o apelante RAIMUNDO atuava como "batedor" do corréu ANTONIO, para garantir que este chegasse com as mercadorias em seu destino.
11. Os depoimentos prestados por agentes policiais têm valor probatório igual ao de qualquer outra testemunha. A condição de policial não torna a testemunha impedida ou suspeita. O substrato da sentença condenatória não se cingiu às declarações dos agentes da polícia militar, mas se amparou em depoimentos outros, inclusive nos depoimentos dos próprios acusados.
12. Comprovado que o acusado internou a munição do Paraguai, mostra-se descabido o pedido de desclassificação da conduta do artigo 18 para o artigo 14 da Lei 10.826/03.
13. Apelação parcialmente provida.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, ACORDAM os integrantes da Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar e, no mérito, dar parcial provimento à apelação para absolver os réus da imputação da prática do crime tipificado no artigo 334 do Código Penal, com fundamento no artigo 386, inciso III do Código de Processo Penal, minorando a pena de cada réu para quatro anos de reclusão, no regime inicial aberto, e dez dias-multa, no valor unitário mínimo, substituída a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, nos termos acima especificados; e determinar a expedição de alvará de soltura clausulado em favor do corréu RAIMUNDO DE SOUZA VIEIRA, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.



São Paulo, 11 de setembro de 2012.
MARCIO MESQUITA
Juiz Federal Convocado


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0003618-86.2008.4.03.6002/MS
2008.60.02.003618-6/MS
RELATOR : Juiz Federal Convocado MARCIO MESQUITA
APELANTE : ANTONIO BATISTA LIMA JUNIOR
: RAIMUNDO DE SOUZA VIEIRA reu preso
ADVOGADO : LUIZ DUARTE RAMOS e outro
APELADO : Justica Publica

RELATÓRIO

O Juiz Federal Convocado Márcio Mesquita (Relator):


O Ministério Público Federal, em 19.08.2008, denunciou ANTÔNIO BATISTA LIMA JUNIOR e RAIMUNDO DE SOUZA VIEIRA, qualificados nos autos, nascidos aos 17.10.1986 e 03.05.1970, respectivamente, como incursos no artigo 18, da Lei 10.826/2003, em concurso material como o artigo 334, "caput", do Código Penal, c.c. artigo 29, do mesmo diploma legal. Consta da denúncia:


No dia 30 de julho de 2008, por volta das 17h30min, na rodovia MS 379, próximo ao local conhecido como "Curral do Arame", município de Dourados/MS, os denunciados ANTÔNIO BATISTA LIMA JUNIOR e RAIMUNDO DE SOUZA VIEIRA foram presos em flagrante delito porque, dolosamente e cientes da ilicitude e reprovabilidade de suas condutas, em comunhão de esforços e unidade de desígnios, importaram 01 (uma) caixa de munições para arma de fogo, de uso permitido, sem autorização da autoridade competente e em desacordo com determinação legal e regulamentar.
Nas mesmas condições de tempo e lugar, os denunciados ainda foram flagrados importando, dolosamente e cientes da ilicitude e reprovabilidade de suas condutas, em comunhão de esforços e unidade de desígnios, 679 (seiscentos e setenta e nove) pacotes de cigarros, provenientes do Paraguai, em desacordo com a legislação aduaneira vigente, iludindo o pagamento do tributo devido pela entrada da mercadoria no país e lesando o erário.
A prisão foi efetuada por uma equipe do Departamento de Operações de Fronteira (DOF) que, em fiscalização de rotina, abordou o veículo VW/Polo, de cor verde, Placas HSA8636 de Campo Grande, conduzido por RAIMUNDO DE SOUZA VIEIRA, que ao ser questionado pelos policiais sobre a origem e destino de sua viagem, forneceu informações desencontradas, bem como deixou transparecer extremo nervosismo.
Nesse ínterim, a equipe policial abordou o veículo Fiat/Pálio, vermelho, placas HSA6152 de Nova Andradina/MS, conduzido por ANTÔNIO BATISTA DE LIMA JUNIOR. Os policiais, ao procederem minuciosa vistoria no veículo, encontraram no banco traseiro e porta-malas 679 (seiscentos e setenta e nove) pacotes de cigarros das mais diversas marcas, e debaixo da alavanca do freio de mão, 01 (uma) caixa de munições, contendo 50 (cinqüenta) cartuchos, calibre .25, da marca Águila.
Questionado sobre as munições e cigarros encontrados, o denunciado ANTÔNIO admitiu que lhe pertenciam, informando que adquiriu as mercadorias em Pedro Juan Caballero/PY, e tencionava revendê-las na cidade de Dourados/MS. Relatou ainda que o também denunciado RAIMUNDO seguia à sua frente, "batendo a estrada" para que ele chegasse ao destino com segurança.
Ao serem interrogados pela Autoridade Policial, os réus nada informaram de relevante, exercitando o direito de permanecerem calados.
Contudo, além da narrativa de ANTÔNIO, quando da entrevista preliminar aos policiais do Departamento de Operações de Fronteira (DOF), no sentido de que RAIMUNDO batia a estrada, outro indício de que ambos agiam em concurso de agentes, está na certidão de fls. 58/IPL, na qual fica cabalmente comprovado que os denunciados não só se conhecem, como também mantêm estreitos laços de amizade.

A denúncia foi recebida em 20.08.2008 (fls. 91).


Foi deferida a liberdade provisória, sem fiança, ao acusado ANTÔNIO (fls. 127).

