D.E. Publicado em 02/08/2013 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, pelo voto médio, negar provimento à apelação da defesa e dar parcial provimento à apelação do Ministério Público Federal para aplicar a causa de aumento de pena prevista no inciso III, do artigo 40, da Lei nº 11.343/06, no patamar de ¼ (um quarto), fixando as penas em 8 (oito) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 730 (setecentos e trinta) dias multa, nos termos do voto médio do Des. Fed. Antonio Cedenho, vencida a Relatora que negava provimento ao recurso de apelação do Ministério Público Federal e dava parcial provimento aos recursos de apelação dos acusados, reduzidas as penas finais a eles cominadas, pela prática dos delitos do art. 33, caput, c/c art. 40, I, ambos da Lei nº 11.343/06 e do art. 244-B da Lei nº 8.069/90 para 5 (cinco) anos e 1 (um) mês de reclusão e 408 (quatrocentos e oito) dias multa e o Des. Fed. Luiz Stefanini que negava provimento à apelação da defesa e dava parcial à apelação do Ministério Público Federal para fixar para cada um dos réus a pena definitiva de 8 (oito) anos, 9 (nove) meses e 10 (dez) dias de reclusão e 778 (setecentos e setenta e oito) dias-multa, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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DECLARAÇÃO DE VOTO
Com a devida vênia da eminente relatora, divirjo do voto na dosimetria das penas impostas aos réus, para reconhecer a incidência da causa de aumento do art. 40, inc. III, da Lei nº 11.343/06, quando há o transporte do entorpecente em transporte público, circunstância que reputo objetiva, razão pela qual, na terceira fase da dosimetria da pena, promovo o aumento de 1/3 (um terço) da pena imposta para cada um dos réus; também entendo que a causa de diminuição de pena pela aplicação do art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06 deva ser aplicada no mínimo legal, conforme estabelecido na sentença.
No que diz com o crime em transporte público, cito entendimento do E. STJ, ao qual adiro:
"CRIMINAL. RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE DROGAS. CONTRARIEDADE A DISPOSITIVOS DO CÓDIGO PENAL E DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO DO RECURSO. (...) INFRAÇÃO COMETIDA A BORDO DE TRANSPORTE PÚBLICO . MAJORANTE. REQUISITO DE ORDEM OBJETIVA. (...). III. Este sodalício firmou entendimento de que não há que se perquirir qualquer circunstância subjetiva para incidência do inciso III, do art. 40 da Lei de Drogas - infração cometida em transporte público, bastando simplesmente ter sido o crime praticado nos locais designados no aludido dispositivo, sendo a pena elevada exclusivamente em função do lugar do cometimento da infração". (...) (Resp 1211286, Min. Gilson Dipp, DJE 16/05/2011).
Por outro lado, no que diz com a causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06, entendo que, no presente caso, a porcentagem que mais se coaduna às circunstâncias do delito é o mínimo legal de 1/6, conforme estabelecido na sentença, tendo em vista a grande quantidade e a natureza da droga apreendida com os réus (cerca de trinta quilos de "maconha" com cada um deles).
Diante de tais entendimentos, resta a reprimenda assim fixada:
Pena-base - mantenho os 6 (seis) anos e 6 meses de reclusão e 650 (seiscentos e cinquenta) dias-multa;
Na segunda fase, mantenho a incidência da atenuante de confissão, a perfazer a pena de 6 anos e 600 dias-multa;
Mantenho a incidência de aumento de pena prevista no art. 40, I, da Lei nº 11.343/06, perfazendo as penas de 7 (sete) anos de reclusão e 700 (setecentos) dias-multa;
Ainda nessa fase, divergindo da relatora, entendo que razão assiste ao Ministério Público Federal, no sentido de dever ser aumentada a pena em 1/3 (um terço) em razão do uso de transporte público, a perfazer a pena de 9 (nove) anos e 4 (quatro) meses de reclusão e 933 dias-multa.
Também divergindo da relatora, mantenho a aplicação da causa de diminuição do § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/06 fixada na sentença em 1/6 (um sexto), restando as penas em 7 (sete) anos, 9 meses e 10 dias de reclusão e 778 (setecentos e setenta e oito) dias-multa.
Ante o exposto, mantenho a pena de um ano de reclusão para o crime de corrupção de menores estabelecida no voto e a aplicação do art. 69, do Código Penal, a totalizar para cada um dos réus, a pena definitiva de 08 (oito) anos, 09 (nove) meses e 10 dias de reclusão e 778 dias-multa, restando mantido, no mais, o voto da eminente relatora.
É como voto.
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VOTO CONDUTOR
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:
Na sessão realizada em 4 de fevereiro de 2013, as apelações criminais foram submetidas a julgamento pela Ilustre Relatora Juíza Federal Convocada Louise Filgueiras, proferindo voto no sentido de negar provimento ao recurso da acusação e dar parcial provimento aos recursos dos réus para reduzir suas penas individuais definitivas, em razão da prática do crime descrito no artigo 33, caput, c/c artigo 40, inciso I, ambos da Lei nº 11.343/06 em concurso material com o crime previsto no artigo 244-B, da Lei nº 8.069/90, para 5 (cinco) anos e 1(um) mês de reclusão e pagamento de 408 (quatrocentos e oito) dias multa. Em seguida, o Ilustre Desembargador Federal Revisor Luiz Stefanini proferiu voto no sentido de negar provimento às apelações defensivas e dar parcial provimento à apelação da acusação para fixar para cada réu a pena definitiva de 8 (oito) anos, 9 (nove) meses e 10 (dez) dias de reclusão e pagamento de 778 (setecentos e setenta e oito) dias multa. Por fim, proferi voto negando provimento à apelação da defesa e dando parcial provimento à apelação do Parquet para aplicar a causa de aumento de pena prevista no inciso III, do artigo 40, da Lei nº 11.343/06, no patamar de ¼ (um quarto), fixando as sanções de cada um dos acusados definitivamente em 8 (oito) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 730 (setecentos e trinta) dias multa.
Apesar de não ter dúvidas em acompanhar a I. Relatora no sentido de manter a condenação dos réus, pois ao contrário do alegado pela defesa, as provas coligidas pela acusação demonstram de maneira inequívoca que os denunciados cometeram os crimes de tráfico internacional de drogas e corrupção de menores, sendo que aquele, aliás, sequer foi objeto de pedido de absolvição pelas defesas. Contudo, divirjo dos votos da Eminente Relatora e Revisor tão somente no tocante à dosimetria da pena daquele delito.
A materialidade delitiva do crime de tráfico de drogas realmente é incontroversa, estando demonstrada pelos seguintes documentos: auto de prisão em flagrante (fls. 02/19), termo de exibição e apreensão (fls. 26/32), laudos de exame de constatação (fls. 34/38) e laudo de exame toxicológico (fls. 126/129 e 150/153), os quais revelam que os diversos tabletes encontrados nas malas e bolsas de viagem apreendidas consistiram na substância cannabis sativa linneu, vulgarmente conhecida como maconha.
Já a materialidade do delito de corrupção de menores restou demonstrada, pois o crime de tráfico transnacional de drogas foi cometido juntamente com menor de dezoito anos. A adolescente Letícia Souza da Silva, nascida em 19.06.1994 realmente era menor de 18 anos à época dos fatos (16.03.2011), conforme cópia de documento de identidade (fl. 20) e teor de suas declarações prestadas em Juízo (mídia à fl. 185).
Quanto ao crime de associação para o tráfico de drogas, previsto no artigo 35, caput, da Lei nº 11.343/06, os elementos probatórios de fato não são hábeis a indicar estabilidade e permanência da associação entre os réus com o intuito de praticar o delito de tráfico, limitando-se a demonstrar tão somente um mero ajuste ocasional de vontades.
