Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 06/03/2013
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000393-98.2012.4.03.6105/SP
2012.61.05.000393-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal LUIZ STEFANINI
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : PAULA AYALA reu preso
ADVOGADO : GUSTAVO HENRIQUE BERTOCCO DE SOUZA (Int.Pessoal)
: DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO : OS MESMOS
No. ORIG. : 00003939820124036105 1 Vr CAMPINAS/SP

EMENTA

PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO TRANSNACIONAL DE DROGAS: ART. 33, CAPUT, C/C ART. 40, I DA LEI 11.343/06. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. CONDENAÇÃO MANTIDA. DOSIMETRIA DA PENA: NATUREZA E QUANTIDADE DA DROGA: PENA-BASE MAJORADA. CONFISSÃO: PRISÃO EM FLAGRANTE: IRRELEVÂNCIA: FUNDAMENTO DA CONDENAÇÃO: APLICAÇÃO DA ATENUANTE. CAUSA DE AUMENTO DO INC. I DO ART. 40 DA LEI 11.343/06: DISTÂNCIA ENTRE PAÍSES: AUSÊNCIA DE PROVAS DE DISTRIBUIÇÃO DA DROGA POR MAIS DE UM PAIS: APLICAÇÃO DA CAUSA DE AUMENTO DA TRANSNACIONALIDADE NO PATAMAR MÍNIMO. § 4º DO ART. 33 DA LEI 11.343/06: INAPLICABILIDADE AOS "MULAS": PROVAS DE ENVOLVIMENTO COM ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. EXCLUSÃO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS E DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE: IMPOSSIBILIDADE: VEDAÇÃO DECORRENTE DE PRECEITO CONSTITUCIONAL E DE LEI ESPECIAL: CF ART. 5º, XLIII, ART. 2º, II, DA LEI 8.072/90, ARTS. 33, § 1º, 34, 37 E 59 DA LEI 11.343/06.
1 . Comprovadas nos autos a materialidade, autoria e dolo do crime previsto no art. 33, caput, c/c o art. 40, I, da Lei 11.343/06 praticado pela ré, presa em flagrante no Aeroporto Internacional de Viracopos/SP, quando prestes a embarcar em vôo para Lisboa/Portugal, trazendo consigo, no interior do organismo, cápsulas contendo 1.220 g. de cocaína.
2 . Condenação mantida.
3 . O julgador, na individualização da pena, deve examinar detidamente os elementos que dizem respeito ao fato, segundo os critérios estabelecidos pelo artigo 59 do CP. No caso de tráfico de drogas, há ainda que observar o artigo 42 da Lei 11.343/06, o qual determina expressamente que o Juiz, na fixação da pena, deve considerar, com preponderância sobre as circunstâncias judiciais previstas no artigo 59 do CP, a natureza e quantidade da droga, bem como a personalidade e conduta do agente. Apesar da primariedade e bons antecedentes, considerando-se a natureza e quantidade da droga que transportava, bem como as circunstâncias dos fatos, em que a droga foi ingerida causando sérios riscos à vida, justifica-se a aplicação da pena-base em um ano acima do mínimo lega. Pena-base elevada para seis anos de reclusão.
4 . Ainda que a ré tenha sido presa em flagrante e que a autoria criminosa seja conhecida, a atenuante da confissão deve ser aplicada quando efetivamente confessou os fatos perante a autoridade judicial, contribuindo para a formação do convencimento do Juiz acerca da autoria delitiva. Precedentes. Pena reduzida para cinco anos e seis meses de reclusão.
5 . Comprovada a transnacionalidade do tráfico, incide a causa especial de aumento de pena do inc. I do art. 40 da lei de drogas. Porém. a mera distância entre países não justifica a aplicação em patamar acima do mínimo, admitida apenas nos casos em que a droga deixe o território nacional para ser distribuída em mais de um país no exterior. O legislador previu, nos incisos desse artigo, uma série de causas de aumento de pena, que justificam um aumento variável de um a dois terços, porém não estabeleceu os parâmetros para a quantificação do percentual. O índice de aumento deve ser calculado de acordo com as circunstâncias especificamente relacionadas com a causa de aumento, (e não às do crime), e variar de acordo com a quantidade de majorantes que estiverem presentes, de forma que na incidência de apenas um inciso não se justifica a elevação do percentual mínimo. Caso em que o réu foi preso com a droga ainda em território brasileiro e, em que pese sua intenção de levá-la a outro continente, não está comprovado que pretendesse difundi-la em mais de um país. Mantida a aplicação da causa de aumento em sexto, elevando a pena para 6 (seis) anos e 5 (cinco) meses de reclusão.
6 . Excluída a aplicação da causa de redução de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei de Drogas. Ainda que não se dedique a atividades criminosas e não haja notícias de ter praticado anteriormente algum crime, a ré, ao transportar a droga, integrou, de maneira voluntária, uma estrutura criminosa voltada à prática do tráfico transnacional de drogas, pois promoveu a conexão entre os membros da organização, de forma que não preencheram um dos requisitos necessários para gozar do benefício, que é o de "não integrar organização criminosa".
7 . Impossibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. A conversão não se mostra como medida social recomendável, diante do estímulo para a prática do tráfico de drogas, crime que causa grave lesão ao bem jurídico tutelado (saúde pública), sendo insuficiente para a prevenção e repressão do delito. Ainda que se admita a substituição das penas pelo fato de os estrangeiros serem iguais aos brasileiros perante a Constituição Federal, para a concessão será necessário que não estejam em situação irregular no país e que nele possuam residência fixa.
8 . O Plenário do STF declarou, através do "habeas corpus" 97256, pela via incidental, a inconstitucionalidade da expressão "vedada a conversão em penas restritivas de direitos" contida no parágrafo 4º do art. 33, da Lei nº 11.343/06, bem como da expressão "vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos", constante do art. 44 da mesma lei. Contudo, a ordem não foi concedida para assegurar ao paciente a imediata substituição, mas sim para remover o óbice contido na Lei 11.343/06, devolvendo ao Juízo das Execuções Criminais a tarefa de auferir o preenchimento das condições objetivas e subjetivas para a concessão.
9 . Caso em que as particularidades do crime não recomendam a substituição, tendo em vista o grau elevado de culpabilidade da ré, com provas contundentes de que participou de uma organização criminosa complexa.
10 . A proibição da liberdade provisória, nos casos de crimes hediondos e assemelhados, decorre da própria proibição de fiança imposta pela CF, art. 5º, XLIII. O art. 2º, II, da Lei nº 8.072/90 nada mais fez do que atender à norma constitucional, ao considerar inafiançáveis os crimes de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os crimes definidos como hediondos.
11 . A Lei nº 11.343/2006, que é específica para os crimes de tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, no artigo 44 estabelece que os crimes previstos nos artigos 33, caput e § 1º e 34 a 37 são insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória. Dispõe ainda o artigo 59 da mesma lei que, nos crimes de tráfico , o réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, salvo se for primário e de bons antecedentes, assim reconhecido na sentença condenatória. Contudo, não tem o direito de recorrer em liberdade o acusado que permaneceu justificadamente preso durante a instrução criminal, por força de prisão em flagrante ou preventiva, ainda que seja primário e de bons antecedentes. Sobrevindo sentença penal condenatória, um de seus efeitos é a manutenção da custódia do réu para apelar, o que não constitui ofensa à garantia constitucional da presunção de inocência, nos termos da Súmula 09 do STJ, de forma que eventuais condições favoráveis do agente, como primariedade e bons antecedentes, não são garantidoras de direito subjetivo à liberdade provisória, quando outros elementos recomendam a prisão.
12 . A vigência da Lei nº 11.464/07, que deu nova redação ao artigo 2º, II, da Lei 8.702/90 afastando a vedação à liberdade provisória aos crimes equiparados a hediondos, não revogou o disposto no artigo 44 da lei 11.343/06 em relação à liberdade provisória, já que a Lei 11.343/06 se trata de legislação especial, que expressamente veda essa concessão aos acusados de tráfico de drogas, não se havendo que falar que o artigo 44 da lei de drogas foi derrogado tacitamente pela Lei 11.464/2007, ou em inconstitucionalidade do referido dispositivo legal, uma vez que é fruto da regra constitucional prevista no art. 5º, inc. XLIII da Constituição Federal, e de uma política criminal mais rigorosa de repressão aos crimes de tráfico .
13 . Caso em que a acusada foi presa em flagrante e assim permaneceu durante toda a instrução criminal. Ademais, é estrangeira, sem vínculos com o distrito da culpa, com fortes possibilidades de se evadir se for solta, razão pela qual sua prisão tem por finalidade assegurar a aplicação da lei penal e o próprio resultado do processo, com o cumprimento integral da pena.
14 . Apelação ministerial a que se dá parcial provimento para aumentar a pena-base da ré e excluir, da dosimetria da pena, a causa de redução do § 4º do artigo 33 da Lei 11.343/06.
15 . Apelação da defesa a que se dá parcial provimento para reconhecer a atenuante da confissão espontânea, fixando a pena da ré definitivamente em 6 (seis) anos e 5 (cinco) meses de reclusão e pagamento de 641 (seiscentos e quarenta e um) dias-multa).








ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, dar parcial provimento à apelação ministerial para aumentar a pena-base da ré e excluir, da dosimetria da pena, a causa de redução do § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/06 e, por maioria, dar parcial provimento à apelação defensiva, a fim de reconhecer a atenuante da confissão espontânea, fixando a pena da ré definitivamente em 6 (seis) anos e 5 (cinco) meses de reclusão e pagamento de 641 (seiscentos e quarenta e um) dias-multa, nos termos do voto do Des. Fed. Antonio Cedenho, acompanhado pela Des. Fed. Ramza Tartuce, vencido o Relator que dava parcial provimento à apelação ministerial tão somente para aumentar a pena-base e dava parcial provimento à apelação defensiva, a fim de reconhecer a atenuante da confissão espontânea, mantendo-se as penas tal como aplicadas em primeiro grau.




São Paulo, 05 de novembro de 2012.
Antonio Cedenho
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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Data e Hora: 25/02/2013 17:06:37



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000393-98.2012.4.03.6105/SP
2012.61.05.000393-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal LUIZ STEFANINI
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : PAULA AYALA reu preso
ADVOGADO : GUSTAVO HENRIQUE BERTOCCO DE SOUZA (Int.Pessoal)
: DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO : OS MESMOS
No. ORIG. : 00003939820124036105 1 Vr CAMPINAS/SP

VOTO CONDUTOR

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:


Trata-se de apelações criminais interpostas pela JUSTIÇA PÚBLICA e por PAULA AYALA, de nacionalidade paraguaia e atualmente sob custódia na Penitenciária Feminina de Campinas/SP, contra sentença de fls. 142//153, que condenou a ré à pena de 5 (cinco) anos, 4 (quatro) meses e 5 (cinco) dias de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado, e pagamento de 550 (quinhentos e cinquenta) dias-multa, no valor unitário de 1/30 do salário mínimo vigente à época dos fatos, por infração ao artigo 33, caput, c/c o artigo 40, I, da Lei 11.324/06.


Segundo a denúncia (fls. 47/49), no dia 12 de janeiro de 2012, no Aeroporto Internacional de Viracopos, em Campinas/SP, policiais federais abordaram a acusada na fila do checkin quando prestes a embarcar para Lisboa/Portugal, com conexão em Madri/Espanha, por se mostrar visivelmente nervosa. Levada ao Pronto Socorro do Hospital da Universidade Católica de Campinas e submetida a raio-X, constatou-se a presença de corpos estranhos em seu organismo, oportunidade em que confessou que havia ingerido cápsulas contendo cocaína.


Consta ainda da exordial que inicialmente, Paula expeliu 83 cápsulas e, após permanecer por um tempo internada, expeliu mais 17 cápsulas, todas contendo a droga.


Apelam a Justiça Pública e a ré condenada.

Nas razões de fls. 176/185, o representante do "Parquet" Federal requer a reforma parcial da sentença, para:


1 . aumentar a pena-base imposta à ré;


2 . aumentar a causa de aumento de pena prevista no inciso I, do artigo 40 da Lei 11.343/06 e


3 . excluir, da dosimetria da pena, a causa de redução prevista no § 4º do artigo 33 da Lei 11.343/06.


Contrarrazões da defesa às fls. 192/199.

Paula Ayala, nas razões de fls. 200/206, também requer a parcial reforma da sentença, para:


1 .reduzir a pena-base ao mínimo legal;


2 . aplicar a causa de redução de pena prevista no § 4º do artigo 33 da Lei de Drogas no patamar máximo;


3 . reduzir a pena de multa;


4 . substituir a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos;


5 . conceder-lhe a liberdade provisória, com a expedição de alvará de soltura.


Contrarrazões ministeriais às fls. 221/228.]


A Procuradoria Regional da República, no parecer de fls. 237/243, opina seja dado parcial provimento à apelação ministerial para aumentar a pena-base da ré e para que seja negado provimento à apelação da defesa.


Inicialmente, não tendo dúvidas em acompanhar o E. Relator no sentido de manter a condenação da ré, tendo em vista que as provas coligidas pela acusação demonstram de maneira inequívoca que cometeu o crime de tráfico transnacional de drogas.


MATERIALIDADE DELITIVA:


Está consubstanciada pelo auto de apreensão (fls. 07), laudo de constatação (fls. 13/15, 36/38) e laudo pericial de fls. 60/61, atestando que os testes realizados na substância entorpecente contida nas cápsulas que a ré ingeriu foram positivos para cocaína, no peso de 1.220 g. (um mil, duzentos e vinte gramas).


AUTORIA DELITUOSA:


Está devidamente comprovada, inicialmente pela prisão em flagrante da acusada no momento em que estava prestes a embarcar com a droga para o exterior, trazendo consigo o entorpecente no interior do organismo.


A corroborar a autoria, há o depoimento das testemunhas de acusação, que, em seus depoimentos na fase judicial, narraram os fatos tais como descritos na denúncia e no auto de prisão em flagrante.


Ademais, a ré, em seu interrogatório, admitiu serem verdadeiros os fatos que lhes foram imputados.


TRANSNACIONALIDADE DO TRÁFICO:


A natureza da substância entorpecente que a ré ingeriu (cocaína) e o local da abordagem policial (checkin em aeroporto internacional), bem como seu depoimento confirmando que sua intenção era a de levar a droga para a Espanha, demonstram que estava em vias de exportação, não havendo dúvidas acerca da transnacionalidade do tráfico.


Portanto, diante da ausência de elementos aptos a ilidir a materialidade e autoria delitivas, e tendo em vista que a ré, livre e conscientemente transportava a droga entre países, demonstrando o dolo em sua conduta, mantenho a condenação da ré pela prática do crime previsto no artigo 33, caput, c/c o artigo 40, I, ambos da Lei 11.343/06.


DOSIMETRIA DA PENA:


PENA-BASE:


Foi fixada pelo MM. Juiz acima do mínimo legal, em cinco anos e seis meses de reclusão.


A Justiça Pública requer a elevação do patamar de aumento, enquanto a defesa alega que deve ser reduzida ao mínimo legal.


Sabe-se que o julgador, na individualização da pena, deve examinar detidamente os elementos que dizem respeito ao fato, segundo os critérios estabelecidos pelo artigo 59 do CP. No caso de tráfico de drogas, há ainda que observar o artigo 42 da Lei 11.343/06, o qual determina expressamente que o Juiz, na fixação da pena, deve considerar, com preponderância sobre as circunstâncias judiciais previstas no artigo 59 do CP, a natureza e quantidade da droga, bem como a personalidade e conduta do agente.


No caso, apesar da primariedade e bons antecedentes, a ré não faz jus à fixação da pena-base no mínimo legal, como quer a defesa, considerando-se a natureza e quantidade da droga que transportava.


De fato, não pode ser considerada de pequena monta a quantidade apreendida nestes autos, se comparada às quantidades normalmente portadas pelo criminoso no tráfico urbano de varejo, quando é vendida diretamente aos consumidores pelos pequenos traficantes.


Ainda que a ré, na qualidade de "mula" do tráfico , não tenha decidido acerca da quantidade da droga que transportaria, é inegável que possuía consciência, por agir mediante promessa de pagamento, que estava colaborando com a atuação de uma organização voltada ao tráfico de entorpecentes.