Após instrução, sobreveio sentença da lavra da MM. Juíza Federal Katia Cilene Balugar Firmino e publicada em 24.10.2008 (fls. 239/256) condenando o réu ANTÔNIO BATISTA LIMA, à pena de 1 (um) ano de reclusão, como incurso no artigo 334 "caput" do CP, e à pena de 4 (quatro) anos de reclusão, e 10 (dez) dias-multa, cada um fixado em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à data do fato, como incurso no artigo 18 da Lei 10.826/2003, fixado o regime inicial semi-aberto, negada a substituição por penas restritivas de direito, e concedido o direito de apelar em liberdade; e condenando o réu RAIMUNDO DE SOUZA VIEIRA à pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão, como incurso no artigo 334 "caput" do CP, e à pena de 4 (quatro) anos de reclusão, e 10 (dez) dias-multa, cada um fixado em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à data do fato, como incurso no artigo 18 da Lei 10.826/2003, fixado o regime inicial semi-aberto, e negados a substituição por penas restritivas de direito e o direito de apelar em liberdade


Apelam os réus (fls. 273/295) requerendo sua absolvição pleiteando, preliminarmente, nulidade da sentença por ofensa ao princípio constitucional da identidade física do juiz. No mérito, sustentam que: não há prova alguma nos autos de que os réus teriam praticado as condutas a eles imputadas, exceto a confissão do réu ANTÔNIO que admitiu ser ele o proprietário de toda a mercadoria apreendida; a sentença foi fundamentada somente no depoimento dos policiais, sem considerar que o réu ANTÔNIO, na fase policial, exerceu seu direito de permanecer calado, e, na fase judicial, em momento algum admitiu ter adquirido a munição no Paraguai, tampouco admitiu a participação do réu RAIMUNDO; exceto pelo depoimento dos policiais, não há nos autos qualquer prova testemunhal no sentido de que ANTÔNIO teria adquirido a munição no Paraguai, ou que tivesse havido a participação de RAIMUNDO no fato delituoso; há contradição entre os depoimentos das testemunhas de acusação quanto à verificação da existência de chamada telefônica no celular de ANTÔNIO para RAIMUNDO, além do que inexiste laudo pericial ou documento a confirmar tal alegação; os autos foram instruídos com declarações de pessoas idôneas às quais afirmam que RAIMUNDO estava na cidade de Laguna Caarapã, e que é proprietário de máquinas retroescavadeira com a qual presta serviços naquela região; nas referidas declarações consta que RAIMUNDO esteve hospedado no Hotel Quinzão, na cidade de Laguna Caarapã, no período de 29 a 30.07.2008, em razão de estar consertando uma máquina retroescavadeira nas dependências do hotel; a testemunha César Augusto Arquerlei confirmou em juízo que tinha ido ao hotel no dia 29.07.2008 levar a RAIMUNDO peças de reposição para conserto da retroescavadeira quebrada; houve contradição no depoimento das testemunhas de acusação, bem como deve ser analisada com reservas o depoimento de policiais; meros indícios não são suficientes para a condenação do acusado, devendo-se interpretar a dúvida em seu favor, aplicando-se o princípio do in dubio pro reo; o juiz sentenciante usou o silêncio dos réus na fase policial como argumento para sua condenação, o que é vedado pelo ordenamento jurídico pátrio. Subsidiariamente, aduzem que não há provas nos autos de que a munição foi trazida do Paraguai, de forma que o réu ANTÔNIO deve responder pela conduta tipificada no art. 14, da Lei 10.826/03; e que se mantida a condenação as penas devem ser fixadas no patamar mínimo.

A sentença transitou em julgado para a acusação em 03.11.2008 (fls. 307).

Contrarrazões do MPF às fls. 322/332 pelo desprovimento da apelação da defesa.

A Procuradoria Regional da República, em parecer da lavra da Dra. Luiza Cristina Fonseca Frischeisen, opinou pelo desprovimento da apelação (fls. 340/346).


É o relatório.

Ao MM. Revisor.






MARCIO MESQUITA
Juiz Federal Convocado


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0003618-86.2008.4.03.6002/MS
2008.60.02.003618-6/MS
RELATOR : Juiz Federal Convocado MARCIO MESQUITA
APELANTE : ANTONIO BATISTA LIMA JUNIOR
: RAIMUNDO DE SOUZA VIEIRA reu preso
ADVOGADO : LUIZ DUARTE RAMOS e outro
APELADO : Justica Publica

VOTO


O Juiz Federal Convocado MÁRCIO MESQUITA (Relator):


Rejeito a preliminar de nulidade da sentença por ofensa ao princípio da identidade física do juiz. Com efeito, é certo que, com a mudança no sistema processual penal brasileiro, por meio da Lei n º 11.719/2008, passou a vigorar, no âmbito do processo penal, o princípio da identidade física do juiz, consubstanciada no artigo 399, §2º, do Código de Processo Penal, segundo o qual "o juiz que presidiu a instrução deverá proferir a sentença".

Tal dispositivo deve ser aplicado analogicamente com o artigo 132 do Código de Processo Civil, que prevê as exceções quando o magistrado "estiver convocado, licenciado, afastado por qualquer motivo, promovido ou aposentado".

O caso dos autos se amolda na exceção prevista no artigo 132 do Código de Processo Civil, pois, conforme certidão de fls. 333 dos autos, o MM. Juiz Federal Substituto da 2ª Vara Federal de Dourados, Dr. Fábio Rubem David Müzel, esteve em gozo de férias no período de 16/10/2008 a 14/11/2008, sendo que nesta ocasião foi proferida a sentença apelada pela MM. Juíza Federal titular, Dra. Katia Cilene Balugar Firmino.

