Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 27/09/2012
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000966-60.2004.4.03.6124/SP
2004.61.24.000966-1/SP
RELATOR : Juiz Convocado MÁRCIO MESQUITA
APELANTE : FERNANDO CESAR LOPES
ADVOGADO : MARCUS ANTÔNIO GIANEZE e outro
APELANTE : EDER SANDRO BOTELHO FEIJO
ADVOGADO : GESUS GRECCO e outro
APELADO : Justica Publica
EXCLUIDO : MARCELO DE PAULA MOTTA (desmembramento)
No. ORIG. : 00009666020044036124 2 Vr SAO JOSE DO RIO PRETO/SP

EMENTA

PENAL. CRIME DE DESCAMINHO. DENÚNCIA QUE NÃO DESCREVE AS MERCADORIAS DESCAMINHADAS: INÉPCIA. PROCESSO ANULADO DE OFÍCIO. APELAÇÕES PREJUDICADAS.
1. Apelações contra sentença que condenou os réus às penas de um ano de reclusão pelo crime tipificado no artigo 334, "caput", do Código Penal, substituída a pena privativa de liberdade por prestação de serviços à comunidade.
2. É inepta a denúncia que imputa ao réu quaisquer das condutas tipificadas no artigo 334 e seus parágrafos do Código Penal, e não descreve as mercadorias contrabandeadas ou descaminhadas.
3. Ao imputar aos réus quaisquer das condutas tipificadas no artigo 334 e seus parágrafos do Código Penal, deve o órgão da Acusação necessariamente descrever as mercadorias em questão, não bastando mera referência ao auto de apreensão, termo de guarda fiscal ou laudo merceológico constantes do inquérito policial.
4. Na ação penal, o réu defende-se dos fatos narrados na denúncia, e não da qualificação jurídica a eles atribuída pelo órgão da acusação. A denúncia que não descreve pormenorizadamente as mercadorias impede o exercício da ampla defesa, já que sequer permite ao réu saber se está sendo acusado de crime de contrabando ou de descaminho. Precedentes.
5. Processo anulado de ofício a partir da denúncia. Apelações prejudicadas.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, ACORDAM os integrantes da Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, de ofício, anular o processo, a partir da denúncia, inclusive, e julgar prejudicadas as apelações, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.



São Paulo, 18 de setembro de 2012.
MARCIO MESQUITA
Juiz Federal Convocado


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000966-60.2004.4.03.6124/SP
2004.61.24.000966-1/SP
RELATOR : Juiz Convocado MÁRCIO MESQUITA
APELANTE : FERNANDO CESAR LOPES
ADVOGADO : MARCUS ANTÔNIO GIANEZE e outro
APELANTE : EDER SANDRO BOTELHO FEIJO
ADVOGADO : GESUS GRECCO e outro
APELADO : Justica Publica
EXCLUIDO : MARCELO DE PAULA MOTTA (desmembramento)
No. ORIG. : 00009666020044036124 2 Vr SAO JOSE DO RIO PRETO/SP

RELATÓRIO

O Juiz Federal Convocado MÁRCIO MESQUITA (Relator):


O Ministério Público Federal, em 17.09.2007, denunciou MARCELO DE PAULA MOTTA, FERNANDO CÉSAR LOPES e ÉDER SANDRO BOTELHO, qualificado nos autos, nascidos em 03.02.1973, 15.02.1972 e 01.09.1972, respectivamente, como incurso no artigo 334, "caput", c. c. o artigo 29, ambos do Código Penal. Consta da denúncia que:

"Consta dos presentes autos que, em 24 de junho de 2004, na Rodovia SP-310, no Município de Macaubal/SP, em abordagem ao ônibus Scania K113, placas ECV-9008, procedente de Foz do Iguaçu/PR, policiais federais surpreenderam o denunciado Marcelo de Paula Motta transportando grande quantidade de mercadorias de procedência estrangeira sem devida documentação fiscal, sendo parte destinada aos denunciados Fernando César Lopes e Éder Sandro Botelho.
As mercadorias foram devidamente apreendidas (fls. 07/08) e encaminhadas à Delegacia da Receita Federal, tendo sido expedido o respectivo Auto de Infração e Termo de Apreensão e Guarda Fiscal de fls. 35/42, o qual informa que as mercadorias estrangeiras apreendidas em poder do denunciado Marcelo de Paula Motta importam em R$ 7.677,43 (sete mil seiscentos e setenta e sete reais e quarenta e três centavos).
O laudo de exame merceológico de fls. 67/68 confirma a origem estrangeira das mercadorias apreendidas.
Ouvido por ocasião da lavratura do auto de prisão em flagrante, o denunciado Marcelo de Paula Motta afirmou que há três anos viaja cerca de duas vezes por mês ao Paraguai trazendo mercadorias para uso próprio e também para Eder Feijó e Fernando Miti, sendo que parte das mercadorias apreendidas seriam para tais indivíduos.
O denunciado Éder Sandro Botelho, ouvido por ocasião de sua prisão em flagrante, confirmou que parte das mercadorias apreendidas em poder do denunciado Marcelo de Paula Motta lhe pertencia (fls. 155/156).
O denunciado Fernando César Lopes, por sua vez, ouvido por ocasião de sua prisão em flagrante, negou que o denunciado Marcelo de Paula Motta estivesse lhe trazendo mercadorias do Paraguai (fls. 161/162).
Ante o exposto, porque o acusado Marcelo de Paula Motta introduziu mercadorias estrangeiras no país sem o pagamento dos impostos devidos, parte a pedido dos denunciados Eder Sandro Botelho e Fernando César Lopes, conclui-se que praticaram, em concurso de pessoas, o delito previsto no artigo 334, caput, do Código Penal (...)".