Nesse sentido:
Não há dúvidas em relação às autorias delitivas, conforme bem analisadas pela I. Relatora, uma vez que restaram provadas pelo próprio auto de prisão em flagrante, devidamente corroborado pelos depoimentos testemunhais colhidos na fase judicial, os quais não deixam dúvidas a respeito dos acusados estarem transportando 78 kg (setenta e oito quilos) de maconha dentro das malas de propriedade dos acusados e encontradas no compartimento de bagagem de ônibus, estando eles acompanhados da menor Letícia Souza da Silva
Os próprios réus confessaram que viajaram até a cidade de Pedro Juan Caballero no Paraguai para adquirir e importar maconha que seria transportada até a cidade de Rio Branco/AC.
Aliás, a defesa sequer se insurge quanto à condenação pela prática do crime de tráfico de drogas, requerendo, todavia, a absolvição do crime de corrupção de menores, alegando que os acusados desconheciam o fato de Letícia ser menor de idade.
Conforme bem observado no voto proferido pela I. Relatora, ao não demonstrarem interesse em saber a exata idade de Letícia Souza da Silva, os denunciados incorreram no dolo eventual, uma vez que sequer perseguiram nas prováveis conseqüências resultantes da conduta de transportar droga na companhia de alguém de idade desconhecida por eles, tendo sido plenamente possível prever a ocorrência do crime corrupção de menor.
Ademais, a própria Letícia Souza da Silva, ouvida em Juízo como informante, afirmou que conhecia os réus desde a época em que morava com sua avó, pois eram amigos de seus primos, tendo ela afirmado que viajou em companhia deles, pois queriam se favorecer de sua presença, já que era menor de idade à época dos fatos (mídia à fl. 185).
Em relação ainda a esse crime, cabe destacar que se trata de delito formal, sendo desnecessária a efetiva corrupção ou idoneidade moral anterior do menor, bastando a demonstração de sua participação em crime na companhia de agentes imputáveis:
Demonstradas as materialidades e respectivas autorias delitivas, não havendo elementos aptos a ilidi-los, restando também evidentes os dolos nas condutas dos apelantes, pois agiram com consciência e vontade de importar droga em território nacional juntamente com menor de 18 (dezoito) anos, a manutenção de suas condenações pela prática dos crimes de tráfico transnacional de drogas e corrupção de menores é medida de rigor.
Passo à análise da dosimetria da pena.
As defesas pleiteiam a redução das penas-base do crime de tráfico de drogas, sustentando para tanto que os réus são primários e possuem bons antecedentes.
Porém, o MM Juiz a quo, na primeira fase de dosimetria da pena, já considerou como favoráveis as circunstâncias judiciais descritas no artigo 59, do Código Penal, tendo fixado as penas-base dos acusados acima do mínimo legal em razão da elevada quantidade de drogas apreendida com eles, a qual era suficiente para atingir muitos usuários caso chegasse a seu destino final, revelando o elevado grau de reprovabilidade dos agentes.
Assim, entendo que a sentença agiu com acerto ao fixar as penas-base dos acusados no patamar eleito, levando-se em consideração a expressiva quantidade da droga, restando atendidos os parâmetros expressamente previstos no artigo 42, da Lei nº 11.343/06, que configura norma especial em relação ao artigo 59, do Código Penal, orientando o magistrado a dar maior importância aos critérios relativos à quantidade e à natureza da droga.
De fato, não pode ser considerada de pequena monta a quantidade de drogas apreendida com os acusados, ainda mais quando comparada às quantidades normalmente portadas pelo criminoso no tráfico urbano de varejo, quando é vendida diretamente aos consumidores pelos pequenos traficantes.
Assim, ainda que os réus sejam primários e possuam bons antecedentes, tal fato não induz, necessariamente, à fixação da pena-base no patamar mínimo, pois subsistem ainda circunstâncias legais especiais previstas no artigo 42, da Lei nº 11.343/06 aptas para justificar a fixação da pena acima do mínimo legal como medida suficiente prevenção e repressão do crime.
Nesse sentido, os seguintes precedentes das Cortes Superiores e deste E. Tribunal:
Portanto, as penas-base dos acusados devem ser mantidas em 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de reclusão e pagamento de 650 (seiscentos e cinqüenta) dias multa.
Na segunda fase, corretamente reconhecida a atenuante genérica da confissão espontânea e, inexistindo outras atenuantes e agravantes, as penas dos acusados foram devidamente reduzidas para 6 (seis) anos de reclusão e pagamento de 600 (seiscentos) dias multa.
Na terceira fase, igualmente correta a aplicação da causa de aumento de pena prevista no inciso I, do artigo 40, da Lei de Drogas, no patamar de 1/6 (um sexto), ante a comprovação da transnacionalidade do delito, já que a droga foi adquirida no Paraguai e introduzida em território nacional, o que resulta nas penas de 7 (sete) anos de reclusão e pagamento de 700 (setecentos) dias multa.
Contudo, não deve ser aplicada a causa especial de aumento de pena referente ao tráfico entre os Estados da Federação, prevista no inciso V, do artigo 40, da lei nº 11.343/06.
Entendo não estar caracterizado o tráfico interestadual de drogas, que apenas existiria caso a intenção dos réus fosse a de transportar a droga proveniente do exterior para o território de um ou mais Estados da Federação.
No caso, as provas dos autos demonstraram que o crime se iniciou no Paraguai, onde a droga foi adquirida, e que o objetivo dos réus não era interná-la no Estado de Mato Grosso do Sul, mas sim na cidade de Rio Branco/AC, de forma que apenas transitou pelo Estado do Mato Grosso do Sul, não havendo nos autos nenhum elemento comprovando que seu propósito fosse o de adentrar a esse Estado para ali disseminar o entorpecente.
Assim sendo, o trajeto percorrido pelo réu no curso da ação não é suficiente para caracterizar a causa de aumento derivada da interestadualidade do tráfico, já que a passagem pelo Estado do Mato Grosso do Sul foi apenas uma etapa do tráfico transnacional.
A propósito, confira-se:
Ainda nesta fase, incide a causa especial de aumento de pena prevista no inciso III, do artigo 40, da Lei nº 11.343/06, tendo em vista que, consoante entendimento desta Corte, a mera utilização de transporte público para a circulação da substância entorpecente ilícita já é suficiente para aplicá-la.
Isso porque torna mais grave o perigo gerado pela conduta do agente e eleva a potencialidade lesiva do crime não apenas por ser cometido em local mais suscetível para a propagação do tóxico, mas também pela lesão a outros setores da segurança pública, no caso o serviço de transporte público, que apenas poderá ser prestado satisfatoriamente quando conduzir o usuário com segurança e no tempo previamente preestabelecido de um ponto para outro, além de dificultar a identificação dos responsáveis pela infração penal, em razão do aglomerado de pessoas, fato que prejudica também a fiscalização da polícia e a repressão do crime.
Nesse sentido:
Sendo assim, as penas devem ser aumentas em ¼ (um quatro), resultando nas penas de 8 (oito) anos e 9 (nove) meses de reclusão e pagamento de 875 (oitocentos e setenta e cinco) dias multa.
Em seguida, as reprimendas devem sofrer redução em 1/6 (um sexto) ante o reconhecimento da causa de diminuição do §4º, do artigo 33, da Lei nº 11.343/06.
Nesse aspecto, ressalvo meu entendimento, assim como o de parte dos integrantes desta Turma, no sentido de que não deve ser aplicada às pessoas que transportam grandes quantidades de drogas, ainda que eventualmente.
No entanto, à míngua de recurso da acusação nesse sentido, entendo que agiu com acerto o MM Juiz sentenciante ao aplicar o benefício no patamar mínimo de 1/6 (um sexto), pois o patamar máximo deve ser reservado aos casos de tráfico eventual para usuários de pequenas quantidades de droga em que também forem totalmente favoráveis as circunstâncias judiciais do artigo 59, do Código Penal.
