D.E. Publicado em 26/11/2012 |
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EMENTA
APELAÇÃO CRIMINAL - TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES - EXCLUDENTE DE CULPABILIDADE - INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA NÃO DEMONSTRADA - PENA-BASE MANTIDA - INCABÍVEL CIRCUNSTÂNCIA ATENUANTE DA CONFISSÃO - INAPLICABILIDADE DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA PREVISTA NO ARTIGO 24, § 2º, DO CP E DA REDUÇÃO DE PENA RELATIVA À DELAÇÃO PREMIADA - MANUTENÇÃO DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA DO § 4º DO ARTIGO 33 DA LEI Nº 11.343/2006. - INTERNACIONALIDADE DO TRÁFICO - INOCORRÊNCIA DE BIS IN IDEM - IMPOSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO POR PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS E DE RECORRER EM LIBERDADE - APELAÇÃO IMPROVIDA.
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ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto do Desembargador Federal Relator, que fazem parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
Trata-se de Apelação Criminal interposta pela Defensoria Pública da União, representante legal de PETRU TEODOR CRET contra a r. sentença condenatória, publicada em 17 de fevereiro de 2010 (fls. 211), proferida em ação penal destinada a apurar a prática do crime descrito no artigo 33, caput c.c artigo 40, inciso I, da Lei nº 11.343/06.
Fato praticado em 2 de maio de 2009; denúncia recebida em 8 de junho do mesmo ano (fls. 69/70).
Após a regular instrução do feito, PETRU TEODOR CRET foi condenado ao cumprimento de 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão, a serem descontados em regime inicialmente fechado, e pagamento de 466 (quatrocentos e sessenta e seis) dias-multa, no valor unitário mínimo, pela prática do delito previsto no artigo 33, caput c.c artigo 40, inciso I, da Lei nº 11.343/06.
Em razões de apelação (fls. 233/255v), a Defensoria Pública da União, representante legal de PETRU TEODOR CRET pleiteia a absolvição em razão da configuração da causa excludente de culpabilidade consistente no estado de necessidade exculpante.
Subsidiariamente, requer:
- a redução da pena-base ao mínimo legal;
- a incidência da circunstância atenuante da confissão;
- a aplicação da redução prevista no artigo 24, § 2º, do Código Penal, em face do estado de necessidade exculpante;
- a incidência da causa de diminuição de pena relativa à delação premiada, prevista no artigo 41 da Lei nº 11.343/06, em seu grau máximo;
- a aplicação da causa de redução de pena prevista no artigo 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06 no patamar máximo de 2/3 (dois terços);
- a exclusão da majorante relativa à internacionalidade do tráfico, por configurar bis in idem;
- a substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos;
- a declaração parcial de inconstitucionalidade via incidental, com redução do texto do artigo 44 da Lei nº 11.343/06, no que tange a vedação da concessão da liberdade provisória, pois viola o princípio da presunção de inocência;
- a viabilização do direito de recorrer em liberdade.
Nas contrarrazões (fls. 260/279), o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL pugnou pela manutenção da r. sentença em sua íntegra.
Expedida a Guia de Recolhimento Provisória (fls. 294).
A Procuradoria Regional da República, na pessoa da Dra. Luiza Cristina Fonseca Frischeisen, opinou pelo improvimento do recurso interposto pela defesa (fls. 297/316v).
É o relatório.
À revisão.
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VOTO
Consta da denúncia (fls. 57/59) que no dia 2 de maio de 2009, às 18h00, nas dependências do Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos/SP, PETRU TEODOR CRET foi preso em flagrante delito quando estava prestes a embarcar em vôo da companhia aérea British Airways com destino à Inglaterra, trazendo consigo, no interior de 2 (dois) pacotes ocultos em um fundo falso de sua mala, para fins de comércio ou entrega de qualquer forma a consumo de terceiros, no exterior, 3.735g (três mil setecentos e trinta e cinco gramas) - peso líquido - de cocaína, substância entorpecente que determina dependência física e/ou psíquica, sem autorização legal ou regulamentar.
Passemos ao exame do recurso interposto.
Devidamente demonstrada - e não impugnada em sede recursal - a autoria da conduta típica e antijurídica, à defesa compete fazer prova das excludentes de ilicitude ou de culpabilidade que venha a alegar.
Nesse passo, não há a menor demonstração da condição financeira adversa do apelante, alegada de forma genérica pela Defensoria Pública - apenas mencionou que PETRU, arrimo de sua família composta pela mãe aposentada e por uma irmã surda-muda, encontrava-se desempregado e em situação avançada de penúria - como motivo "justificador" da narcotraficância à conta de "estado de necessidade" (ofensa ao artigo 156 do CPP).