No sentido de que não viola o princípio da identidade física do juiz a prolação de sentença por outro juiz em razão das férias do juiz que presidiu a instrução situa-se o entendimento desta Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, v.g.:


APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES. CANNABIS SATIVA LINNEU. TRANSNACIONALIDADE DO DELITO. NULIDADE PROCESSUAL. RÉU INDEFESO. ARTIGO 399, §2º DO CÓDIGO PENAL. PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ... V - Não violação do princípio da identidade física do juiz, consubstanciado no artigo 399, § 2º, do Código de Processo Penal, eis que fundamentada a atuação do magistrado que não participou da instrução processual diante das férias do titular...
TRF 3ª Região, 1ª Turma, AC 00145172820074036181, Rel. Des.Fed. José Lunardelli, j. 25/10/2011, DJe 16/11/2011

Quanto ao crime do artigo 334 do Código Penal, observo que os acusados foram denunciados e condenados como incursos na pena do artigo 334 do Código Penal, em concurso material com as penas do artigo 18 da Lei 10.826/2003.

No caso dos autos, as provas demonstram que as mercadorias apreendidas são cigarros produzidos no estrangeiro (origem estrangeira, de fabricação de indústria paraguaia) e uma caixa de munição de uso permitido (de procedência de fabricação de indústria mexicana), consoante laudo de fl. 69 e ofício da Receita Federal de fls. 117/121.

No tocante à internação dos cigarros, os fatos amoldam-se à tipificação do crime de descaminho.

Com relação aos cigarros, é preciso distinguir a importação de cigarro produzido no Brasil que se destina exclusivamente à exportação - é dizer, de importação proibida - e a importação de cigarro estrangeiro, sem o pagamento de tributos devidos com a internação.

O primeiro fato - importação de cigarro produzido no Brasil e destinado exclusivamente à exportação - sujeita-se à tipificação legal do artigo 334 do Código Penal, na modalidade contrabando. O segundo fato - importação de cigarro de origem estrangeira, sem o pagamento de tributos devidos com a internação - amolda-se à tipificação legal do artigo 334 do Código Penal, na modalidade descaminho.

O Termo de Exibição e Apreensão aponta que foram apreendidos 679 pacotes de cigarros.

A Delegacia da Receita Federal do Brasil de Dourados informou (fls. 118/121) que os cigarros de origem estrangeira estão sujeitos ao II - Imposto de Importação à alíquota de 20% (vinte por cento), e IPI - Imposto sobre Produtos Industrializados à alíquota específica de R$ 0,619 por vintena do produto. Discriminou ainda os valores dos tributos devidos (II ="" 1.358,00 e IPI ="" 4.203,01) (cfr. fl. 120), no valor total de R$ 5.561,01.

Acresce-se que o artigo 105, inciso X, do Decreto-lei 37/1966 estabelece que "aplica-se a pena de perda da mercadoria: estrangeira, exposta à venda, depositada ou em circulação comercial no país, se não for feita prova de sua importação regular".

E o artigo 65 da Lei 10.833/2003 dispõe que "a Secretaria da Receita Federal poderá adotar nomenclatura simplificada para a classificação de mercadorias apreendidas, na lavratura do correspondente auto de infração para a aplicação da pena de perdimento, bem como aplicar alíquotas de 50% (cinqüenta por cento) sobre o valor arbitrado dessas mercadorias, para o cálculo do valor estimado do Imposto de Importação e do Imposto sobre Produtos Industrializados que seriam devidos na importação, para efeito de controle patrimonial, elaboração de estatísticas, formalização de processo administrativo fiscal e representação fiscal para fins penais".

Portanto, é de se concluir que, no caso dos autos, o valor dos tributos devidos em razão da importação das mercadorias apreendidas é inferior a R$ 20.000,00 (vinte mil reais).

No sentido de que o valor dos tributos sonegados, para fins de aplicação do princípio da insignificância, deve ser determinado na forma do artigo 65 da Lei 10.833/2003 situa-se o entendimento desta Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região:


PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. MPF. DESCAMINHO. INSIGNIFICÂNCIA PENAL. CARGA TRIBUTÁRIA SONEGADA. LEI Nº 10.865/2004. LEI Nº 10.833/2003. NÃO INCIDÊNCIA DE PIS, CONFINS E ICMS. IMPOSTOS DE IMPORTAÇÃO E SOBRE PRODUTO INDUSTRIALIZADO. VALOR INFERIOR AO PASSÍVEL DE EXIGÊNCIA JUDICIAL. CONDUTA ATÍPICA. RECURSO DESPROVIDO. 1. Recurso da acusação contra sentença que desconsiderou o valor do ICMS, tomando por base o valor dos tributos federais sonegados, II, IPI, PIS e COFINS, para absolver sumariamente o réu do crime de descaminho, pela aplicação do princípio da insignificância. 2. O artigo 334 do Código Penal - que não admite interpretação extensiva nem analógica, senão in bonam partem - estabelece que seja punida a sonegação de imposto devido pela entrada clandestina de mercadoria de procedência estrangeira. Tratando-se de introdução de mercadoria alienígena não proibida, a carga tributária devida à União é composta pelo Imposto de Importação (II), cujo fato gerador é a entrada do produto estrangeiro no território nacional (artigo 19 do CTN); e pelo Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), derivado do desembaraço aduaneiro do artigo de origem estrangeira (artigo 46, I, do CTN). 3. O COFINS/importação e o PIS/importação, instituídos pela Lei nº 10.865/2004, além de pertencerem à classe das contribuições, são indiferentes no âmbito criminal para se estimar o valor dos tributos evadidos no descaminho, considerando que o discurso do artigo 334 do Código Penal criminaliza somente a sonegação de ...imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo da mercadoria... Acrescente-se que consoante a Lei nº 10.865/2004 - que rege as estruturas tributárias do COFINS/importação e do PIS/importação - tais contribuições não incidem sobre ...bens estrangeiros que tenham sido objeto de pena de perdimento... (artigo 2°, III). Sucede que no crime de descaminho a regra é o decreto de perdimento, de modo que a estimativa fiscal da carga tributária para fins de representação criminal não pode levar em conta aquelas contribuições, sob pena de infração ao princípio da estrita legalidade. 4. Ainda, no caso de perdimento, o artigo 65 da Lei nº 10.833/2003 estabelece que a Receita Federal pode aplicar alíquota de 50% sobre o valor arbitrado das mercadorias apreendidas, para o cálculo do valor estimado dos impostos de importação (II) e sobre produtos industrializados (IPI), que seriam devidos na internação regular, para efeitos de controle patrimonial, elaboração de estatísticas, formalização de processo administrativo fiscal e representação fiscal para fins penais. 5. O ICMS não incide no cálculo porque o fato gerador desse imposto estadual é o desembaraço aduaneiro (STF, Súmula n° 661), inexistente quando a introdução é irregular e a mercadoria é apreendida e submissa a perdimento. 6. A tese defendida pela acusação, acerca do cálculo do tributo sonegado pelo réu, não possui validação jurídica. Saliente-se que nem mesmo a sentença de primeiro grau tomou por base a estimativa adequada, uma vez que incorporou ao quantum os valores do PIS e do COFINS. 7. Levando-se em conta - apenas - o valor do II (R$ 2.692,80) e do IPI (R$ 3.516,40), verifica-se que a carga tributária sonegada pelo réu equivale a R$ 6.209,20 e, portanto, é inferior à expressão monetária que as autoridades tributárias entendem como passível de exigência pela via judicial, R$ 10.000,00. 8. Conduta do réu materialmente atípica pela insignificância da lesão ao bem jurídico tutelado 9. Recurso a que se nega provimento.
TRF 3ª Região, 1ª Turma, ACR 2010.61.81.008369-9, Rel Des. Fed. Johonsom di Salvo, j. 27/09/2011, DJe 04/10/2011 p.47

Com a ressalva do meu ponto de vista pessoal, adoto a orientação jurisprudencial predominante para reconhecer, no presente caso, a ausência de lesividade à bem jurídico relevante e aplicar à espécie o princípio da insignificância.

A Lei 10.522/2002, em seu artigo 20, com a redação dada pela Lei nº 11.033/2004, afastou a execução de débitos fiscais de valor igual ou inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais), demonstrando a falta de interesse fiscal da Administração Publica relativo a tributos que não ultrapassem este limite monetário:


Art. 20. Serão arquivados, sem baixa na distribuição, mediante requerimento do Procurador da Fazenda Nacional, os autos de execuções fiscais de débitos inscritos como Dívida Ativa da União pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional ou por ela cobrados, de valor consolidado igual ou inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais).

E a Portaria MF nº 75, de 22/03/2012, majorou o valor anteriormente fixado para R$ 20.000,00 ( vinte mil reais ):


Art.1º. Determinar:
I- a não inscrição na Dívida Ativa da União de débito de um mesmo devedor contra a Fazenda Nacional de valor consolidado igual ou inferior a R$ 1.000,00 (mil reais);
II- o não ajuizamento de execuções fiscais de débitos com a Fazenda Nacional, cujo valor consolidado seja igual ou inferior a R$ 20.000,00 ( vinte mil reais ).

Logo, o crime é de bagatela e a incidência do princípio da insignificância leva à atipicidade fática. Nesse sentido, destaco os seguintes precedentes do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça e desta Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região:


HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL. PENAL E PROCESSUAL PENAL. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. PACIENTE PROCESSADO PELA INFRAÇÃO DO ART. 334, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL (DESCAMINHO). ALEGAÇÃO DE INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. EXISTÊNCIA DE PRECEDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FAVORÁVEL À TESE DA IMPETRAÇÃO. HABEAS CORPUS CONCEDIDO PARA DETERMINAR O TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. 1. O descaminho praticado pelo Paciente não resultou em dano ou perigo concreto relevante, de modo a lesionar ou colocar em perigo o bem jurídico reclamado pelo princípio da ofensividade. Tal fato não tem importância relevante na seara penal, pois, apesar de haver lesão a bem juridicamente tutelado pela norma penal, incide, na espécie, o princípio da insignificância, que reduz o âmbito de proibição aparente da tipicidade legal e, por consequência, torna atípico o fato denunciado. 2. A análise quanto à incidência, ou não, do princípio da insignificância na espécie deve considerar o valor objetivamente fixado pela Administração Pública para o arquivamento, sem baixa na distribuição, dos autos das ações fiscais de débitos inscritos como Dívida Ativa da União (art. 20 da Lei n. 10.522/02), que hoje equivale à quantia de R$ 10.000,00, e não o valor relativo ao cancelamento do crédito fiscal (art. 18 da Lei n. 10.522/02), equivalente a R$ 100,00. 3. É manifesta a ausência de justa causa para a propositura da ação penal contra o ora Paciente. Não há se subestimar a natureza subsidiária, fragmentária do Direito Penal, que só deve ser acionado quando os outros ramos do direito não sejam suficientes para a proteção dos bens jurídicos envolvidos. 4. Ordem concedida.
STF, 1a Turma, HC 96309/RS, Rel.Min. Cármen Lúcia, j. 24/03/2009, DJe 24/03/2009
DIREITO PENAL. HABEAS CORPUS. CRIME DE DESCAMINHO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICABILIDADE. VALOR SONEGADO INFERIOR AO FIXADO NO ART. 20 DA LEI Nº 10.522/02. ATIPICIDADE DA CONDUTA. ORDEM CONCEDIDA. 1. A questão de direito tratada neste writ, consoante a tese exposta pela impetrante na petição inicial, é a suposta atipicidade da conduta realizada pela paciente com base no princípio da insignificância. 2. No caso concreto, a paciente foi denunciada por transportar mercadorias de procedência estrangeira sem pagar quaisquer impostos, o que acarretou a sonegação de tributos no valor de R$ 1.715,99 (mil setecentos e quinze reais e noventa e nove centavos). 3. O art. 20 da Lei nº 10.522/02 determina o arquivamento das execuções fiscais, sem baixa na distribuição, quando os débitos inscritos como dívida ativa da União forem iguais ou inferiores a R$ 10.000,00 (valor modificado pela Lei nº 11.033/04). 4. Esta colenda Segunda Turma tem precedentes no sentido de que falta justa causa para a ação penal por crime de descaminho quando a quantia sonegada não ultrapassar o valor previsto no art. 20 da Lei nº 10.522/02. 5. Ante o exposto, concedo a ordem de habeas corpus.
STF, 2a Turma, HC 96374/PR, Rel.Min. Ellen Gracie, j. 31/03/2009, DJe 23.04.2009
RECURSO ESPECIAL REPETITIVO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 105, III, A E C DA CF/88. PENAL. ART. 334, § 1º, ALÍNEAS C E D, DOCÓDIGO PENAL. DESCAMINHO. TIPICIDADE. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. I - Segundo jurisprudência firmada no âmbito do Pretório Excelso - 1ª e 2ª Turmas - incide o princípio da insignificância aos débitos tributários que não ultrapassem o limite de R$ 10.000,00 (dez mil reais), a teor do disposto no art. 20 da Lei nº 10.522/02. II - Muito embora esta não seja a orientação majoritária desta Corte (vide EREsp 966077/GO, 3ª Seção, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe de 20/08/2009), mas em prol da otimização do sistema, e buscando evitar uma sucessiva interposição de recursos ao c. Supremo Tribunal Federal, em sintonia com os objetivos da Lei nº 11.672/08, é de ser seguido, na matéria, o escólio jurisprudencial da Suprema Corte. Recurso especial desprovido.
STJ, 3ª Seção, REsp 1112748/TO, Rel.Min. Felix Fischer, j. 09/09/2009, DJe 13/10/2009
PENAL E PROCESSO PENAL. ARTIGO 1°, INCISOS I E IV, DA LEI Nº. 8.137/90. VALOR DO TRIBUTO SONEGADO. LEI 10522/02 E PORTARIA MF 75, DE 22/03/2012. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICABILIDADE. RECURSOS PROVIDOS SOB FUNDAMENTO DIVERSO. 1. Apelantes condenados pela prática do crime descrito no artigo 1º, incisos I e IV, da Lei nº 8.137/90 c.c. o artigo 29 do Código Penal. 2. De acordo com a denúncia a fraude empregada resultou no lançamento tributário no valor de R$11.061,80 ( onze mil, sessenta e um reais, oitenta centavos). 3. O princípio da insignificância , como corolário do princípio da pequenez ofensiva inserto no artigo 98, inciso I, da Constituição Federal, estabelece que o Direito Penal, pela adequação típica do fato à norma incriminadora, somente intervenha nos casos de lesão de certa gravidade, atestando a atipicidade penal nas hipóteses de delitos de lesão mínima, que ensejam resultado diminuto ( de minimis non curat praetor). 4. Para fins de aplicação da teoria da bagatela, o artigo 20, caput, da Lei n.º 10.522/2002, com a redação dada pela Lei n.º 11.033/2004, autoriza o arquivamento dos autos da execução fiscal, sem baixa na distribuição, quando o valor devido for de até R$ 10.000,00 (dez mil reais). 5. Mais recentemente foi publicada no D.O.U de 29 de março de 2012, a Portaria MF nº 75, de 22 de março de 2012, que elevou o patamar outrora estabelecido para R$ 20.000,00 ( vinte mil reais). 6. O valor do crédito tributário, como consignado na denúncia, perfaz a cifra de R$ R$11.061,80 ( onze mil, sessenta e um reais, oitenta centavos), sendo plenamente aplicável o princípio da insignificância . 7. Se é admissível aplicar o princípio da insignificância ao descaminho, e se o valor de paradigma é exatamente esse, com mais forte razão se deve considerar penalmente irrelevante a conduta da sonegação, eis que, naquela outra, à supressão do tributo se soma a introdução clandestina da mercadoria em território nacional, de maneira que o crime não aconteceria apenas contra o patrimônio do fisco, mas também contra a administração fiscalizadora. 8. Recursos providos para, embora sob fundamento diverso, absolver os réus com fulcro no artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal.
TRF 3ª Região, 1ª Turma, ACR 0012528-69.2003.4.03.6102, Rel. Des.Fed. José Lunardelli, j. 07/08/2012, DJFe 15/08/2012

