Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 19/03/2013
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000414-89.1998.4.03.6000/MS
2006.03.99.033749-2/MS
RELATORA : Desembargadora Federal VESNA KOLMAR
APELANTE : DOUGLAS RAMOS
ADVOGADO : ANTONIO JOAO PEREIRA FIGUEIRO
APELANTE : RUBENS DARIO FERREIRA LOBO JUNIOR
ADVOGADO : JAIL BENITES DE AZAMBUJA
APELANTE : VERA SUELI LOBO RAMOS
ADVOGADO : ANTONIO JOAO PEREIRA FIGUEIRO
APELADO : Justica Publica
CO-REU : ROSELI DARLENE FERREIRA LOBO
No. ORIG. : 98.00.00414-9 5 Vr CAMPO GRANDE/MS

EMENTA

PENAL. ARTIGO 312, § 1º DO CÓDIGO PENAL - PECULATO-FURTO. PRELIMINAR DE NULIDADE PROCESSUAL REJEITADA. RECURSO DA DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO PREJUDICADO. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. REDUÇÃO DA PENA-BASE OFÍCIO. SÚMULA 444 DO STJ. APELAÇÕES DOS RÉUS IMPROVIDAS. REDUÇÃO DE OFÍCIO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE E DAS PENA DE MULTA.
1. Os réus foram denunciados como incursos nas sanções do artigo 312, § 1º, do Código Penal.
2. Preliminar de nulidade processual que se rejeita, tendo o réu sido intimado da data de audiência de inquirição de testemunha bem como da expedição de carta precatória relativa àquela audiência, nos termos do artigo 222 do Código de Processo Penal.
3. Recurso de apelação interposto pela Defensoria Pública da União prejudicado, em razão da interposição de apelação pelo réu Rubens Dário Ferreira Lobo Júnior.
4. Autoridade e materialidade comprovadas. Conjunto probatório mostra de forma clara e segura que os réus praticaram o delito em questão ao concorrerem para a subtração de bem público, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade proporcionada pela qualidade de funcionário público de uma deles.
5. Dosimetria da pena. Pena-base dos réus Rubens Dário Ferreira Lobo Júnior e Vera Sueli Lobo Ramos fixada em 3 (três) anos de reclusão. Pena-base da ré Roseli Darlene Ferreira Lobo mantida em 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão. Pena-base do réu Douglas Ramos fixada em 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão, reduzida de ofício para o mínimo legal de 2 (dois) anos de reclusão, em atenção ao disposto na Súmula 444 do C. STJ. Penas de multa relativas aos réus Rubens Dário Ferreira Lobo Júnior e Vera Sueli Lobo Ramos reduzidas de ofício para 15 (quinze) dias-multa cada. Pena de multa relativa à ré Roseli Darlene Ferreira Lobo reduzida de ofício para 12 (doze) dias-multa. Pena de multa relativa ao réu Douglas Ramos reduzida de ofício para 10 (dez) dias-multa. Valor do dia-multa reduzido de ofício para 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo, em relação a todos os réus. Manutenção do regime aberto. Penas pecuniárias revertidas em favor da União Federal
6. Substituição das penas privativas de liberdade dos réus Roseli Darlene Ferreira Lobo e Douglas Ramos por uma pena de multa e uma restritiva de direito cada, nos termos do artigo 44 do Código Penal, as quais se mantêm, uma vez que presentes os requisitos subjetivos para tanto.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar de apelação do réu RUBENS DARIO FERREIRA LOBO JUNIOR, e, no mérito, negar-lhe provimento, bem como à apelação interposta por VERA SUELI LOBO RAMOS e DOUGLAS RAMOS; julgar prejudicado o recurso interposto pela Defensoria Pública da União; por maioria, de ofício, reduzir a pena privativa de liberdade de DOUGLAS RAMOS para 2 (dois) anos de reclusão, bem assim reduzir a pena de multa para 15 (quinze) dias-multa, em relação ao réu RUBENS DARIO FERREIRA LOBO JUNIOR e à ré VERA SUELI LOBO RAMOS, para 12 (doze) dias-multa, em relação à ré ROSELI DARLENE FERREIRA LOBO, e para 10 (dez) dias-multa, em relação ao réu DOUGLAS RAMOS; ainda de ofício, por unanimidade, reduzir o valor do dia-multa para 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo, em relação a todos os réus, e reverter as penas pecuniárias em favor da União Federal, nos termos do relatório e voto que fazem parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 15 de janeiro de 2013.
Vesna Kolmar
Desembargadora Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000414-89.1998.4.03.6000/MS
2006.03.99.033749-2/MS
RELATORA : Desembargadora Federal VESNA KOLMAR
APELANTE : DOUGLAS RAMOS
ADVOGADO : ANTONIO JOAO PEREIRA FIGUEIRO
APELANTE : RUBENS DARIO FERREIRA LOBO JUNIOR
ADVOGADO : JAIL BENITES DE AZAMBUJA
APELANTE : VERA SUELI LOBO RAMOS
ADVOGADO : ANTONIO JOAO PEREIRA FIGUEIRO
APELADO : Justica Publica
CO-REU : ROSELI DARLENE FERREIRA LOBO
No. ORIG. : 98.00.00414-9 5 Vr CAMPO GRANDE/MS

VOTO VENCIDO

O Juiz Federal Convocado MÁRCIO MESQUITA:


Trata-se de apelação interposta pela Defesa contra a sentença proferida pelo Juízo da 5ª Vara Federal de Campo Grande/MS que condenou VERA SUELI LOBO RAMOS à pena de 3 (três) anos de reclusão e 25 (vinte e cinco) dias-multa, bem como à perda do cargo público; RUBENS DÁRIO FERREIRA LOBO RAMOS à pena de 3 (três) anos de reclusão e 25 (vinte e cinco) dias-multa; DOUGLAS RAMOS à pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 20 (vinte) dias-multa; ROSELI DARLENE FERREIRA LOBO à pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 20 (vinte) dias-multa, todos incursos nas sanções do delito previsto no artigo 312, § 1º, do Código Penal. Foi fixado o regime inicial aberto para o cumprimento da pena e o valor de R$ 10,00 (dez) para cada dia-multa para todos os condenados.