Isso porque o parâmetro para a graduação da redução deve ser extraído da razão que motivou a edição da lei e da causa de diminuição, ou seja, o recrudescimento do tratamento do tráfico em geral, aliado às disposições contidas nos artigos 42, da Lei nº 11.343/06 e 59, do Código Penal.
Deve-se considerar a quantidade da droga, elemento decisivo também para o estabelecimento do quantum da redução da pena, nos casos em que for aplicado o artigo 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006.
Assim, na hipótese dos autos, não caberia a redução no patamar máximo, tendo em vista que os acusados adquiriram grande quantidade de droga, que seria pulverizada entre vários vendedores no mercado de consumo, conduta esta que, se bem sucedida, possibilitaria o abastecimento de diversos pontos de venda de tóxicos distintos, sendo potencialmente mais gravosa que o mero abastecimento no mercado interno.
Portanto, concluo que foi razoável e suficiente, em termos de repressão e prevenção penal, a aplicação da causa de redução de pena prevista no §4º, do artigo 33, da Lei de Drogas no patamar de 1/6 (um sexto), razão pela qual as penas restam definitivamente fixadas em 7 (sete) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 730 (setecentos e trinta) dias multa.
Quanto ao crime previsto no artigo 244-B, da Lei nº 8.069/90, as penas-base foram fixadas no mínimo legal, em 1 (um) ano de reclusão, a qual devem ser tornadas definitivas, haja vista a inexistência de agravante ou atenuantes e causas de aumento ou diminuição.
Em decorrência do concurso material, as penas devem ser somadas, resultando nas sanções de 8 (oito) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 730 (setecentos e trinta) dias multa, cujo valor unitário do dia multa deve ser mantido em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, nos termos da sentença.
No tocante à fixação do regime inicial, o Plenário da Suprema Corte, em sessão realizada em 27.06.2012, ao analisar o HC 111.840/ES, de relatoria do Ministro Dias Toffoli, por maioria, declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do § 1º, do artigo 2º, da Lei nº 8.072/90, com a redação dada pela Lei 11.464/2007:
Desse modo, restou superada a obrigatoriedade de início do cumprimento de pena no regime fechado aos condenados por crimes hediondos ou equiparados.
Assim, o magistrado deve se valer, além do quantum de pena imposta, dos critérios previstos no artigo 59, do Código Penal para determinar o regime inicial de cumprimento da pena, conforme exegese do artigo 33, §3º, do mesmo Codex.
Em se tratando de crime de tráfico de drogas, as circunstâncias judiciais para fixação da pena-base incluem ainda a natureza e a quantidade da droga, nos termos do artigo 42, da Lei nº 11.343/2006.
Portanto, considerando a quantidade da droga transportada pelos acusados e a quantidade da pena superior a 8 (oito) anos de reclusão, mantenho o regime inicial fechado para início do cumprimento das penas, nos termos do artigo 33, §2º, "a", do Código Penal.
Quanto à substituição das penas privativas de liberdade por restritivas de direitos, o Pretório Excelso declarou, incidentalmente, por ocasião do julgamento do HC 97.256, a inconstitucionalidade de sua vedação prevista nos artigos 33, §4º e 44, da Lei nº 11.343/06, tendo sido suspensa a execução da expressão "vedada a conversão em penas restritivas de direitos" prevista naquele dispositivo legal pela Resolução nº 5/12, do Senado Federal.
Assim, para que o acusado faça jus ao benefício, devem ser observados os requisitos do artigo 44, do Código Penal, sendo que o critério objetivo consistente na quantidade da pena não restou preenchido, pois as penas privativas de liberdade superaram 4 (quatro) anos de reclusão, nos termos do inciso I, do artigo 44, do Código Penal.
Por esses motivos, deixo de substituir a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos.
Diante do exposto, nego provimento às apelações interpostas pelos réus Cleiton Araújo Rola e Alcione Ramos Machado e dou parcial provimento à apelação interposta pelo Ministério Público Federal para reconhecer a causa de aumento de pena descrita no artigo 40, inciso III, da Lei nº 11.343/06, no patamar de ¼ (um quarto), resultando na pena individual de 8 (oito) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 730 (setecentos e trinta) dias multa decorrente da prática dos crimes descritos nos artigos 33, caput, c/c artigo 40, incisos I e III, ambos da Lei nº 11.343/06 e 244-B, da Lei nº 8.069/90, mantida, no mais, a r. sentença.
É o voto.
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QUESTÃO DE ORDEM
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:
Submeto à apreciação desta C. Quinta Turma a presente questão de ordem, que suscito ex officio.
Na sessão realizada em 4 de fevereiro de 2013, as apelações criminais foram submetidas à julgamento pela Ilustre Relatora Juíza Federal Convocada Louise Filgueiras, que proferiu voto no sentido de negar provimento ao recurso da acusação e dar parcial provimento aos recursos dos réus para reduzir suas penas individuais definitivas, em razão da prática do crime descrito no artigo 33, caput, c/c artigo 40, inciso I, ambos da Lei nº 11.343/06 em concurso material com o crime previsto no artigo 244-B, da Lei nº 8.069/90, para 5 (cinco) anos e 1(um) mês de reclusão e pagamento de 408 (quatrocentos e oito) dias-multa. Em seguida, o Ilustre Revisor Desembargador Federal Luiz Stefanini proferiu voto no sentido de negar provimento às apelações defensivas e dar parcial provimento à apelação da acusação para fixar para cada réu a pena definitiva de 8 (oito) anos, 9 (nove) meses e 10 (dez) dias de reclusão e pagamento de 778 (setecentos e setenta e oito) dias-multa. Por fim, proferi voto médio em razão de ter negado provimento à apelação da defesa e ter dado parcial provimento à apelação do Parquet para aplicar a causa de aumento de pena prevista no inciso III, do artigo 40, da Lei nº 11.343/06 no patamar de ¼ (um quarto), fixando as sanções dos acusados em 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de reclusão e pagamento de 760 (setecentos e sessenta) dias-multa, razão pela qual este relator para acórdão ficou incumbido de proferir o voto condutor.
Contudo, constato a ocorrência de erro material no tocante à fixação das penas definitivas aos réus, pelas razões a seguir expostas.
Na primeira fase de dosimetria da pena quanto ao crime de tráfico transnacional de drogas, mantive a pena-base em 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 650 (seiscentos e cinquenta) dias-multa, que, ao final da segunda fase, resultou em 6 (seis) anos de reclusão e pagamento de 600 (seiscentos) dias-multa em face da atenuante da confissão, nos termos do artigo 65, inciso III, "d", do Código Penal.
Porém, na terceira fase, mantido o aumento da sanção em 1/6 (um sexto) em face da transnacionalidade do delito, conforme prevê o artigo 40, inciso I, da Lei nº 11.343/06, resultando na pena de 7 (sete) anos de reclusão e pagamento de 700 (setecentos) dias-multa, apliquei a causa de aumento prevista no artigo 40, inciso III, da supracitada lei, em ¼ (um quarto), tendo em vista que o crime foi cometido no interior de transporte público, o que resulta na pena de 8 (oito) anos e 9 (nove) meses de reclusão e pagamento de 875 (oitocentos e setenta e cinco) dias-multa. Finalmente, mantido o patamar de diminuição em 1/6 (um sexto), nos termos do §4º, do artigo 33, da Lei nº 11.343/06, a pena deste delito restou estabelecida em 7 (sete) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 730 (setecentos e trinta) dias-multa.
Tal sanção somada com a decorrente da prática do crime de corrupção de menores, previsto no artigo 244-B, da Lei nº 8.069/90, fixada em 1 (um) ano de reclusão, haja vista a ocorrência de concurso material de delitos, resultou na pena definitiva de 8 (oito) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 730 (setecentos e trinta) dias-multa para cada um dos acusados.
