Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 02/08/2013
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001710-77.2011.4.03.6005/MS
2011.60.05.001710-7/MS
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : CLEITON ARAUJO ROLA reu preso
ADVOGADO : LISSANDRO MIGUEL DE CAMPOS DUARTE e outro
APELANTE : ALCIONE RAMOS MACHADO reu preso
ADVOGADO : RODRIGO FABIAN FERNANDES DE CAMPOS (Int.Pessoal)
APELADO : OS MESMOS
No. ORIG. : 00017107720114036005 1 Vr PONTA PORA/MS

EMENTA

PENAL E PROCESSO PENAL. APELAÇÕES CRIMINAIS. CRIME DE TRÁFICO TRANSNACIONAL DE DROGAS. CRIME DE CORRUPÇÃO DE MENORES. DELITO FORMAL. MATERIALIDADES E AUTORIAS DEMONSTRADAS. CRIME DE ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. INEXISTÊNCIA DE ESTABILIDADE E PERMANÊNCIA. PENAS MAJORADAS. TRÁFICO DE DROGAS COMETIDO EM TRASNPORTE PÚBLICO. NECESSIDADE DE MERA UTILIZAÇÃO. RECURSO DAS DEFESAS IMPROVIDOS. RECURSO DA ACUSAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. A materialidade delitiva do crime de tráfico de drogas realmente é incontroversa, estando demonstrada pelos seguintes documentos: auto de prisão em flagrante, termo de exibição e apreensão, laudos de exame de constatação e laudo de exame toxicológico, os quais revelam que os diversos tabletes encontrados nas malas e bolsas de viagem apreendidas consistiram na substância cannabis sativa linneu, vulgarmente conhecida como maconha.
2. A materialidade do delito de corrupção de menores restou demonstrada, pois o crime de tráfico transnacional de drogas foi cometido juntamente com menor de dezoito anos.
3. Quanto ao crime de associação para o tráfico de drogas, previsto no artigo 35, caput, da Lei nº 11.343/06, os elementos probatórios não são hábeis a indicar estabilidade e permanência da associação entre os réus com o intuito de praticar o delito de tráfico, limitando-se a demonstrar tão somente um mero ajuste ocasional de vontades.
4. Não há dúvidas em relação às autorias delitivas, uma vez que restaram provadas pelo próprio auto de prisão em flagrante, devidamente corroborado pelos depoimentos testemunhais colhidos na fase judicial, os quais não deixam dúvidas a respeito dos acusados estarem transportando de maconha dentro de malas de propriedade dos acusados e encontradas no compartimento de bagagem de ônibus, estando eles acompanhados de pessoa menor de dezoito anos.
5. Os próprios réus confessaram que viajaram até a cidade de Pedro Juan Caballero no Paraguai para adquirir e importar maconha que seria transportada até a cidade de Rio Branco/AC.
6. Os denunciados ao não demonstrarem interesse em saber a exata idade da pessoa que os acompanhava incorreram no dolo eventual, uma vez que sequer perseguiram nas prováveis conseqüências resultantes da conduta de transportar droga na companhia de alguém de idade desconhecida por eles, tendo sido plenamente possível prever a ocorrência do crime corrupção de menor.
7. A própria menor, ouvida em Juízo como informante, afirmou que conhecia os réus desde a época em que morava com sua avó, pois eram amigos de seus primos, tendo ela afirmado que viajou em companhia deles, pois queriam se favorecer de sua presença, já que era menor de idade à época dos fatos.
8. O crime de corrupção de menores é formal, sendo desnecessária a efetiva corrupção ou idoneidade moral anterior do menor, bastando a demonstração de sua participação em crime na companhia de agentes imputáveis.
9. Os dolos nas condutas dos apelantes restaram demonstrados, tendo agido com consciência e vontade de importar droga em território nacional juntamente com menor de 18 (dezoito) anos.
10. Ainda que os réus sejam primários e possuam bons antecedentes, tal fato não induz, necessariamente, à fixação da pena-base no patamar mínimo, pois subsistem ainda circunstâncias legais especiais previstas no artigo 42, da Lei nº 11.343/06 aptas para justificar a fixação da pena acima do mínimo legal como medida suficiente prevenção e repressão do crime, razão pela qual as penas-base dos acusados devem ser mantidas em 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de reclusão e pagamento de 650 (seiscentos e cinqüenta) dias multa.
11. Na segunda fase, corretamente reconhecida a atenuante genérica da confissão espontânea e, inexistindo outras atenuantes e agravantes, as penas dos acusados devem ser reduzidas para 6 (seis) anos de reclusão e pagamento de 600 (seiscentos) dias multa.
12. Na terceira fase, igualmente correta a aplicação da causa de aumento de pena prevista no inciso I, do artigo 40, da Lei de Drogas, no patamar de 1/6 (um sexto), ante a comprovação da transnacionalidade do delito, já que a droga foi adquirida no Paraguai e introduzida em território nacional, o que resulta nas penas de 7 (sete) anos de reclusão e pagamento de 700 (setecentos) dias multa.
13. Não resta caracterizado o tráfico interestadual de drogas, que apenas existiria caso a intenção dos réus fosse a de transportar a droga proveniente do exterior para o território de um ou mais Estados da Federação.