Por outro lado, a cocaína é altamente maléfica ao organismo, pois vicia facilmente, sendo alta sua lesividade à saúde dos usuários, Por outro lado, a que é normalmente exportada possui grau de pureza altíssimo, sendo misturada a outras substâncias antes da entrega ao consumidor para elevar o rendimento.


Ademais, o bem jurídico tutelado pela Lei 11.343/06 é a saúde pública. Portanto, as consequências do crime de tráfico de drogas são extremamente nefastas, já que objetiva o fornecimento de expressivo numerário aos controladores da mercancia internacional de entorpecente, em prejuízo da saúde e do patrimônio honesto de milhares de cidadãos. Não se pode olvidar também que é um crime que está diretamente vinculado a outras práticas delitivas, em especial os crimes contra a pessoa.

Portanto, ainda que a ré seja primária e de bons antecedentes, mas levando em conta a natureza e a quantidade da droga, bem como a gravidade e conseqüências do crime, e tendo em vista a larga faixa de graduação da reprimenda corporal prevista pelo preceito secundário do tipo descrito no artigo 33 da Lei 11.343/06 (de cinco a quinze anos de reclusão), penso que se mostra justa e suficiente para a prevenção, reprovação e repressão do crime, a fixação em patamar um pouco maior.


Nesse aspecto, ressalto que as circunstâncias do crime justificam a exasperação da pena, tendo em vista a audácia da ré em transportar tantas cápsulas em seu organismo, contendo mais de um quilo de cocaína, o que denota que estava disposta a chegar até as últimas conseqüências para o sucesso da atividade criminosa.


Assim sendo, fixo a pena-base da ré em 6 (seis) anos de reclusão.


ATENUANTE DA CONFISSÃO


Concordo com o E. Relator no sentido de que deve incidir essa atenuante na dosimetria da pena da ré, tendo em vista que ela efetivamente confessou que transportava a droga na fase judicial, embora tenha argüido excludentes e que tenha sido presa em flagrante. Ademais, de acordo com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, bem como desta Corte, a atenuante da confissão (CP, art. 65, III, d), ainda que não seja espontânea ou seja parcial, deve incidir sempre que fundamentar a condenação do acusado, como no caso.


Dessa forma, se a confissão do acusado contribuiu para a formação do convencimento do Juiz, deve ser aplicada.


Transcrevo alguns julgados a respeito:



" PENAL E PROCESSUAL PENAL . HABEAS CORPUS. LATROCÍNIO. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE SOMENTE EM RELAÇÃO A UMA CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL DESFAVORÁVEL. CONFISSÃO ESPONTÂNEA EXTRAJUDICIAL. RETRATAÇÃO EM JUÍZO. INCIDÊNCIA COMO ATENUANTE.
(...)
V - Finalmente, se a confissão na fase inquisitorial, posteriormente retratada em juízo, alicerçou o decreto condenatório, é de ser reconhecido o benefício da atenuante do art. 65, III, alínea d, do CP (Precedentes do STJ e do Pretório Excelso). Habeas corpus concedido."
STJ, HC 200902101441, Relator(a) Min. FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, DJE DATA:03/05/2010)
" PENAL E PROCESSUAL PENAL . TRÁFICO TRANSNACIONAL DE COCAÍNA. PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO DEVIDAMENTE COMPROVADOS. CONDENAÇÃO MANTIDA. DOSIMETRIA DA PENA. SUBSTITUIÇÃO DA PENA. DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE.
(...)
4. Aplica-se a atenuante da confissão prevista no art. 65, inc. III, alínea "d", do Código penal sempre que a palavra do réu contribuir para a formação do juízo condenatório.
(...)"
(TRF3, ACR 200961190007489, Relator(a) Des. Fed. NELTON DOS SANTOS, SEGUNDA TURMA, DJF3 CJ1 DATA:14/12/2010 PÁGINA: 145 )

Diante da ausência de critérios legais para a valoração do "quantum" a ser aplicado em razão das atenuantes, tendo em vista as circunstâncias dos autos e aos princípios da proporcionalidade, razoabilidade, necessidade e suficiência para a prevenção e repressão do crime, e dada a pouca relevância probatória da confissão diante da prisão em flagrante da ré e o alojamento da droga em seu estômago, entendo que a pena deve ser reduzida para 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de reclusão.


CAUSA DE AUMENTO DE PENA: INCISO I, DO ART. 40, DA LEI 11.343/2006:


Na terceira fase da dosimetria das penas, foi aplicada a causa de aumento da transnacionalidade do tráfico ( art. 40, I, da Lei 11.343/06) no patamar de um sexto.


A Justiça Pública afirma que não constou da sentença a fundamentação para a fixação do critério de exasperação do "quantum" da majorante e requer seja aplicada em patamar maior, em razão das circunstâncias do caso, notadamente em atenção à maior amplitude geográfica da conduta, já que a ré levaria a droga para outro continente.


Apesar desse entendimento estar referendado em algumas decisões, o entendimento desta Turma é no sentido de que a simples distância entre países não justifica a aplicação dessa causa de aumento em patamar acima do mínimo, admitindo-se apenas nos casos em que a droga deixe o território nacional para ser distribuída em mais de um país no exterior.


Ademais, o legislador previu, nos incisos do artigo 40, da Lei 11.343/06, uma série de causas de aumento de pena, que justificam um aumento variável de um a dois terços, porém não estabeleceu os parâmetros para a quantificação do percentual.


À míngua desses critérios, o índice de aumento deve ser calculado de acordo com as circunstâncias especificamente relacionadas com a causa de aumento, (e não às do crime), e variar de acordo com a quantidade de majorantes que estiverem presentes, de forma que na incidência de apenas um inciso não se justifica a elevação do percentual mínimo. Não se deve olvidar ainda a regra do artigo 42 do mesmo texto legal, que determina a consideração da natureza e quantidade da droga para a fixação da pena.


No caso, porém, há que ser considerado que a ré foi presa com a droga ainda em território brasileiro e, em que pese sua intenção de levá-la a outro continente, não está comprovado nos autos que pretendesse difundi-la em mais de um país.


Portanto, penso ser razoável a exasperação da pena no mínimo legal (um sexto), considerando-se a natureza e quantidade da droga e a rota planejada por mais de um continente, não estando evidenciadas outras circunstâncias que justifiquem o agravamento da causa de aumento.


A respeito, confira-se os seguintes excertos de alguns julgados desta Turma:



"(...)
16. O caráter transnacional do tráfico restou evidenciado porque o estupefaciente seria transportado entre dois países (Brasil e Malásia), e a mera distância entre os referidos países não se afigura suficiente para justificar a majoração da reprimenda penal em metade, como efetuado pela sentença de primeiro grau: tal causa de aumento poderia incidir em patamar maior se, por exemplo, o entorpecente em questão deixasse o território nacional para ser distribuído em mais de um país no exterior.
17. É de se ressaltar, ainda, que, apesar de integrar a organização criminosa, a apelante não possuía a faculdade de escolher os destinos que percorreria, e que, no caso concreto, a acusada ainda foi presa em solo pátrio, razões pelas quais o aumento referente à internacionalidade do tráfico de drogas não deve ultrapassar seu patamar mínimo.
(...)"
(TRF 3, ACR 34767, Relator(a) JUIZ CONVOCADO EM AUXILIO HELIO NOGUEIRA, QUINTA TURMA, DJF3 CJ1 DATA:13/11/2009 PÁGINA: 693).
"PENAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. BENEFÍCIO DO RECURSO EM LIBERDADE. PENA. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DO ART. 33, § 4º DA LEI Nº 11.343/06. TRANSNACIONALIDADE.
A internacionalidade do tráfico se caracteriza pela execução potencial ou efetiva do delito abrangendo o território de mais de um país, não infirmando esta intelecção o pensamento de implicação de "bis in idem" em relação à conduta de exportação, exegese que ignora as características da figura delituosa de conteúdo variado e opera descabida decomposição do tipo penal que como um todo unitário se apresenta à interpretação. Descabida a pretensão da acusação de aumento do percentual em função da distância do destino da droga, o que não se depara de maior censurabilidade, tudo dependendo de casuísmos, numa viagem mais curta mas de riscos maiores podendo o agente revelar maior capacidade para a traficância, mantido o patamar mínimo previsto na sentença.
(...)"
(TRF 3ª REGIÃO, ACR - 2009.61.19.002878-0/SP, QUINTA TURMA , DJF3 CJ1 DATA:02/07/2010 PÁGINA: 259 , Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL PEIXOTO JUNIOR)

Portanto, mantenho a aplicação da causa de aumento prevista no artigo 40, I , da Lei 11.343/06 no percentual de um sexto.