Portanto, a pena definitiva restou em 8 (oito) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 730 (setecentos e trinta) dias-multa para cada um dos acusados e não em 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de reclusão e pagamento de 760 (setecentos e sessenta) dias-multa, conforme constou na minuta de julgamento.
Diante do exposto, suscito a presente questão de ordem, com o fim de que seja retificado o voto por mim prolatado na sessão realizada em 4 de fevereiro de 2013, por ocasião do julgamento das apelações criminais interpostas pelo Ministério Público Federal e pelos réus Cleiton Araújo Rola e Alcione Ramos Machado, apenas para constar que a pena definitiva para cada um dos réus restou fixada em 8 (oito) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 730 (setecentos e trinta) dias-multa.
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RELATÓRIO
Trata-se de apelações criminais interpostas pelo Ministério Público Federal e pelas defesas dos acusados Cleiton Araújo Rola e Alcione Ramos Machado contra a sentença que os condenou a 6 (seis) anos e 10 (dez) meses de reclusão, no regime inicial fechado, e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa, no valor unitário mínimo legal, pela prática dos delitos do art. 33, caput, c. c. o art. 40, I, ambos da Lei n. 11.343/06, e do art. 244-B da Lei n. 8.069/90, na forma dos arts. 29 e 69, ambos do Código Penal, absolvendo-os da imputação relativa ao art. 35, caput, da Lei n. 11.343/06, com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal (fls. 315/330).
Apela o Ministério Público Federal com os seguintes argumentos:
As defesas dos acusados Cleiton Araújo Rola e Alcione Ramos Machado ofereceram contrarrazões (fls. 383/392 e 405/417).
Recorreu Cleiton Araújo Rola com os seguintes argumentos:
Recorreu Alcione Ramos Machado com os seguintes argumentos:
O Ministério Público Federal ofereceu contrarrazões (fls. 419/433).
A Ilustre Procuradora Regional da República, Dra. Maria Iraneide Olinda S. Facchini, manifestou-se pelo desprovimento do recurso de apelação dos acusados e pelo parcial provimento do recurso do Ministério Público Federal (fls. 435/460).
Os autos foram encaminhados à revisão, nos termos regimentais.
É o relatório.
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VOTO
Imputação. Cleiton Araújo Rola e Alcione Ramos Machado foram denunciados pela prática dos delitos dos arts. 33, caput, e 35, ambos c. c. o art. 40, I, III, V e VI, todos da Lei n. 11.343/06, e art. 244-B da Lei n. 8.069/90, pelos seguintes fatos:
Do Processo. Os acusados Cleiton Araújo Rola e Alcione Ramos Machado foram absolvidos da imputação da prática do delito do art. 35 da Lei n. 11.343/06, com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal (fl. 323v.).
Embora a denúncia narre a participação da menor Letícia Ramos Machado, sua identificação correta é Letícia Souza da Silva (fls. 18/20).
Materialidade. A materialidade do delito está comprovada por intermédio dos seguintes documentos:
Foram também colacionados aos autos os Laudos de exame em aparelho de telefonia celular n. 6.024/11 e 6.025/11, com a transcrição dos contatos da agenda telefônica, das mensagens e ligações recebidas e efetuadas, além das imagens armazenadas (fls. 59/76).
Autoria. A autoria delitiva encontra-se satisfatoriamente comprovada.
Em Juízo, a menor Letícia Souza da Silva disse que estava viajando com os acusados Cleiton e Alcione, com destino ao Paraguai. Declarou que aceitou o convite para viajar com eles, a passeio, não sabendo que iriam transportar droga. Adicionou que foi entregue 1 (uma) mala com droga para ela transportar, e que ela tinha consciência do conteúdo trazido. Referiu que a droga lhe foi entregue por paraguaio conhecido dos demais acusados, em rodoviária do Paraguai. Aduziu que os acusados Cleiton e Alcione sabiam que estavam transportando droga e queriam favorecer-se com sua presença, por ser menor de idade. Afirmou que contava com 16 (dezesseis) anos na data dos fatos. Relatou que conheceu os acusados na época em que morava com sua avó, pois eram amigos dos seus primos, não sabendo declinar a profissão que eles exercem. Acrescentou que receberia R$ 5.000,00 (cinco mil reais) para transportar a droga de Pedro Juan Caballero (Paraguai) para Rio Branco (AC). Informou que a droga foi recebida no Hotel Acapulco, em Pedro Juan Caballero (Paraguai). Disse que foi a primeira vez que esteve envolvida com tráfico de entorpecentes (fls. 183/184 e mídia à fl. 185).
Na Polícia, Letícia aduziu que namorava Geovani, que estava cumprindo pena em regime semiaberto, por infração que acreditava estar relacionada à violência doméstica, e que este insistiu que concordasse em transportar entorpecente. Disse que recebeu telefonema de preso, desconhecido, que lhe ofereceu R$ 5.000,00 (cinco mil reais) para buscar maconha no Paraguai. Relatou que recebeu orientações de pessoa conhecida como "Coringa", que informou que os acusados Cleiton e Alcione a acompanhariam na viagem. Esclareceu que Alcione foi contratada por "Coringa" porque namorava detento da mesma unidade prisional, que havia cometido o delito de tráfico de entorpecentes, assim como Cleiton, também contratado por tal pessoa em razão de seu irmão encontrar-se preso na mesma unidade prisional, pela prática de tráfico de drogas. Adicionou que, ao chegarem em Ponta Porã (MS), foram orientados a seguir em táxi para o Hotel Acapulco, no Paraguai, onde ficaram hospedados, com as despesas pagas por paraguaio, identificado como sendo Rodrigo. Afirmou que foi Rodrigo quem lhe entregou 2 (duas) bolsas contendo maconha, colocando-a em táxi, rumo à rodoviária, e que, por medo, retornou ao referido hotel, sendo instruída a aguardar pelos acusados Cleiton e Alcione para realizar a viagem de regresso, os quais estariam na casa de paraguaio para prensar maconha. Referiu que, no momento da abordagem policial realizada no ônibus rodoviário em que viajavam, os acusados Cleiton e Alcione informaram que ela estava "só voltando" (fl. 19), e que policial teria se enganado ao declará-la como responsável pelo transporte de 20 Kg (vinte quilos) de maconha. Negou o transporte de entorpecente. Não soube esclarecer qual vantagem seria revertida em favor de Geovani. Aduziu que recebeu dinheiro para pagamento das despesas com a viagem da mulher de "Coringa", não sabendo precisar se foi ela quem forneceu numerário para os demais pagarem as despesas da viagem (fls. 18/19).
