Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 22/01/2013
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0006119-50.2008.4.03.6119/SP
2008.61.19.006119-4/SP
RELATORA : Desembargadora Federal VESNA KOLMAR
APELANTE : SONIA MOLINA MOLINA
ADVOGADO : GISELE MELLO MENDES DA SILVA e outro
APELANTE : ANTONIO ISIDRO PLASENCIA GORDECH
ADVOGADO : DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO : Justica Publica
EXCLUIDO : ARISBEL BERTHA SIFONTE ALFONSO

EMENTA

PENAL. PROCESSUAL PENAL. PRELIMINAR DE NULIDADE REJEITADA. ARTIGOS 304 E 297 DO CÓDIGO PENAL. FALSIFICAÇÃO E USO DE DOCUMENTO PÚBLICO FALSO. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA REVERTIDA DE OFÍCIO EM FAVOR DA UNIÃO FEDERAL. APELAÇÕES DESPROVIDAS.
1. Os réus foram denunciados como incursos nas sanções do artigo 304 c.c. com artigo 297, do Código Penal, tendo o corréu sido denunciado também pelo artigo 297 do Codex.
2. A nulidade relativa deve ser alegada pela defesa em oportunidade imediatamente posterior ao ato que lhe deu causa e, no caso dos autos, somente foi alegada em razões de apelação. Quaestio preclusa. Ausente demonstração de prejuízo decorrente de nulidade (CPP, artigo 563). Precedentes. Preliminar de nulidade de interrogatório por ausência de assinatura das testemunhas rejeitada.
3. Materialidade comprovada pelos documentos constantes do Inquérito Policial, tendo o Laudo de Exame Pericial concluído pela falsidade dos documentos apreendidos.
4. Autoria evidenciada pelo interrogatório dos réus, depoimentos de testemunhas e demais provas coligidas aos autos.
5. Decreto condenatório mantido.
6. Dosimetria da pena mantida.
7. Prestação pecuniária revertida, de ofício, em favor da União Federal.
8. Preliminar rejeitada e, no mérito, apelações desprovidas e, de ofício, revertida a prestação pecuniária imposta à corré em favor da União Federal.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar de nulidade e, no mérito, negar provimento às apelações e, de ofício, reverter a prestação pecuniária imposta à corré em favor da União Federal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 15 de janeiro de 2013.
Vesna Kolmar
Desembargadora Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0006119-50.2008.4.03.6119/SP
2008.61.19.006119-4/SP
RELATORA : Desembargadora Federal VESNA KOLMAR
APELANTE : SONIA MOLINA MOLINA
ADVOGADO : GISELE MELLO MENDES DA SILVA e outro
APELANTE : ANTONIO ISIDRO PLASENCIA GORDECH
ADVOGADO : DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO : Justica Publica
EXCLUIDO : ARISBEL BERTHA SIFONTE ALFONSO

RELATÓRIO

A EXCELENTÍSSIMA SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL VESNA KOLMAR: Trata-se de Apelação Criminal interposta por Antônio Isidro Plasencia Gordech e Sônia Molina Molina contra a r. sentença (fls. 490/503), proferida pelo MM. Juiz Federal da 6ª Vara Federal de Guarulhos (SP), que julgou a ação procedente para:


a) condenar Antônio Isidro à pena de 2 (dois) anos de reclusão e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa, pelo delito previsto no artigo 304 c.c. o artigo 297, ambos do Código Penal e, à pena de 3 (três) anos de reclusão e ao pagamento de 15 (quinze) dias multa, pelo crime descrito no artigo 297 do mesmo Codex, que, materialmente cumulados, resultam na pena privativa de liberdade de 5 (cinco) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 25 (vinte e cinco) dias-multa, no valor mínimo legal e,


b) condenar a ré Sônia à pena de 2 (dois) anos de reclusão, em regime inicial aberto, e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa, no valor mínimo legal, pela prática do delito previsto no artigo 304 c.c. o artigo 297, todos do Código Penal, substituída a pena privativa de liberdade por uma pena restritiva de direitos, consistente na prestação pecuniária fixada em 3 (três) salários mínimos a ser paga a entidade pública ou privada com destinação social, designada pelo Juízo da Execução, e por uma pena de multa substitutiva, equivalente a 10 (dez) dias-multa, cada qual no mínimo legal, a ser recolhida em favor do Fundo Penitenciário Nacional.


Nas razões de apelação (fls. 526/538), Antônio suscita, em preliminar, a nulidade do interrogatório extrajudicial de Arisbel Bertha Sifonte Alfonso, à fl. 28 dos autos, por ausência de assinatura de testemunhas.


No mérito, o réu pleiteia, em síntese, a absolvição por ausência de provas da materialidade e autoria dos fatos, devendo ser aplicado o princípio in dubio pro reo.


Por fim, requer a fixação do regime aberto e a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos.


Nas razões de apelação (fls. 598/603), Sônia postula, em síntese, a absolvição, por ausência de provas da materialidade e autoria delitiva e pela configuração de crime impossível, nos termos do artigo 17 do Código Penal, uma vez que a falsidade grosseira do documento não ofende a fé pública. Aduz que, por se tratar de flagrante esperado, os agentes da Polícia Federal tinham conhecimento da falsidade, de modo que o documento não teve o condão de ludibriá-los, tratando-se, pois, de meio absolutamente ineficaz.


Nas contrarrazões (fls. 561/567), o Ministério Público Federal pugna pela manutenção da sentença.


A Procuradoria Regional da República (fls. 605/610), por sua ilustre representante Dra. Isabel Cristina Groba Vieira, opina pelo desprovimento das apelações.


O processo foi desmembrado em relação à acusada Arisbel Bertha Sifonte Alfonso (fls. 213/232).


É o relatório.


À revisão.




Vesna Kolmar
Desembargadora Federal Relatora


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0006119-50.2008.4.03.6119/SP
2008.61.19.006119-4/SP
RELATORA : Desembargadora Federal VESNA KOLMAR
APELANTE : SONIA MOLINA MOLINA
ADVOGADO : GISELE MELLO MENDES DA SILVA e outro
APELANTE : ANTONIO ISIDRO PLASENCIA GORDECH
ADVOGADO : DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO : Justica Publica
EXCLUIDO : ARISBEL BERTHA SIFONTE ALFONSO

VOTO

A EXCELENTÍSSIMA SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL VESNA KOLMAR: Sônia Molina Molina foi denunciada como incursa nas sanções do artigo 304 c.c. o artigo 297, ambos do Código Penal, e Antônio Isidro Plasencia Gordech como incurso nas sanções do artigo 304 c.c. o artigo 297 e artigo 297, na forma do Art. 69, todos do Código Penal.