Adoto, também com ressalva de meu ponto de vista pessoal, o entendimento jurisprudencial dominante no sentido da aplicabilidade do princípio da insignificância, independente das circunstâncias de caráter pessoal, como a habitualidade delitiva:


RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PENAL. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA RECONHECIDO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM E NÃO APLICADO PELA CONTUMÁCIA DO RÉU. ARTIGO 334, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL. HABEAS CORPUS CONCEDIDO DE OFÍCIO. PRECEDENTES... 2. Recorrente condenado pela infração do artigo 334, caput, do Código Penal (descaminho). Princípio da insignificância reconhecido pelo Tribunal de origem, em razão da pouca expressão econômica do valor dos tributos iludidos, mas não aplicado ao caso em exame porque o réu, ora apelante, possuía registro de antecedentes criminais. 3. Habeas corpus de ofício. Para a incidência do princípio da insignificância só devem ser considerados aspectos objetivos da infração praticada. Reconhecer a existência de bagatela no fato praticado significa dizer que o fato não tem relevância para o Direito Penal. Circunstâncias de ordem subjetiva, como a existência de registro de antecedentes criminais, não podem obstar ao julgador a aplicação do instituto. 4. Concessão de habeas corpus, de ofício, para reconhecer a atipicidade do fato narrado na denúncia, cassar o decreto condenatório expedido pelo Tribunal Regional Federal e determinar o trancamento da ação penal existente contra o recorrente.
STF, 2a Turma, RE 514531/RS, Rel.Min. Joaquim Barbosa, j. 21/10/2008, DJe 05/03/2009
Recurso extraordinário em matéria criminal. Ausência de prequestionamento. Princípio da insignificância. Habeas corpus de ofício. 1. Não se admite o recurso extraordinário quando a questão constitucional cuja ofensa se alega não foi expressamente debatida no Tribunal de origem. Incidência das Súmulas nº 282 e 356/STF. 2. Nos termos da jurisprudência da Corte Suprema, o princípio da insignificância é reconhecido, sendo capaz de tornar atípico o fato denunciado, não sendo adequado considerar circunstâncias alheias às do delito para afastá-lo. 3. No cenário dos autos, não parece razoável concluir, com base em dois episódios, que o réu faça da prática do descaminho o seu modo de vida. 4. Habeas corpus concedido de ofício para cassar o título judicial condenatório formado contra o réu.
STF, 1a Turma, RE 550761/RS, Rel.Min. Menezes Direito, j. 27/11/2007, DJe 31/01/2008
PENAL. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. DESCAMINHO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. LEI N. 10.522/02, ART. 20. CRÉDITO TRIBUTÁRIO NÃO SUPERIOR A R$10.000,00. APLICABILIDADE.1. O delito de descaminho não se resolve exclusivamente no campo tributário, pois tutela também a atividade administrativa concernente à internação de mercadorias estrangeiras no País. Por essa razão, penso que o princípio da insignificância deve ser aplicado com reservas, pois a matéria transcende o aspecto pecuniário da infração. Ocorre que o Supremo Tribunal Federal fixou o entendimento de ser aplicável o princípio da insignificância ao delito de descaminho quando o valor do débito tributário não exceder a R$10.000,00 (dez mil reais), dado que a Lei n. 10.522/02, art. 20, estabelece que serão arquivados, sem baixa na distribuição, as execuções fiscais de valor igual ou inferior a esse montante. Por essa razão, o Superior Tribunal de Justiça veio a editar precedente nos termos da Lei n. 11.672/08 para o efeito de se ajustar àquela orientação jurisprudencial (STF, 1ª Turma, RHC n. 96.545, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 16.06.09; 2ª Turma, HC n. 96.374, Rel. Min. Ellen Gracie, j. 31.03.09; STJ, REsp n. 1.112.748, Rel. Min. Felix Fischer, j. 09.09.09). 3. Sem embargo de entendimento em sentido contrário, uma vez reconhecida a aplicabilidade do princípio da insignificância, este concerne ao fato, não ao agente. A circunstância de o agente ter antecedentes ou perpetrar conduta delitiva posteriormente ao fato não é elemento apto a tornar relevante ou irrelevante a conduta para efeito de tipificação: um contumaz delinqüente, por assim dizer, pode eventualmente realizar conduta desprovida de significado penal. Do contrário, haveria nítida ofensa ao princípio da presunção da inocência, pois a condenação decorre menos do fato cometido e mais do passado do agente. Por tais motivos, reputo pertinente o entendimento já externado pelo Supremo Tribunal Federal (RE n. 514.531, Rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 21.10.08 e AI n. 559904, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 07.06.05). 3. Embargos infringentes conhecidos e providos.
TRF 3ª Região, 1ª Seção, EIFNU 2002.61.11.002007-6, Rel. Des.Fed. André Nekatschalow, j. 20/05/2010, DJe 12/07/2010


Por estas razões, é de concluir que pela atipicidade da conduta em relação ao crime do artigo 334 do Código Penal.


Quanto ao crime do artigo 18 da Lei nº 10.826/2003, a apelação não comporta provimento.

A materialidade delitiva restou demonstrada pelo termo de exibição e apreensão (fl. 33), laudo de exame pericial (fls. 68/73) e pelo tratamento tributário da Receita Federal (fls. 118/121), que apontam que foi apreendido em poder dos réus uma caixa de uma caixa de munição de uso permitido contendo 50 cartuchos .25 da marca Águila, "de procedência de fabricação Indústria Mexicana".