Interrogado em Juízo, o acusado Cleiton Araújo Rola declarou que reside em Rio Branco (AC) com sua mãe, e trabalha em empresa de fabricação de asfalto, auferindo R$ 600,00 (seiscentos reais) mensais. Aduziu que nunca foi preso ou processado anteriormente. Disse que a denúncia é parcialmente verdadeira. Alegou que desconhecia que Letícia era menor de idade na data dos fatos. Narrou que pessoa de presídio do Rio Branco (AC) ofereceu-lhe R$ 3.000,00 (três mil reais) para transportar maconha. Afirmou que realizou viagem com a acusada Alcione e a menor Letícia, as quais conheceu na rodoviária de Rio Branco (AC), não sabendo declinar se foram todos contratados pela mesma pessoa. Relatou que foram instruídos a se hospedar no Hotel Acapulco, no Paraguai. Informou que iriam transportar o total de 80 Kg (oitenta quilos) de maconha. Declarou que encontrou com pessoa brasileira no Paraguai, identificada apenas como "Tadeu", que fornecia informações sobre pagamento. Aduziu que encontrou na rodoviária outra pessoa, desconhecida, responsável pela entrega da droga, acondicionada no interior de 3 (três) malas, para os 3 (três) transportarem. Referiu que cada um iria transportar 1 (mala) e que a menor Letícia não quis transportar a dela, que identificou como sendo sua, ficando ele com 2 (duas) malas, e Alcione com outra. Negou tivesse colaborado na prensa da maconha. Disse que o paraguaio identificado como Rodrigo era o responsável pelo fornecimento de dinheiro para alimentação e para a viagem. Acrescentou que seu irmão também estava preso. Referiu que seu amigo Paulo, que esteve preso, não foi o responsável pela sua contratação. Esclareceu que não sabia que iria deslocar-se até o Paraguai, e que acreditava que a droga seria retirada em Ponta Porã (MS) para entrega em Rio Branco (AC). Informou que o dinheiro apreendido em seu poder lhe pertencia e correspondia a verbas trabalhistas recebidas, e que o celular que portava também lhe pertencia, não sabendo declinar o número. Declarou que não chegou a receber os R$ 3.000,00 ajustados para o transporte da droga e que a pessoa que o contratou e lhe telefonava não informava o nome ou apelido. Não soube declinar a relação da acusada Alcione e da menor Letícia com a pessoa que o contratou, tampouco soube informar o motivo da realização da viagem em 3 (três) pessoas. Declarou que Letícia afirmou que contava com 20 (vinte) anos e que iria receber pagamento pelo transporte da droga e que a acusada Alcione precisou que iria receber R$ 3.000,00 (três mil reais). Relatou que a porção da droga que transportava seria entregue para mulher, desconhecida, na rodoviária de Rio Branco (AC) e que cada um deles iria entregar a droga transportada para o respectivo destinatário. Afirmou que tinha avistado Letícia anteriormente, com quem já tinha conversado 2 (duas) vezes. Referiu que conversava com a pessoa que o contratou com o uso de outro chip de celular, que deixou no assento do ônibus. Adicionou que Letícia não aparentava ser menor de idade e que, embora tenha preenchido o ticket da bagagem dela em seu nome, ela também foi abordada porque trazia consigo bolsa de viagem do acusado, com as roupas dele em seu interior, tendo se autoincriminado no momento da apreensão (fl. 196 e mídia à fl. 197).
Na Polícia, o acusado Cleiton informou que seu vizinho, identificado apenas como Paulo, preso por tráfico de entorpecentes em Rio Branco (AC), avisou-o que um colega dele iria telefonar e que, em seguida, recebeu a proposta do transporte da droga, pelo valor de R$ 3.000,00 (três mil reais). Aduziu que concordou em retirar 80Kg (oitenta quilos) de maconha em Ponta Porã (MS), que seria entregue por taxista. Informou que recebeu dinheiro para pagamento das despesas com a viagem de mulher desconhecida, na rodoviária de Rio Branco (AC). Disse que encontrou a menor Letícia e a acusada Alcione na rodoviária, tendo telefonado para uma delas para marcar o encontro, no número informado pelo amigo de Paulo. Negou hospedagem em hotel na cidade paraguaia de Pedro Juan Caballero. Não soube declinar o nome do hotel em que permaneceu durante a empreitada criminosa. Afirmou que a droga teria sido entregue no Brasil, por brasileiro, em carro paraguaio, e que esteve no Paraguai a passeio, negando o recebimento do entorpecente em território estrangeiro. Adicionou que a menor Letícia Souza da Silva comentou que seu namorado estava preso, não sabendo informar seu nome ou o crime cometido. Disse que não foi o namorado de Letícia, nem Letícia, nem a acusada Alcione quem o contratou para o transporte do entorpecente, desconhecendo a pessoa denominada "Coringa". Acrescentou que reside em bairro distante da residência da menor Letícia e da acusada Alcione (fls. 6/7).
Interrogada em Juízo, a acusada Alcione Ramos Machado declarou que reside com sua mãe em Tancredo Neves (AC) e trabalha como secretária do lar, sendo que estava desempregada na data dos fatos. Disse que tem 3 (três) filhos, que são sustentados por sua mãe. Afirmou que está sendo processada pela prática do delito do art. 121 do Código Penal. Disse que a acusação é verdadeira. Negou tenha se ausentado do hotel para prensar maconha, tarefa executada por Letícia, na companhia do paraguaio Rodrigo. Referiu que foi contratada para o transporte da maconha, por intermédio de amiga, que já atuava no tráfico de entorpecentes. Narrou que, logo que recebeu telefonema de pessoa conhecida dessa sua amiga, foi contratada para realizar viagem, com o objetivo de retirar droga, em local desconhecido, por R$ 3.000,00 (três mil reais). Disse que foi informada que, chegando em Ponta Porã (MS), pessoa iria conduzí-la até hotel. Esclareceu que apenas na rodoviária de Rio Branco (AC) é que soube que seria acompanhada por mais 2 (duas) pessoas. Adicionou que não sabia que Letícia era menor de idade. Alegou que desconhecia o nome da pessoa que telefonava para dar as orientações da viagem, tendo-o apelidado de "Guia". Aduziu que, ao chegarem em Ponta Porã (MS), pegaram táxi e dirigiram-se ao Hotel Acapulco, não sabendo dizer se está localizado no Paraguai. Referiu que 1 (um) homem paraguaio, chamado Rodrigo, comparecia no hotel para o pagamento das despesas dos 3 (três). Disse que, enquanto esteve hospedada no hotel, não saía para passear, apenas dirigia-se ao restaurante e voltava. Aduziu que não conversou com Rodrigo. Não soube declinar o motivo pelo qual esperou por diversos dias a retirada da droga. Acrescentou que, no dia do retorno a Rio Branco (AC), o entorpecente foi entregue no hotel e que solicitou a Rodrigo que providenciasse mais malas para dividir o peso, o que foi efetuado. Informou que recebeu R$ 250,00 (duzentos e cinquenta reais) para a viagem de ida e R$ 450,00 (quatrocentos e cinquenta reais) para a viagem de volta, sendo as despesas de hotel e alimentação pagas por Rodrigo. Esclareceu que se deslocou até a rodoviária, comprou a própria passagem de retorno, colocou as malas no bagageiro do ônibus e, apenas após, o acusado Cleiton e a menor Letícia chegaram ao local. Relatou que Cleiton é que se responsabilizou pela mala que Letícia estava transportando, com a desistência manifestada por ela. Referiu que Letícia foi a primeira a ser abordada, depois Cleiton e, por último, ela, causando suspeita nos policiais o fato de todos residirem em Rio Branco (AC). Disse que não conhece pessoa identificada como "Coringa", sendo que ouviu Letícia falar a respeito dele, ou com ele, em conversa telefônica. Acrescentou que registrou o número do telefone de "Coringa" em seu aparelho celular, confirmando o envio de mensagem para ele quando estava deixando o Hotel Acapulco, no retorno para Rio Branco (AC). Informou que "Guia" e "Coringa" são a mesma pessoa e que os 3 (três) passaram a chamar tal pessoa de "Coringa". Negou tenha namorado preso pela prática do delito de tráfico de entorpecentes. Disse que já foi usuária de drogas. Afirmou que Cleiton e Letícia já se conheciam antes da viagem. Referiu que Letícia não aparentava ser menor de idade e que passava por moça de 18 (dezoito) ou 19 (dezenove) anos (fl. 195 e mídia à fl. 197).
Na Polícia, Alcione disse que localizou envelope com o dinheiro para pagamento das despesas com a viagem sobre lixeira na rodoviária e que tomou conhecimento que o transporte da droga seria realizado em conjunto com outras 2 (duas) pessoas apenas na rodoviária, tendo recebido telefonema do acusado Cleiton para que se encontrassem, e que acreditava que seu número de telefone havia sido informado a Cleiton pelo contratante, pois não o conhecia anteriomente. Referiu que foi Cleiton quem se apresentou para ela e localizou a menor Letícia na rodoviária, para acompanhá-los na viagem. Negou hospedagem no Paraguai. Disse que os 3 (três) se hospedaram em hotel próximo à rodoviária de Ponta Porã (MS). Relatou que a menor Letícia namora indivíduo preso em Rio Branco (AC), conhecido como "Coringa", que confirmou ser a pessoa que a contratou, de quem partiam diversos telefonemas para os 3 (três) para orientações. Disse que o entorpecente foi recebido no Brasil (fls. 12/13).