Com tal acréscimo, a pena anteriormente fixada em 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses, totaliza 6 (seis) anos e 5 (cinco) meses de reclusão.


CAUSA DE REDUÇÃO DE PENA: § 4º DO ART. 33, DA LEI 11.343/06:

Ainda na terceira fase da aplicação da pena, o MM. Juiz aplicou o benefício previsto no § 4º do artigo 33, da Lei 11.343/06 no patamar de um sexto.


A Justiça Pública requer o afastamento do benefício, enquanto a defesa pleiteia por sua aplicação do patamar máximo (dois terços).


Neste ponto, discordo do voto do E. Relator, que entendeu ser aplicável o benefício no patamar eleito.


Isso porque essa causa de redução exige a presença de quatro requisitos, que devem ser preenchidos cumulativamente, ou seja, que o agente "seja primário, de bons antecedentes, não se dedique a atividades criminosas nem integre organização criminosa".


Como a lei utilizou a conjunção "NEM", deduz-se que há uma diferença substancial entre "se dedicar a atividades criminosas" e "integrar uma organização criminosa". A dedicação a atividades criminosas exige habitualidade, permanência, conjunção de propósitos, divisão de tarefas, ou seja, que o réu faça do crime seu meio de vida. Por outro lado, para que se afirme que o réu integra uma organização criminosa, basta a prova de que participou da empreitada criminosa de alguma forma.


Assim, quando o parágrafo 4º do artigo 33 da Lei 11.343/06 exige que o agente não integre organização criminosa, significa que não é necessário, para esse fim, que esteja incurso no crime de associação para o tráfico. A reiteração de condutas criminosas no passado, ou o ânimo de reiterá-las futuramente, é elemento caracterizador da estabilidade e permanência, exigíveis para a configuração do crime autônomo de associação para o tráfico (antigo artigo 14 da Lei nº 6.368/75 e atual artigo 35, da Lei nº. 11.343/06).


Contudo, no parágrafo 4º do artigo 33, da Lei 11.343/06, não é necessário esse ânimo para que se caracterize a integração em organização criminosa, já que está presente em outro requisito, que é o "não se dedicar a atividades criminosas". Repito: se a lei exigisse que a prática reiterada de delitos, ou a vontade de praticá-los reiteradamente fosse elemento essencial para a integração a uma atividade criminosa, não teria inserido como requisito da causa de redução de pena a exigência de que o agente também não se dedique a atividades criminosas.

Feitas tais considerações, e passando à análise do caso concreto, é certo que a acusada é primária, sem antecedentes e que não há provas de que se dedique a atividades criminosas.


Entretanto, as circunstâncias do fato, a quantidade da droga, o alto valor pela qual é comercializada, bem como a prática do crime mediante promessa de pagamento demonstram que não agiu sozinha na prática criminosa e que integrou uma organização criminosa voltada ao tráfico transnacional de drogas que atua em dois países, na qual há a divisão de tarefas e em que cada integrante tem uma função específica, havendo sempre de um lado um membro da organização que fornece a droga, embala, prepara o local para ocultá-la e, de outro lado, uma pessoa que recebe a droga, prepara para consumo e posteriormente fornece a pessoas que irão vendê-la.


Embora não possa ser considerada como membro efetivo de uma quadrilha ou que não tivesse o ânimo de voltar a delinqüir, não há como negar que efetivamente figurou, ainda que de forma eventual, em uma ponta da organização criminosa voltada ao tráfico internacional de drogas. Integrou a organização ao lhe prestar serviços transportando a droga de um para outro país, ao promover a conexão entre seus membros e ao colaborar, como elemento essencial, para o sucesso da atividade ilícita e a distribuição mundial de entorpecentes.


Por esses motivos, comungo do entendimento de que a causa de diminuição prevista no parágrafo 4º do artigo 33 da Lei de drogas não foi criada a fim de ser aplicada a pessoas que, como a ré, participa de organização criminosa de tráfico internacional de grande poder financeiro e logístico, que distribui grandes quantidades de entorpecentes, plenamente cientes de que está se envolvendo com pessoas que vivem do crime, mas sim ao tráfico de menor expressão, que não envolve quantidades tão expressivas de entorpecente; como no tráfico urbano de varejo, onde pequenos distribuidores comercializam drogas em quantidades menores, diretamente aos usuários.


Ressalto que a aplicação indiscriminada dessa causa de redução de pena aos "mulas" do tráfico transnacional de drogas certamente servirá como incentivo para que o Brasil se torne, muito em breve, a principal rota para o transporte de drogas provenientes dos países vizinhos para o exterior, fato incompatível com os vários acordos internacionais sobre o combate às drogas firmados pelo nosso País.

Esse é também o entendimento de parte dos integrantes desta Turma. Confira-se:



"PENAL - PROCESSUAL PENAL - TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES - LEI 11.343/2006 - LIBERDADE PROVISÓRIA - IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO - RÉU PRESO DURANTE TODO O PROCESSO - ARTIGO 312 CPP - PRESENTES OS REQUISITOS PARA A PRISÃO CAUTELAR - PRELIMINAR REJEITADA - AUTORIA E MATERIALIDADE DO DELITO AMPLAMENTE COMPROVADAS - INTERNACIONALIDADE DEMONSTRADA - AUSÊNCIA DE "BIS IN IDEM" - PENA BASE FIXADA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL - CONDIÇÕES JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS - CONFISSÃO - OCORRÊNCIA - CAUSA DE DIMINUIÇÃO PREVISTA NO § 4º, DO ARTIGO 33, DA LEI 11.343/06 - INAPLICABILIDADE - RECURSO DA ACUSAÇÃO PROVIDO - RECURSO DA DEFESA IMPROVIDO.
(...)
O apelante, de forma habitual ou não, integrava associação criminosa, participando, como transportador da droga, de esquema criminoso voltado para o comércio ilícito de entorpecentes, impossibilitando a aplicação do benefício legal previsto no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/06.
(...)"
(TRF 3, ACR 200861190080255, Relator(a) JUIZA RAMZA TARTUCE, QUINTA TURMA, DJF3 CJ1 DATA:15/06/2010 PÁGINA: 18 )
"PENAL - PROCESSUAL PENAL - TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES - LEI 11.343/2006 - AUTORIA E MATERIALIDADE DO DELITO AMPLAMENTE COMPROVADAS - INTERNACIONALIDADE DEMONSTRADA - PENA BASE FIXADA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL MANTIDA - CAUSA DE DIMINUIÇÃO PREVISTA NO § 4º, DO ARTIGO 33, DA LEI 11.343/06: INAPLICABILIDADE - RECURSO DA DEFESA IMPROVIDO.
1 . A autoria e a materialidade do delito restaram bem demonstradas pelo Auto de Prisão em Flagrante, pelo Laudo Preliminar de Constatação, pelo Laudo de Apresentação e Apreensão, pelas Fotos Digitalizadas, pelo Laudo de Exame Químico Toxicológico, com resultado positivo para maconha, pelos depoimentos prestados pelas testemunhas e pelo próprio interrogatório judicial do apelante, que acabou reconhecendo a existência do entorpecente no interior do veículo Astra, embora tenha asseverado desconhecer tal fato.
2. As circunstâncias em que foi realizada a prisão em flagrante do apelante, aliadas aos depoimentos dos agentes policiais, colhidos tanto na fase policial como judicial, confirmam, de forma precisa e robusta, a ocorrência dos fatos delituosos e a responsabilidade do recorrente, que não é excluída com sua pueril alegação de que desconhecia a existência do entorpecente no interior do veículo que conduzia, já que tal versão não se harmoniza com a prova carreada aos autos.
3. A versão de inocência do apelante, além de insulada no acervo probatório, não se afigura verossímil, não sendo crível que o réu aceitasse proposta de paraguaio desconhecido para conduzir veículo Astra, recebido de pessoa estranha em território paraguaio, até a cidade de Eldorado/MS (tendo como destino final a cidade de São Paulo), obtendo valores em dinheiro para tanto, sem que tivesse ciência que no interior do automóvel houvesse enorme quantidade de estupefaciente (mais de 60 Kg de maconha), o que denota, desde logo, que agia dolosamente, cônscio de sua participação na empreitada criminosa. Ademais, ao assumir a responsabilidade de conduzir o veículo Astra, recebido em cidade paraguaia, cumpria-lhe vistoriar o automóvel que recebia, mormente diante da circunstância de já ter sido preso pelo transporte de cigarros também do Paraguai, como declarou em juízo por ocasião de seu interrogatório.
4. A versão do acusado, apresentada por ocasião do interrogatório, deve ser interpretada, apenas, como intenção de eximir-se da responsabilidade penal, pelo que fica rejeitada 5. No que se refere à fixação da pena-base, como se observa do auto de apreensão e do laudo de exame em substância, foi apreendida, em poder do apelante, razoável quantidade de substância entorpecente, com poder de criar vício e dependência (maconha) e em montante considerável, como já dito (60.715 gramas), o que denota, sem dúvida, uma maior culpabilidade e lesão mais intensa ao bem jurídico tutelado (saúde pública), justificando o recrudescimento da sanção penal, atendendo, inclusive, o comando normativo inserto no art. 42 da Lei nº 11.343/06: "O juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância do produto, a personalidade e a conduta social do agente"
6. Ausentes circunstâncias agravantes ou atenuantes, na terceira fase de fixação da pena, com relação à causa de aumento da pena pela internacionalidade do tráfico de drogas, resta patente a sua configuração. A majorante prevista no artigo 40, inciso I da Lei n.º 11.343/06, aplica-se ao tráfico com o exterior, seja quando o tóxico venha para o Brasil, seja quando esteja em vias de ser exportado. Assim, é evidente, in casu, a tipificação do tráfico internacional de entorpecentes, já que o apelante, ao ser preso, confessou aos policiais que vinha do Paraguai conduzindo o veículo no qual o entorpecente era transportado.
7. O apelante, de forma habitual ou não, dedicava-se à atividade criminosa de tráfico de entorpecentes, participando, como transportador da droga, de esquema criminoso voltado para o comércio ilícito de entorpecentes, impossibilitando a aplicação do benefício legal previsto no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/06. Nesta trilha já decidiu o Tribunal Regional Federal da 3a. Região que: "(...) Incabível a aplicação do art. 33, §4º, da Lei nº 11.343/06, frente às circunstâncias que norteiam a prática delitiva, a natureza e a grande quantidade de droga apreendida, bem como diante as declarações do réu, que seguramente transportava a droga por conta e ordem de organização criminosa, exercendo a função de mula" (ACR nº 29658 - Proc. nº 2006.61.19.008219-0 - 2ª T. - Rel. Desembargadora Cecília Mello - DJF3 12.06.08).
8. O benefício não é, pois, cabível, dada a notória lesividade do entorpecente e sua significativa quantidade, e o fato de o recorrente, no mínimo, estar colaborando diretamente com as atividades de organização criminosa voltada para o comércio ilícito de drogas. Além disso, como se verifica da certidão de fls. e do próprio interrogatório judicial do acusado, constata-se que este já responde a processo criminal por crime de descaminho, dedicando-se, pois, ao desenvolvimento de atividades delituosas, não fazendo jus, também por essa razão, ao benefício legal previsto no § 4º do art. 33 da Lei Antidrogas.
9. Recurso da defesa improvido. "
(TRF 3, ACR 2009.60.06.000074-2/MS , QUINTA TURMA, Fonte: DJF3 CJ1 DATA:13/09/2010 PÁGINA: 626, Relator: JUIZ CONVOCADO EM AUXILIO HELIO NOGUEIRA).

Por esses motivos, excluo, da dosimetria da pena da ré, a causa de redução prevista no § 4º do artigo 33, da Lei 11.343/06, razão pela qual a pena resta estabelecida definitivamente em 6 (seis) anos e 5 (cinco) meses de reclusão.


PENA PECUNIÁRIA:


A pena pecuniária, proporcionalmente à pena privativa de liberdade, fica estabelecida em 641 (seiscentos e quarenta e um) dias-multa, no valor unitário estipulado pela sentença.


SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS :

A vedação à substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos tem fundamento nos artigos 33, parágrafo 4º e 44, ambos da Lei nº 11.343/06, que proíbem expressamente que a pena privativa de liberdade cominada, embora possa ser objeto de redução, seja convertida em restritiva de direitos, em atenção à função preventivo-repressiva da pena privativa de liberdade como instrumento eficaz ao combate das atividades relacionadas ao tráfico de entorpecentes.


Em primeiro lugar, há que se considerar que não está preenchido o requisito objetivo exigido (quantidade da pena).


Ademais, em que pesem alguns entendimentos em contrário, entendo que a regra prevista no artigo 44 da Lei nº 11.343/2006, ao vedar a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, não fere a Constituição Federal. Ao contrário, a completa, porque tal substituição se mostra incompatível com a necessidade de maior repressão e prevenção aos crimes considerados mais gravosos à sociedade, tais como o de tráfico internacional de entorpecentes, que causa efeitos altamente maléficos aos usuários e à sociedade. Por esses motivos, não se há falar-se em afronta ao princípio da individualização da pena.


Reconheço ainda que o Plenário do STF recentemente declarou, através do "habeas corpus" 97.256, pela via incidental, a inconstitucionalidade da expressão "vedada a conversão em penas restritivas de direitos" contida no parágrafo 4º do artigo 33, da Lei nº 11.343/06, bem como da expressão "vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos", constante do artigo 44 da mesma lei. Contudo, a ordem não foi concedida para assegurar ao paciente a imediata substituição , mas sim para remover o óbice contido na Lei 11.343/06, devolvendo ao Juízo das Execuções Criminais a tarefa de auferir o preenchimento das condições objetivas e subjetivas para a concessão.


Ainda que seja adotado o entendimento do Supremo Tribunal Federal, há que se considerar que as penas restritivas de direitos dificilmente serão aptas a reprimir o tráfico ilícito de drogas e, portanto, além dos requisitos objetivos exigidos pelo art. 44 do Código Penal, deve haver outros elementos subjetivos altamente favoráveis ao réu para que possa ser concedida a substituição.


No caso, as particularidades não recomendam a substituição, tendo em vista que os elementos dos autos revelaram um grau elevado de culpabilidade da ré, com provas contundentes de que participou de uma organização criminosa.


Ademais, é estrangeira, de forma que facilmente poderá se evadir se permanecer solta, mais um motivo demonstrando não ser recomendável a substituição, por não se mostrar suficiente para a reprovação e a prevenção do crime, inclusive pela repercussão que terá sobre a aplicação da lei penal.


Destaco que esse fato de forma alguma fere o princípio da isonomia, que consiste em conceder tratamento diferenciado para situações distintas.


Levando-se em consideração os motivos e as circunstâncias do crime, observa-se que a substituição da pena privativa de liberdade não se mostra suficiente para impedir que a ré volte a traficar drogas, refreando o desejo de ganho irrefletido de dinheiro. Por outro lado, prestando serviços em instituições públicas, haverá o sério risco de dar continuidade ao crime de tráfico de drogas.


Assim, entendo não ser socialmente recomendável a substituição da pena privativa de liberdade, que deve limitar-se a crimes considerados de menor gravidade, sendo inadequada sua aplicação aos condenados pelo crime de tráfico de drogas por ser por demais branda e insuficiente para reprimir tão grave delito, em nosso país equiparado a hediondo, tendo em vista os terríveis malefícios que causam aos usuários e à sociedade como um todo.


