Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 08/11/2012
HABEAS CORPUS Nº 0024398-69.2012.4.03.0000/SP
2012.03.00.024398-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal LUIZ STEFANINI
IMPETRANTE : CAIO DE LIMA SOUZA
PACIENTE : LI QI WU
ADVOGADO : CAIO DE LIMA SOUZA
IMPETRADO : JUIZO FEDERAL DA 3 VARA CRIMINAL SAO PAULO SP
CO-REU : ALCIDES ANDREONI JUNIOR
: MAURO SABATINO
: PAULO MARCOS DAL CHICCO
: WELDON E SILVA DELMONDES
: YE ZHOU YOUNG
INVESTIGADO : HICHAM MOHAMAD SAFIE
: MAHER CHAER
No. ORIG. : 00081337820094036181 3P Vr SAO PAULO/SP

EMENTA

PENAL PROCESSUAL - HABEAS CORPUS - PLEITO DE RESTITUIÇÃO DE PASSAPORTE APREENDIDO - LIBERDADE - VIA OBLÍQUA - CONHECIMENTO DO WRIT - ART. 333, PARÁGRAFO ÚNICO, C.C. ART. 69 E 29, DO CÓDIGO PENAL - RETENÇÃO DO PASSAPORTE - NATUREZA CAUTELAR - ART. 282, I DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL - APLICAÇÃO - ILEGALIDADE OU ABUSIVIDADE - AUSÊNCIA - DENEGAÇÃO DA ORDEM.
1. Habeas corpus impetrado em face do amparo em matriz constitucional prevista no art. 5º, LXVIII, da Carta Magna, considerando-se via oblíqua ao alcance de liberdade, uma vez que a retenção do passaporte implicaria em manifesta restrição à liberdade de locomoção do Paciente. Conhecimento da ação. Precedente do Supremo Tribunal Federal.
2. A retenção do passaporte teve por lastro medida de natureza cautelar em face da necessária garantia à eventual aplicação da lei penal, ex vi do art. 282, I, do Código de Processo Penal
3.Extrai-se dos autos que o Paciente foi denunciado porque, na qualidade de comerciante de mercadorias de origem estrangeira que atuava na região da Rua 25 de março em São Paulo, faria parte de quadrilha cuja atuação consistia em prestação periódica e habitual de vantagens indevidas a servidores da Polícia Federal em troca de espécie de proteção que se caracterizava pela omissão desses servidores em reprimir atividades ilícitas em que estavam envolvidos os comerciantes, bem como pela prestação de informações sigilosas sobre eventuais operações policiais que pudessem prejudicar negócios escusos.
4. Aponta ainda a denúncia que o Paciente, em relação às mercadorias apreendidas em seu estabelecimento, apresentou notas fiscais de suposto fornecedor que não existe de fato, não conferindo o documento contábil conformidade com as transações comerciais, atribuindo-lhes valores irrisórios e irreais, a indicar ocorrência de crime contra a ordem tributária.
5.No imóvel do Paciente foi apreendida agenda com códigos de remessa de encomendas para o exterior, notadamente China, Hong Kong e Cingapura, para o Brasil, algumas com até 30 quilos de produtos contrabandeados, tendo sido encontrados em seu estabelecimento 230.000 armações de óculos.
6.A denúncia não descarta ainda outras irregularidades, tais como fraude contratual, uso de documento falso, além de crimes contra a ordem tributária, v.g., a máquina de cartão de crédito utilizada pelo Paciente em seu estabelecimento que está em nome de terceiro com forte indício de ser "laranja".
7.Além de negócios envolvendo a importação e o comércio de armações de óculos, o monitoramento telefônico permitiu constatar que o Paciente também negociaria dólares de forma irregular, em evidente desacordo com a legislação, suspeitando-se de evasão de divisas do País, inclusive com uso de contas bancárias de terceiros, tais como de sua esposa e sogra.
8. As informações prestadas pela autoridade apontada como coatora dão conta de que a retenção do passaporte teve por lastro medida de natureza cautelar em face da necessária garantia à eventual aplicação da lei penal, ex vi do art. 282, I, do Código de Processo Penal.
9. Diante da narrativa, não há ilegalidade ou abusividade no ato judicial de retenção de passaporte.
10. Medida que se impõe, considerando-se que as supostas atividades ilícitas estão intrinsicamente ligadas à oportunização de viagens ao exterior, inclusive uma delas empreendida pelo Paciente recentemente, segundo sua declaração, à passeio, no decorrer da apuração do caso dos autos, não sendo o ato de retenção do documento medida que lhe trará prejuízo.
11. Há de ser considerado, ainda, que a saída do país certamente frustraria a aplicação da lei.
12. A impetração não alega qualquer necessidade de viagem ou sua comprovação, não sendo razoável oportunizar ao Paciente saídas do Brasil, como garantia da futura e eventual execução da lei penal.
13. Denegação da ordem.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, denegar a ordem, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 29 de outubro de 2012.
LUIZ STEFANINI
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): LUIZ DE LIMA STEFANINI:10055
Nº de Série do Certificado: 47D97696E22F60E3
Data e Hora: 31/10/2012 14:05:19