Indo além, considero absolutamente impossível - à conta de clamorosa imoralidade - a tentativa de emprestar juridicidade para a narcotraficância transnacional que vitima milhões de pessoas no mundo todo, sob o pálio do enfrentamento de agruras econômicas. Auferir dinheiro com a prática do narcotráfico insere-se no índice de reprovabilidade que justifica o próprio tipo penal, sendo um absurdo o réu pretender elidir a injuridicidade da sua conduta típica valendo-se do abjeto lucro que o narcotraficante - grande ou pequeno, iniciante ou velhaco, mais ou menos financeiramente afortunado - consegue com a prática criminosa. Melhor seria que tal argumento defensivo nem fosse utilizado perante nossos pretórios.
Passo à análise da dosimetria da pena.
Em observância às circunstâncias judiciais elencadas no artigo 59 do Código Penal e artigo 42 da Lei nº 11.343/06, em especial, à quantidade (3.735g - peso líquido) e natureza da droga apreendida (cocaína); à desabonadora personalidade do réu, que se dispôs a atravessar fronteiras internacionais como forma de angariar algum dinheiro, revelando desprezo pela vida ordeira em sociedade e frieza no agir; ao motivo mercenário, pois agiu com vistas à obtenção de lucro fácil proporcionado pela narcotraficância; e às terríveis conseqüências à saúde pública caso a droga alcançasse seu destino, a pena-base foi fixada acima do mínimo legal, em 6 (seis) anos de reclusão.
Destaco que a personalidade do réu não transcende à normalidade do comportamento dos transportadores que, por dinheiro, se arriscam em aventuras geralmente fadadas ao fracasso, sendo que o fato de o agente ter sua conduta impulsionada pelo desejo vil de obtenção de lucro financeiro é circunstância inerente ao tipo penal.
Quanto às conseqüências do crime, observo que o risco de dano à sociedade, indissociável do próprio resultado do crime de tráfico de entorpecentes, já foi ponderado pelo legislador quando da cominação da pena em abstrato, constituindo circunstância indissociável ao tipo penal sub examine (nesse sentido: HC 162.967/RS, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 18/05/2010, DJe 21/06/2010).
Todavia, a elevada quantidade (mais de três quilos e meio) da nefasta droga apreendida (cocaína) - circunstâncias preponderantes - autorizam a manutenção da pena-base tal como fixada no édito condenatório, em 6 (seis) anos de reclusão.
Na segunda fase, incabível a incidência da circunstância atenuante prevista no artigo 65, inciso III, "d", do Código Penal, eis que a confissão traduziu-se em admissão da autoria impossível de ser negada, diante da prova inequívoca do transporte da droga pelo réu, dentro de sua bagagem, nas dependências do Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos/SP.
Nesse sentido, a jurisprudência do STF vem repelindo o reconhecimento da atenuante nos casos de prisão em flagrante (HC 102002/RS, rel. Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 22/11/2011, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-234 DIVULG 09-12-2011 PUBLIC 12-12-2011; HC 101861/MS, rel. Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 13/4/2011, DJe-085 DIVULG 06-05-2011 PUBLIC 09-05-2011; HC 108148/MS, rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 7/6/2011, DJe-125 DIVULG 30-06-2011 PUBLIC 01-07-2011 de 1/7/2011).
Além disso, PETRU agregou à confissão tese defensiva consistente na incomprovada excludente de culpabilidade relativa ao estado de necessidade exculpante.
Ora, é irreconhecível a confissão espontânea na conduta do agente que admite conduta criminosa incontrovertível, mas no mesmo ato aduz causa excludente do injusto da prática criminosa.
Na terceira e última etapa, não há que se cogitar da aplicação da causa de redução de pena prevista no artigo 24, § 2º, do Código Penal, eis que não se afigura nada razoável, nem aceitável, expor a risco a saúde pública, bem jurídico tutelado pela norma penal, em prol de uma temporária melhora na situação financeira do apelante, recordando que no caso dos autos não restou comprovado sequer um fato concreto que demonstrasse a sua necessidade. O conjunto probatório carreado aos autos conduz a inafastável ilação de que o motivo propulsor da atuação criminosa de PETRU foi a obtenção de dinheiro fácil (receberia dois mil euros pelo transporte bem sucedido da droga).
Incabível o pleito de reconhecimento da "delação premiada", com a consequente redução da reprimenda, tendo em vista que as informações prestadas pelo réu em Juízo (fls. 207/210) - que se resumiram ao primeiro nome de seu aliciador que o contratou na Espanha ("Miguel") e da pessoa que lhe entregou a droga no Brasil ("Manolo") - foram vagas, insuficientes e incapazes de auxiliar na identificação, localização e prisão dos demais partícipes do delito, ou no esclarecimento sobre uma possível quadrilha, possibilitando seu desmantelamento.
