D.E. Publicado em 30/01/2013 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação do Ministério Público Federal, a fim de condenar a acusada Maria de Lourdes Ayres Castro, como incursa nas penas do artigo 171, parágrafo 3º, do Código Penal, ao cumprimento de uma pena de em 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de reclusão e 13 (treze) dias-multa, no valor unitário mínimo legal. Substituída a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade, a ser designada pelo Juízo da Execução, pelo prazo da pena privativa de liberdade, e prestação pecuniária, no valor de 5 (cinco) salários mínimos, mediante depósito bancário, comprovados nos autos, em prol do INSS. Com supedâneo no artigo 92, inciso I, do Código Penal, decretar a perda do cargo público de Maria de Lourdes Ayres Castro, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI: Consta da denúncia (fs. 02/04) que, no dia 14 de abril de 1997, no Posto da Mooca do Instituto Nacional do Seguro Social, na cidade de São Paulo, a apelada teria obtido, em benefício de Sérgio Bono, vantagem indevida, induzindo o Instituto Nacional do Seguro Social em erro, mediante meio fraudulento.
Segundo, ainda, a denúncia, Sérgio protocolou pedido de benefício previdenciário em 14 de abril de 1997, entretanto, a apelada teria se aproveitado de sua função pública para ingressar no sistema de processamento de dados da Previdência Social e adulterar o número de benefício do segurado, atribuindo-lhe a numeração 102.351.936-1. Ocorre que tais autos de procedimento administrativo versavam requerimento de terceiro, Elias Pereira da Silva, e estavam já encerrados como "simples contagem de tempo", permitindo que o segurado usufruísse da data do protocolo do pedido de Elias, qual seja, 29 de abril de 1996.
Referida conduta teria implicado a retroação da data do início do benefício de Sérgio àquela data, ocasionando o pagamento indevido do valor não atualizado de R$ 6.404,56 (seis mil, quatrocentos e quatro reais e cinqüenta centavos).
A denúncia foi recebida, em 22.05.02 (fs. 131/132).
A r. sentença, de 29.08.08, julga improcedente o pedido formulado na denúncia, para absolver a ré Maria de Lourdes Ayres Castro da acusação que lhe foi imputada, nos termos do art. 386, II, do Código de Processo Penal.
O Parquet Federal interpôs recurso de apelação, em cujas razões (fls. 414/422) requer, em síntese, a reforma da decisão recorrida, a fim de condenar a acusada como incursa nas penas do art. 171, § 3º, do Código Penal, devendo a pena base ser fixada em patamar superior ao mínimo legal, haja vista a existência de circunstâncias judiciais desfavoráveis, incidindo-se, também, a agravante prevista no art. 61, II, alínea "g", do Código Penal.
Em suas contrarrazões (fs. 452/453), Maria de Lourdes Ayres Castro requer o desprovimento do recurso do Ministério Público Federal, e a manutenção da r. sentença.
O Ministério Público Federal, por meio de parecer da lavra da e. Procuradora Regional da República, Ana Lúcia Amaral (fls. 458/461), opina pelo provimento do recurso de apelação interposto pela acusação, culminando com a reforma da sentença, a fim de condenar a acusada como incursa nas penas do art. 171, § 3º, do Código Penal, com a fixação da pena base em patamar superior ao mínimo legal em virtude das circunstâncias judiciais desfavoráveis, e sobre ela incidir a agravante prevista no art. 61, II, alínea "g", do Código Penal.
Em sessão realizada em 27 de abril de 2010, esta E. Primeira Turma, por unanimidade, deu provimento à apelação do Ministério Público Federal para condenar a acusada MARIA DE LOURDES AYRES CASTRO, como incursa nas penas do art. 171, § 3º, do Código Penal, ao cumprimento de uma pena de quatro anos e quatro meses de reclusão, além do pagamento de duzentos e noventa dias-multa, cada qual no mínimo legal, em regime inicial semiaberto, decretando-se, ainda, a perda do cargo público, com supedâneo no art. 92, inciso I, do Código Penal e determinando-se a expedição de mandado de prisão em seu desfavor, após o trânsito em julgado, nos termos do voto do então relator Juiz Federal Convocado Ricardo China (fls. 474 e fls. 479/483).
O v. acórdão transitou em julgado em 13 de julho de 2010 (fls. 489).
Julgando o Habeas Corpus n.º177.669 - SP (2010/0119211-1), o Colendo Superior Tribunal de Justiça concedeu a ordem para, "mantida a condenação, reformar o acórdão no tocante à individualização da pena e determinar que a Eg. Corte Federal a quo complemente os fundamentos utilizados na fixação da pena-base, sob pena de aplicação retroativa da reprimenda no mínimo legal" (fls. 638).