HABEAS CORPUS Nº 0024398-69.2012.4.03.0000/SP
2012.03.00.024398-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal LUIZ STEFANINI
IMPETRANTE : CAIO DE LIMA SOUZA
PACIENTE : LI QI WU
ADVOGADO : CAIO DE LIMA SOUZA
IMPETRADO : JUIZO FEDERAL DA 3 VARA CRIMINAL SAO PAULO SP
CO-REU : ALCIDES ANDREONI JUNIOR
: MAURO SABATINO
: PAULO MARCOS DAL CHICCO
: WELDON E SILVA DELMONDES
: YE ZHOU YOUNG
INVESTIGADO : HICHAM MOHAMAD SAFIE
: MAHER CHAER
No. ORIG. : 00081337820094036181 3P Vr SAO PAULO/SP

RELATÓRIO

Trata-se de habeas corpus, com pedido de medida liminar, impetrado por Caio de Lima Souza em favor de Li Qi Wu, contra ato emanado do MM. Juízo da 3ª Vara Federal Criminal de São Paulo, objetivando restituição de passaporte apreendido, conforme Auto de fls. 25, acostado aos autos por cópia.

Considerando-se que a impetração necessitava de mais subsídios para a apreciação do pedido, requisitei as informações da autoridade apontada como coatora que vieram aos autos acompanhadas de cópias do procedimento criminal.

Às fls. 69/70, indeferi o pedido de medida liminar.

Parecer do Ministério Público opinou pelo não conhecimento do writ e, se conhecido, pela denegação da ordem (fls. 71/78).

A respeito do não conhecimento do presente mandamus manifestou-se a ilustre Procuradora Regional da República pela inadequação da via eleita com vistas ao pleito de restituição de objeto apreendido.

É o relatório.

Trago o feito em mesa.


VOTO

Por primeiro, entendo que merece conhecimento o presente habeas corpus em face do amparo em matriz constitucional prevista no art. 5º, LXVIII, da Carta Magna, considerando-se via oblíqua ao alcance de liberdade, uma vez que a retenção do passaporte implicaria em manifesta restrição à liberdade de locomoção do Paciente.

Esse é o entendimento jurisprudencial predominante. A respeito, veja-se:


"PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. FACILITAÇÃO DE DESCAMINHO. CORRUPÇÃO ATIVA E PASSIVA. RESTITUIÇÃO DE PASSAPORTES: CAUSA DE PEDIR PRÓXIMA. LIBERDADE DE LOCOMOÇÃO: CAUSA DE PEDIR REMOTA. APREENSÃO DE PASSAPORTES COMO MEDIDA ACAUTELATÓRIA. CONSTITUCIONALIDADE.

1. O habeas corpus não tutela "direitos que têm na liberdade física apenas a sua condição de exercício, objeto, não imediato, mas mediato, do pedido, não estando, assim, afetada imediatamente, mas apenas de modo oblíquo, a liberdade de locomoção" (HC n. 81.814-AgR/SP, Relator o Ministro MOREIRA ALVES, Pleno, DJ de 08.05.2002).

2. Pedido é "o bem da vida pretendido pelo autor (...). Divide-se em pedido imediato (sentença) e pedido mediato (bem da vida). Pede-se a prolação de uma sentença (imediato) que garanta ao autor o bem da vida pretendido (mediato)" (Código de processo civil comentado e legislação extravagante. Nery Júnior, Nelson e Nery, Rosa Maria de Andrade - 10ª ed. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, págs. 550).

3. Na hipótese dos autos, o pedido mediato é a devolução definitiva dos passaportes; a liberdade de locomoção constitui apenas o pedido imediato. Pleiteia-se a restituição dos passaportes (pedido mediato) a fim de que possam realizar viagens ao exterior, exercendo seu direito de liberdade de locomoção (pedido imediato).

4. É cediço na Corte, consoante destaca o Membro do Parquet, a constitucionalidade da apreensão de passaportes como medida acautelatória no processo penal (Precedente: HC n. 94.147/RJ, Relatora a Ministra Ellen Gracie, 2ª Turma DJ de 12.06.2008).