Na fase inquisitiva, o Policial Militar José Alencar Valério disse que, na abordagem de ônibus da Viação Expresso Queiroz, com itinerário de Ponta Porã (MS) a Campo Grande (MS), no Posto Fiscal Pacuri, foi vistoriado o bagageiro externo, sendo localizadas 2 (duas) bolsas e 2 (duas) malas contendo diversos tabletes de substância com odor e características análogas à maconha. Relatou que foram identificados os proprietários dessas bagagens pelas tarjetas de identificação, os acusados Cleiton e Alcione e a menor Letícia, os quais confirmaram a propriedade das malas. Narrou que os 3 (três) afirmaram que eram naturais do Estado do Acre e que foram contratados para buscar entorpecente em Pedro Juan Caballero, no Paraguai, e transportá-lo até Rio Branco (AC). Alegou que a acusada Alcione disse que não sabia quem a havia contratado, informando que receberia R$ 3.000,00 (três mil reais), enquanto o acusado Cleiton declarou que foi contratado pelo namorado de Letícia, que se encontrava preso em Rio Branco (AC), e que receberia R$ 3.000,00 (três mil reais), o que foi parcialmente confirmado por Letícia, que declarou que foi contratada por preso de Rio Branco (AC), conhecido como "Curinga", que não é seu namorado, e que receberia R$ 5.000,00 (cinco mil reais) pelo transporte da droga. Aduziu que o entorpecente foi apanhado no Paraguai (fl. 3).
Tais declarações foram corroboradas pelo depoimento extrajudicial do Policial Militar Luis Carlos Rebechi (fl. 5).
É inconteste, portanto, que os acusados Cleiton Araújo Rola e Alcione Ramos Machado, com consciência e livre vontade, aderiram ao transporte transnacional de 78Kg (setenta e oito quilos) de maconha, adquirida em Pedro Juan Caballero (Paraguai), para introdução e disseminação em Rio Branco (AC), mediante o pagamento de R$ 3.000,00 (três mil reais) para cada.
Não obstante os acusados Cleiton e Alcione tenham declarado, na Polícia, que não se hospedaram no Paraguai e que teriam recebido o entorpecente em Ponta Porã (MS), tal versão foi modificada em Juízo e confirmada pelos policiais militares e pela menor Letícia, cujos depoimentos foram todos convergentes quanto ao deslocamento e hospedagem dos acusados em Pedro Juan Caballero (Paraguai), para obtenção da maconha, o que demonstra satisfatoriamente a transnacionalidade do delito.
Comprovada a materialidade, a autoria e o dolo, bem como a transnacionalidade do delito, a condenação dos acusados Cleiton Araújo Rola e Alcione Ramos Machado pela prática do delito do art. 33, caput, c. c. o art. 40, I, ambos da Lei n. 11.343/06 deve ser mantida.
Associação para o tráfico de entorpecentes. Pugna o Ministério Público Federal pela condenação dos acusados pela prática do delito do art. 35 da Lei 11.343/06, uma vez evidenciada a existência de vínculo associativo estável e permanente entre eles. Sustenta que a prática do delito do art. 33 da Lei n. 11.343/06 torna ainda mais evidente a presença do vínculo associativo, e que a expressiva quantidade de droga apreendida, a internacionalidade e a interestadualidade do delito são circunstâncias relevantes na aferição da ocorrência do delito de associação para o tráfico de entorpecentes. Pondera que, durante a conduta ilícita, os acusados estiveram em constante contato sobre o transporte da droga. Aduz também que é incriminada a associação voltada à prática reiterada ou não do tráfico de entorpecentes, não importando a reiteração de condutas.
Tal irresignação não merece prosperar.
Não foram produzidas provas robustas da existência de vínculo associativo estável e permanente entre os acusados.
Consta dos autos que Cleiton e Alcione foram arregimentados para a prática do tráfico de entorpecentes separadamente e que eram desconhecidos até o momento do ingresso em ônibus na rodoviária de Rio Branco (AC), com o objetivo comum de retirada da droga.
A teor dos depoimentos judiciais dos acusados, eles supuseram que foram contratados pela mesma pessoa, identificada como "Coringa", no decorrer da empreitada criminosa, sendo que acreditavam que a droga transportada por cada um deles seria entregue a destinatário diferente, quando do retorno a Rio Branco (AC). Tampouco puderam esclarecer se foi a mesma pessoa que lhes entregou dinheiro para o pagamento das despesas com a viagem.
Extrai-se, portanto, a ocorrência de reunião meramente eventual entre os acusados Cleiton e Alcione, ao menos não há elementos de prova que autorizem inferir-se pela existência de ajuste prévio entre eles, pelo que entendo deva ser mantida a absolvição de ambos quanto à prática do delito de associação para o tráfico.
Nesse sentido, manifestou-se a Ilustre Procuradora Regional da República:
Corrupção de menores. Crime formal. Tipicidade. O delito de corrupção de menores é de natureza formal, caracterizando-se ainda que o menor tenha anterior envolvimento em prática delitiva:
Do caso dos autos. A defesa dos acusados Cleiton e Alcione pleiteia a absolvição à prática do delito do art. 244-B da Lei n. 8.069/90, uma vez que não induziram, nem estimularam, de qualquer forma, que a menor Letícia Ramos Machado realizasse as condutas descritas na denúncia. Alega que os acusados desconheciam que Letícia era menor na data dos fatos.
Tal argumentação não merece prosperar.
Não obstante os acusados tenham negado conhecimento sobre a menoridade de Letícia Souza da Silva, ao tempo dos fatos, é certo que o delito de corrupção de menores é formal, sua caracterização independe de prova da efetiva e posterior corrupção do menor, sendo suficiente a comprovação da participação do inimputável em prática delituosa na companhia de imputável.
Além disso, ao não se interessarem sobre a idade exata de Letícia, os acusados assumiram o risco de praticar a conduta, o que configura dolo eventual.
Mantenho, por conseguinte, a condenação dos acusados pela prática do delito do art. 244-B da Lei n. 8.069/90.
Dosimetria. Cleiton Araújo Rola e Alcione Ramos Machado.
Tráfico transnacional de entorpecentes. Considerados os critérios dos arts. 42 da Lei n. 11.343/06 e 59 do Código Penal, o MM. Magistrado a quo fixou as penas-base acima do mínimo legal, em 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 650 (seiscentos e cinquenta) dias-multa.
Sem circunstâncias agravantes.
Reconheceu a incidência da atenuante da confissão, reduzindo as penas para 6 (seis) anos de reclusão e 600 (seiscentos) dias-multa.
Elevou as penas em 1/6 (um sexto), em decorrência da causa de aumento da transnacionalidade do delito, perfazendo 7 (sete) anos de reclusão e 700 (setecentos) dias-multa.
Sem outras causas de aumento, reduziu as penas em 1/6 (um sexto), em razão da causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06, tornando-as definitivas em 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa.
Corrupção de menores. Considerados os critérios do art. 59 do Código Penal, o MM. Magistrado a quo fixou as penas-base no mínimo legal, em 1 (um) ano de reclusão, quantum que tornou definitivo, à míngua de circunstâncias agravantes, atenuantes, causas de aumento, ou de diminuição de pena.
Nos termos do art. 69 do Código Penal, somou as penas aplicadas pelos 2 (dois) delitos, perfazendo 6 (seis) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa.
Arbitrou o valor do dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo do crime, com atualização monetária.
Estabeleceu o regime inicial fechado.
Denegou a substituição da pena privativa por restritivas de direitos, por ausência de requisitos legais.