O feito foi levado a julgamento na sessão de 15/01/2013.

Em seu voto, a E. Relatora Desembargadora Federal Vesna Kolmar rejeitou a preliminar suscitada por RUBENS DARIO FERREIRA LOBO JUNIOR, em sua apelação e, no mérito, negou-lhe provimento, bem como à apelação interposta pela ré VERA SUELI LOBO RAMOS e pelo réu DOUGLAS RAMOS; julgou prejudicado o recurso interposto pela Defensoria Pública da União; de ofício, reduziu a pena privativa de liberdade do réu DOUGLAS RAMOS para 2 (dois) anos de reclusão, bem assim reduziu a pena de multa para 15 (quinze) dias-multa, em relação ao réu RUBENS DARIO FERREIRA LOBO JUNIOR e à ré VERA SUELI LOBO RAMOS; para 12 (doze) dias-multa, em relação à ré ROSELI DARLENE FERREIRA LOBO; para 10 (dez) dias-multa, em relação ao réu DOUGLAS RAMOS; reduziu o valor do dia-multa para 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo, em relação a todos os réus, e reverteu as penas pecuniárias em favor da União Federal, no que foi acompanhada pelo voto do E. Juiz Federal Convocado Paulo Domingues.

Acompanhei a E. Relatora, pelas razões expendidas no seu voto, para rejeitar a preliminar suscitada, negar provimento aos apelos de Vera, Rubens e Douglas, julgar prejudicado o apelo da DPU e, de ofício, reduzir o valor de cada dia-multa para o mínimo legal e alterar a destinação da pena de prestação pecuniária em favor da União.

Com a devida vênia, ousei divergir da douta maioria para, de ofício, desclassificar a conduta do peculato-furto para estelionato, tipificado no artigo 171, §3º, do Código Penal, e reduzir as penas de VERA e RUBENS para 2 anos e 8 meses de reclusão e 26 dias-multa, de ROSELI para 2 anos de reclusão e 20 dias-multa e de DOUGLAS para 1 ano e 4 meses de reclusão e 13 dias-multa


Passo a expor as razões da divergência.


No caso dos autos, os réus foram denunciados e condenados como incursos nas penas do artigo 312, §1º, c.c. o artigo 29, ambos do Código Penal. Consta da denúncia:


1. Consta do incluso inquérito policial que, em 20 de setembro de 1995, a denunciada VERA, servidora do INSS, lotada no Posto do Seguro Social I, em Campo Grande/MS, por intermédio de requerimento providenciado por seu irmão, o advogado RUBENS DÁRIO, habilitou e concedeu benefício de pensão por morte à MARIA JOSÉ DA SILVA.
2. Sem a necessária outorga de procuração por parte dessa suposta pensionista, e também sem a elaboração do competente termo de responsabilidade, VERA emitiu Autorizações de Pagamento, por meio dos nominados cartões "APP" (Autorização de Pagamento a Procurador), em favor de seu marido DOUGLAS RAMOS e de sua irmã ROSELI DARLENE (f. 36-37), os quais sacaram e receberam indevidamente os valores atrasados e resíduos referentes ao pagamento do aludido benefício, repassando parte do dinheiro a RUBENS DÁRIO (f. 62-64).
3. No decorrer dos trabalhos da Auditoria levada a cabo no aludido posto, foram constatadas diversas irregularidades. Apurou-se que nos processos habilitados por VERA em favor de seu irmão, constavam a cidade de Campo Grande/MS nos endereços das interessadas, sendo, que, na verdade, elas residiam em outras localidades. Foi o que ocorreu in casu, pois MARIA morava em Iguatemi/MS e no documento de f. 08 consta como seu a Rua São Carlos, nº 438, Bairro Santa Luzia, nesta Capital.
Isso era feito adredemente para não levantar suspeitas quanto ao fato dos requerimentos estarem sendo protocolados fora da jurisdição das verdadeiras residências das eventuais beneficiárias, certos de que, no Posto de Seguro I, lograriam maior êxito na "agilização" dos mesmos, já que RUBENS constava com o auxílio ímprobo de sua irmã, servidora daquele órgão público.
4. Constatou-se também que os documentos em que consta a impressão digital de MARIA JOSÉ não são idôneos, eis que a própria VERA SUELI confessou ter colhido a impressão digital de outra pessoa como se fosse daquela, justificando essa ímproba atitude com a escusa de que, na época, os funcionários responsáveis pela habilitação não podiam deixar requerimento de benefício sem assinatura ou impressão digital dos requerentes. Aliás, disse que caso mandasse para o seu irmão RUBENS os documentos em que fosse necessária a colheita das digitais de MARIA JOSÉ, demoraria muito, por isso, resolveu "agilizar" o processo (f. 262).
5. Na cópia da Carteira de Trabalho de MANOEL (f. 19-21), consta, na folha referente às anotações de dependentes, o nome de MARIA JOSÉ DA SILVA, sua companheira (f. 21). Todavia, perante a Auditoria do INSS (f. 120-121), MARIA JOSÉ apresentou cópia da CTPS em comento, sendo que, na página nove, não consta a inscrição de dependente existente na cópia que instruiu o pedido de benefício previdenciário. (f. 124),
6. Na qualidade de Chefe do Posto, VERA SUELI possuía uma senha para atuar desde a habilitação até o seu efetivo pagamento. Munida de tal prerrogativa, ela concedia benefícios desvinculados de sua competência e emitia diversos cartões de pagamento às mesmas pessoas, prática proibida pelo Decreto nº 611/92, regulamento previdenciário vigente à época dos fatos.
7. Com uma vasta folha de antecedentes, VERA SUELI, envolvida em tantos outros casos de prevaricação e estelionato perpetrados em desfavor da Seguridade Social, em seu interrogatório policial (f. 260-264), também confessou ter ciência da necessidade da procuração para poder emitir os cartões "APP" em nome dos respectivos procuradores, e admitiu tê-los preenchido e assinado mesmo diante da ausência dessa formalidade, apesar de saber que os valores sacados seriam destinados, na realidade, ao seu irmão RUBENS DÁRIO e não à eventual beneficiária.
8. O Laudo de Exame Documentoscópico de f. 243-247 atesta que foi VERA SUELI quem registrou na CTPS de MANOEL a inscrição de MARIA JOSÉ como sua dependente, bem como que foi a denunciada referida quem preencheu as APP's existentes nos autos.
9. Às f. 223, o Superintendente do INSS confirmou que as APP's em apreço são falsas, tendo em vista que não consta nos controles do Posto de Seguro Social, nenhuma procuração de MARIA JOSÉ outorgando poderes para DOUGLAS RAMOS ou para ROSELI DARLENE. Assim, se houve a emissão de autorização de pagamento a procurador por parte de VERA SUELI, sem atender às normas estabelecidas, as mesmas não possuem validade perante o Instituto.
10. Perante a autoridade policial (f. 204-206), MARIA JOSÉ alegou ter contratado o advogado RUBENS DÁRIO para requerer seu benefício previdenciário, mas que não sabe quem possa ter feito a anotação de dependentes na CTPS de seu companheiro, dizendo apenas que entregou a carteira de trabalho de MANOEL para aquele causídico.
11. ROSELI DARLENE (f. 57-58) e DOUGLAS RAMOS (f. 69-71) confirmaram, perante a Auditoria do INSS, que receberam os pagamentos de MARIA JOSÉ e de outras beneficiárias a pedido de RUBENS. Inclusive, DOUGLAS confirmou, na fase policial, que sequer conhecia a beneficiária e que tampouco estava legalmente autorizado a receber os pagamentos em nome da beneficiária (f. 324-325).
12. Já o denunciado RUBENS DÁRIO, pessoa que atraiu MARIA JOSÉ com o emprego de engodo, eis que se apresentava como o advogado responsável pela habilitação de seu benefício previdenciário junto ao INSS, preferiu valer-se de seu direito ao silêncio (f. 310-311)
Entretanto, perante a Auditoria do INSS (f. 82-85), já havia confessado que ficava com os primeiros pagamentos a título de "atrasados", como forma de compensar os seus honorários.
13. Realmente, o contrato de prestação de serviços e honorários advocatícios de f. 88; e os depósitos em sua conta corrente (f. 61-64), referente ao recebimento do pagamento retroativo do benefício concedido à MARIA JOSÉ, indicam que RUBENS realmente embolsou parte do dinheiro relativo à aludida pensão.
14. Agindo dessa maneira, os denunciados, cada um com seu modo de participação na perpetração da fraude, ocasionaram prejuízos financeiros ao INSS, que, absorvendo uma falsa representação da realidade, concedeu e pagou indevidamente o benefício merecido.
15. Conclui-se, portanto, que ao obterem vantagem ilícita em prejuízo da Seguridade Social, mormente a denunciada VERA SUELI que, valendo-se das facilidades que seu cargo de chefe do Posto de Benefícios lhes proporcionava, mesmo sem ter a posse do numerário, os denunciados incidiram na prática do crime de peculato-furto, eis que a aplicação desse dispositivo se estende a todos, tendo em vista que concorreram voluntária e conscientemente para a prática do referido delito, transmitindo-se a RUBENS, ROSELI e DOUGLAS, a circunstância elementar de ser funcionário público (art. 30 do CP).