Confira-se alguns julgados acerca desse tema:



"HABEAS CORPUS. ART. 10, § 2º, DA LEI N. 9.437/97. ATIPICIDADE DA CONDUTA. ABOLITIO CRIMINIS TEMPORÁRIA. PRETENDIDO RECONHECIMENTO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. WRIT NÃO CONHECIDO.
(...)
SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. REQUISITOS OBJETIVO E SUBJETIVO. AUSÊNCIA DE PREENCHIMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE PROCEDER-SE À PERMUTA.
Inviável substituir-se a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, haja vista a ausência de preenchimento do pressuposto objetivo previsto no art. 44 do CP e a desfavorabilidade de 2 (duas) circunstâncias judiciais, o que evidencia que, in casu, a conversão da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos não se mostrará suficiente para a prevenção e repressão dos delitos denunciados. (...)"
(STJ, HC 200901593924, Relator(a) JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, DJE DATA:01/02/2011)
"HABEAS CORPUS. NARCOTRAFICÂNCIA. CRIME COMETIDO NA VIGÊNCIA DA LEI 6.368/76. PACIENTE CONDENADO A 4 ANOS DE RECLUSÃO, EM REGIME INICIAL FECHADO, E MULTA, POR TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES (ART. 12, CAPUT, C/C ART. 18, I, AMBOS DA LEI 6.368/76). INGESTÃO DE 72 CÁPSULAS DE COCAÍNA, PARA COMERCIALIZAÇÃO NO ESTRANGEIRO. PENA-BASE FIXADA NO MÍNIMO LEGAL: 3 ANOS. IMPOSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO POR PENA RESTRITIVA DE DIREITOS. FALTA DO REQUISITO SUBJETIVO. QUANTIDADE, NATUREZA E FORMA DE TRANSPORTE DA DROGA APREENDIDA. REGIME PRISIONAL. INSTAURAÇÃO DE INQUÉRITO PARA EXPULSÃO DO PACIENTE DO PAÍS. MANUTENÇÃO DO REGIME MAIS GRAVOSO. PARECER DO MPF PELO CONHECIMENTO PARCIAL DO WRIT E, NA EXTENSÃO, PELA DENEGAÇÃO DA ORDEM. ORDEM DENEGADA.
(...)
2. O óbice à substituição por pena restritiva de direitos e o cumprimento da pena em regime progressivo, ou mesmo em regime inicial aberto, decorre de construção jurisprudencial, que versa sobre a impossibilidade de se reconhecer a progressão de regime prisional a estrangeiro condenado pela prática de crime de tráfico ilícito, que tenha contra si decretada a expulsão, ou esteja em vias de ser decretada, quando não detenha residência fixa no país, sendo esta a hipótese dos autos.
(...)"
(STJ, HC 200801221176, Relator(a) NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA TURMA, DJE DATA:03/11/2010)
"Política criminal. Pena de prisão (limitação aos casos de reconhecida necessidade). Entorpecente ( tráfico internacional). Estrangeiro não-residente no país (caso). Art. 44 do Cód. Penal (não-aplicação). substituição da pena (impossibilidade).
1. A norma penal prevê a possibilidade de se aplicarem sanções outras que não a pena privativa de liberdade para crimes de pequena e média gravidade, como meio eficaz de combater a crescente ação criminógena do cárcere.
(...)
3. Tratando-se de condenado de nacionalidade outra, certamente tal não impede a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, porquanto brasileiros e estrangeiros são iguais perante a lei - di-lo a Constituição -, pressupondo-se, porém, quanto aos estrangeiros, a regular residência no país.
(...)"
(STJ, RESP 200602656993, Relator(a) NILSON NAVES, SEXTA TURMA, DJE DATA:16/06/2008 LEXSTJ VOL.:00229 PG:00396)
"PENAL. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO TRANSNACIONAL DE ENTORPECENTE. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. TRANSNACIONALIDADE DEMONSTRADA. INTERNACIONALIDADE. CAUSA DE AUMENTO DE PENA. SUBSTITUIÇÃO POR PENA RESTRITIVA DE DIREITOS. IMPOSSIBILIDADE. NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS DO ART. 44 DO CP. APELAÇÃO DESPROVIDA.
(...)
2 - Embora preenchidos os requisitos objetivos constantes dos incisos I e II do art. 44 do CP, a concessão da substituição resultaria inviável pela inadequação do caso aos requisitos subjetivos do inciso III do dispositivo supra mencionado. Trata-se de acusado estrangeiro, em situação irregular no que diz respeito à permanência no território nacional, sem ocupação lícita e que não demonstrou qualquer vínculo com o distrito da culpa. Logo, a substituição de pena privativa por restritiva certamente frustraria a aplicação da lei penal, não se revelando medida recomendável e suficiente para prevenção e repressão do delito em tela;
(...)"
(TRF 3ª REGIÃO, ACR 2010.61.12.005145-5, SP, SEGUNDA TURMA, DJF3 CJ1 DATA:02/06/2011 PÁGINA: 437 , Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL COTRIM GUIMARÃES )

DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE


Consoante entendimento cediço nas Cortes Superiores, a proibição da liberdade provisória, nos casos de crimes hediondos e assemelhados, decorre da própria proibição de fiança, imposta pela Constituição Federal no artigo 5º, inciso XLIII.


E o artigo 2º, inciso II, da Lei nº 8.072/90, atendendo à norma constitucional, considerou inafiançáveis os crimes de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os crimes definidos como hediondos.


Por outro lado, a Lei nº 11.343/2006, que é específica para os crimes de tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, no artigo 44 estabelece que os crimes previstos nos artigos 33, caput e § 1º e 34 a 37 são insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória. Dispõe ainda o artigo 59 da mesma lei que, nos crimes de tráfico, o réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, salvo se for primário e de bons antecedentes, assim reconhecido na sentença condenatória.


Sabe-se, contudo, que não tem o direito de recorrer em liberdade o acusado que permaneceu justificadamente preso durante a instrução criminal, por força de prisão em flagrante ou preventiva, ainda que seja primário e de bons antecedentes e que, sobrevindo sentença penal condenatória, um de seus efeitos é a manutenção da custódia do réu para apelar, o que não constitui ofensa à garantia constitucional da presunção de inocência, nos termos da Súmula 09 do STJ, de forma que eventuais condições favoráveis do agente, como primariedade e bons antecedentes, não são garantidoras de direito subjetivo à liberdade provisória, quando outros elementos recomendarem a prisão.


Postas tais premissas, verifico que a ré foi presa em flagrante e assim permaneceu durante toda a instrução criminal. É estrangeira, com fortes possibilidades de se evadir se for solta, razão pela qual a prisão tem por finalidade assegurar a aplicação da lei penal e o próprio resultado do processo, com o cumprimento integral da pena.


Por outro lado, a mera circunstância de a ré integrar uma organização criminosa dedicada à prática do tráfico de drogas já é suficiente para que permaneça presa, pois sabe-se que essas organizações não se intimidam com ações repressoras no sentido de investigar e punir a ação do grupo, tanto é que a própria Lei nº 9.034/95, que trata das organizações criminosas, prevê expressamente no artigo 7º, que não será concedida liberdade provisória, com ou sem fiança, aos agentes que tenham tido intensa e efetiva participação na organização criminosa, como no caso.


Assim sendo, para a efetivação da ação repressora do Estado, é necessário que o grupo seja desestruturado, o que somente se obtém com a prisão de todos os seus integrantes, daí porque o principal fundamento para a custódia é a garantia da ordem pública.


E ainda que não mais se justifique o requisito concernente à conveniência da instrução criminal, já que a instrução probatória já foi encerrada, remanesce também a necessidade da garantia da ordem pública e da necessidade de se garantir a aplicação da lei penal, razão pela qual não cabe o deferimento do benefício do apelo em liberdade, quer seja mediante termo de comparecimento (artigo 310, parágrafo único), ou mediante pagamento de fiança (artigo 324, inciso IV).