Manteve a prisão dos acusados, tendo em vista a presença dos elementos autorizadores da prisão preventiva.
Recorre o Ministério Público Federal, objetivando:
Recorre a defesa do acusado Cleiton, objetivando:
Recorre a defesa de Alcione Ramos Machado, objetivando:
O recurso do Ministério Público Federal merece desprovimento e o recurso da defesa, parcial provimento.
Tráfico transnacional de entorpecentes. Nos termos do art. 42 da Lei n. 11.343/06, a natureza (maconha) e a quantidade da droga apreendida na posse do acusado (78Kg) são circunstâncias preponderantes na graduação da pena-base. As demais circunstâncias não são desfavoráveis (Apenso), mas é preciso aquilatar o maior desvalor desta conduta em função da quantidade e qualidade do entorpecente, nesta fase, pois diz com as consequências potenciais do crime, com os motivos, pois demonstra maior ganância do agente que visa ao lucro com sua conduta, circunstâncias essas próprias da graduação da pena-base, nos termos do art. 59 do Código Penal e do citado art. 42 da Lei n. 11.343/06.
No presente caso, o transporte de 78Kg (setenta e oito quilos) de maconha enseja maior aumento da pena-base. Porém, não houve recurso do Ministério Público Federal nesse aspecto, sendo proibida a reformatio in pejus.
Assim, mantenho a pena-base fixada na sentença em 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 650 (seiscentos e cinquenta) dias-multa.
Sem circunstâncias agravantes.
Acertado o reconhecimento da atenuante da confissão, bem como a conservação do quantum fixado, o que resulta as penas de 6 (seis) anos de reclusão e 600 (seiscentos) dias-multa.
Sem outras circunstâncias atenuantes.
Mantenho a incidência da causa de aumento de pena do art. 40, I, da Lei n. 11.343/06, tendo em vista a comprovação nos autos do recebimento do entorpecente pelos acusados na cidade paraguaia de Pedro Juan Caballero para internação em território nacional. Mantenho a proporção de elevação estabelecida na sentença, em 1/6 (um sexto), perfazendo as penas de 7 (sete) anos de reclusão e 700 (setecentos) dias-multa.
Correto o entendimento do MM. Magistrado a quo quanto à não incidência da causa de aumento do art. 40, III, da Lei n. 11.343/06, destinada aos casos em que o ânimo do agente estiver voltado à mercancia do entorpecente no interior do transporte público, bem como quanto à não incidência da causa de aumento do art. 40, V, da mesma Lei, destinada aos casos em que o tráfico é praticado entre Estados da Federação, não àqueles em que o dolo do agente estiver voltado à importação/exportação, ainda que para isso seja necessário ultrapassar fronteiras estaduais.
Sem outras causas de aumento de pena.
Mantenho a incidência da causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06. Os acusados não possuem maus antecedentes, são primários e não foram produzidas provas de que se dedicassem a atividades criminosas ou integrassem organização criminosa voltada ao tráfico de drogas. Contudo, reformo a proporção de diminuição estabelecida na sentença.
Ao tratar da causa de diminuição do § 4º do art. 33, o legislador não se utilizou da mesma técnica e estabeleceu tão somente a possibilidade de graduação entre o mínimo de 1/6 (um sexto) e o máximo de 2/3 (dois terços) de diminuição, verbis:
Fixou requisitos cumulativos que, se preenchidos, dão direito à diminuição, naqueles termos.
No presente caso, não há qualquer prova de envolvimento do acusado com organização criminosa. Não é dado presumir-se em desfavor do direito de liberdade, destarte, entendo deva ficar provado, ainda que por um conjunto indiciário, que a ré pertencia, integrava um grupo voltado para a prática de crimes, com um mínimo de estabilidade, para negar-se a diminuição, o que implica dizer que o julgador deve poder concluir da prova dos autos que houve ação prévia junto ao grupo, não sendo possível presumi-lo do fato isolado do transporte aqui julgado, ainda que isso viesse a trazer um benefício a suposto grupo organizado.
Devida a diminuição, passo ao problema de sua graduação.
Segundo o critério trifásico de aplicação da pena, encampado pelo Código Penal Brasileiro em seu art. 68, verbis:
A quantidade da droga, por sua vez, é critério aferível no momento de se avaliar as circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, dizendo a lei textualmente que:
Refere-se, portanto, claramente às circunstâncias do art. 59, indicando ao intérprete, quais as de maior dentre aquelas ali previstas, portanto, nos termos do art. 68 do Código Penal - dentre aquelas aplicáveis na dosagem da pena base.
O art. 59 do Código Penal diz, por sua vez que:
Portanto, o legislador ao inserir o art. 42 na Lei n. 11.343/06, nada mais fez que ressaltar que a quantidade da droga deveria ser levada em consideração na graduação da pena base, ressaltar, por que a título de conseqüência do crime e de motivos - considerando que quanto mais droga, maior o lucro visado - tais circunstâncias já constavam do rol do art. 59, e mesmo antes da lei poderiam, e deveriam ser avaliadas nesta fase.
Preocupou-se, quiçá, em evitar o costume de fixação de pena mínima mesmo diante da maior reprovabilidade da conduta e nesse passo, vê-se que também a quantidade se relaciona com a culpabilidade, circunstância judicial, a ser avaliada na primeira fase da dosimetria, na forma do art. 68 do Código Penal.
Portanto, dosar a diminuição entre mínimo e máximo levando em consideração quaisquer das circunstâncias judiciais seria evidente bis in idem. Diminuir menos é agravar, tanto assim é que é preciso fundamentar, motivar explicar porque não se defere a diminuição máxima prevista na lei. Se o agente não tiver nada de negativo que possa ser considerado nessa fase, faria jus à máxima diminuição.
Vale aqui me socorrer dos ensinamentos dos renomados professores Ada Pelegrini Grinover, Antonio Scarance Fernandes e Antonio de Magalhães Gomes Filho em sua notória obra "As Nulidades do Processo Penal", Malheiros 2ª ed., pg 163/164:
Note-se que os autores afirmam a impossibilidade de avaliação dupla de circunstância própria de fases distintas, tanto para agravar como para atenuar a pena, e logo de início, nos alertam de que o princípio da individualização da pena decorre do princípio da isonomia.
Portanto, não é demasiado concluir que a preservação do critério trifásico e a vedação ao bis in idem pretende garantir que indivíduos em situação semelhante não venham a ser tratados diferentemente, ou que indivíduos em situação desigual sejam tratados da mesma forma, em função da apreciação subjetiva de circunstâncias por parte do judiciário. O subjetivismo decorrente disso é também evitado por meio do princípio da reserva legal.
Sobre a vedação ao bis in idem na aplicação da pena, colaciono alguma jurisprudência:
O princípio do ne bis in idem decorre também, logicamente do princípio da reserva legal, pois realiza a sua aplicação nas diversas fases da dosimetria da pena, exigindo do julgador que puna mais, ou puna menos, pela circunstância fática prevista previamente em lei, de acordo com a sanção previamente estatuída para aquele fato, o que não ocorrerá se for aplicada a sanção duplamente, pelo mesmo fato.
Sobre o princípio da reserva legal, vale uma incursão nas palavras sempre atuais de Aníbal Bruno:
Nesse sentido ainda, a doutrina de Assis Toledo:
Trouxe essa doutrina para demonstrar que o § 4º do art. 33 da Lei de drogas traz possibilidade de agravamento incerto, a critério do julgador, e só por isso incide em violação ao princípio da reserva legal, pois não traça nenhum critério para a graduação da benesse.
Ainda que se pudesse criar meios de graduação, violando-se o princípio da lei estrita, ao dosá-la utilizando-se das circunstâncias do crime, motivos, quantidade e qualidade da droga, conduta social, internacionalidade, ou outras, já previstas em lei, a decisão incidirá em bis in idem vedado.