A denúncia imputa aos réus a percepção indevida de benefício previdenciário concedido mediante a inserção de dados inidôneos no requerimento de pensão por morte de Manoel em favor de Maria José da Silva, na CTPS de Manoel e em diversos documentos que instruíram o pedido. Segundo a denúncia, a acusada Vera Lucia emitiu habilitou e concedido indevidamente o benefício de pensão por morte e emitiu autorizações de pagamento indevidas, sem a observância das formalidades necessárias. Assim, de posse dessas autorizações, os réus Douglas e Roseli perceberam o benefício previdenciário, repassando parte do dinheiro ao "advogado" Rubens.

Portanto, a conduta narrada na denúncia não se enquadra no tipo referente ao crime de peculato-furto (artigo 312, §1º, do Código Penal).

Isso porque, no caso em apreço, a conduta típica diz respeito à obtenção de benefício previdenciário por meio fraudulento, amoldando-se à figura prevista no artigo 171, §3º, do Código Penal.

Vale dizer, não houve a subtração da coisa sem o consentimento da vítima, o que poderia ensejar o enquadramento da conduta no artigo 312, §1º, do Código Penal. Houve, em verdade, o emprego de fraude, de modo que a própria vítima, ludibriada, entrega espontaneamente a coisa para o agente.

Em outras palavras, no caso do peculato-furto é necessário que haja subtração, ou seja, que a posse do bem seja obtida sem o conhecimento da vítima; e no caso do estelionato é a própria vítima que, iludida, entrega o bem ao estelionatário.

Esse é justamente o caso dos autos: a vítima, o INSS, iludida com as autorizações de pagamento fraudulentamente feitas pela acusada VERA, entregou o dinheiro aos corréus DOUGLAS e ROSELI, que repassou parte para o corréu RUBENS, que atuou como procurador.

Assim, a tipificação legal correta para os fatos descritos na inicial acusatória é a do artigo 171, §3º, do Código Penal.

Ainda que haja o concurso de funcionário público não é cabível o enquadramento da conduta no crime de peculato-furto se a fraude continua sendo o meio empregado para se obter o benefício previdenciário. Ademais, esse é o enquadramento que usualmente é dado na jurisprudência aos casos de benefícios previdenciários indevidamente obtidos com a falsificação de documentos e outras fraudes.