Narra a denúncia (fls. 113/116):


"(...).
Consta dos autos que, no dia 01 de agosto de 2008, durante a madrugada, nas dependências do Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos, SONIA MOLINA MOLINA fez uso de documento público falso, consubstanciado no passaporte brasileiro nº CK358577 em nome de Amélia Margarita Casasus Sariol, tendo sido auxiliada moral e materialmente por ANTONIO ISIDRO PASENCIA GORDECH, responsável pelo fornecimento do passaporte falsificado e pela organização da viagem rumo aos Estados Unidos da América.
ANTONIO ISIDRO também foi responsável pela falsificação do passaporte brasileiro nº CS 165469, em nome de ZUSEL PEREZ QUEVEDO, encontrado em poder da denunciada ARISBEL BERTHA SIFONTE ALFONSO, na mesma data e local, tendo esta concorrido para a falsificação na medida em que forneceu sua fotografia e pagou pela obtenção do documento.
Na data e local supracitados, a Agente da Polícia Federal Luciana Horta, na ocasião em que trabalhava no setor de migração da Polícia Federal, recebeu informação de que passageiros embarcariam para o Panamá portando passaportes falsos.
A partir da notícia, a APF desconfiou da passageira ARISBEL, que lhe apresentou um passaporte cubano, sendo que nenhuma irregularidade foi constatada no documento. No entanto, ao ser realizada revista pessoal, encontrou-se em poder de ARISBEL um passaporte brasileiro com indícios de falsificação, em nome Zusel Perez Quevedo. Após consulta ao sistema de passaportes, constatou-se que o mesmo foi expedido em nome de Edson Ferreira da Silva.
Inquirida, ARISBEL confessou que adquirira o documento de pessoa conhecida como ANTONIO, que também estava no aeroporto naquele momento.
Prosseguindo-se às diligências, a policial desconfiou dos denunciados ANTONIO e SONIA, que conversavam no saguão de passageiros, sendo que aquele apontava para o passaporte, fornecendo informações a SONIA.
A policial continuou monitorando os passageiros ANTONIO e SONIA até a área de embarque, onde se dispersaram.
SONIA, ao passar pelo setor de migração, apresentou à agente de atendimento ELIANE RODRIGUES, um passaporte brasileiro com indícios de falsificação em nome de Amélia Margarita Casasus Sariol. Em pesquisa junto ao sistema de passaportes, verificou-se que o documento fora expedido em nome de Ernandes Paulo de Oliveira.
Foi ainda encontrada em poder de SONIA uma cédula de identidade cubana em nome de SONIA MOLINA MOLINA.
Ato contínuo, ANTONIO foi abordado e revistado, sendo encontradas, em uma das malas, fotografias de ARISBEL, bem como roupas femininas, que, segundo ela, pertenciam-lhe. Em outra bagagem de ANTONIO, foram encontradas reservas de hotel em seu nome e no de ZUSEL PEREZ QUEVEDO, indicando que se hospedariam juntos no percurso que fariam com vistas a ingressar ilegalmente nos Estados Unidos da América.
Dessume-se da narrativa acima que SONIA MOLINA MOLINA e ANTONIO ISIDRO PLASENCIA GORDECH praticaram a conduta delituosa tipificada no art. 304 c.c. o art. 297, ambos do Código Penal, na medida em que a primeira, contando com o auxílio moral e material deste último, fez uso de passaporte brasileiro adulterado perante as autoridades de migração brasileiras, na ocasião em que embarcaria em vôo com destino ao Panamá.
ANTONIO também incorreu na prática do delito previsto no art. 297 do Código Penal, na medida em que providenciou a falsificação e forneceu o passaporte brasileiro adulterado em nome de ZUSEL PEREZ QUEVEDO a ARISBEL BERTHA SIFONTE ALFONSO, tendo esta concorrido para o crime, pois contratou os serviços de ANTONIO, a ele fornecendo sua fotografia para a confecção do documento.
Pelo exposto, o Ministério Público Federal denuncia SONIA MOLINA MOLINA como incursa no art. 304 c.c o art. 297 do Código Penal; ANTONIO ISIDRO PLASCENCIA GORDECH como incurso nas sanções do artigo 304 c.c. artigo 297, e art. 297, todos do Código Penal; e ARISBEL BERTHA SIFONTE ALFONSO como incursa no art. 297 do Código Penal, (...)."

Por primeiro, observo que a preliminar de nulidade do interrogatório extrajudicial de Arisbel Bertha Sifonte Alfonso não prospera.


Verifico dos autos que os fatos narrados na denúncia ocorreram em 01.08.2008 no Aeroporto Internacional de Guarulhos. Por consequência, na referida data, deu-se a prisão em flagrante delito dos acusados Sônia e Antônio, enquanto Arisbel foi apenas indiciada, não tendo sido privada de sua liberdade.


Em cumprimento às suas atribuições, o Delegado de Polícia Federal Fábio Mota Muniz determinou a lavratura do Auto de Prisão em Flagrante Delito (fls. 02/10), tendo sido colhidos os interrogatórios de Sônia (fl. 08) e Antônio (fls. 09/10), na presença da intérprete Maria José Santos Macedo, e os depoimentos das testemunhas Luciana Horta de Antunes (fls. 02/05) e Eliane Rodrigues de Carvalho (fls. 06/07).


Na mesma data, em ato contínuo, o citado Delegado de Polícia Federal procedeu ao interrogatório de Arisbel (fls. 28/29), o qual foi devidamente acompanhado pela intérprete Maria José Santos Macedo.


Alega Antônio, em sede de apelação, a nulidade do interrogatório de Arisbel por ausência de assinatura de testemunhas.


Razão não lhe assiste, uma vez que a quaestio se encontra preclusa.