5. É o que registrou o parecer da Procuradoria Geral da República, verbis: "HABEAS CORPUS. APREENSÃO DE PASSAPORTE. PODER GERAL DE CAUTELA DO JUIZ. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. PELO CONHECIMENTO E/OU DENEGAÇÃO DA ORDEM. 1. A retenção de passaporte pelo magistrado de primeiro grau tem clara natureza acautelatória, inserindo-se, portanto, no poder geral de cautela, o qual é depreendido de normas processuais dispostas no art. 3º do CPP, e do art. 798 do CPC. 2. 'Se o direito brasileiro admite a decretação da prisão temporária e preventiva, entre outras medidas constritivas da liberdade de locomoção da pessoa, no momento anterior ao trânsito em julgado de sentença condenatória, com muito mais razão revela-se admissível a imposição de condições para o acusado durante o processo, como a entrega do passaporte, a necessidade de obtenção de autorização judicial para empreender viagens ao exterior, entre outras' (HC 94.147/RJ, Rel. Min. Ellen Gracie, Dje 13.06.2008) 3. Parecer pelo conhecimento e indeferimento da ordem." 7. Ordem indeferida".

(STF HC 101830, Relator LUIZ FUX, votação unânime em 12.4.2011, 1ª Turma).


Uma vez conhecida a ação, não vislumbro presentes os requisitos para a concessão da ordem em que se pleiteia restituição do passaporte de nº N.G. 302236257 expedido em nome do Paciente.

Extraio dos autos que foi Li Qi Wu denunciado pela prática delitiva prevista no art. 333, parágrafo único, c.c. art. 69 e 29, do Código Penal.

A denúncia aponta, em síntese, que o Paciente, na qualidade de comerciante de mercadorias de origem estrangeira que atuava na região da Rua 25 de março em São Paulo, faria parte de quadrilha cuja atuação consistia em prestação periódica e habitual de vantagens indevidas a servidores da Polícia Federal em troca de espécie de proteção que se caracterizava pela omissão desses servidores em reprimir atividades ilícitas em que estavam envolvidos os comerciantes, bem como pela prestação de informações sigilosas sobre eventuais operações policiais que pudessem prejudicar negócios escusos.

Aponta ainda a denúncia que o Paciente, em relação às mercadorias apreendidas em seu estabelecimento, apresentou notas fiscais de suposto fornecedor que não existe de fato, não conferindo o documento contábil conformidade com as transações comerciais, atribuindo-lhes valores irrisórios e irreais, a indicar ocorrência de crime contra a ordem tributária.

No imóvel do Paciente foi apreendida agenda com códigos de remessa de encomendas para o exterior, notadamente China, Hong Kong e Cingapura, para o Brasil, algumas com até 30 quilos de produtos contrabandeados, tendo sido encontrados em seu estabelecimento 230.000 armações de óculos. A denúncia não descarta ainda outras irregularidades, tais como fraude contratual, uso de documento falso, além de crimes contra a ordem tributária, v.g., a máquina de cartão de crédito utilizada pelo Paciente em seu estabelecimento que está em nome de terceiro com forte indício de ser "laranja".

Além de negócios envolvendo a importação e o comércio de armações de óculos, o monitoramento telefônico permitiu constatar que o Paciente também negociaria dólares de forma irregular, em evidente desacordo com a legislação, suspeitando-se de evasão de divisas do País, inclusive com uso de contas bancárias de terceiros, tais como de sua esposa e sogra.

As informações prestadas pela autoridade apontada como coatora dão conta de que a retenção do passaporte teve por lastro medida de natureza cautelar em face da necessária garantia à eventual aplicação da lei penal, ex vi do art. 282, I, do Código de Processo Penal.

Diante da narrativa, não vejo ilegalidade ou abusividade no ato judicial de retenção de passaporte.

Ao contrário, entendo que a medida se impõe, considerando-se que as supostas atividades ilícitas estão intrinsicamente ligadas à oportunização de viagens ao exterior, inclusive uma delas empreendida pelo Paciente recentemente, segundo sua declaração, à passeio, no decorrer da apuração do caso dos autos, não sendo o ato de retenção do documento medida que trará prejuízo ao Paciente. Considero, ainda, que a saída do país certamente frustraria a aplicação da lei.

Por fim, também verifico que a impetração não alega qualquer necessidade de viagem ou sua comprovação, não sendo razoável oportunizar ao Paciente saídas do Brasil, como garantia da futura e eventual execução da lei penal.

Diante do exposto, denego a ordem.

É como voto.


LUIZ STEFANINI
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): LUIZ DE LIMA STEFANINI:10055
Nº de Série do Certificado: 47D97696E22F60E3
Data e Hora: 24/10/2012 17:54:34