A jurisprudência deste Tribunal Regional Federal da 3ª Região e do Superior Tribunal de Justiça é nesse sentido:


PENAL. HABEAS CORPUS. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO POR MEIO FRAUDULENTO. ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE APRECIAÇÃO NA VIA ELEITA. CONDENAÇÃO POR PECULATO-FURTO. SUBSUNÇÃO DA CONDUTA AO CRIME DE ESTELIONATO MAJORADO. ART. 171, § 3º, DO CP. PRECEDENTES DO STJ.
ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA...
2. A conduta de servidor do INSS de habilitar e conceder indevidamente aposentadoria por tempo de serviço a terceira pessoa, agindo de forma fraudulenta, amolda-se ao tipo previsto no § 3º do art. 171 do Código Penal - estelionato cometido contra a autarquia previdenciária.
3. Não se trata, no caso, de subtração de bens ou valores, em proveito alheio, valendo-se da facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário público, mas da obtenção, para outrem, de vantagem indevida, mediante meio fraudulento. A conduta, portanto, não se subsume ao tipo de peculato-furto, mas ao estelionato na modalidade majorada, porque praticada contra entidade previdenciária.
4. Ordem parcialmente concedida para, anulando a sentença condenatória, determinar ao Tribunal de origem que proceda a nova dosimetria da pena, tendo em vista a classificação da conduta da paciente no delito previsto no art. 171, § 3º, do Código Penal.
(STJ, HC 112842/PA, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 24/11/2008, DJe 19/12/2008)
PENAL. ESTELIONATO CONTRA A PREVIDÊNCIA SOCIAL. FRAUDE NA CONCESSÃO DE BENEFÍCIOS. NÃO CONFIGURAÇÃO DE PECULATO. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. CONDENAÇÕES MANTIDAS. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE. MAUS ANTECEDENTES. SÚMULA 444 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. FUNCIONÁRIA DA AUTARQUIA. CIRCUNSTÂNCIA AGRAVANTE. PERDA DO CARGO PÚBLICO.
1. Ainda que perpetrada mediante o concurso de funcionário do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, a concessão fraudulenta de benefício previdenciário configura o crime de estelionato e não o de peculato...
(TRF 3ª Região, SEGUNDA TURMA, ACR 0006718-75.2000.4.03.6181, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NELTON DOS SANTOS, julgado em 04/10/2011, e-DJF3 Judicial 1 DATA:13/10/2011 PÁGINA: 130)

Dessa forma, impõe-se refazer a dosimetria da pena.


Pelas mesmas razões indicas no voto da voto da E. Relatora, a pena-base dos acusados VERA e RUBENS deve ser fixada acima do mínimo legal, em 2 anos de reclusão e 20 dias-multa. Ausentes circunstâncias agravantes e atenuantes, bem como causas de diminuição da pena. Presente apenas a causa de aumento do §3º do artigo 171 do Código Penal, em um terço, resultando na pena definitiva de 02 (dois) anos e 08 (oito) meses de reclusão e 26 (vinte e seis) dias-multa.

Em relação à acusada ROSELI, consideradas ponderações da E. Relatora, estabeleço a pena-base pouco acima do mínimo legal, em 1 ano e 6 meses de reclusão e 15 dias-multa. Ausentes circunstâncias agravantes e atenuantes e causas de diminuição da pena. Presente a causa de aumento do artigo 171 §3º do Código Penal, majoro-a em 1/3, resultando na pena definitiva em 2 (dois) anos de reclusão e 20 (vinte) dias-multa.

Quanto ao corréu DOUGLAS, na primeira fase da dosimetria da pena, à míngua de circunstância judicial negativa, conforme mencionado no voto da E. Relatora, fixo a pena-base no mínimo legal, em 1 ano de reclusão. Ausentes atenuantes e agravantes, bem como causas de diminuição da pena. Presente a majorante do §3º do artigo 171 do Código Penal, de 1/3 (um terço), o que resulta na pena definitiva de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de reclusão e 13 (treze) dias-multa.

No mais, acompanho o voto da Relatora, reduzindo de ofício o valor do dia-multa para 1/30 (um trinta avos) em relação a todos os acusados, mantendo o regime aberto para cumprimento das penas privativas de liberdade, bem como alterando a destinação da pena de prestação pecuniária em favor da União.


Pelo exposto, pelo meu voto rejeito a preliminar suscitada, nego provimento às apelações dos réus VERA SUELI LOBO RAMOS, DOUGLAS RAMOS e RUBENS DARIO FERREIRA LOBO JUNIOR; julgo prejudicado o recurso interposto pela Defensoria Pública da União; de ofício, reclassifico a conduta para o crime de estelionato, tipificado no artigo 171, §3º, do Código Penal, e altero as penas dos réus VERA e RUBENS para 2 anos e 8 meses de reclusão e 26 dias-multa; da ré ROSELI para 2 anos de reclusão e 20 dias-multa; e do réu Douglas para 1 ano e 4 meses de reclusão e 13 dias-multa; reduzo o valor do dia-multa para 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo, em relação a todos os réus, e reverto as penas pecuniárias em favor da União Federal.



MARCIO MESQUITA
Juiz Federal Convocado


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000414-89.1998.4.03.6000/MS
2006.03.99.033749-2/MS
RELATORA : Desembargadora Federal VESNA KOLMAR
APELANTE : DOUGLAS RAMOS
ADVOGADO : ANTONIO JOAO PEREIRA FIGUEIRO
APELANTE : RUBENS DARIO FERREIRA LOBO JUNIOR
ADVOGADO : JAIL BENITES DE AZAMBUJA
APELANTE : VERA SUELI LOBO RAMOS
ADVOGADO : ANTONIO JOAO PEREIRA FIGUEIRO
APELADO : Justica Publica
CO-REU : ROSELI DARLENE FERREIRA LOBO
No. ORIG. : 98.00.00414-9 5 Vr CAMPO GRANDE/MS

RELATÓRIO

A EXCELENTÍSSIMA SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL VESNA KOLMAR: Trata-se de apelação criminal interposta por RUBENS DARIO FERREIRA LOBO JUNIOR, VERA SUELI LOBO RAMOS e DOUGLAS RAMOS contra a r. sentença proferida pela 5ª Vara Federal de Campo Grande/MS, que julgou procedente a ação para condenar VERA SUELI LOBO RAMOS à pena privativa de liberdade de 3 (três) anos de reclusão e pena de multa de 25 (vinte e cinco) dias-multa, no valor de R$ 10,00 (dez reais) cada, a ser cumprida em regime aberto, bem como à perda do cargo público, com fulcro no artigo 92, I. "a", do Código Penal, como incursa nas sanções do delito previsto no artigo 312, § 1º, do referido diploma normativo; RUBENS DÁRIO FERREIRA LOBO RAMOS à pena privativa de liberdade de 3 (três) anos de reclusão e pena de multa de 25 (vinte e cinco) dias-multa, no valor de R$ 10,00 (dez reais) cada, a ser cumprida em regime aberto, como incurso nas sanções do delito previsto no artigo 312, § 1º, do Código Penal; DOUGLAS RAMOS à pena privativa de liberdade de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão e pena de multa de 20 (vinte) dias-multa, no valor de R$ 10,00 (dez reais) cada, como incurso nas sanções do delito previsto no artigo 312, § 1º, do Código Penal; ROSELI DARLENE FERREIRA LOBO à pena privativa de liberdade de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão e pena de multa de 20 (vinte) dias-multa, no valor de R$ 10,00 (dez) cada.