Manifestação do Ministério Público Federal e juntada do inteiro teor do acórdão que julgou referido Habeas Corpus n.º177.669 (fls. 648/656).
Os autos voltaram à conclusão, em 12 de julho de 2012 (fls. 657).
É o relatório.
Feito sujeito à revisão.
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VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ FEDERAL CONVOCADO FERNANDO MENDES:
Inicialmente, ratifico o relatório.
Segundo a denúncia, Maria de Lourdes Ayres Castro teria obtido vantagem indevida para o segurado Sergio Bono, ao retroagir indevidamente a data de entrada de seu requerimento administrativo de 14/04/1997 para 29/04/1996, mediante alterações lançadas no sistema de informática da autarquia previdenciária, transpassando o número de protocolo concernente a outro segurado (Elias Pereira da Silva) para o mencionado Sérgio.
O apelo ministerial merece ser provido, pois materialidade e autoria restaram amplamente demonstradas pelas provas carreadas aos autos.
Pelo simples exame do documento acostado às fls. 15 destes autos, verifica-se que a data nele lançada foi grosseiramente adulterada, numa tentativa de ali fazer constar o dia 29/04/96, ao invés da data originária (14/04/97).
Compulsando os autos, constata-se que a documentação apresentada, notadamente a tela de auditoria de benefício, juntada às fls. 38, demonstra a participação da apelada nas condutas delitivas descritas na denúncia.
Da referida tela de auditoria, depreende-se que a denunciada, cuja matrícula era no. 2.328.224, SIAPE nº 940.344, teve acesso a todas as fases da concessão do benefício de Sérgio Bono. Além da fase de pré-habilitação, também atuou nas demais fases, quais sejam, protocolo, habilitação, informações de tempo de serviço, informações de valores, despacho concessório e despacho de encerramento do procedimento administrativo.
Ressalte-se, ainda, o acesso ao sistema por ela realizado em 14/04/1997, data do real protocolo de Sérgio Bono, quando realizou a operação historiada como "Reabre Encerramento", ou seja, deu nova ativação a um procedimento administrativo já antes encerrado.
Esta última operação, qual seja, o reaproveitamento do processo administrativo de no. 1023519361, com o objetivo de fraudulentamente retroagir a data de entrada do requerimento de Sérgio Bono, é também comprovada pelos documentos de fls. 46/47, que também são telas do sistema de informática da Previdência Social, e bem demonstram a alteração do pólo ativo do benefício, de Elias Pereira da Silva para Sérgio Bono.
Saliente-se, também, que os documentos apresentados por Sérgio Bono, necessários à obtenção do benefício, foram emitidos todos a partir de fevereiro de 1997. Isso demonstra que, na data em que o segurado supostamente teria protocolado o requerimento de seu benefício (29.04.96), nem sequer possuía os documentos necessários para tanto. Senão vejamos: a relação dos salários de contribuição da empresa ESM Com. e Representação Ltda., bem assim a discriminação das parcelas do salário de contribuição, foram datados em 04.04.97 (fs. 20 e fs. 22). Já a conta de energia elétrica apresentada pelo segurado também foi emitida em 05.03.97 (fs. 18).
Atente-se, ainda, para o fato de não haver, no processo administrativo de concessão do benefício, qualquer justificativa quanto a eventual atraso na entrega da documentação e, também, não se olvida da possibilidade de posterior complementação desses documentos apresentados inicialmente pelo segurado, o que é perfeitamente possível e até mesmo corriqueiro. O que não é comum e nem mesmo admissível, na hipótese dos autos, é que tal complementação advenha quase um ano após o suposto protocolo, e sem quaisquer atos de comunicação expedidos pela administração para exigi-los.
Sérgio Bono, ao ser ouvido perante a autarquia (fls. 53/55) tentou justificar sua conduta, asseverando que somente foi informado da necessidade de complementar a documentação alguns meses após seu requerimento. Sabe-se, entretanto, que tais comunicações são realizadas de maneira formal, por escrito, e não meramente verbais, motivo pelo qual tais assertivas não merecem credibilidade.
Maria de Lourdes, por sua vez, ouvida na fase inquisitorial e em juízo (fs. 108 e fs. 168), confirma ter atuado na concessão do benefício em análise. Contudo, relata que a alteração da data de entrada do requerimento decorreu de falha "espontânea" do sistema do INSS.
As escusas da apelada não prosperam, pois ainda que ocorresse uma falha no sistema, a simples consulta à documentação apresentada por Sérgio Bono, cujas datas são posteriores à DER para a qual o sistema retroagiu, já seria suficiente para constatar a irregularidade.
Ressalte-se, uma vez mais, que a apelada foi responsável por todas as fases de concessão do benefício questionado e, portanto, manuseou e examinou todos os documentos apresentados para tanto. Sem contar que a data do requerimento inicial (fls. 15) está escandalosa e grosseiramente rasurada.