14. Incide ainda a causa especial de aumento de pena prevista no inciso III, do artigo 40, da Lei nº 11.343/06, tendo em vista que, consoante entendimento desta Corte, a mera utilização de transporte público para a circulação da substância entorpecente ilícita já é suficiente para aplicá-la.
15. As reprimendas devem sofrer redução em 1/6 (um sexto) ante o reconhecimento da causa de diminuição do §4º, do artigo 33, da Lei nº 11.343/06, a qual deve considerar a quantidade da droga, elemento decisivo também para o estabelecimento do quantum da redução da pena.
16. As penas restam definitivamente fixadas em 7 (sete) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 730 (setecentos e trinta) dias multa.
17. Quanto ao crime previsto no artigo 244-B, da Lei nº 8.069/90, as penas-base foram fixadas no mínimo legal, em 1 (um) ano de reclusão, a qual devem ser tornadas definitivas, haja vista a inexistência de agravante ou atenuantes e causas de aumento ou diminuição.
18. Em decorrência do concurso material, as penas devem ser somadas, resultando nas sanções de 8 (oito) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 730 (setecentos e trinta) dias multa, cujo valor unitário do dia multa deve ser mantido em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, nos termos da sentença.
19. No tocante à fixação do regime inicial, o Plenário da Suprema Corte, em sessão realizada em 27.06.2012, ao analisar o HC 111.840/ES, de relatoria do Ministro Dias Toffoli, por maioria, declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do § 1º, do artigo 2º, da Lei nº 8.072/90, com a redação dada pela Lei 11.464/2007.
20. O magistrado deve se valer, além do quantum de pena imposta, dos critérios previstos no artigo 59, do Código Penal para determinar o regime inicial de cumprimento da pena, conforme exegese do artigo 33, §3º, do mesmo Codex.
21. Em se tratando de crime de tráfico de drogas, as circunstâncias judiciais para fixação da pena-base incluem ainda a natureza e a quantidade da droga, nos termos do artigo 42, da Lei nº 11.343/2006.
22. O regime inicial fechado para início do cumprimento das penas deve ser mantido em razão da quantidade de droga e de pena.
23. Quanto à substituição das penas privativas de liberdade por restritivas de direitos, o Pretório Excelso declarou, incidentalmente, por ocasião do julgamento do HC 97.256, a inconstitucionalidade de sua vedação descrita nos artigos 33, §4º e 44, da Lei nº 11.343/06, tendo sido suspensa a execução da expressão "vedada a conversão em penas restritivas de direitos" prevista naquele dispositivo legal pela Resolução nº 5/12 do Senado Federal.
24. Para que o acusado faça jus ao benefício, devem ser observados os requisitos do artigo 44, do Código Penal, sendo que o critério objetivo consistente na quantidade da pena não restou preenchido, pois as penas privativas de liberdade superem em muito 4 (quatro) anos, nos termos do inciso I, do artigo 44, do Código Penal, razão pela qual deixo de substituir a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos.
25. Apelações interpostas pelos réus improvidas e apelação interposta pelo Ministério Público Federal parcialmente provida para reconhecer a causa de aumento de pena descrita no artigo 40, inciso III, da Lei nº 11.343/06, no patamar de ¼ (um quarto), resultando na pena individual de 8 (oito) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 730 (setecentos e trinta) dias multa decorrente da prática dos crimes descritos nos artigos 33, caput, c/c artigo 40, incisos I e III, ambos da Lei nº 11.343/06 e 244-B, da Lei nº 8.069/90, mantida, no mais, a r. sentença.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, pelo voto médio, negar provimento à apelação da defesa e dar parcial provimento à apelação do Ministério Público Federal para aplicar a causa de aumento de pena prevista no inciso III, do artigo 40, da Lei nº 11.343/06, no patamar de ¼ (um quarto), fixando as penas em 8 (oito) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 730 (setecentos e trinta) dias multa, nos termos do voto médio do Des. Fed. Antonio Cedenho, vencida a Relatora que negava provimento ao recurso de apelação do Ministério Público Federal e dava parcial provimento aos recursos de apelação dos acusados, reduzidas as penas finais a eles cominadas, pela prática dos delitos do art. 33, caput, c/c art. 40, I, ambos da Lei nº 11.343/06 e do art. 244-B da Lei nº 8.069/90 para 5 (cinco) anos e 1 (um) mês de reclusão e 408 (quatrocentos e oito) dias multa e o Des. Fed. Luiz Stefanini que negava provimento à apelação da defesa e dava parcial à apelação do Ministério Público Federal para fixar para cada um dos réus a pena definitiva de 8 (oito) anos, 9 (nove) meses e 10 (dez) dias de reclusão e 778 (setecentos e setenta e oito) dias-multa, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 01 de julho de 2013.
Antonio Cedenho
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001710-77.2011.4.03.6005/MS
2011.60.05.001710-7/MS
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : CLEITON ARAUJO ROLA reu preso
ADVOGADO : LISSANDRO MIGUEL DE CAMPOS DUARTE e outro
APELANTE : ALCIONE RAMOS MACHADO reu preso
ADVOGADO : RODRIGO FABIAN FERNANDES DE CAMPOS (Int.Pessoal)
APELADO : OS MESMOS
No. ORIG. : 00017107720114036005 1 Vr PONTA PORA/MS

