Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 23/01/2013
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002176-26.2011.4.03.6117/SP
2011.61.17.002176-1/SP
RELATOR : Juiz Federal Convocado FERNANDO MENDES
APELANTE : HILDA CAMARGO ALVES
ADVOGADO : GLAUBER GUILHERME BELARMINO e outro
: ALBERTO AUGUSTO REDONDO DE SOUZA
APELADO : Justica Publica
No. ORIG. : 00021762620114036117 1 Vr JAU/SP

EMENTA

PENAL. CONTRABANDO . MÁQUINA CAÇA-NÍQUEL. AUTORIA E MATERIALIDADE. ELEMENTO SUBJETIVO DO TIPO. COMPROVAÇÃO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. ABSORÇÃO PELA CONTRAVENÇÃO DE EXPLORAÇÃO DE JOGOS DE AZAR. IMPOSSIBILIDADE.
1. Materialidade delitiva demonstrada pelo Auto de Apreensão e Laudo Pericial.
2. Autoria delitiva comprovada pelo conjunto probatório.
3. Princípio da consunção que não se aplica. Os bens jurídicos tutelados são distintos. O objeto jurídico tutelado no crime de contrabando e descaminho definidos no artigo 334, "caput", do Código Penal é a Administração Pública no que diz respeito ao erário público lesado pelo comportamento do agente que, importa ou exporta mercadoria proibida ou deixa de pagar os tributos devidos. A contravenção penal trazida no artigo 50 do Decreto Lei nº 3.688/41 tem como bem jurídico tutelado os bons costumes.
4. Impossibilidade da absorção do crime de contrabando ou descaminho, que comina em abstrato pena mais grave, por contravenção penal, apenada de forma menos severa.
5. O fato de a acusada utilizar-se do referido maquinário, no exercício de atividade comercial, para a obtenção de lucro pela exploração de jogos de azar consubstancia a prática de duas infrações penais: contravenção de jogo de azar, de competência da Justiça Estadual e crime de descaminho descrito no artigo 334, §1º, alínea "c", do Código Penal, de competência da Justiça Federal, nos moldes do artigo 109, inciso IV, da Constituição Federal.
6. Princípio da insignificância não aplicado. Trata-se de maquinário cujo uso e exploração são proibidos no Brasil, sendo irrelevante o valor dos bens apreendidos
7. Apelação desprovida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 15 de janeiro de 2013.
FERNANDO MENDES
Juiz Federal Convocado


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002176-26.2011.4.03.6117/SP
2011.61.17.002176-1/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : HILDA CAMARGO ALVES
ADVOGADO : GLAUBER GUILHERME BELARMINO e outro
: ALBERTO AUGUSTO REDONDO DE SOUZA
APELADO : Justica Publica
No. ORIG. : 00021762620114036117 1 Vr JAU/SP

RELATÓRIO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:

Cuida-se de apelação criminal interposta por HILDA CAMRGO ALVES contra sentença que a condenou pela prática do crime descrito no artigo 334, §1º, alínea "c", do Código Penal.

De acordo com a peça acusatória, no dia 07 de abril de 2011, a acusada foi surpreendida mantendo em depósito e utilizando, em proveito próprio, no exercício de atividade comercial, uma máquina do tipo caça-níquel, mercadoria de procedência estrangeira, produto de introdução clandestina no território nacional ou de importação fraudulenta por parte de outrem, ante a ilegalidade patente da atividade.

Narra a denúncia que, na data dos fatos, policiais militares compareceram no estabelecimento comercial da denunciada, onde lograram apreender uma máquina "caça-níquel", na sala ao lado do balcão de seu bar, além da quantia de R$ 57,00 (cinqüenta e sete reais) em dinheiro dentro desta, conforme indicado no Boletim de Ocorrência.

A denúncia foi recebida em 17 de novembro de 2011 (fls. 76).

Regulamente processado o feito, sobreveio sentença, proferida em audiência (fls. 124/127-v) condenando a acusada à pena de 01 (um) ano de reclusão, em regime inicial aberto, por infração ao artigo 334, §1º, alínea "c", do Código Penal.