A nulidade relativa deve ser alegada pela defesa em oportunidade imediatamente posterior ao ato que lhe deu causa e, no caso dos autos, somente foi alegada em razões de apelação.


Ademais, deixou o apelante de demonstrar prejuízo decorrente de nulidade (CPP, artigo 563), não sendo possível suscitá-la com o mero objetivo de reforma do decreto condenatório fundamentado em farto conjunto de provas.


Neste sentido, colaciono a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:


"HABEAS CORPUS. ROUBO CIRCUNSTANCIADO. ALEGAÇÃO DE QUE A CONDENAÇÃO FOI BASEADA TÃO SOMENTE NO TESTEMUNHO DA VÍTIMA E EM PROVAS COLHIDAS NA FASE INQUISITORIAL. TESE SEM FUNDAMENTO. CONCLUSÃO DAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS BASEADAS EM DEPOIMENTOS OCORRIDOS NA FASE JUDICIAL E EM DEMAIS DOCUMENTOS DOS AUTOS. SUBSTITUIÇÃO DE TESTEMUNHAS NO DECORRER DA INSTRUÇÃO. SUPOSTA NULIDADE QUE SE MOSTRA, NA VERDADE, PRECLUSA, POR NÃO TER SIDO FORMULADA NO MOMENTO OPORTUNO. ALEGAÇÃO DESPROVIDA DE DEMONSTRAÇÃO DO CONCRETO PREJUÍZO. ART. 563, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. PAS DE NULLITÉ SANS GRIEF. HABEAS CORPUS DENEGADO.
1. No caso, da simples leitura da sentença verifica-se que a Magistrada sentenciante realizou o cotejo entre os testemunhos da vítima na fase processual e na judicial e avaliou diversos outros elementos probatórios, como o laudo de lesões corporais e o testemunho em juízo do ora Paciente. Por isso, a alegação de que a sentença baseou-se apenas e tão somente no depoimento da vítima e no inquérito policial não pode prosperar.
2. A rigor, em razão do que se colhe nos autos, o que pretende a Defesa, em verdade, é o revolvimento da conclusão das instâncias ordinárias acerca da situação fático-probatória, o que é vedado na via célere eleita.
3. Resta fulminado pelo instituto da preclusão o fundamento de que foi ilegal a substituição das testemunhas ocorridas. As nulidades relativas devem ser arguidas na primeira oportunidade para a Defesa se manifestar no processo-crime, após a produção do ato - o que não ocorreu no caso. Dessa forma, não há como ser reconhecido qualquer constrangimento no ponto.
4. Ainda que assim não fosse, tal fato ocorreu após o interrogatório do Paciente. Porém, à época da produção dos atos instrutórios, a oitiva do Acusado ocorria antes de as testemunhas serem ouvidas em juízo. Ora se efetivamente o Réu seria interrogado antes das testemunhas, não se evidencia qualquer prejuízo na posterior substituição ocorrida - ônus que cabia à Defesa demonstrar.
5. Alegações genéricas de nulidade, desprovidas de demonstração do concreto prejuízo, não podem dar ensejo à invalidação da ação penal. É imprescindível em tais casos a demonstração de prejuízo, pois o art. 563, do Código de Processo Penal, positivou o dogma fundamental da disciplina das nulidades - pas de nullité sans grief.
6. Apenas mencione-se que o pedido de substituição das testemunhas e a decisão que o deferiu sequer foram acostados aos autos - ônus que também competia ao Impetrante. Ora, no caso, sequer está documentado nos autos os motivos pelos quais ocorreu a substituição questionada. Relembre-se, por isso, que, em diversas ocasiões, alegações em habeas corpus desacompanhadas da devida comprovação nem mesmo foram conhecidas por esta Corte.
7. Habeas corpus denegado."
(STJ - HC - 167236/ES - Ministra Relatora LAURITA VAZ - DJe 03.05.12)
"HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. HOMICÍDIO. INQUÉRITO. INTERROGATÓRIO. REPRODUÇÃO SIMULADA DOS FATOS. NULIDADE. INOCORRÊNCIA. PRECLUSÃO.
1. O inquérito policial constitui peça meramente informativa, onde não existe contraditório e, exatamente por essa razão, não possui valor probatório, apenas servindo de suporte para a propositura da ação penal.
2. Não há nulidade processual sem demonstração da ocorrência de efetivo prejuízo para o réu, nos termos do art. 563 do Código de Processo Penal. É princípio de direito que: "pás de nullité sans grief".
3. As supostas nulidades no interrogatório e na realização do auto de reprodução simulada de fatos deveriam ter sido apontadas no momento oportuno pela Defesa, consoante previsão do art. 571, inciso I, do Código de Processo Penal, com demonstração do prejuízo, o que não ocorreu.
4. Ordem denegada."
(STJ - HC - 66186/SP - Ministra Relatora LAURITA VAZ - DJe 29.09.08)

Portanto, rejeito a preliminar de nulidade do interrogatório.


Passo à análise do mérito.


A materialidade delitiva restou comprovada, conforme se depreende do Inquérito Policial (fls. 02/105), no qual constam:


a) o Auto de Apresentação e Apreensão (fls. 11/12) de um passaporte da República Federativa do Brasil nº CK 358577 em nome de Amélia Margarita Casasus Sariol; uma cédula de identidade brasileira nº 9.516.586-4 SSP-SP em nome de Amélia Margarita Casasus Sariol; um passaporte da República Federativa do Brasil nº CS 165469 em nome de Zusel Perez Quevedo; uma cédula de identidade brasileira nº 19.340.601-3 SSP-SP em nome de Zusel Perez Quevedo;


b) Laudo de Exame Pericial nº 4062/2008 (fls. 161/164) que conclui que "Os documentos descritos nos itens I-3 e I-5 (passaportes brasileiros em nome de ZUSEL PEREZ QUEVEDO e AMELIA MARGARITA CASASUS SARIOL) são falsificados. Estão registrados no banco de dados do Departamento de Polícia Federal, respectivamente, em nome de EDSON FERREIRA DA SILVA e ERNANDES PAULO DE OLIVEIRA. Trata-se de cadernetas autênticas, adulteradas pela substituição das fotografias e das folhas que contêm os dados de identificação dos titulares. Os documentos descritos nos itens I-4 e I-6 (carteiras de identidade em nome de ZUSEL PEREZ QUEVEDO e AMELIA MARGARITA CASASUS SARIOL) são falsos. Os números de RG que neles constam estão registrados no banco de dados do Instituto de Identificação Ricardo Gumbleton Daunt, respectivamente, em nome de WALDIR ABILIO DA SILVA e GERALDO JOSÉ DA SILVA. Trata-se de meras imitações do modelo de documento emitido pelo instituto, impressas com informações falsas.";


c) documentos supracitados juntados às fls. 167/172 e 178.