A denúncia foi recebida em 31.10.2007 (fls. 194).

O processo foi suspenso em relação corréu Marcelo de Paula Motta Cícero Neves, nos termos do artigo 89 da Lei 9.099/95 (fls. 283/284), tendo o feito sido desmembrado em relação a ele (fl. 432)

Após, sobreveio sentença, da lavra do MM. Juiz Federal Roberto Crsitiano Tamantini e publicada em 31.08.2011 (fls. 469/474), que condenou os réus FERNANDO CÉSAR LOPES e ÉDER SANDRO BOTELHO às penas de 01 (um) ano de reclusão para cada um, em regime inicial aberto, pelo crime tipificado no artigo 334, "caput", do Código Penal, substituída a pena privativa de liberdade por prestação de serviços à comunidade.

Apela FERNANDO CÉSAR LOPES, suscitando, em preliminar, a ocorrência de litispendência da presente ação com o feito nº 0006724-69.2007.403.6106, resultando em duplicidade da acusação pelo mesmo fato. No mérito, postula a absolvição por atipicidade da conduta pela aplicação do princípio da insignificância. Sustenta ainda a ausência de prova da autoria delitiva (fls. 482/488).

Apela o réu ÉDER SANDRO BOTELHO requerendo em preliminar a suspensão condicional do processo, pois quando do início da ação penal não havia contra si processo em andamento. No mérito, requer a absolvição por ausência de prova da autoria delitiva; alega que a conduta não é reprovável na sociedade; que é aplicável o princípio da insignificância; que deve ser reconhecida a conexão com os autos nº 2007.61.06.006723-4 (fls. 522/533).

Vieram contrarrazões do Ministério Público Federal pugnando pelo desprovimento do recurso dos réus (fls. 535/542).

A Procuradoria Regional da República, em parecer da lavra do Dr. Osvaldo Capelari Junior, opinou pelo desprovimento dos recursos (fls. 544/555).


É o relatório.

Ao MM. Revisor.



MARCIO MESQUITA
Juiz Federal Convocado


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000966-60.2004.4.03.6124/SP
2004.61.24.000966-1/SP
RELATOR : Juiz Convocado MÁRCIO MESQUITA
APELANTE : FERNANDO CESAR LOPES
ADVOGADO : MARCUS ANTÔNIO GIANEZE e outro
APELANTE : EDER SANDRO BOTELHO FEIJO
ADVOGADO : GESUS GRECCO e outro
APELADO : Justica Publica
EXCLUIDO : MARCELO DE PAULA MOTTA (desmembramento)
No. ORIG. : 00009666020044036124 2 Vr SAO JOSE DO RIO PRETO/SP

VOTO

O Juiz Federal Convocado MÁRCIO MESQUITA (Relator):


Melhor examinando a questão, adoto o entendimento de que é inepta a denúncia que imputa ao réu quaisquer das condutas tipificadas no artigo 334 e seus parágrafos do Código Penal, e não descreve as mercadorias contrabandeadas ou descaminhadas.

Com efeito, o artigo 41 do Código de Processo Penal exige que "a denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias". Assim, ao imputar aos réus quaisquer das condutas tipificadas no artigo 334 e seus parágrafos do Código Penal, deve o órgão da Acusação necessariamente descrever as mercadorias em questão, não bastando mera referência ao auto de apreensão, termo de guarda fiscal ou laudo merceológico constantes do inquérito policial.

Acresce-se que é assente na jurisprudência que, na ação penal, o réu defende-se dos fatos narrados na denúncia, e não da qualificação jurídica a eles atribuída pelo órgão da acusação (STF, Pleno, HC 70620-DF, Dj 24.11.2006 p.63). Dessa forma, a denúncia que não descreve pormenorizadamente as mercadorias impede o exercício da ampla defesa, já que sequer permite ao réu saber se está sendo acusado de crime de contrabando ou de descaminho.