Por tais razões, não há como afastar o dolo da apelada, na conduta perpetrada.
Em face das provas documentais produzidas, não merecem credibilidade as alegações das testemunhas de defesa, uma vez que, como se depreende de seus depoimentos, todas estão sendo investigadas ou respondendo a processo crime pela suposta prática de condutas análogas às da ré (fs. 207/214). Senão vejamos:
A testemunha Ana Maria de Souza Sasso, chefe da Agência do INSS da Mooca, em seu depoimento judicial (fs. 207/209) afirmou que:
Também a testemunha Lourde Ney de Jesus Torres Sampaio, em seu depoimento judicial às fs 210/211, disse que:
Demonstradas materialidade, autoria e dolo, passo, à dosimetria da pena.
DOSIMETRIA DA PENA
1ª fase da dosimetria: Compulsando os autos, verifica-se que a apelada também está respondendo por várias outras ações penais (fs. 423/441), em razão da suposta prática de condutas análogas às aqui apuradas.
Contudo, não é possível agravar a pena com alusão ao desajuste na personalidade e na conduta social do acusado se tal avaliação se funda no registro de ações penais em andamento, sem trânsito em julgado, como é o caso dos autos, visto que tal juízo choca-se com o princípio da presunção de inocência. Nessa linha, a Súmula 444 do STJ: "É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base".
A avaliação da personalidade do acusado e também da sua conduta social devem estar assentadas em elementos idôneos e devidamente demonstrados nos autos, não servindo para tal fim os registros supracitados. Essa é jurisprudência pacífica do STJ: "A existência de inquéritos e ações em andamento não pode constituir fundamento para a valoração negativa dos antecedentes, da conduta social ou da personalidade do agente, em respeito ao princípio constitucional da presunção de não culpabilidade." (HC 130.235/RJ, 5ª Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJ de 29/06/2009).
Pois bem, não havendo circunstâncias judiciais desfavoráveis à condenada, deve a pena-base ser fixada no mínimo legal, ou seja, em 1 (um) ano de reclusão e 10 (dez) dias-multa.
2ª fase da dosimetria: Ausentes atenuantes, entendo que deveria incidir a agravante prevista no art. 61, II, "g", do Código Penal, pois a apelada praticou a conduta delitiva, na qualidade de servidora do INSS, com violação de dever inerente a seu cargo. Entretanto, por não ter incidido no julgamento anulado, para não incorrer em reformatio in pejus, deixo de reconhecê-la.
3ª fase da dosimetria: Não há causas de diminuição da pena. Presente, porém, a causa de aumento do § 3º do artigo 171 do Código Penal, porquanto o crime foi praticado contra a autarquia previdenciária, aumentando-se a pena-base em 1/3 (um terço), motivo pelo qual a pena resta fixada, definitivamente, em 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de reclusão e 13 (treze) dias-multa, no valor unitário mínimo legal.
A condenada iniciará o cumprimento de sua pena corporal no regime aberto, nos termos do art. 33, § 2º, "c", do Código Penal.
Preenchidos os requisitos os requisitos do art. 44 do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade, a ser designada pelo Juízo da Execução, pelo prazo da pena privativa de liberdade, e prestação pecuniária, no valor de 5 (cinco) salários mínimos, mediante depósito bancário, comprovados nos autos, em favor da UNIÃO.
Com fundamento no artigo 92, inciso I, "a", do Código Penal, decreto a perda do cargo público que a acusada vem exercendo perante o Instituto Nacional do Seguro Social. Não faz jus a permanecer exercendo cargo público aquele que se utiliza dos conhecimentos ou facilidades obtidas no exercício de suas funções para a prática de infrações penais, ficando determinado que seja oficiado ao órgão público em referência para as providências cabíveis, após trânsito em julgado desta decisão.
Ante todo o exposto, DOU PROVIMENTO à apelação do Ministério Público Federal, a fim de condenar a acusada Maria de Lourdes Ayres Castro, como incursa nas penas do artigo 171, parágrafo 3º, do Código Penal, ao cumprimento de uma pena de em 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de reclusão e 13 (treze) dias-multa, no valor unitário mínimo legal. Substituída a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade, a ser designada pelo Juízo da Execução, pelo prazo da pena privativa de liberdade, e prestação pecuniária, no valor de 5 (cinco) salários mínimos, mediante depósito bancário, comprovados nos autos, em favor da UNIÃO.
Com supedâneo no artigo 92, inciso I, "a" do Código Penal, decreto a perda do cargo público de Maria de Lourdes Ayres Castro, nos termos da fundamentação supra.
É como voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 23/01/2013 19:23:55 |