DECLARAÇÃO DE VOTO

Com a devida vênia da eminente relatora, divirjo do voto na dosimetria das penas impostas aos réus, para reconhecer a incidência da causa de aumento do art. 40, inc. III, da Lei nº 11.343/06, quando há o transporte do entorpecente em transporte público, circunstância que reputo objetiva, razão pela qual, na terceira fase da dosimetria da pena, promovo o aumento de 1/3 (um terço) da pena imposta para cada um dos réus; também entendo que a causa de diminuição de pena pela aplicação do art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06 deva ser aplicada no mínimo legal, conforme estabelecido na sentença.

No que diz com o crime em transporte público, cito entendimento do E. STJ, ao qual adiro:


"CRIMINAL. RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE DROGAS. CONTRARIEDADE A DISPOSITIVOS DO CÓDIGO PENAL E DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO DO RECURSO. (...) INFRAÇÃO COMETIDA A BORDO DE TRANSPORTE PÚBLICO . MAJORANTE. REQUISITO DE ORDEM OBJETIVA. (...). III. Este sodalício firmou entendimento de que não há que se perquirir qualquer circunstância subjetiva para incidência do inciso III, do art. 40 da Lei de Drogas - infração cometida em transporte público, bastando simplesmente ter sido o crime praticado nos locais designados no aludido dispositivo, sendo a pena elevada exclusivamente em função do lugar do cometimento da infração". (...) (Resp 1211286, Min. Gilson Dipp, DJE 16/05/2011).


Por outro lado, no que diz com a causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06, entendo que, no presente caso, a porcentagem que mais se coaduna às circunstâncias do delito é o mínimo legal de 1/6, conforme estabelecido na sentença, tendo em vista a grande quantidade e a natureza da droga apreendida com os réus (cerca de trinta quilos de "maconha" com cada um deles).


Diante de tais entendimentos, resta a reprimenda assim fixada:


Pena-base - mantenho os 6 (seis) anos e 6 meses de reclusão e 650 (seiscentos e cinquenta) dias-multa;

Na segunda fase, mantenho a incidência da atenuante de confissão, a perfazer a pena de 6 anos e 600 dias-multa;

Mantenho a incidência de aumento de pena prevista no art. 40, I, da Lei nº 11.343/06, perfazendo as penas de 7 (sete) anos de reclusão e 700 (setecentos) dias-multa;

Ainda nessa fase, divergindo da relatora, entendo que razão assiste ao Ministério Público Federal, no sentido de dever ser aumentada a pena em 1/3 (um terço) em razão do uso de transporte público, a perfazer a pena de 9 (nove) anos e 4 (quatro) meses de reclusão e 933 dias-multa.