Na verdade, vislumbra-se que o réu não revelou às autoridades nada que tivesse colaborado no prosseguimento das investigações visando à identificação dos responsáveis pela sua convocação para as fileiras da infame legião dos traficantes, eis que delatou o suposto aliciador de forma vaga e imprecisa, de modo que as informações prestadas em nada repercutiram no âmbito repressivo.
Dessa forma, não basta a mera prestação de informações para que se considere eficaz a colaboração, estando adstrita, necessariamente, ao seu efetivo rendimento para a persecução penal estatal. Apontamentos sem maiores dados indicativos, insuscetíveis de ensejar uma perseguição aos demais comparsas não podem ser eficazes para apreciação de eventual diminuição de pena por ocasião da prolação da sentença.
Nesse sentido é a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: HC 215.315/SP, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 17/05/2012, DJe 04/06/2012; HC 115.065/DF, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 09/11/2010, DJe 13/12/2010.
Ainda na terceira fase, o magistrado sentenciante aplicou a causa de diminuição de pena prevista no artigo 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06 no patamar de 1/3 (um terço).
Cumpre considerar a causa de redução disposta no artigo 33, § 4º, da Lei de Drogas, que prevê a redução de 1/6 a 2/3 para o agente que seja primário, possua bons antecedentes e não se dedique a atividades criminosas nem integre organização criminosa.
O dispositivo indica a intenção do legislador em permitir a individualização da pena para as diversas condutas concernentes ao tráfico de drogas, uma vez que não é razoável punir com a mesma intensidade o responsável pela organização e o criminoso primário, ou o mero "subordinado".
O fato de a pessoa servir como "mula" no transporte da droga não exclui, necessariamente, seu pertencimento à organização criminosa. Entretanto, se o transporte ocorre pela primeira vez, como há indicações de ser o caso do réu nestes autos, tal questão há de ser analisada com maior cautela.
Assim, como não encontrei nos autos comprovação de que o réu integre organização criminosa, ou que se dedique a atividades criminosas permanentemente, revejo meu posicionamento anteriormente adotado.
Portanto, deve ser mantida a causa de diminuição prevista, consoante fundamentação exposta na r. sentença proferida pelo Juízo a quo, de modo que mantenho a redução de 1/3 (um terço) empregada em primeira instância.
Não há que se cogitar da ocorrência de bis in idem, como inutilmente almeja a defesa diante do frágil argumento de que o verbo "exportar", contido no caput do artigo 33 da Lei nº 11.343/06, já conteria a causa da internacionalidade. É que o crime previsto no artigo 33 da Lei nº 11.343/06 caracteriza-se como tipo penal misto alternativo, e PETRU foi denunciado e posteriormente condenado pela conduta de trazer consigo substância entorpecente destinada à exportação para a Inglaterra, e não pela conduta de exportar droga.
Nesse sentido já decidiu a Primeira Turma desta Corte: ACR 0007422-70.2006.4.03.6119, Juíza Federal Convocada SILVIA ROCHA, j. 6/3/2012, TRF3 CJ1 16/3/2012.
Dessa forma, mantido o aumento de 1/6 decorrente da internacionalidade do tráfico, a pena privativa de liberdade restou definitivamente fixada em 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão.
Em observância ao critério bifásico eleito no artigo 43 da Lei nº 11.343/06, o número de dias-multa foi corretamente fixado em 466 (quatrocentos e sessenta e seis), no valor unitário mínimo.
Ainda que tenha sido declarada pelo STF a inconstitucionalidade da Lei nº 11.343/06 na parte em que vedava a conversão em pena substitutiva, na singularidade do caso é incabível a incidência de pena alternativa em razão da quantidade de pena privativa de liberdade fixada, que excede o limite disposto no inciso I do artigo 44 do Código Penal.
Outrossim, é entendimento cediço que ao condenado por crime de tráfico ilícito de entorpecentes é negado o direito de recorrer em liberdade, máxime se o agente respondeu preso a todo o processo em razão de prisão em flagrante - exatamente a hipótese sub judice - ou de prisão preventiva, não havendo de se cogitar em ofensa ao princípio constitucional da presunção de inocência, nos termos da Súmula nº 09 do Colendo Superior Tribunal de Justiça.
Nesse sentido: STJ, HC 152.470/RJ, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA TURMA, julgado em 17/03/2011, DJe 04/04/2011.
A matéria de inconstitucionalidade parcial do artigo 44 da Lei nº 11.343/2006, no que tange à vedação da concessão da liberdade provisória, é inócua na singularidade do caso, vez que, como já mencionado, o réu não preenche as condições necessárias para pleitear o benefício.
Em face de todo o exposto, nego provimento à apelação.
É como voto.
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Data e Hora: | 21/11/2012 16:39:19 |