A pena privativa de liberdade dos acusados DOUGLAS RAMOS e ROSELI DARLENE FERREIRA LOBO foi substituída pelo pagamento de multa no valor de R$ 300,00 (trezentos reais) para cada um, além de prestação de serviços à comunidade para cada um pelo período de 1 (um) ano e 6 (seis) meses, durante 7 (sete) horas semanais, nos termos do artigo 44 do Código Penal.


Em razões de apelação, VERA SUELI LOBO RAMOS e DOUGLAS RAMOS sustentam insuficiência probatória a ensejar suas condenações, bem como a inexistência de prejuízo ao Erário necessário à tipificação do crime sob comento. Pedem, a final, a absolvição.


RUBENS DARIO FERREIRA LOBO JUNIOR sustenta, preliminarmente, a nulidade do processo face à ausência de sua intimação pessoal para acompanhar o depoimento da testemunha Maria José da Silva.


No mérito, aduz a atipicidade da conduta praticada, tendo em vista a ausência de prejuízo para a Administração Pública, e requer sua absolvição. Alternativamente, pugna pela reclassificação do crime cometido para apropriação indébita, por não ter havido fraude na concessão do benefício previdenciário em questão.


Requer, subsidiariamente, seja a pena-base fixada no mínimo legal, em atenção à Súmula 444 do Superior Tribunal de Justiça, procedendo-se à sua conversão em pena restritiva de direito, bem assim seja reconhecida a prescrição da pena em concreto, declarando-se extinta a punibilidade.


A Defensoria Pública da União também interpôs recurso, por meio do qual pede a absolvição de RUBENS DÁRIO FERREIRA LOBO JÚNIOR, nos termos do artigo 386, IV, do Código de Processo Penal, e, subsidiariamente, a redução da pena-base e conseqüente substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos.


Por decisão de fl. 954 foi determinada a exclusão da Defensoria Pública da União do processo (fl. 954), em razão de o réu RUBENS DÁRIO FERREIRA LOBO JÚNIOR ter oferecido recurso de apelação, por meio de advogado contratado.


Contrarrazões pelo Ministério Público Federal às fls. 959/973 e fls. 976/990.


A Procuradoria Geral da República, por sua ilustre representante, Dra. Mônica Nicida Garcia, opinou pelo improvimento das apelações e pela manutenção da sentença condenatória.


É o relatório.


À revisão.





Vesna Kolmar
Desembargadora Federal


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Data e Hora: 24/10/2012 15:02:05



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000414-89.1998.4.03.6000/MS
2006.03.99.033749-2/MS
RELATORA : Desembargadora Federal VESNA KOLMAR
APELANTE : DOUGLAS RAMOS
ADVOGADO : ANTONIO JOAO PEREIRA FIGUEIRO
APELANTE : RUBENS DARIO FERREIRA LOBO JUNIOR
ADVOGADO : JAIL BENITES DE AZAMBUJA
APELANTE : VERA SUELI LOBO RAMOS
ADVOGADO : ANTONIO JOAO PEREIRA FIGUEIRO
APELADO : Justica Publica
CO-REU : ROSELI DARLENE FERREIRA LOBO
No. ORIG. : 98.00.00414-9 5 Vr CAMPO GRANDE/MS

VOTO

A EXCELENTÍSSIMA SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL VESNA KOLMAR: VERA SUELI LOBO RAMOS, DOUGLAS RAMOS, RUBENS DÁRIO FERREIRA LOBO JÚNIOR e ROSELI DARLENE FERREIRA LOBO foram denunciados como incursos nas penas do artigo 312, § 1º, do Código Penal, por concorrerem para a subtração de bem público, em proveito próprio ou alheio, valendo-se da facilidade proporcionada pela qualidade de funcionário público de um deles.


Inicialmente, considerando a decisão de fl. 954, informando à Defensoria Pública da interposição de recurso pelo advogado constituído por Rubens Dario Ferreira Lobo Junior e a manifestação de fl.955, julgo prejudicado o recurso de fls. 947/951.


Passando à análise dos recursos examino por primeiro a matéria preliminar suscitada pelo acusado RUBENS DARIO FERREIRA LOBO JUNIOR.


Tenho que referida preliminar não merece prosperar, tendo em vista que, conforme se verifica às fls. 476 e 489-v dos autos, o réu foi regularmente intimado tanto da data da audiência de inquirição da testemunha Maria José da Silva quanto da expedição da carta precatória relativa àquela audiência, nos termos do artigo 222 do Código de Processo Penal, não havendo falar em nulidade processual no presente caso.


Passo ao exame do mérito recursal.