No sentido da inépcia da denúncia por crimes do artigo 334 e parágrafos do Código Penal que não descreve pormenorizadamente as mercadorias situa-se o entendimento desta Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região:


PENAL. PROCESSUAL PENAL. ARTIGO 334, § 1º, "c", DO CÓDIGO PENAL. DENÚNCIA QUE NÃO DESCREVE AS MERCADORIAS APREENDIDAS. INÉPCIA. ANULAÇÃO, DE OFÍCIO, DO PROCESSO, A PARTIR DO OFERECIMENTO DA DENÚNCIA. APELAÇÃO PREJUDICADA.
1. Dispõe o artigo 41 do Código de Processo Penal, que a "denúncia ou a queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol de testemunhas".
3. No caso dos autos o libelo acusatório não preencheu os requisitos do citado dispositivo. Isto porque não expôs o fato criminoso, com todas as suas circunstâncias.
4. A peça acusatória imputou ao acusado a conduta de receber, em proveito próprio, no exercício de atividade comercial, mercadorias de procedência estrangeira, desacompanhadas de documentação legal.
5. A fim de que reste demonstrada a materialidade delitiva, a denúncia deve descrever, de forma pormenorizada, quais os bens internados de forma ilícita, sendo mister a exposição do fato criminoso com todas as suas circunstâncias, não bastando mera remissão ao Auto de Apreensão ou ao Termo de Guarda Fiscal.
6. O réu se defende dos fatos imputados na peça acusatória e, portanto, com amparo nos princípios do contraditório e da ampla defesa, assegura-se a ela a ciência acerca das mercadorias que o órgão ministerial aduz que expusera à venda sem a documentação comprobatória de sua importação regular.
7. Denúncia inepta, porquanto não atendeu aos ditames legais, ausente a exposição clara e objetiva dos fatos alegadamente delituosos, com a narração de todos os elementos essenciais e circunstanciais, vedando ao acusado o exercício pleno do direito de defesa assegurado pela Constituição Federal.
8. Processo anulado, de ofício, a partir do oferecimento da denúncia. Apelação prejudicada.
TRF 3ª Região, 1ª Turma, ACR 0006668-78.2002.4.03.6181/SP, Rel. Des.Fed. José Lunardelli, j. 24/04/2012, DJe 09/05/2012
PENAL. PROCESSUAL PENAL. DESCAMINHO. ARTIGO 334, "CAPUT", DO CÓDIGO PENAL. DENÚNCIA QUE NÃO DESCREVE A MERCADORIA APREENDIDA. INÉPCIA. PROCESSO ANULADO, DE OFÍCIO.
1. Insurge-se o apelante contra a sentença que o condenou à pena de 01 (um) ano e 02 (dois) meses de reclusão, em regime inicial aberto, por infração ao artigo 334, §1º, do Código Penal.
2. Dispõe o artigo 41 do Código de Processo Penal, que a "denúncia ou a queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol de testemunhas".
3. No caso dos autos o libelo acusatório não preencheu os requisitos do citado dispositivo. Isto porque não expôs o fato criminoso, com todas as suas circunstâncias.
4. A peça acusatória imputou ao acusado a conduta de receber, em proveito próprio, no exercício de atividade comercial, mercadorias de procedência estrangeira, desacompanhadas de documentação legal.
5. O objeto jurídico tutelado no crime de descaminho definido no artigo 334, "caput", segunda parte, do Código Penal é a Administração Pública no que diz respeito ao erário público lesado pelo comportamento do agente que ilude, no todo ou em parte, o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo de mercadoria.
6.Para a consumação delitiva basta a internação das mercadorias em território nacional, sem o pagamento dos tributos incidentes sobre aquela operação, e a fraude empregada para iludir o fisco consiste no modus operandi.
7. Para fins de comprovação da materialidade delitiva, a denúncia deve descrever, de forma pormenorizada, quais os bens internados de forma ilícita, sendo mister a exposição do fato criminoso com todas as suas circunstâncias, não bastando mera remissão ao Auto de Apreensão ou ao Termo de Guarda Fiscal.
8. O réu se defende dos fatos imputados na peça acusatória e, portanto, com amparo nos princípios do contraditório e da ampla defesa, assegura-se ao acusado a ciência acerca da mercadoria que o órgão ministerial aduz que importara ilicitamente ou que recebera desprovida de documentação comprobatória de sua regular importação.
9. Denúncia inepta, porquanto não atendeu aos ditames legais, ausente a exposição clara e objetiva dos fatos alegadamente delituosos, com narração de todos os elementos essenciais e circunstanciais, vedando ao acusado o exercício pleno do direito de defesa assegurado pela Constituição Federal.
10. Processo que se anula, de ofício, a partir do oferecimento da denúncia, considerada inepta, restando prejudicada a apelação interposta.
TRF 3ª Região, 1ª Turma, ACR 0010394-16.2001.4.03.6110, Rel. Des.Fed. José Lunardelli, j. 30/08/2011, DJe 06/09/2011

Pelo exposto, anulo o processo, a partir da denúncia, inclusive, e julgo prejudicadas as apelações.

É o voto.



MARCIO MESQUITA
Juiz Federal Convocado


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): MARCIO SATALINO MESQUITA:125
Nº de Série do Certificado: 46DD6A9BF14786E7
Data e Hora: 13/07/2012 15:07:44