A autoria delitiva em relação ao corréu ANTONIO sequer foi questionada em sede de apelação. De qualquer forma, observo que restou comprovada pelos depoimentos das testesmunhas, que confirmaram a apreensão da munição no veículo de ANTONIO. Este, em seu interrogatório, admitiu que adquiriu a munição, com finalidade de revenda.

A autoria delitiva em relação ao corréu RAIMUNDO também encontra-se demonstrada pelas provas produzidas nos autos, sob o crivo do contraditório e ampla defesa.

Segundo a denúncia, o acusado RAIMUNDO atuava como "batedor", conduzindo seu veículo à frente do acusado ANTÔNIO, que trazia as mercadorias adquiridas no Paraguai.

Embora RAIMUNDO tenha negado a sua participação no delito, seu depoimento apresentou contradições, além de estar dissociado do conjunto probatório.

Na fase policial, inquirido a respeito dos fatos narrados na denúncia, o acusado RAIMUNDO permaneceu calado (fls. 13/14). Interrogado na fase judicial, alegou desconhecer que o corréu ANTONIO transportava cigarros e munições, confirmando apenas tê-lo encontrado em Laguna Carapã/MS, enquanto estava consertando uma maquina retroescavadeira (fl. 203):

Diz que no momento em que estava consertando sua maquina no dia da prisão, o acusado Antonio passou em Laguna Carapã conversou com o interrogando e foi embora. Diz que não sabia que o acusado estava transportando cigarros e munições. Diz que não tem nenhuma relação com cigarros e munições. Diz que não sabe explicar por qual razão o veículo do denunciado Antonio estava atrás do veículo do interrogando.

Não se mostra verossímil versão dada pelo acusado RAIMUNDO na fase judicial. Com efeito, as circunstâncias em que o réu RAIMUNDO foi preso, permitem concluir que trafegava à frente de seu comparsa ANTONIO "batendo a estrada" com o intuito de garantir que ele chegasse em seu destino com segurança. Acresça-se o fato de se conhecerem, pois ANTONIO reside no imóvel pertencente ao sogro de RAIMUNDO.

Acrescente-se o teor dos depoimentos dos policiais prestados nas fases policial e judicial, que foram unânimes no sentido de que RAIMUNDO atuava como batedor do comparsa ANTONIO:


Antonio Batista Lima Junior confirmou ser o proprietário dos cigarros e das munições, que as adquiriu em Pedro Juan Caballero/PY para revender na cidade de Dourados/MS e que Raimundo de Souza Vieira seguia na frente batendo a estrada para que ele chegasse ao destino com segurança (depoimento prestado pelo policial militar João José dos Santos na fase policial, fls. 4/5)

(...) Antonio Batista Lima Junior confessou que era proprietário dos cigarros e da munição encontrada, disse que adquiriu tanto os cigarros quanto a munição em Pedro Juan Caballero/PY para revender na cidade de Dourados/MS e que Raimundo de Souza Vieira viajava na frente batendo estrada para que ele chegasse no destino com segurança (...) (depoimento do policial militar Anderson de Azevedo Rosa Reis na fase policial, fls. 7/8)
Antonio Batista Lima Junior disse aos policiais que era proprietário dos cigarros e da munição encontrada, e que comprou tanto os cigarros quanto a munição no Paraguai para revender em Dourados/MS; Disse ainda que Raimundo de Souza Vieira, que conduzia o VW/Polo, viajava na frente batendo estrada para que ele chegasse em segurança com a mercadoria. (depoimento prestado pelo policial militar Antonio Messias da Silva na fase policial, fls. 09/10)
Diz que reconhece os denunciados presentes na audiência. Diz que fez a abordagem do veículo conduzido pelo denunciado Raimundo. Diz que logo depois foi feita a abordagem do veículo conduzido pelo denunciado Antonio. Diz que o denunciado Antonio confessou que o "batedor" era o veiculo da frente conduzido pelo acusado Raimundo. (...) (depoimento da testemunha de acusação Antonio Messias da Silva em Juízo, fl. 196)
Diz que reconhece os denunciados presentes nesta audiência. Diz que abordou inicialmente o veículo conduzido pelo denunciado Raimundo, que demonstrou nervosismo. Diz que logo na sequencia abordou o veiculo conduzido pelo denunciado Antonio. Diz que o acusado Antonio confessou que o denunciado Raimundo era "batedor". Diz que constatou que o acusado Raimundo telefonou para o denunciado Antonio. Diz que o delegado do DOF foi quem constatou a existência do telefonema de um denunciado para o outro (...). (depoimento da testemunha de acusação João Jose dos Santos, em Juízo, fl. 197/198).

Ainda que as testemunhas de defesa de RAIMUNDO tenham confirmado que o acusado estava na cidade de Laguna Carapã na data dos fatos consertando sua máquina retroescavadeira e se hospedado no hotel local, tais circunstâncias não infirmam a alegação de que atuou como "batedor" do corréu ANTONIO, com o intuito de assegurar a consumação do crime.

As alegadas contradições apontadas pela Defesa nos depoimentos dos policiais não excluem a certeza necessária para a condenação. Não obstante os depoimentos tenham divergido quanto à quantidade de cigarros apreendidos e qual corréu ligou para o outro, é compreensível devido ao tempo decorrido e a quantidade de fiscalização e apreensões que os policiais realizam naquela região.

Ademais, conforme mencionado acima, todos os depoimentos foram uníssonos no sentido de que o apelante RAIMUNDO atuava como "batedor" do corréu ANTONIO, para garantir que este chegasse com as mercadorias em seu destino.