Nesse sentido:



"PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. ART. 33 DA LEI Nº 11.343/06. PRISÃO EM FLAGRANTE. LIBERDADE PROVISÓRIA. PROIBIÇÃO DECORRENTE DE NORMA CONSTITUCIONAL.
I - A proibição de concessão do benefício de liberdade provisória para os autores do crime de tráfico ilícito de entorpecentes está prevista no art. 44 da Lei nº 11.343/06, que é, por si, fundamento suficiente por se tratar de norma especial especificamente em relação ao parágrafo único do art. 310, do CPP.
II - Além do mais, o art. 5º, XLIII, da Carta Magna, proibindo a concessão de fiança, evidencia que a liberdade provisória pretendida não pode ser concedida.
III - Precedentes do Pretório Excelso (AgReg no HC 85711-6/ES, 1ª Turma, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence; HC 86814-2/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Joaquim Barbosa; HC 86703-1/ES, 1ª Turma, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence; HC 89183-7/MS, 1ª Turma, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence; HC 86118-1/DF, 1ª Turma, Rel. Ministro Cezar Peluso; HC 79386-0/AP, 2ª Turma, Rel. Ministro Maurício Corrêa; HC 83468-0/ES, 1ª Turma, Rel. Min. Sepúlveda Pertence; HC 82695-4/RJ, 2ª Turma, Rel. Ministro Carlos Velloso)
Habeas corpus denegado."
(STJ - HC 78.237/RS, 5ª Turma, Rel. Ministro FELIX FISCHER, DJU de 24.9.2007)

Diante do exposto, dou parcial provimento à apelação ministerial para aumentar a pena-base do réu e excluir, da dosimetria da pena, a causa de redução do § 4º do artigo 33 da Lei 11.343/06 e dou parcial provimento à apelação defensiva, para reconhecer a atenuante da confissão espontânea, fixando a pena da ré definitivamente em 6 (seis) anos e 5 (cinco) meses de reclusão e pagamento de 641 (seiscentos e quarenta e um) dias-multa.


Determino o envio de ofício ao Ministério da Justiça, com o escopo de verificação da conveniência e oportunidade da instauração de procedimento administrativo tendente à expulsão da ré Paula Ayala, a ser efetivada após o cumprimento da pena.


É o voto.





Antonio Cedenho
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): ANTONIO CARLOS CEDENHO:10061
Nº de Série do Certificado: 07ED7848D1F21816
Data e Hora: 09/01/2013 21:06:31



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000393-98.2012.4.03.6105/SP
2012.61.05.000393-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal LUIZ STEFANINI
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : PAULA AYALA reu preso
ADVOGADO : GUSTAVO HENRIQUE BERTOCCO DE SOUZA (Int.Pessoal)
: DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO : OS MESMOS
No. ORIG. : 00003939820124036105 1 Vr CAMPINAS/SP

RELATÓRIO

Trata-se de apelações interposta pelo Ministério Público Federal e por Paula Ayala, em face da r. sentença que a condenou como incursa nas penas do artigo 33, "caput", c.c o art. 40, inciso I, ambos da Lei nº 11.343/2006, a cinco anos, quatro meses e cinco dias de reclusão, em regime inicialmente fechado, e ao pagamento de 550 (quinhentos e cinquenta) dias-multa, no valor unitário mínimo legal.

Em razões de fls. 176/185, o "Parquet" Federal requer, em síntese:

a) a majoração da pena-base;

b) a majoração do patamar de aplicação da causa de aumento resultante da internacionalidade do tráfico;

c) a exclusão da causa de diminuição prevista no § 4º do artigo 33 da Lei nº 11.343/2006.

Contrarrazões defensivas às fls. 192/199, pelo improvimento do recurso ministerial.

A defesa, por sua vez, em razões de fls. 200/206, requer:

a) a concessão da liberdade provisória, com o reconhecimento do direito ao recurso em liberdade;

b) a aplicação da pena-base no mínimo legal;

c) o reconhecimento da minorante do artigo 33, § 4º, fixado em seu patamar máximo (2/3);

d) a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos.

Contrarrazões ministeriais às fls. 221/228, pelo desprovimento da apelação defensiva.

Em parecer de fls. 237/243, a Procuradoria Regional da República opinou pelo improvimento do recurso defensivo e pelo parcial provimento à apelação ministerial, a fim de que se proceda ao aumento da pena-base imposta na sentença.

É o relatório.

À revisão.


LUIZ STEFANINI
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): LUIZ DE LIMA STEFANINI:10055
Nº de Série do Certificado: 47D97696E22F60E3
Data e Hora: 02/10/2012 15:50:18



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000393-98.2012.4.03.6105/SP
2012.61.05.000393-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal LUIZ STEFANINI
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : PAULA AYALA reu preso
ADVOGADO : GUSTAVO HENRIQUE BERTOCCO DE SOUZA (Int.Pessoal)
: DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO : OS MESMOS
No. ORIG. : 00003939820124036105 1 Vr CAMPINAS/SP

VOTO

Segundo a denúncia, no dia 12 de janeiro de 2012, nas dependências do Aeroporto Internacional de Viracopos, em Campinas/SP, a apelante foi surpreendida por agentes federais, atuando em fiscalização de rotina, na posse de 100 (cem) cápsulas de cocaína, na iminência de embarcar em voo com destino a Lisboa/Portugal, com escala em Madri/Espanha, estando a droga alojada no estômago da ré, que, após ser submetida a exames médicos, expeliu as referidas cápsulas contendo 1220g (um mil duzentos e vinte gramas) de substância em pó branco, posteriormente identificada como cocaína.

A materialidade delitiva restou efetivamente comprovada por meio do Laudo Preliminar de Constatação (fls. 13/15), posteriormente ratificado pelo Laudo Pericial Toxicológico encartado às fls. 60/61, que atesta ser cocaína a substância entorpecente apreendida na posse da acusada.

A autoria, da mesma forma, é inconteste.

Com efeito, além de ter sido presa em flagrante delito na posse da droga, ao ser interrogada em juízo, a apelante confessou integralmente a prática delitiva, afirmando que realmente cometeu o crime porque vinha enfrentando sérias dificuldades financeiras, tendo a sua versão sido corroborada pelos testemunhos harmônicos e coesos colhidos em inquérito e em juízo.

No tocante à transnacionalidade do tráfico, também restou demonstrada ante as circunstâncias da prisão, realizada no Aeroporto Internacional de Campinas momentos antes de a apelante embarcar com destino ao exterior, corroboradas pelo passaporte e bilhete de passagem encartados aos autos, bem como pela confissão da apelante.

Outrossim, não havendo dúvida quanto ao acerto da condenação, passo a analisar os recursos das partes, ambos voltados exclusivamente à dosimetria da pena.

Considerando as circunstâncias judiciais previstas nos artigos 59 do Código Penal e 42 da Lei Antitóxicos, particularmente, a natureza e a expressiva quantidade de substância entorpecente apreendida na posse da ré - 1220g (um mil duzentos e vinte gramas) de cocaína, a demonstrar sua maior culpabilidade e as nefastas consequências que seriam trazidas a número relevante de pessoas, a pena-base foi fixada em cinco anos e seis meses de reclusão.

Entendo que referido "quantum" foi desproporcionalmente aplicado, pois a quantidade e a natureza da droga (cocaína), apta a causar consequências gravíssimas a relevante número de pessoas e famílias, são circunstâncias que legitimam a fixação da pena-base acima daquele patamar, de maneira que a aplico em seis anos de reclusão.

Ao contrário do aduzido pela acusação, entendo presente a atenuante da confissão espontânea, pois, independentemente de a ré ter arguido excludentes ou mesmo que presa em flagrante delito, certo é que ela confessou integralmente a prática delitiva, o que basta ao reconhecimento daquela atenuante, devendo a pena, pois, ser reduzida para cinco anos e seis meses de reclusão.

Penso ser suficiente referido patamar de redução, porquanto está em consonância com a importância da confissão no caso em análise, ao se considerar não só a prisão em flagrante, mas também o alojamento da droga no estômago da ré.

Na terceira e última fase, em razão da transnacionalidade do delito, deve ser mantida a aplicação da causa de aumento prevista no artigo 40, inciso I, da Lei em questão, no patamar de 1/6 (um sexto), sendo irrelevante para esta finalidade a distância da viagem que seria empreendida pela ré, resultando, assim, na pena de seis anos e cinco meses de reclusão.