Não é possível negar a diminuição da lei a quem faz jus, mas também não é possível aplicar o parágrafo como está sem incidir em bis in idem, concluo.
Nesse sentido, ao tratar da dupla consideração do critério quantidade e qualidade, já se pronunciou o E. Supremo Tribunal Federal, pela existência de bis in idem, confira-se:
Porém, em que pese a Suprema Corte ter declarado que "O magistrado não está obrigado a aplicar a causa de diminuição prevista no § 4° do art. 33 da Lei nº 11.343/06 em seu patamar máximo quando presentes os requisitos para a concessão de tal benefício, tendo plena autonomia para aplicar a redução no 'quantum' reputado adequado de acordo com as peculiaridades do caso concreto" (HC 99.440/SP, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe-090 de 16.05.2011)", resta saber que critério seria esse, que já não tenha sido avaliado, ou que já não devesse ter sido avaliado nas operações anteriores e possa, portanto, ser utilizado pelo juiz nesta fase.
Ora nesse cenário, desde que devida a redução, só será cabível no patamar máximo de 2/3 (dois terços), pois a única consentânea com o princípio da reserva legal e presunção de inocência, que indicam que na dúvida, no impasse, a solução deve ser em favor do direito de liberdade.
Esse foi o meu posicionamento por algum tempo.
Porém, o estou revendo agora, pois é inegável que essa solução também deixa a desejar.
Ocorre que na prática, a solução acaba por provocar um excesso em favor do réu que aniquila o intuito punitivo da norma, e torna a pena aplicável, incompatível com a gravidade da conduta que é tida por hedionda pela Constituição Federal, o que torna a essa solução também contrária ao Direito.
O afastamento da graduação com aplicação em 2/3 (dois terços) da diminuição faz resultar evidentemente desproporcional a pena, e obriga o juiz a praticar excesso em favor do réu, ao solapar, por exemplo, uma grave pena de 6 (seis) anos de reclusão a apenas 2 (dois), muitas vezes, pena inferior à que resulta de muitos crimes de gravidade infinitamente menor que o tráfico.
O legislador quis privilegiar a primariedade, em senso lato, sem dúvida. Porém, não a ponto de tornar impune aquele que pratica a conduta pela primeira vez, sem vínculo com grupo criminoso organizado.
Reconheço que desconsiderar a gravidade da conduta já fixada com a pena-base e nas fases seguintes da dosimetria em nome da primariedade solapando a punição pela redução de 2/3 (dois terços) é de fato praticar o excesso, em favor do réu, o que a lei não poderia fazer, nem pretendeu fazer, pois fixou um redutor variável.
Portanto, a interpretação conforme a Constituição, ao princípio da isonomia que norteia o sistema e aos demais princípios de direito penal, como a individualização da pena e reserva legal deve afastar também o excesso em favor do réu, privilegiando o princípio da proporcionalidade razoável na aplicação da pena, que decorre da equidade e proibição do excesso, que norteia o legislador e o juiz, seja em favor da sociedade, seja em favor do réu.
Note-se que aqui não se trata de criar reprimenda onde não existe lei para punir, com base no excesso em favor do direito de liberdade, não se trata de legislar, criar preceito, mas adequar uma reprimenda existente a limites proporcionais.
No sentido da proibição do excesso no exercício do poder legislativo, já discorremos ao tratar do art. 273 do Código Penal, porém neste caso, apontamos excesso em desfavor do direito de liberdade:
Vê-se do exposto, que nada impede que a doutrina acima se aplique também em favor da sociedade, quando se afirma que as punições devem ser proporcionais e razoáveis.
Na verdade, o Estado é titular do direito de punir, limitado pela lei, porém esse direito se traduz também num dever, o dever de punir as condutas contrárias a ordem vigente. Não se olvida que o Estado Brasileiro se propôs a punir efetivamente o tráfico de drogas, já que consta da lei maior que "XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem."
Portanto, é dever do legislador punir adequadamente o tráfico.
Nesse sentido, Manuel Pedro Pimentel, verbis:
Reconheço, por essas razões, que é preciso realizar o intento da norma, que é efetivamente punir o delinquente, o que não ocorrerá se a pena fracassar em quaisquer de suas funções, repressivas, intimidatórias ou de reinserção social e prevenção, pois a pena deve funcionar como instrumento de prevenção geral e especial, e assim a resposta penal precisa ser adequada ao delito praticado.
Desbordaria os limites da discricionariedade do legislador abrandar de tal maneira o tratamento de um delito hediondo, assim considerado pela Constituição de modo que a pena reste inócua para os fins a que se destina, assim como não poderá agravar de forma evidentemente excessiva a reprimenda de delito de gravidade notadamente inferior.
Portanto, após muito desassossego com esse assunto, pois a solução que encontrei para não incidir em bis in idem, aplicar o redutor sempre em 2/3 (dois terços) nunca me pareceu plenamente satisfatória - ainda que a aplicasse por tratar-se da solução em prol do direito de liberdade, com base na presunção de inocência - reconheço que é preciso coibir excessos também em favor desse direito, sob pena de sacrificar-se a ordem constitucional vigente e os objetivos de pacificação social do Direito.
Na verdade, a falta de técnica do legislador, ao prever diminuição em patamar elástico e sem critérios para o seu estabelecimento, não deve levar o julgador a resultado evidentemente desproporcional em face da conduta já dosada nas fases anteriores e do sistema repressivo como um todo.
Portanto, uma interpretação conforme a Constituição Federal desse inquietante § 4º da Lei n. 11.343/06 DEVE AFASTAR A IMPOSSÍVEL GRADUAÇÃO, EVITANDO-SE O BIS IN IDEM, E POR ISSO ESTIPULAR O REDUTOR EM PATAMAR FIXO, SEMPRE QUE PRESENTES OS REQUISITOS CUMULATIVOS DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO , sob pena de negar-se vigência ao dispositivo, que não é de ser declarado inconstitucional por esse defeito, mas interpretado conforme os princípios constitucionais.
O patamar, pelo exposto, não deve ser o máximo. Entendo que, para atender, dentro da medida do possível a mens legis, procurando situar o julgamento mais proximamente à vontade do legislador (punir o tráfico adequadamente), sem incidir em bis in idem, nem em excesso permissivo, revejo entendimento e passo a fixar a diminuição, quando devida, sempre no patamar fixo correspondente à MÉDIA do intervalo pela lei estabelecido que vem a ser "5/12" (cinco doze avos) (fração média entre 1/6 e 2/3 fixada pelo legislador).
Concluo que, aplicada a diminuição em 5/12 (cinco doze avos), as restam definitivamente fixadas em 4 (quatro) anos e 1 (um) mês de reclusão e 408 (quatrocentos e oito) dias-multa.
Corrupção de menores. Considerados os critérios do art. 59 do Código Penal, mantenho as penas-base fixadas pelo MM. Magistrado a quo no mínimo legal de 1 (um) ano de reclusão, quantum que torno definitivo, à míngua de circunstâncias agravantes, atenuantes, causas de aumento, ou de diminuição de pena.
Nos termos do art. 69 do Código Penal, somo as penas aplicadas pelos 2 (dois) delitos, perfazendo 5 (cinco) anos e 1 (um) mês de reclusão e 408 (quatrocentos e oito) dias-multa.
Mantenho os demais termos da sentença.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso de apelação do Ministério Público Federal e DOU PARCIAL PROVIMENTO aos recursos de apelação dos acusados Cleiton Araújo Rola e Alcione Ramos Machado, reduzidas as penas finais a eles cominadas, pela prática dos delitos do art. 33, caput, c c. o art. 40, I, ambos da Lei n.11.343/06 e do art. 244-B da Lei n. 8.069/90, para 5 (cinco) anos e 1 (um) mês de reclusão e 408 (quatrocentos e oito) dias-multa, mantidos os demais termos da sentença.
É o voto.
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