A autoria também se revela induvidosa.


Em sede policial (fl. 08), Sônia declarou que viajava ao Panamá, mas tentaria ingressar nos Estados Unidos da América. Disse que obteve o passaporte falso no centro de São Paulo, pelo valor de US$ 5.000 (cinco mil dólares americanos), como segue:


"(...) Que estava viajando para o Panamá; Que do Panamá tentaria viajar para os Estados Unidos da América; Que tem parentes residindo nos Estados Unidos; Que não conhece ANTÔNIO ISIDRO PASENCIA GORDESH; Que apenas conversou com ele no saguão porque ambos são cubanos; Que conversou sobre Cuba; Que obteve o passaporte no centro de São Paulo; Que não sabe o nome da pessoa que lhe forneceu o documento brasileiro em nome de AMELIA MARGARITA CASASUS SARIOL; Que também não sabe onde essa pessoa pode ser encontrada; Que pagou US$ 5.000,00 (cinco mil dólares) pelo documento de viagem."

Em Juízo (fl. 383 - CD-ROM), Sônia afirmou que, na tentativa de regularizar a sua situação no Brasil, foi ao Cáritas, no centro de São Paulo. Revelou que, a caminho do Cáritas, passou por um bar onde um rapaz de nome Andrés lhe perguntou se teria interesse em ir aos Estados Unidos. Asseverou que, passado algum tempo, decidiu empreender a viagem àquele país, pois Andrés assegurou-lhe que teria a documentação para ingresso em território americano. Declarou que pagou R$ 5.000,00 (cinco mil reais) pelo passaporte. Disse que viu tratar-se de passaporte em nome de Amélia Margarita Casasus Sariol, mas que aquele foi seu último contato com o rapaz, o qual lhe disse que o caminho mais fácil para chegar aos Estados Unidos era através do Panamá e México. Afirmou que viajava sozinha e que conheceu Antônio Isidro no aeroporto. Narrou que do México pretendia ingressar nos Estados Unidos e que se encontraria com amigos em Miami. Disse que trazia consigo US$ 100 (cem dólares americanos) e que acreditava ser o suficiente para viajar do México aos Estados Unidos.


Em sede policial (fls. 9/10), Antônio afirmou que conheceu Sônia no aeroporto e que não conhecia Arisbel nem Zusel, como segue:


"Que é diretor de cinema; Que trabalha na Rússia; Que reside no Brasil; Que estava viajando hoje para Cancun, em vôo com conexão no Panamá; Que viajava a Cancun a turismo; Que comprou a passagem para Cancun em 27/07/08, pagando em dinheiro; Que conheceu SONIA MOLINA MOLINA hoje no aeroporto; Que conversou com SONIA sobre sua viagem; Que trocou telefone com SONIA e depois se despediu; Que depois de Cuba, viajaria para Monterey; Que não sabe o destino de SONIA; Que não sabe porque SONIA também viajaria para Monterey; Que não sabia que SONIA utilizaria documento brasileiro com indícios de falsidade; Que SONIA quando trocou telefones, havia se apresentado por seu nome verdadeiro; Que não conhece ARISBEL BERTHA SIFONTE ALFONSO; Que também não conhece ZUCEL QUEVEDO; Que a bagagem que havia despachado contendo roupas femininas seria levada para Cancun para ser entregue a uma amiga que se chama Raísa; Que sabia que na mala havia roupas femininas; Que não havia visto a foto de Arisbel dentro de sua bagagem que continha roupas femininas; Que não sabe porque foi encontrada uma reserva de hotel em nome de ZUCEL QUEVEDO e em seu nome em sua bagagem."

Em Juízo (fl. 383 - CD-ROM), Antônio declarou que é diretor de cinema, tendo estudado na Rússia. Disse que, no Brasil, trabalhou para companhias aéreas e, após um acidente de trabalho, foi indenizado, no montante de R$ 80.000,00 (oitenta mil reais), que empregou em negócio próprio, qual seja, um salão de beleza na cidade de Santos. Registrou que manteve o seu endereço em São Paulo, onde fazia compras de produtos para o salão. Afirmou que também obtinha renda da parceria de negócios com o tio, proprietário de uma farmácia em Cancun. Disse que viajava a negócios para Cancun, mas declarou anteriormente que viajava a turismo, pois não possui o visto de negócios. Asseverou que conheceu Sônia no aeroporto quando trocaram número de telefone e informações sobre o embarque, sendo que Sônia mostrou-lhe seu passaporte cubano, não o passaporte brasileiro. Disse que não sabia que Sônia viajaria aos Estados Unidos.


Antônio declarou, ainda, que conhecia Zusel, mas não Arisbel. Revelou que era amigo de infância do namorado de Zusel, o qual lhe pediu para acompanhá-la do Panamá ao Brasil, país que ela visitava pela primeira vez. Registrou que não sabia a explicação para o passaporte em nome de Zusel ter sido encontrado com Arisbel. Narrou que o namorado de Zusel comentou que iria ao México para se encontrar com Zusel e pediu-lhe que a ajudasse com a viagem. Afirmou que passou a ajudar Zusel na compra das passagens e que esta sugeriu que comprasse um pacote turístico, em razão do menor preço, daí porque seu nome aparece junto ao de Zusel nos documentos de viagem. Ressaltou que Zusel jamais disse que iria aos Estados Unidos. Esclareceu que tinha direito de despachar mais de uma mala e, por isso, enviou, em seu nome, uma mala, a pedido de Zusel. Afirmou que abriu a mala de Zusel e viu roupas femininas e a boneca, mas não a fotografia de Arisbel. Disse que não sabia explicar a razão de Arisbel ter declarado que recebeu o passaporte falso de uma pessoa chamada Antônio, que se encontrava no Aeroporto, e atribuiu este fato à Polícia Federal. Negou o fornecimento de documento falso a Arisbel e o seu encaminhamento aos Estados Unidos. Registrou que Ormani é o nome de seu amigo de infância, namorado de Zusel.