Ao contrário do que alegam os apelantes, os depoimentos prestados por agentes policiais têm valor probatório igual ao de qualquer outra testemunha. Verifica-se, in casu, quão coesas e uníssonas são as declarações dos policiais. Idôneos os referidos depoimentos e, porque coerentes e não desmentidos pelo restante da prova, são suficientes para embasar o decreto condenatório. A condição de policial não torna a testemunha impedida ou suspeita.

Ademais, o substrato da sentença condenatória não se cingiu às declarações dos agentes da polícia militar, mas se amparou em depoimentos outros, inclusive nos depoimentos dos próprios acusados.

Assim, não procede a alegação de insuficiência de provas para a condenação.

Não procede o pedido de desclassificação da conduta do artigo 18 para o artigo 14 da Lei 10.826/03. Interrogado na fase judicial, o acusado Antonio afirmou ter adquirido as munições em Laguna Carapã de um rapaz desconhecido (fls. 201/202):

...Diz que comprou cigarro em Pedro Juan Caballero/PY e iria revender numa banca de camelô que possuía perto da rodoviária em Dourados. Diz que quando saiu de Pedro Juan Caballero passou em Laguna Carapã e parou numa lanchonete para tomar um refrigerante. Diz que quando saiu da lanchonete um rapaz desconhecido ofereceu munições para que o interrogando as adquirisse. Diz que comprou as munições por R$ 40,00,uma vez que achou o preço barato e pensou que poderia ter lucro as revendendo...

Não se mostra verossímil versão dada pelo acusado no sentido de que uma pessoa desconhecida ofereça munições na saída de uma lanchonete.

Como bem ressaltado pela Procuradoria Regional da República em seu parecer: "não parece razoável que uma pessoa vendesse uma mercadoria cuja ilicitude é notória para um estranho e em plena luz do dia e, o simples fato de o carro estar sobrecarregado de pacotes não parece instigar um vendedor de mercadorias deste tipo, sem que este conhecesse antes a pessoa a quem ele iria negociar" (fl. 345).

Ademais, todos os policiais foram incisivos em afirmar que o acusado ANTONIO confessou ter adquirido a munição no Paraguai. Confira-se:


Antonio Batista Lima Junior confirmou ser o proprietário dos cigarros e das munições, que as adquiriu em Pedro Juan Caballero/PY para revender na cidade de Dourados/MS e que Raimundo de Souza Vieira seguia na frente batendo a estrada para que ele chegasse ao destino com segurança (depoimento prestado pelo policial João José dos Santos, fls. 4/5)
Antonio Batista Lima Junior confessou que era proprietário dos cigarros e da munição encontrada, disse que adquiriu tanto os cigarros quanto a munição em Pedro Juan Caballero/PY para revender na cidade de Dourados/MS e que Raimundo de Souza Vieira viajava na frente batendo estrada para que ele chegasse ao destino com segurança. (depoimento prestado por Anderson de Souza Reis, fl. 7/8)
Antonio Batista Lima Junior disse aos policiais que era proprietário dos cigarros e da munição encontrada, e que comprou tanto os cigarros quanto a munição no Paraguai para revender em Dourados/MS; Disse ainda que Raimundo de Souza Vieira, que conduzia o VW/Polo, viajava na frente batendo estrada para que ele chegasse em segurança com a mercadoria. (depoimento prestado por Antonio Messias da Silva, fls. 09/10)

Registre-se que referida afirmação foi corroborada na fase judicial:


Diz que o denunciado Antonio relatou que todas as mercadorias foram obtidas em Pedro Juan Caballero/PY. (depoimento da testemunha de acusação João José dos Santos, fl. 197).

Dessa forma, comprovado que o acusado internou a munição do Paraguai, mostra-se descabido o pedido de desclassificação da conduta do artigo 18 para o artigo 14 da Lei 10.826/03.


Quanto à dosimetria da pena, no tocante ao artigo 18 da Lei 10.826/2003, fica mantida a pena-base de cada réu no mínimo legal, em 4 anos de reclusão e 10 (dez) dias multa, tal como lançada na sentença, considerando-se inclusive o disposto na Súmula nº 444 do Superior Tribunal de Justiça, que dispõe que "é vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base".

Ausentes atenuantes e agravantes, bem como causas de diminuição e de aumento, resta a pena definitiva em 4 anos de reclusão e 10 (dez) dias multa, mantido o valor unitário mínimo, tal como fixado na sentença.

Em relação ao regime inicial de cumprimento prisional, fixo-o no aberto, a teor do disposto no artigo 33, §2º, alínea "c", do Código Penal.

Preenchidos os requisitos do artigo 44 do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade de cada réu por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade pública em entidade a ser indicada pelo Juízo das Execuções, e em prestação pecuniária de 1 (um) salário mínimo em favor da entidade lesada com a ação criminosa, nos termos do artigo 45, §1° do Código Penal, no caso, a União Federal.


Da conclusão: por estas razões, rejeito a preliminar e, no mérito, dou parcial provimento à apelação para absolver os réus da imputação da prática do crime tipificado no artigo 334 do Código Penal, com fundamento no artigo 386, inciso III do Código de Processo Penal, minorando a pena de cada réu para quatro anos de reclusão, no regime inicial aberto, e dez dias-multa, no valor unitário mínimo, substituída a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, nos termos acima especificados; e determino a expedição de alvará de soltura clausulado em favor do corréu RAIMUNDO DE SOUZA VIEIRA

É como voto.




MARCIO MESQUITA
Juiz Federal Convocado


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