Consta da denúncia que:


(...) em 20 de setembro de 1995, a denunciada VERA, servidora do INSS, lotada no Posto do Seguro Social I, em Campo Grande/MS, por intermédio de requerimento providenciado por seu irmão, o advogado RUBENS DÁRIO, habilitou e concedeu benefício de pensão por morte à MARIA JOSÉ DA SILVA.
Sem a necessária outorga de procuração por parte dessa suposta pensionista, e também sem a elaboração do competente termo de responsabilidade, VERA emitiu Autorizações de Pagamento, por meio dos nominados cartões "APP" (Autorização de Pagamento a Procurador), em favor de seu marido DOUGLAS RAMOS e de sua irmã ROSELI DARLENE (f. 36-37), os quais sacaram e receberam indevidamente os valores atrasados e resíduos referentes ao pagamento do aludido benefício, repassando parte do dinheiro a RUBENS DÁRIO (f. 62-64).
No decorrer dos trabalhos da Auditoria levada a cabo no aludido posto, foram constatadas diversas irregularidades. Apurou-se que nos processos habilitados por VERA em favor de seu irmão, constavam a cidade de Campo Grande/MS nos endereços das interessadas, sendo, que, na verdade, elas residiam em outras localidades. Foi o que ocorreu in casu, pois MARIA morava em Iguatemi/MS e no documento de f. 08 consta como seu a Rua São Carlos, nº 438, Bairro Santa Luzia, nesta Capital.
Isso era feito adredemente para não levantar suspeitas quanto ao fato dos requerimentos estarem sendo protocolados fora da jurisdição das verdadeiras residências das eventuais beneficiárias, certos de que, no Posto de Seguro I, lograriam maior êxito na "agilização" dos mesmos, já que RUBENS constava com o auxílio ímprobo de sua irmã, servidora daquele órgão público.
Constatou-se também que os documentos em que consta a impressão digital de MARIA JOSÉ não são idôneos, eis que a própria VERA SUELI confessou ter colhido a impressão digital de outra pessoa como se fosse daquela, justificando essa ímproba atitude com a escusa de que, na época, os funcionários responsáveis pela habilitação não podiam deixar requerimento de benefício sem assinatura ou impressão digital dos requerentes. Aliás, disse que caso mandasse para o seu irmão RUBENS os documentos em que fosse necessária a colheita das digitais de MARIA JOSÉ, demoraria muito, por isso, resolveu "agilizar" o processo (f. 262).
Na cópia da Carteira de Trabalho de MANOEL (f. 19-21), consta, na folha referente às anotações de dependentes, o nome de MARIA JOSÉ DA SILVA, sua companheira (f. 21). Todavia, perante a Auditoria do INSS (f. 120-121), MARIA JOSÉ apresentou cópia da CTPS em comento, sendo que, na página nove, não consta a inscrição de dependente existente na cópia que instruiu o pedido de benefício previdenciário. (f. 124),
Na qualidade de Chefe do Posto, VERA SUELI possuía uma senha para atuar desde a habilitação até o seu efetivo pagamento. Munida de tal prerrogativa, ela concedia benefícios desvinculados de sua competência e emitia diversos cartões de pagamento às mesmas pessoas, prática proibida pelo Decreto nº 611/92, regulamento previdenciário vigente à época dos fatos.
Com uma vasta folha de antecedentes, VERA SUELI, envolvida em tantos outros casos de prevaricação e estelionato perpetrados em desfavor da Seguridade Social, em seu interrogatório policial (f. 260-264), também confessou ter ciência da necessidade da procuração para poder emitir os cartões "APP" em nome dos respectivos procuradores, e admitiu tê-los preenchido e assinado mesmo diante da ausência dessa formalidade, apesar de saber que os valores sacados seriam destinados, na realidade, ao seu irmão RUBENS DÁRIO e não à eventual beneficiária.
O Laudo de Exame Documentoscópico de f. 243-247 atesta que foi VERA SUELI quem registrou na CTPS de MANOEL a inscrição de MARIA JOSÉ como sua dependente, bem como que foi a denunciada referida quem preencheu as APP's existentes nos autos.
Às f. 223, o Superintendente do INSS confirmou que as APP's em apreço são falsas, tendo em vista que não consta nos controles do Posto de Seguro Social, nenhuma procuração de MARIA JOSÉ outorgando poderes para DOUGLAS RAMOS ou para ROSELI DARLENE. Assim, se houve a emissão de autorização de pagamento a procurador por parte de VERA SUELI, sem atender às normas estabelecidas, as mesmas não possuem validade perante o Instituto.
Perante a autoridade policial (f. 204-206), MARIA JOSÉ alegou ter contratado o advogado RUBENS DÁRIO para requerer seu benefício previdenciário, mas que não sabe quem possa ter feito a anotação de dependentes na CTPS de seu companheiro, dizendo apenas que entregou a carteira de trabalho de MANOEL para aquele causídico.
ROSELI DARLENE (f. 57-58) e DOUGLAS RAMOS (f. 69-71) confirmaram, perante a Auditoria do INSS, que receberam os pagamentos de MARIA JOSÉ e de outras beneficiárias a pedido de RUBENS. Inclusive, DOUGLAS confirmou, na fase policial, que sequer conhecia a beneficiária e que tampouco estava legalmente autorizado a receber os pagamentos em nome da beneficiária (f. 324-325).
Já o denunciado RUBENS DÁRIO, pessoa que atraiu MARIA JOSÉ com o emprego de engodo, eis que se apresentava como o advogado responsável pela habilitação de seu benefício previdenciário junto ao INSS, preferiu valer-se de seu direito ao silêncio (f. 310-311)
Entretanto, perante a Auditoria do INSS (f. 82-85), já havia confessado que ficava com os primeiros pagamentos a título de "atrasados", como forma de compensar os seus honorários.
Realmente, o contrato de prestação de serviços e honorários advocatícios de f. 88; e os depósitos em sua conta corrente (f. 61-64), referente ao recebimento do pagamento retroativo do benefício concedido à MARIA JOSÉ, indicam que RUBENS realmente embolsou parte do dinheiro relativo à aludida pensão.
Agindo dessa maneira, os denunciados, cada um com seu modo de participação na perpetração da fraude, ocasionaram prejuízos financeiros ao INSS, que, absorvendo uma falsa representação da realidade, concedeu e pagou indevidamente o benefício merecido.
Conclui-se, portanto, que ao obterem vantagem ilícita em prejuízo da Seguridade Social, mormente a denunciada VERA SUELI que, valendo-se das facilidades que seu cargo de chefe do Posto de Benefícios lhes proporcionava, mesmo sem ter a posse do numerário, os denunciados incidiram na prática do crime de peculato-furto, eis que a aplicação desse dispositivo se estende a todos, tendo em vista que concorreram voluntária e conscientemente para a prática do referido delito, transmitindo-se a RUBENS, ROSELI e DOUGLAS, a circunstância elementar de ser funcionário público (art. 30 do CP).