Por fim, Antônio asseverou que viajava com frequência aos Estados Unidos porque sua mãe e sua irmã vivem naquele país e estavam enfermas. Afirmou que obtinha as passagens com facilidade por ser membro de um programa de milhas aéreas. Ressaltou que, para a viagem em análise, adquiriu as passagens pela Seiva Turismo e obteve desconto ao efetuar o pagamento em moeda nacional. Disse que o valor da passagem era menor se pernoitasse no Panamá e no México.


Em sede policial, a Agente da Polícia Federal, Luciana Horta de Antunes, informou que:


"(...), encontrava-se trabalhando no setor de imigração desta Polícia Federal junto ao Terminal de Passageiros II; Que esta Delegacia recebeu uma denúncia mencionando o embarque de passageiros ao Panamá portando documento falsos; Que a partir de então foi solicitado o monitoramento do check in dos passageiros que embarcariam nesta madrugada pela empresa COPA AIRLINES, companhia esta que mantém vôo regular para o Panamá; Que inicialmente, compareceu na imigração a passageira ARISBEL BERTHA SIFONTE ALFONSO apresentando um passaporte cubano; Que suspeitou da passageira, tendo em vista que os cubanos costumam utilizar o Brasil como rota para alcançar os Estados Unidos da América e, para tanto, utilizam-se de documentos adulterados; Que nenhuma irregularidade foi constatada com o passaporte cubano apresentado, todavia, em revista pessoal, logrou êxito em encontrar um passaporte brasileiro com indícios de adulteração na bolsa da passageira; Que no passaporte constatava o nome ZUSEL PEREZ QUEVEDO, porém em consulta ao sistema de passaportes consta o nome EDSON FERREIRA DA SILVA; Que em entrevista, ARISBEL BERTHA SIFONTE ALFONSO confessou a aquisição do documento e mencionou que o responsável pela adulteração seria 'ANTONIO', que estaria neste aeroporto na data de hoje; Que prosseguindo as diligências, suspeitou dos conduzidos tendo em vista que, no saguão de passageiros, ANTONIO ISIDRO PLASENCIA GORDECH manteve contato com a conduzida SONIA MOLINA MOLINA, mostrando o passaporte para esta última e aparentando lhe dar explicações sobre o documento; Que há registro visual em VHS do contato mantido entre ANTONIO ISIDRO PLASENCIA GORDECH e SONIA MOLINA MOLINA; Que os conduzidos passaram a ser acompanhados até a área de embarque, onde se dispersaram; Que no guichê, perante a agente de atendimento ELIANE RODRIGUES, segunda testemunha, a conduzida SONIA MOLINA MOLINA apresentou um passaporte brasileiro com indícios de adulteração em nome de AMELIA MARGARITA CASASUS SARIOL; Que a página de dados biográficos foi substituída, uma vez que o padrão de impressão é jato de tinta; Que em pesquisa pelo número do passaporte, verificou-se que o documento foi originalmente emitido em nome de ERNANDES PAULO DE OLIVEIRA; Que em revista pessoal, foi encontrada em sua bolsa uma cédula de identidade cubana em nome de SONIA MOLINA MOLINA; Que a conduzida confessou a aquisição do documento; Que ato contínuo, ANTONIO ISIDRO PLASENCIA GORDECH foi abordado e identificado, momento em que descobriu se chamar 'ANTONIO' mesmo nome mencionado por ARISBEL BERTHA SIFONTE ALFONSO; Que os conduzidos, bem como ARISBEL SIFONTE ALFONSO foram apresentados nesta Delegacia; Que em revista nas bagagens dos conduzidos, encontrou-se em uma das malas despachadas por ANTONIO ISIDRO PLASENCIA GORDECH vestimentas femininas; Que questionado sobre o conteúdo, o conduzido mencionou que eram objetos pessoais de uma prima, a quem entregaria os pertences em Cancun; Que prosseguindo a revista na bagagem despachada por ANTÔNIO ISIDRO PLASENCIA GORDECH, foi encontrado um envelope em nome de ARISBEL contendo fotografia desta; Que questionado sobre as fotografias, ANTONIO ISIDRO PLASENCIA GORDECH passou a negar conhecimento sobre o conteúdo da mala, mencionando apenas que sua prima solicitou o transporte da bagagem até Cancun; Que Arisbel confessou ser sua a bagagem despachada por ANTONIO que continha roupas femininas e foto sua; Que descreveu todo o conteúdo da bagagem despachada por ANTONIO que continha vestimentas femininas; Que em uma outra bagagem despachada por ANTONIO foram encontradas reservas de um hotel em seu nome e no nome de ZUSEL PEREZ QUEVEDO, indicando que se hospedariam juntos; Que as passagens de SONIA MOLINA MOLINA e ANTONIO ISIDRO PLASENCIA GORDECH e ARISBEL BERTHA SIFONTE ALFONSO foram emitidas em 29/07/08, sendo que a dos dois primeiros foram pagas em dinheiro; Que foram encontrados ainda bilhetes eletrônicos indicando que SONIA MOLINA MOLINA e ANTONIO ISIDRO PLASENCIA GORDECH viajariam no mesmo vôo de Cancun para Monterey; Que em razão desses fatos deu voz de prisão em flagrante delito pela prática crime de uso de documento falso;"

Em Juízo (fl. 383 - CD-ROM), a testemunha de acusação Luciana descreveu que tinha conhecimento da notitia criminis de que pessoas passariam pelo setor de imigração utilizando-se de passaporte falso. Narrou que a primeira viajante se apresentou com o passaporte cubano e, após a revista, foi encontrado o passaporte brasileiro contrafeito em nome de Zusel Perez Quevedo. Relatou que, verificado o sistema de informações da Polícia Federal, constatou-se o nome de um homem, Edson. Disse que, questionada, a pessoa respondeu que viajaria na companhia de Antônio, que se encontrava no local.