A pena privativa de liberdade foi substituída por uma pena restritiva de direito, consistente em prestação pecuniária de 02 (dois) salários mínimos, em favor da União.

Inconformada, apela a acusada (fls. 133/134), em cujas razões recursais (135/150), alega, em síntese:

a) a absorção do crime de contrabando pela contravenção de jogo de azar;

b) a aplicação do princípio da insignificância;

c) absolvição por ausência de elemento subjetivo.

Contrarrazões do Ministério Público Federal (fls. 153/158), nas quais requer seja negado provimento ao recurso interposto pela defesa.

Nesta Corte, a Procuradoria Regional da República, em seu parecer, opina pelo desprovimento do apelo (fls. 160/161-v).

É o relatório.

À revisão.


JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002176-26.2011.4.03.6117/SP
2011.61.17.002176-1/SP
RELATOR : Juiz Federal Convocado FERNANDO MENDES
APELANTE : HILDA CAMARGO ALVES
ADVOGADO : GLAUBER GUILHERME BELARMINO e outro
: ALBERTO AUGUSTO REDONDO DE SOUZA
APELADO : Justica Publica
No. ORIG. : 00021762620114036117 1 Vr JAU/SP

VOTO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ FEDERAL CONVOCADO FERNANDO MENDES:

Inicialmente, ratifico o relatório.

O recurso não prospera.

1. Da materialidade. A materialidade delitiva ficou demonstrada pelo Auto de Exibição e Apreensão (fls. 16/17), bem como pelo laudo pericial (fls. 19/23).

2. Da autoria. A autoria restou inconteste. As testemunhas Enzo Henrique Gurizan e Luiz Henrique Marinello, ambos policiais militares, informaram que a apelante era responsável pelo estabelecimento comercial, bem como pela máquina caça-níquel apreendida, o que foi comprovado pela própria ré, em seu interrogatório (mídia às fls. 128).

Ademais, a defesa em nenhum momento a contestara, de modo que a autoria delitiva é questão incontroversa.

3. Da consunção. A defesa alega que o crime de contrabando constitui meio necessário para a consumação da contravenção de jogo de azar.

Assevera que inexiste ofensa direta a interesse da União a justificar a persecução penal.

Aduz que a conduta da ré visou a exploração de jogo de azar, sendo o delito de contrabando mera etapa de execução, devendo ser aplicado o princípio da consunção, de forma que o crime seja absorvido pela contravenção penal.

Razão não se lhe assiste.

Os bens jurídicos tutelados são distintos. O objeto jurídico tutelado no crime de contrabando e descaminho definidos no artigo 334, "caput", do Código Penal é a Administração Pública no que diz respeito ao erário público lesado pelo comportamento do agente que, importa ou exporta mercadoria proibida ou deixa de pagar os tributos devidos. A contravenção penal trazida no artigo 50 do Decreto Lei nº 3.688/41 tem como bem jurídico tutelado os bons costumes.

Esta Corte já decidiu:


"PENAL. APELAÇÃO. CONTRABANDO. ARTIGO 334, §1º, "C", DO CÓDIGO PENAL. MÁQUINAS CAÇA-NÍQUEIS. POSSE. MATERIALIDADE DELITIVA CONFIGURADAS. PROVA DA PROCEDÊNCIA ESTRANGEIRA. ABSORÇÃO PELA CONTRAVENÇÃO DE EXPLORAÇÃO DE JOGOS DE AZAR. IMPOSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. DESCABIMENTO.
1. Materialidade e autoria delitiva devidamente configuradas nos autos.
2. Não há que se falar na aplicação do princípio da consunção para a absorção do delito de contrabando como crime-meio para a consumação do mencionada modalidade contravencional, tendo em vista a disparidade entre a lesividade jurídica de uma e de outra espécie delituosa, razão pela qual às contravenções é destinado tratamento jurídico muito mais brando do que é dispensado aos crimes comuns.
3. O reconhecimento do princípio da bagatela se deve à irrelevância da lesividade ao bem jurídico tutelado, de forma a tornar imerecida a repercussão penal à conduta formalmente típica, tendo por base os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima do Direito Penal nas relações jurídicas.
4. A adoção de um limite de insignificância nos delitos ofensivos à atividade tributária aduaneira se justifica pelo desinteresse da Fazenda em cobrar os créditos tributários de até R$ 10.000,00 (dez mil reais), nos termos do art. 20, da Lei 10.522/02. Nestes casos, estamos diante do crime de descaminho, cuja objetividade jurídica consiste no interesse fiscal do Estado em seu aspecto meramente econômico.
5. Diferente é o caso em tela, no qual o enquadramento típico da conduta se refere ao cometimento de contrabando, espécie criminosa que, conquanto esteja também prescrita no art. 334, do Código Penal, tem como bem jurídico tutelado a moralidade e a segurança pública, as quais são resguardadas pela proibição legal da entrada dos itens apreendidos no território nacional.
6. Apelação desprovida. Condenação mantida.
(ACR - APELAÇÃO CRIMINAL 2008.61.17.001855-6, SEGUNDA TURMA, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL COTRIM GUIMARÃES ,DJF3 CJ1 DATA:02/06/2011 PÁGINA: 440).

De outra banda, não se admite possa o crime de contrabando ou descaminho, que comina em abstrato pena mais grave, ser absorvido por contravenção penal, apenada de forma menos severa.

O fato de a acusada utilizar-se do referido maquinário, no exercício de atividade comercial, para a obtenção de lucro pela exploração de jogos de azar consubstancia a prática de duas infrações penais: contravenção de jogo de azar, de competência da Justiça Estadual e crime de contrabando descrito no artigo 334, §1º, alínea "c", do Código Penal, de competência da Justiça Federal, nos moldes do artigo 109, inciso IV, da Constituição Federal.

Considerando que as peças periciadas são de procedência estrangeira, utilizadas para fabricação de máquinas caça-níqueis, tal fato é suficiente para configurar a conduta típica, pois são mercadorias de uso e exploração proibidos no País, o que torna o fato relevante penalmente.

4. Do princípio da insignificância.Configurado crime de contrabando perpetrado contra serviços e interesses da União, inaplicável o princípio da insignificância, restrito aos crimes de descaminho, quando a exação resulte inferior a R$10.000,00, valor mínimo para cobrança do crédito tributário.

No caso, trata-se de crime de contrabando, no qual as mercadorias são de internação proibida, sendo irrelevante o valor do crédito tributário e, consequentemente, inaplicável o princípio da insignificância.

Nesse sentido, o entendimento desta E. Turma:


PENAL. ARTIGO 334, §1º, ALÍNEA "C", DO CÓDIGO PENAL. AUTORIA. MATERIALIDADE. MÁQUINAS CAÇANÍQUEIS. PRINCIPIO DA INSIGNIFICANCIA. INAPLICABILIDADE. CONDENAÇÃO MANTIDA. APELAÇÃO IMPROVIDA. 1. Autoria e materialidade comprovadas. 2. Alegação de que as máquinas caçaníqueis apreendidas não são de propriedade do acusado não comprovada. Não foram fornecidos endereço ou quaisquer outros dados aptos a auxiliar na localização do suposto proprietário, tampouco foi comprovado que o mesmo realmente existe. 3. Apreensão das máquinas no bar do apelante. Manter em depósito mercadorias de procedência estrangeira que sabia ser produto de introdução clandestina no território nacional ou de importação fraudulenta é fato suficiente para configurar o delito previsto no artigo 334, §1º, alínea "c", do Código Penal . 4. Princípio da insignificância não aplicado. Trata-se de maquinário cujo uso e exploração são proibidos no Brasil, sendo irrelevante o valor dos bens apreendidos. 5. Condenação mantida. 6. Apelação a que se nega provimento.
(TRF da 3ª Região, ACr n. 200561210020440, Rel. Des. Fed. Vesna Komar, j. 19.05.09)
Sob o mesmo prisma se posiciona o E. Superior Tribunal de Justiça:
PENAL . CONTRABANDO . MERCADORIA DE INTERNAÇÃO PROIBIDA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE.
O princípio da insignificância é aplicável ao delito de descaminho, na medida em que a exação resulte inferior a R$10.000,00, em consonância com a jurisprudência dominante, segundo a qual esse seria o valor mínimo para cobrar o crédito tributário correspondente. Mas no caso do contrabando , no qual as mercadorias são de internação proibida, não há falar em crédito tributário e, em conseqüência, aplicabilidade do princípio da insignificância (STJ, REsp n. 193367, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, j. 20.05.99; TRF da 3ª Região, ACr n. 200203990130429, Rel. Des. Fed. Nelton dos Santos, j. 27.08.08; ACr n. 200561210020440, Rel. Des. Fed. Vesna Komar, j. 19.05.09; TRF da 4ª Região, Rel. Des. Fed. Taadaqui Hirose, j. 17.11.09; TRF da 1ª Região, RCCR n. 200438000418647, Rel. Des. Fed. Cândido Ribeiro, j. 30.09.08).

No mesmo sentido o posicionamento do Supremo Tribunal Federal:


EMENTA: HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. CRIME DE CONTRABANDO DE CIGARROS ESTRANGEIROS. ARQUIVAMENTO DE INQUÉRITO E ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ART. 28 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. INEXISTÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. PRETENSÃO DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. IMPROCEDÊNCIA. HABEAS CORPUS DENEGADO. 1. Nenhuma irregularidade há na decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça, que restabeleceu a viabilidade do exame do inquérito pelo Procurador-Geral de Justiça, após o Juízo local ter considerado improcedente o pedido de arquivamento. 2. O princípio da insignificância reduz o âmbito de proibição aparente da tipicidade legal e, por consequência, torna atípico o fato na seara penal, apesar de haver lesão a bem juridicamente tutelado pela norma penal. 3. Para a incidência do princípio da insignificância, devem ser relevados o valor do objeto do crime e os aspectos objetivos do fato, tais como, a mínima ofensividade da conduta do agente, a ausência de periculosidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica causada. 4. Impossibilidade de incidência, no contrabando de cigarros estrangeiros, do princípio da insignificância. Precedentes. 5. O criminoso contumaz, mesmo que pratique crimes de pequena monta, não pode ser tratado pelo sistema penal como se tivesse praticado condutas irrelevantes, pois crimes considerados ínfimos, quando analisados isoladamente, mas relevantes quando em conjunto, seriam transformados pelo infrator em verdadeiro meio de vida. 6. O princípio da insignificância não pode ser acolhido para resguardar e legitimar constantes condutas desvirtuadas, mas para impedir que desvios de conduta ínfimos, isolados, sejam sancionados pelo direito penal, fazendo-se justiça no caso concreto. Comportamentos contrários à lei penal, mesmo que insignificantes, quando constantes, devido a sua reprovabilidade, perdem a característica da bagatela e devem se submeter ao direito penal. 7. Habeas corpus denegado (.HC 110841 / PR - PARANÁ HABEAS CORPUS Relator(a):  Min. CÁRMEN LÚCIAJulgamento:  27/11/2012           Órgão Julgador:  Segunda Turma ).


Por fim, não prospera a alegada ausência do elemento subjetivo do tipo penal, pois o dolo da ré claramente se extrai ao constatar-se que ela responde a outros três processos penais por crime idêntico (certidão de fls. 31/33), aliada à sua condição de comerciante.

Com tais considerações, NEGO PROVIMENTO à apelação.

É como voto.


FERNANDO MENDES
Juiz Federal Convocado


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): FERNANDO MARCELO MENDES:267
Nº de Série do Certificado: 4DB35192E5805758
Data e Hora: 16/01/2013 14:59:18