Da análise dos autos, verifico que a materialidade do delito restou amplamente demonstrada, conforme se infere do Laudo de Exame Documentoscópico nº 22794 (fls. 254/258), o qual atesta que os cartões de autorização de pagamento a procurador (fls. 29 a 30), emitidos em nome de DOUGLAS RAMOS e ROSELI DARLENE, foram escriturados por VERA SUELI LOBO RAMOS, servidora daquela autarquia federal e responsável pela habilitação e concessão do benefício de pensão por morte a Maria José da Silva.


Da mesma forma, a inscrição irregular de Maria José da Silva como dependente de seu falecido companheiro Manoel Figueiredo Ramos, verificada na cópia autenticada da Carteira de Trabalho e Previdência Social deste, foi igualmente escriturada por VERA SUELI LOBO RAMOS, conforme restou demonstrado pelo referido laudo técnico, com o objetivo de facilitar a concessão do benefício previdenciário almejado.


Anote-se que referidos cartões de autorização de pagamento a procurador necessitam de procuração específica do titular do benefício previdenciário para serem emitidos, em virtude da normatização estabelecida pela Previdência Social, procuração esta não outorgada por Maria José da Silva, conforme atesta o ofício encaminhado pelo Superintendente Estadual do INSS em Mato Grosso do Sul à Polícia Federal (fl. 239).


Também induvidosa revela-se a autoria por parte dos réus VERA SUELI LOBO RAMOS e RUBENS DARIO FERREIRA LOBO JUNIOR, bem como a participação dos réus DOUGLAS RAMOS e ROSELI DARLENE na conduta delitiva prevista no artigo 312, § 1º, do Código Penal.


Com relação à acusada VERA SUELI LOBO RAMOS, servidora pública lotada na unidade do INSS responsável pela emissão do benefício de pensão por morte requerido, a autoria revela-se nas provas materiais retro elencadas, restando corroborada por suas próprias declarações prestadas em sede administrativa (fls. 40/42).


RUBENS DARIO FERREIRA LOBO JUNIOR, advogado e irmão de Vera, por sua vez, apresentou-se a Maria José da Silva e lhe propôs pleitear administrativamente benefício previdenciário em razão do falecimento de seu companheiro Manoel José da Silva, conforme se infere do documento de fl. 552, bem como do depoimento prestado em Juízo por Maria José da Silva (fl. 524).


Ademais, do interrogatório judicial de DOUGLAS RAMOS (460/462), extrai-se a informação de que os valores por ele recebidos via de cartão de autorização de pagamento a procurador deveriam ser repassados a Rubens, conforme se verifica do trecho que ora transcrevo, por oportuno:


É esposo da acusada Vera Sueli Lobo Ramos, e, portanto, cunhado dos acusados Rubens Dário e Roseli Darlene. Afirma o interrogando que atua na advocacia, nas áreas trabalhista e cível, sendo certo que jamais lidou com causas previdenciárias, seja no âmbito administrativo ou judicial. O cunhado do depoente, Rubens Dário, advogava na cidade de Mundo Novo e já atuava na área previdenciária. Assim, tendo em vista que residia em cidade distante de Campo Grande, volta e meia Rubens pedia ao interrogando alguns favores. É o caso do benefício previdenciário requerido por ele em favor de Maria José da Silva. Rubens pediu ao interrogando que recebesse o benefício concedido em favor de Maria e remetesse os valores a ele. Não se lembra o depoente se depositou esses na conta-corrente ou se os remeteu diretamente. O interrogando esteve no INSS e falou com sua esposa Vera Sueli. Esta explicou-lhe que era possível o recebimento do benefício através de uma autorização de pagamento. Assim, recebeu o cartão de fl. 43, com o qual recebeu o benefício concedido em favor de Maria José da Silva (...)

DOUGLAS RAMOS e ROSELI DARLENE FERREIRA, esposo e irmã de VERA SUELI LOBO RAMOS, respectivamente, tiveram participação na prática do crime em tela ao receberem, por meio dos já mencionados cartões, o benefício previdenciário de pensão por morte devido a Maria José da Silva, conforme já admitido por Douglas em seu interrogatório judicial, e, em sede administrativa, por Roseli (fls. 65/66), tendo esta última efetuado depósitos em nome de RUBENS DARIO FERREIRA LOBO JUNIOR, conforme se verifica dos comprovantes de fls. 69/73 dos autos.


À fl. 455 foi decretada a revelia de ROSELI DARLENE FERREIRA, tendo-lhe sido nomeada advogada dativa e apresentada defesa prévia à fl. 471 dos autos.


Os depoimentos prestados em Juízo pelas testemunhas Inacir Miguel Zancalnelli (fls. 541/545) e Januário Dias de Moura (fls. 546/548), servidores do INSS responsáveis pela auditoria visando à apuração de irregularidades na concessão de benefícios previdenciários, são enfáticos no sentido de apontar a concorrência de todos os acusados para a prática da conduta ora incriminada, cada qual com seu modus operandi.


Quanto à alegação de que necessária a comprovação de prejuízo à Administração Pública para a tipificação do crime de peculato-furto previsto no artigo 312, § 1º, do Código Penal, tenho que não merece acolhida, uma vez que o bem jurídico tutelado neste caso, além do patrimônio, é a moralidade da Administração Pública, restando consumado o delito sob comento com a efetiva violação do dever funcional em prejuízo da Administração.


A propósito, o entendimento desta E. Turma:


CRIMINAL - PECULATO - AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS - PRINCÍPIO DA BAGATELA OU INSIGNIFICÂNCIA INCABÍVEIS 1. A autoria e a materialidade delitivas restaram devidamente comprovadas, ante o material fático probatório colacionado, tais como relatórios de apuração administrativa e depoimentos testemunhais. 2. No crime de peculato, o sujeito passivo da infração penal é a Administração Pública, e a consumação do delito se dá com a violação do dever de fidelidade do agente para com o Estado, sendo a vantagem patrimonial alcançada, mero exaurimento. 3. Recurso provido
(ACR nº 00101561620044036102, Rel. Des. Fed. LUIZ STEFANINI, p. e-DJF3 05/05/2008)

O argumento de necessidade de desclassificação do crime de peculato-furto para apropriação indébita, aduzido pelo acusado RUBENS DÁRIO FERREIRA LOBO JUNIOR, igualmente não merece prosperar, uma vez que do conjunto probatório se extrai que VERA SUELI LOBO RAMOS valeu-se de sua qualidade de funcionária pública para concorrer voluntariamente para a subtração de bem público em proveito de outrem, o que enseja a tipificação do crime previsto no artigo 312, § 1º, do Código Penal.