Luciana narrou que a segunda viajante, Sônia, apresentou-se no guichê com o passaporte em nome de outra pessoa e, pesquisado o sistema, verificou-se que o documento também estava em nome de um homem. Informou que, constatada a falsidade, procedeu-se à revista e foi encontrada uma carteira de identidade cubana em nome de Sônia. Declarou que, em seguida, passou pelo guichê o Senhor Antônio, que entregou o passaporte brasileiro.


Luciana afirmou que recebeu a informação da Polícia Federal no sentido de que duas pessoas passariam pela imigração acompanhadas de terceira pessoa que as levaria para um país com o intuito de, posteriormente, ingressar nos Estados Unidos. Esclareceu que a primeira pessoa fiscalizada era Arisbel.


Em sede policial e judicial (fls. 06/07 e 383 - CD-ROM), a testemunha Eliane Rodrigues de Carvalho, servidora terceirizada da Polícia Federal, com atribuições no setor de imigração, ratificou as declarações prestadas por Luciana.


Em Juízo (fl. 383 - CD-ROM), Eliane esclareceu que acompanhou a revista das malas de Antônio, sendo que uma das malas continha pertences de uma mulher, que Antônio disse ser sua prima. Informou que a foto encontrada na mala de Antônio era de uma das cubanas detidas. Disse que a referida cubana soube descrever os objetos encontrados na mala. Revelou que se tratava dos pertences de Arisbel e que também foi encontrada uma reserva de hotel na bagagem de mão de Antonio.


Em sede extrajudicial, Arisbel relatou que Antônio era o responsável pela organização de sua viagem aos Estados Unidos e lhe forneceu o passaporte brasileiro em nome de Zusel:


"Que chegou de Cuba em 14/07/2008; Que ficou hospedada em um Hotel; Que veio ao Brasil como rota para viajar aos Estados Unidos da América; Que possui um namorado nos Estados Unidos; Que seu namorado é cubano e se chama Omani; Que foi o namorado que providenciou sua viagem aos Estados Unidos; Que não sabe o valor que foi pago para que fosse providenciada sua viagem aos Estados Unidos; Que saiu de Cuba para o Panamá; Que conheceu ANTONIO ISIDRO PLASENCIA GORDECH no Panamá em 13/07/2008; Que ANTONIO sabia como a depoente estava vestida; Que utilizou o documento cubano quando ingressou no Brasil; Que chegou no Brasil em 14/07/08; Que encontrou-se com ANTONIO varias vezes no Brasil; Que ANTONIO era o responsável pela organização de sua viagem aos Estados Unidos; Que ANTONIO embarcaria hoje com a depoente para o Panamá; Que ANTONIO não dizia com antecedência todos os passos da viagem; Que foi ANTONIO que lhe forneceu o passaporte brasileiro em nome de ZUSEL PEREZ QUEVEDO; Que foi ANTONIO que reservou as passagens aéreas e hospedagens em hotéis de toda a viagem; Que hoje ANTONIO pegou sua bagagem e despachou como se fosse do primeiro; Que todos os seus pertences foram etiquetados em nome de ANTONIO; Que havia uma foto sua dentro de sua bagagem que fora despachada por ANTONIO; Que também estava na bagagem roupas, uma bolsa da Puma, uma boneca, entre outras coisas; Que hoje viu ANTONIO conversando com uma senhora cubana no saguão do aeroporto; Que ANTONIO pediu para que não conversasse com esta senhora cubana; que não apresentou o passaporte brasileiro em nome de ZUSEL PERES QUEVEDO na imigração brasileira, apresentando o passaporte cubano em seu nome; Que foi abordada por uma policial federal no momento da imigração; Que foi encontrado em sua bagagem um passaporte brasileiro em nome de ZUSEL PERES QUEVEDO; Que resolveu cooperar com a Polícia Federal e a Justiça brasileira falando toda a verdade sobre os fatos."

Em sede judicial (fl. 383 - CD-ROM), a testemunha de defesa Célia Cristina Ferreira Pinto nada soube esclarecer sobre os fatos narrados na denúncia.


Do conjunto probatório infere-se que Sônia fez uso de passaporte brasileiro sabidamente falso. A apelante não nega que se apresentou diante do guichê de imigração da Polícia Federal com o citado documento e afirma, em Juízo, que verificou tratar-se de passaporte em nome de Amélia Margarita Casasus Sariol, pelo qual pagou o equivalente a R$ 5.000,00 (cinco mil reais). O dolo e a ilicitude da conduta são evidentes.


Os depoimentos da Agente da Polícia Federal Luciana Horta de Antunes, em sede judicial e extrajudicial, são claros e precisos no sentido de que Sônia compareceu perante o setor de imigração do Aeroporto Internacional de Guarulhos e apresentou passaporte brasileiro em nome de Amélia, enquanto o sistema de informações da Polícia Federal apontava para aquele número de passaporte o nome de um homem. Luciana também informou que, em revista pessoal à apelante, foi encontrada a sua identidade cubana, oportunidade em que se desvelou seu nome, Sônia Molina Molina.


As declarações de Luciana foram confirmadas pela testemunha Eliane Rodrigues de Carvalho.


O laudo de Exame Pericial não deixa dúvida de que o passaporte foi adulterado pela substituição da fotografia e da folha que contém os dados de identificação do titular Ernandes Paulo de Oliveira.


Não se trata de crime impossível em razão de falsificação grosseira, pois a falsidade não era perceptível primo ictu oculi. O passaporte apresentado pela acusada poderia passar por autêntico, uma vez que foi necessário o exame por profissional habilitado para a confirmação do falso. A sua utilização pela ré violou o bem jurídico tutelado, a fé pública.


O fato de integrantes da Polícia Federal conhecerem a notitia criminis também não torna o crime impossível, nos termos do artigo 17 do Código Penal.


Ao contrário do que a defesa sustenta, restou configurado o flagrante esperado, na medida em que os Policiais Federais apenas aguardaram o momento da prática delituosa para cumprir o seu dever legal.


Nos termos da lição do Professor Fernando Capez - in Curso de Processo Penal, 17ª edição, editora saraiva, pág. 310, temos que:


"(...) Flagrante esperado: nesse caso, a atividade do policial ou do terceiro consiste em simples aguardo do momento do cometimento do crime, sem qualquer atitude de induzimento ou instigação. Considerando que nenhuma situação foi artificialmente criada, não há que se falar em fato atípico ou crime impossível. O agente comete crime e, portanto, poderá ser efetuada a prisão em flagrante. Esta é a posição do STJ: "Não há flagrante preparado quando a ação policial aguarda o momento da prática delituosa, valendo-se de investigação anterior, para efetivar a prisão, sem utilização de agente provocador. (...)".