Nesse sentido, os seguintes precedentes:


"[...] Descabida a pretensão da acusação de aumento do percentual em função da distância do destino da droga, o que não se depara de maior censurabilidade, tudo dependendo de casuísmos, numa viagem mais curta mas de riscos maiores podendo o agente revelar maior capacidade para a traficância. - De ofício reduzida a pena-base ao mínimo legal. - Recurso da acusação parcialmente provido para afastar a aplicação da causa de diminuição do artigo 33, §4º, da Lei nº 11.343/06. - Recurso da defesa desprovido" (ACR 200961190115808 ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 41416 Relator(a) DESEMBARGADOR FEDERAL PEIXOTO JUNIOR Sigla do órgão TRF3 Órgão julgador QUINTA TURMA Fonte DJF3 CJ1 DATA:28/10/2010 PÁGINA: 1455).


"5. A circunstância da transnacionalidade restou devidamente comprovada, pelas evidências do flagrante. Já no que concerne à quantidade do aumento, a transnacionalidade no aspecto da distância do destino da droga não se depara de maior censurabilidade, tudo dependendo de casuísmos, numa viagem mais curta mas de riscos maiores podendo o agente revelar maior capacidade para a traficância, pelo que o patamar de ¼ fixado na sentença deve ser reduzido para o mínimo previsto. 6 . Apelação parcialmente provida". (ACR 201061190006979 ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 41720 Relator(a) DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO Sigla do órgão TRF3 Órgão julgador QUINTA TURMA Fonte DJF3 CJ1 DATA:10/03/2011 PÁGINA: 351).


Quanto a aplicação do § 4º do artigo 33, da Lei nº 11.343/2006, a acusação não trouxe aos autos quaisquer provas, nem mesmo indiciárias, que pudessem revelar que a ré estivesse envolvida com organização criminosa ou que vinha se dedicando a atividades criminosas, não sendo lícito ao julgador fazer essa espécie de presunção, sob pena de odiosa responsabilização objetiva. Ainda, consta do autos que a apelante é primária e ostenta bons antecedentes, circunstâncias também reconhecidas na própria r. sentença "a quo".

Dessa forma, entendo que deve ser mantida a incidência daquela causa de diminuição, no mínimo legal de 1/6 (um sexto), tendo em vista a natureza e a grande quantidade de droga apreendida com a acusada, bem como pelo fato de que a ré, ainda que agindo como simples "mula", tinha plena consciência de que estava contribuindo com organização criminosa voltada ao tráfico de drogas em âmbito internacional.

Outrossim, as reprimendas devem ser definitivamente aplicadas em cinco anos, quatro meses e cinco dias de reclusão, e ao pagamento de 550 (quinhentos e cinquenta) dias-multa.

Com relação ao regime inicial, pelas mesmas razões supra destacadas, deve ser mantido o inicial fechado, único compatível com a prática de crimes extremamente gravosos à sociedade, tal como o verificado no caso presente, tratando-se de apreensão de grande quantidade de cocaína, droga com potencial de causar consequências gravíssimas à saúde e à vida de número indeterminado de pessoas, devendo prevalecer o artigo 2º, § 1º, da Lei 8.072/90, com a redação da Lei 11.464/2007.

No que se refere à substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, ausentes estão os pressupostos objetivos à concessão, tendo em vista que fixada reprimenda privativa de liberdade superior a quatro anos de reclusão.

Ainda que assim não fosse, ausentes também estão os pressupostos subjetivos previstos no artigo 44 do Código Penal, porquanto a grande quantidade e a natureza da droga teriam o condão de causar consequências gravíssimas a número relevante de pessoas, não sendo, assim, tal conduta compatível com os escopos da substituição.

Ademais, a apelante é estrangeira, sem vínculos com o Brasil, fator que também inviabilizaria a substituição, já que não haveria como trabalhar licitamente neste País.

Nesse sentido, colaciono os seguintes precedentes:


Política criminal. Pena de prisão (limitação aos casos de reconhecida necessidade). Entorpecente (tráfico internacional). Estrangeiro não-residente no país (caso). Art. 44 do Cód. Penal (não-aplicação). Substituição da pena (impossibilidade). 1. A norma penal prevê a possibilidade de se aplicarem sanções outras que não a pena privativa de liberdade para crimes de pequena e média gravidade, como meio eficaz de combater a crescente ação criminógena do cárcere (...) 3. Tratando-se de condenado de nacionalidade outra, certamente tal não impede a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, porquanto brasileiros e estrangeiros são iguais perante a lei - di-lo a Constituição -, pressupondo-se, porém, quanto aos estrangeiros, a regular residência no país (...) (STJ, RESP 200602656993, Relator(a) NILSON NAVES, SEXTA TURMA, DJE DATA:16/06/2008 LEXSTJ VOL.:00229 PG:00396) - grifo nosso.


PENAL. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO TRANSNACIONAL DE ENTORPECENTE. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. TRANSNACIONALIDADE DEMONSTRADA. INTERNACIONALIDADE. CAUSA DE AUMENTO DE PENA. SUBSTITUIÇÃO POR PENA RESTRITIVA DE DIREITOS. IMPOSSIBILIDADE. NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS DO ART. 44 DO CP. APELAÇÃO DESPROVIDA (...) 2 - Embora preenchidos os requisitos objetivos constantes dos incisos I e II do art. 44 do CP, a concessão da substituição resultaria inviável pela inadequação do caso aos requisitos subjetivos do inciso III do dispositivo supra mencionado. Trata-se de acusado estrangeiro, em situação irregular no que diz respeito à permanência no território nacional, sem ocupação lícita e que não demonstrou qualquer vínculo com o distrito da culpa. Logo, a substituição de pena privativa por restritiva certamente frustraria a aplicação da lei penal, não se revelando medida recomendável e suficiente para prevenção e repressão do delito em tela (...)

(TRF 3ª REGIÃO, ACR 2010.61.12.005145-5, SP, SEGUNDA TURMA, DJF3 CJ1 DATA:02/06/2011 PÁGINA: 437 , Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL COTRIM GUIMARÃES ) - grifo nosso.


HABEAS CORPUS. NARCOTRAFICÂNCIA (...) IMPOSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO POR PENA RESTRITIVA DE DIREITOS. FALTA DO REQUISITO SUBJETIVO. QUANTIDADE, NATUREZA E FORMA DE TRANSPORTE DA DROGA APREENDIDA. REGIME PRISIONAL. INSTAURAÇÃO DE INQUÉRITO PARA EXPULSÃO DO PACIENTE DO PAÍS. MANUTENÇÃO DO REGIME MAIS GRAVOSO. PARECER DO MPF PELO CONHECIMENTO PARCIAL DO WRIT E, NA EXTENSÃO, PELA DENEGAÇÃO DA ORDEM. ORDEM DENEGADA.

(...) 2. O óbice à substituição por pena restritiva de direitos e o cumprimento da pena em regime progressivo, ou mesmo em regime inicial aberto, decorre de construção jurisprudencial, que versa sobre a impossibilidade de se reconhecer a progressão de regime prisional a estrangeiro condenado pela prática de crime de tráfico ilícito, que tenha contra si decretada a expulsão, ou esteja em vias de ser decretada, quando não detenha residência fixa no país, sendo esta a hipótese dos autos (...) (STJ, HC 200801221176, Relator(a) NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA TURMA, DJE DATA:03/11/2010) - grifo nosso.


Não há falar-se em direito à liberdade provisória e ao recurso em liberdade, pois, por primeiro, tendo a acusada sido presa em flagrante e assim permanecido durante todo o processo, com maior razão deve ser mantida a prisão cautelar até o trânsito em julgado, conforme reiterada jurisprudência de nossos tribunais superiores.

Ademais, verifico presentes os pressupostos da prisão preventiva, pois além de a autoria e a materialidade delitivas já terem sido exaustivamente demonstradas, é certo que a acusada é estrangeira, sem vínculos com o Brasil, não havendo qualquer garantia de que, posta em liberdade, se apresente espontaneamente após o trânsito em julgado para o cumprimento de sua pena, circunstância suficiente à manutenção da prisão cautelar, como forma de garantir a aplicação da lei penal.

Ante todo o exposto, dou parcial provimento à apelação ministerial para aumentar a pena-base e dou parcial provimento à apelação defensiva, a fim de reconhecer a atenuante da confissão espontânea, mantendo-se, porém, as penas tal como aplicadas em primeiro grau. No mais, resta mantida a r. sentença "a quo"

É como voto.


LUIZ STEFANINI
Desembargador Federal


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