Assim, comprovadas a materialidade e a autoria do crime, porquanto presentes nos autos elementos probatórios de que VERA SUELI LOBO RAMOS, RUBENS DÁRIO FERREIRA LOBO JUNIOR, DOUGLAS RAMOS e ROSELI DARLENE FERREIRA LOBO agiram voluntária e conscientemente com o fim de concorrer para a subtração de bem público em proveito próprio ou alheio, valendo-se da facilidade proporcionada pela qualidade de funcionária pública de VERA SUELI LOBO RAMOS, não há reparo na sentença que os condenou como incursos no delito capitulado no artigo 312, § 1º, do Código Penal.


Passo à análise da dosimetria das penas.


a) Com relação aos réus VERA SUELI LOBO RAMOS e RUBENS DÁRIO FERREIRA LOBO JUNIOR:


Verifico que a pena-base foi corretamente fixada em 3 (três) anos de reclusão, levando-se em conta as circunstâncias judiciais de que trata o artigo 59 do Código Penal, em especial os maus antecedentes dos réus, mencionados às fls. 690/695 e 716/729 dos autos.


Ressalte-se que as condenações de que tratam os processos de nº 98.00005463, 98.00004114, 98.00005471 e 98.00005455, já tiveram seu trânsito em julgado decretado, conforme se verifica do sistema de consulta processual desta Corte, restando acertada a majoração da pena-base.


Ausentes circunstâncias agravantes e atenuantes, bem como causas especiais de aumento ou diminuição, a pena privativa de liberdade restou definitiva em 3 (três) anos de reclusão, não merecendo reforma a r. sentença neste tópico.


No que tange à pena de multa, observo que, segundo o mesmo critério utilizado para a fixação da pena privativa de liberdade, esta deveria ter sido fixada em 15 (quinze) dias-multa, razão pela qual a reduzo de ofício.


b) Com relação à ré ROSELI DARLENE FERREIRA LOBO:


A pena-base foi acertadamente fixada em 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão, em atenção aos antecedentes criminais mencionados às fls. 686/687 dos autos.


Tendo em vista a existência de condenação em processo criminal já transitado em julgado (2005.03.99.046110-1), justifica-se a majoração da pena-base para além do mínimo legal.


Ausentes circunstâncias agravantes e atenuantes, bem como causas especiais de aumento ou diminuição, a pena privativa de liberdade restou definitiva em 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão, devendo ser mantida nesse patamar.


No que tange à pena de multa, observo que, segundo o mesmo critério utilizado para a fixação da pena privativa de liberdade, esta deveria ter sido fixada em 12 (doze) dias-multa, razão pela qual a reduzo de ofício.


c) Com relação ao réu DOUGLAS RAMOS:


Verifico que a pena-base foi fixada em 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão, em razão dos antecedentes de que tratam as fls. 688/689 dos autos.


Entretanto, da análise do sistema de consulta processual desta Corte, não se verifica nenhuma condenação criminal transitada em julgado, motivo pelo qual merece reforma a r. sentença nesse ponto.


Assim, tendo em vista não restar demonstrado nos autos a presença de qualquer das circunstâncias judiciais (artigo 59 do Código Penal) a justificar o aumento do patamar da pena-base, levando-se em conta a aplicação, in casu, da Súmula 444 do C. STJ, a qual pacificou o entendimento no sentido de que os inquéritos policiais e as ações penais em curso não podem servir de parâmetro para efeito de majoração da pena-base, reduzo-a de ofício para o mínimo legal de 2 (dois) anos de reclusão.


No que se refere à pena de multa, observo que, segundo o mesmo critério utilizado para a fixação da pena privativa de liberdade, esta deveria ter sido fixada em 10 (dez) dias-multa, razão pela qual a reduzo de ofício.


Reduzo de ofício o valor do dia-multa para 1/30 (um trinta avos), em relação a todos os acusados, por não constar dos autos qualquer informação relativa à sua situação econômica.


Mantido o regime aberto para cumprimento das penas privativas de liberdade.


As penas privativas de liberdade dos réus ROSELI DARLENE FERREIRA LOBO e DOUGLAS RAMOS foram substituídas, cada uma, por uma pena de multa no valor de R$ 300,00 e uma pena restritiva de direito, consistente na prestação de serviços à comunidade, pelo período de 1 (um) ano e 6 (seis) meses, durante 7 (sete) horas semanais, de forma a não prejudicar suas jornadas de trabalho.


Consoante precedentes desta Turma, reverto as penas pecuniárias em favor da União Federal.


Ficam, assim, mantidas as penas substitutivas na forma como fixadas, uma vez que em conformidade com o artigo 44 do Código Penal.


Por esses fundamentos, rejeito a preliminar suscitada por RUBENS DARIO FERREIRA LOBO JUNIOR, e, no mérito, nego-lhe provimento, bem como à apelação interposta pela ré VERA SUELI LOBO RAMOS e pelo réu DOUGLAS RAMOS; julgo prejudicado o recurso interposto pela Defensoria Pública da União; de ofício, reduzo a pena privativa de liberdade do réu DOUGLAS RAMOS para 2 (dois) anos de reclusão, bem assim reduzo a pena de multa para 15 (quinze) dias-multa, em relação ao réu RUBENS DARIO FERREIRA LOBO JUNIOR e à ré VERA SUELI LOBO RAMOS; para 12 (doze) dias-multa, em relação à ré ROSELI DARLENE FERREIRA LOBO; para 10 (dez) dias-multa, em relação ao réu DOUGLAS RAMOS; reduzo o valor do dia-multa para 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo, em relação a todos os réus, e reverto as penas pecuniárias em favor da União Federal.


É o voto.






Vesna Kolmar
Desembargadora Federal


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