Portanto, não há que se falar em crime impossível no caso dos autos.


O farto conjunto de provas também evidencia a participação do apelante Antônio no delito de uso de documento público falso perpetrado por Sônia.


A negativa dos fatos por Antônio não prospera. O réu alega que conheceu Sônia no aeroporto. Entretanto, ambos tinham o mesmo destino Monterrey (México), com passagens compradas pela Seiva Turismo, através do email de contato "micheli@seivaturismo.com.br", e reservas no mesmo hotel, Best Western Centro Monterrey, no período de 02.08.08 a 05.08.08, com vouchers emitidos pela empresa UTELL by Pegasus (fls. 13/14 e 19/20).


Além disso, como bem assinalou o magistrado de primeiro grau, a filmagem do aeroporto comprova que o corréu Antônio entregou à Sônia o passaporte momentos antes de se dirigem separadamente ao setor de imigração.


Confira-se excerto da sentença (fls. 495/497):


"A participação de Antonio Isidro no crime, da mesma forma, exsurge a par da análise do conjunto probatório colacionado.
Embora Antônio Isidro, cubano naturalizado brasileiro, tenha se esmerado em negar a participação no crime em comento, afirmando em Juízo que conhecera a ré Sônia ocasionalmente no Aeroporto de Guarulhos, fato é que tal versão restou isolada nos autos, especialmente a par do quanto registrado pela sistema de vídeo do Aeroporto.
Refiro-me à prova da autoria coligida nos autos consiste em uma gravação de imagens, sem áudio, registrada em uma fita VHS acostada à fl. 294. A câmera registra imagens do saguão do aeroporto, dos terminais de embarque, cenas da movimentação das pessoas. Marcando 02:40, a câmera focaliza os réus Sônia e Antônio Isidro sentados, conversando. Em seguida a ré recebe do co-réu um envelope e guarda-o na mala. Ambos levantam e inicialmente se afastam um do outro, seguindo em direção oposta. Mas logo em seguida passam a caminhar na mesma direção, o réu na frente. Encaminham-se se para o setor de embarque e antes de se dirigirem cada qual para um guichê, a cena mostra Sonia recebendo de Antonio o passaporte e em seguida entregando-o à funcionária (nesse instante a marcação do vídeo é de 02:42). Depois a câmera focaliza a bagagem do réu sendo submetida ao equipamento de raio-x. O acusado chega primeiro ao guichê e apresenta os seus documentos. A funcionária inicia o atendimento e analisa o documento. Conversa com a atendente ao lado. As funcionárias entreolham-se e conversam. O réu continua aguardando. Sonia encaminha-se para o guichê contíguo ao que está o acusado, entrega seus documentos e a funcionária fala com ela. Após, todos aguardam por certo período, até que chega ao local o policial federal que vai ao encontro de Sonia, faz-lhe algumas perguntas, encaminhando-a, em seguida, a uma outra sala. Neste instante, (02:49), Sonia lança um último e intrigante olhar para o co-réu Antonio Isidro, seguindo com o policial. Minutos depois, o mesmo ocorre com o réu, que também é conduzido pela polícia, encerrando-se a gravação.
É certo, insisto, que o acusado apresentou versão repleta de detalhes na tentativa de esquivar-se da acusação e destruir as conclusões que exsurgem da filmagem gravada em VHS. A versão dele, contudo, não pode ser aceita, porquanto as imagens claramente revelam o momento em que ele entrega o passaporte brasileiro adulterado à co-ré Sonia Molina Molina, a fim de que ela burlasse a fiscalização aeroportuária. Ademais, a atitude demonstrada por ambos na filmagem realizada no aeroporto não condiz com o comportamento de duas pessoas recém conhecidas, como quer fazer crer o réu nas declarações prestadas por ocasião de seu interrogatório.
(...)
As provas carreadas aos autos, a saber, a perícia documentoscópica; o relato das testemunhas; bem assim as circunstâncias da prisão, são suficientes para confirmar de forma indelével o cometimento do delito pelos réus Sonia e Antonio Isidro, restando indene de dúvidas o dolo na obtenção e efetivo uso do documento falsificado por parte da ré Sonia, com plena ciência da falsificação; bem assim, a conduta de auxiliar material e moralmente Sonia no uso do documento público falso perante a fiscalização aeroportuária, conduta esta praticada pelo co-réu Antonio Isidro.

Claro, portanto, que a conduta da corré Sônia Molina Molina, que se apresentou ao setor de imigração do Aeroporto Internacional de Guarulhos fazendo uso de passaporte brasileiro falso, bem como do corréu Antônio Isidro Plasencia Gordech, que auxiliou Sônia moral e materialmente no uso do documento falso, subsume-se ao tipo penal inscrito no artigo 304 c.c. o artigo 297, ambos do Código Penal.


Do conjunto probatório dos autos, infere-se, ainda, a autoria de Antônio na falsificação do passaporte brasileiro em nome de Zusel Perez Quevedo encontrado na posse de Arisbel Bertha Sifonte Alfonso.


Primeiramente, cumpre salientar que ambos os passaportes apreendidos foram adulterados pelo mesmo modus operandi, qual seja, a substituição da fotografia e da folha que contém os dados de identificação do titular, que neste caso, tratava-se de Edson Ferreira da Silva.


Embora o apelante tenha negado a autoria delitiva, as suas versões dadas aos fatos, na fase policial e judicial, são controvertidas e incongruentes.


Na fase inquisitiva, Antônio afirmou que não conhecia nem Zusel nem Arisbel e que a mala por ele despachada, que continha roupas femininas e um envelope com foto de Arisbel, pertencia a uma pessoa chamada Raísa. Em Juízo, disse que conhecia Zusel, mas não Arisbel e que a referida mala foi despachada a pedido de Zusel.


As passagens aéreas e reservas de hotel em nome de Antônio e Zusel (fls. 19/20) comprovam que eles viajavam juntos e se hospedariam nos hotéis Best Western Centro Monterrey e Camino Real Nuevo Laredo.


As declarações de Arisbel, em sede extrajudicial, esclarecem que Antônio era o responsável pela organização de sua viagem aos Estados Unidos, tendo reservado passagens aéreas e hotéis para toda a viagem, fornecido o passaporte brasileiro em nome de Zusel Perez Quevedo e despachado os seus pertences.


Neste sentido, observo que a sentença foi amplamente fundamentada. Confira-se (fl. 499):


"(...)
Não se trata, portanto, de concluir pela autoria de Antonio Isidro no tocante ao falso com base apenas nas declarações de Arisbel colhidas ainda no curso do inquérito policial, mas sim de atingir tal conclusão a partir do quanto declarado por ela e ainda pelo mais existente nos autos, tal como: 1) as contradições nos depoimentos de Antonio Izidro na seara policial e em Juízo (v.g. primeiro disse que os pertences de Arisbel encontrados na mala por ele despachada pertenciam a uma prima, para depois dizer que desconhecia o conteúdo da mala; disse que conhecera Sonia Molina no aeroporto por ocasião do embarque, mas foi flagrado pelas câmeras de segurança do aeroporto em atitude obviamente suspeita, entregando a Sonia o passaporte brasileiro falsificado CK 358.577 e lhe dando orientações de como proceder, ainda que não captadas por áudio; primeiro disse à Polícia desconhecer qualquer Arisbel ou Zusel, para depois mudar a versão perante o magistrado para declarar que conhecia Zusel Perez Quevedo - namorada de um amigo residente em Miami - a quem prestaria auxílio para viajar para os EUA); 2) a apreensão de mala despachada com pertences de Arisbel - a comprovar que com ela mantinha contato prévio e com ela se encontraria no Panamá e em Monterrey/México a par das reservas de viagem realizadas; 3) a prisão de Sonia quando do uso de passaporte brasileiro falso a ela entregue pelo réu, conforme já exaustivamente examinado alhures, sendo o itinerário de Sonia idêntico àquele a ser desenvolvido por Arisbel (Guarulhos - Cidade do Panamá - Monterrey/México - EUA), de modo que ambas fossem a um só tempo auxiliadas, monitoradas e preparadas por Antonio Isidro para adentrar ilegalmente no território americano, em atividade típica daqueles vulgarmente conhecidos como 'coiotes'."

Assim, resta inconteste que Antônio agiu com a intenção de falsificar passaporte brasileiro e facilitar a entrada de Arisbel em território alinenígena, tendo perpetrado o crime previsto no artigo 297 do Código Penal.


Portanto, não merece reparo o decreto condenatório.


Passo à análise da dosimetria da pena.


Embora Sonia Molina Molina não tenha se insurgido contra a dosimetria da pena, examino-a por se tratar de matéria de ordem pública.


Nos termos do artigo 59 do Código Penal, observo que o MM. Juiz de primeiro grau, com acerto, fixou a pena-base no mínimo legal, em 2 (dois) anos de reclusão e a multa em 10 (dez) dias-multa, no valor unitário mínimo.


Sem atenuantes (Súmula 231 do STJ) e agravantes, assim como causas de diminuição e aumento de pena, tornou-a definitiva, que não merece qualquer reparo.


Fica mantido o regime aberto para o início do cumprimento de pena e a substituição da pena privativa de liberdade por uma pena restritiva de direitos e uma multa substitutiva, nos termos fixados na sentença; entretanto, reverto ex officio a prestação pecuniária em favor da União Federal.


Examino a dosimetria da pena de Antônio Isidro Plasencia Gordech quanto ao crime previsto no artigo 304 c.c. o artigo 297 ambos de Código Penal.


Também com acerto, o magistrado de primeiro grau fixou a pena-base no mínimo legal, em 2 (dois) anos de reclusão, e a multa em 10 (dez) dias-multa, cada qual no mínimo legal.


Ausentes atenuantes e agravantes, bem como causas de diminuição e aumento de pena, foi ela tornada definitiva, que fica mantida.


Passo à análise da fixação da pena de Antônio no tocante ao delito tipificado no artigo 297 do Código Penal.


Uma vez mais, merece ser mantida a pena-base fixada pelo magistrado de primeiro grau, nesta hipótese, acima do mínimo legal, no patamar de 3 (três) anos de reclusão, nos termos do artigo 59 do Código Penal, e a multa equivalente a 15 (quinze) dias-multa, no valor unitário mínimo.


O MM. Juiz a quo esclarece na sentença (fls. 500/501):


"(...) considero o alto grau de censurabilidade da conduta do acusado, que demonstrou nestes autos que tinha por meio de vida facilitar o encaminhamento de pessoas - em especial compatriotas cubanos - aos EUA de forma ilegal, valendo-se para tanto dos conhecimentos que possui sobre o funcionamento da atividade aeroportuária pelo seu histórico profissional detalhado em seu interrogatório e também por meio da falsificação de passaportes brasileiros para promover a burla a toda sorte de fiscalização durante as viagens aéreas internacionais a serem realizadas pelos interessados em seus 'serviços'. Considero, ainda, as nefastas consequências advindas desse crime, já que a proliferação de adulterações de passaportes nacionais macula a mais não poder a boa imagem do Estado brasileiro perante seus pares, diminuindo a credibilidade e boa receptividade dos documentos oriundos do Brasil por autoridades estrangeiras, tudo, em última análise, de modo a gerar dificuldades e restrições as mais variadas para os brasileiros honestos quando em viagens internacionais."

Não havendo atenuantes e agravantes ou causas de diminuição e aumento de pena, foi definitivamente fixada nos termos supracitados.


Reconhecido o concurso material entre os crimes perpetrados por Antônio, a pena totaliza 5 (cinco) anos de reclusão e 25 (vinte cinco) dias-multa, que fica mantida.


Mantido também o regime semiaberto para o início do cumprimento de pena a teor do disposto no artigo 33, § 2º, b e § 3º c.c. o artigo 59, do Código Penal e a não substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos (CP, art. 44, I).


Por esses fundamentos, rejeito a preliminar de nulidade e, no mérito, nego provimento às apelações e, de ofício, reverto a prestação pecuniária imposta à corré em favor da União Federal.



Vesna Kolmar
Desembargadora Federal


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