Também divergindo da relatora, mantenho a aplicação da causa de diminuição do § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/06 fixada na sentença em 1/6 (um sexto), restando as penas em 7 (sete) anos, 9 meses e 10 dias de reclusão e 778 (setecentos e setenta e oito) dias-multa.

Ante o exposto, mantenho a pena de um ano de reclusão para o crime de corrupção de menores estabelecida no voto e a aplicação do art. 69, do Código Penal, a totalizar para cada um dos réus, a pena definitiva de 08 (oito) anos, 09 (nove) meses e 10 dias de reclusão e 778 dias-multa, restando mantido, no mais, o voto da eminente relatora.

É como voto.


LUIZ STEFANINI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001710-77.2011.4.03.6005/MS
2011.60.05.001710-7/MS
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : CLEITON ARAUJO ROLA reu preso
ADVOGADO : LISSANDRO MIGUEL DE CAMPOS DUARTE e outro
APELANTE : ALCIONE RAMOS MACHADO reu preso
ADVOGADO : RODRIGO FABIAN FERNANDES DE CAMPOS (Int.Pessoal)
APELADO : OS MESMOS
No. ORIG. : 00017107720114036005 1 Vr PONTA PORA/MS

VOTO CONDUTOR

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:


Na sessão realizada em 4 de fevereiro de 2013, as apelações criminais foram submetidas a julgamento pela Ilustre Relatora Juíza Federal Convocada Louise Filgueiras, proferindo voto no sentido de negar provimento ao recurso da acusação e dar parcial provimento aos recursos dos réus para reduzir suas penas individuais definitivas, em razão da prática do crime descrito no artigo 33, caput, c/c artigo 40, inciso I, ambos da Lei nº 11.343/06 em concurso material com o crime previsto no artigo 244-B, da Lei nº 8.069/90, para 5 (cinco) anos e 1(um) mês de reclusão e pagamento de 408 (quatrocentos e oito) dias multa. Em seguida, o Ilustre Desembargador Federal Revisor Luiz Stefanini proferiu voto no sentido de negar provimento às apelações defensivas e dar parcial provimento à apelação da acusação para fixar para cada réu a pena definitiva de 8 (oito) anos, 9 (nove) meses e 10 (dez) dias de reclusão e pagamento de 778 (setecentos e setenta e oito) dias multa. Por fim, proferi voto negando provimento à apelação da defesa e dando parcial provimento à apelação do Parquet para aplicar a causa de aumento de pena prevista no inciso III, do artigo 40, da Lei nº 11.343/06, no patamar de ¼ (um quarto), fixando as sanções de cada um dos acusados definitivamente em 8 (oito) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 730 (setecentos e trinta) dias multa.


Apesar de não ter dúvidas em acompanhar a I. Relatora no sentido de manter a condenação dos réus, pois ao contrário do alegado pela defesa, as provas coligidas pela acusação demonstram de maneira inequívoca que os denunciados cometeram os crimes de tráfico internacional de drogas e corrupção de menores, sendo que aquele, aliás, sequer foi objeto de pedido de absolvição pelas defesas. Contudo, divirjo dos votos da Eminente Relatora e Revisor tão somente no tocante à dosimetria da pena daquele delito.


A materialidade delitiva do crime de tráfico de drogas realmente é incontroversa, estando demonstrada pelos seguintes documentos: auto de prisão em flagrante (fls. 02/19), termo de exibição e apreensão (fls. 26/32), laudos de exame de constatação (fls. 34/38) e laudo de exame toxicológico (fls. 126/129 e 150/153), os quais revelam que os diversos tabletes encontrados nas malas e bolsas de viagem apreendidas consistiram na substância cannabis sativa linneu, vulgarmente conhecida como maconha.


Já a materialidade do delito de corrupção de menores restou demonstrada, pois o crime de tráfico transnacional de drogas foi cometido juntamente com menor de dezoito anos. A adolescente Letícia Souza da Silva, nascida em 19.06.1994 realmente era menor de 18 anos à época dos fatos (16.03.2011), conforme cópia de documento de identidade (fl. 20) e teor de suas declarações prestadas em Juízo (mídia à fl. 185).


Quanto ao crime de associação para o tráfico de drogas, previsto no artigo 35, caput, da Lei nº 11.343/06, os elementos probatórios de fato não são hábeis a indicar estabilidade e permanência da associação entre os réus com o intuito de praticar o delito de tráfico, limitando-se a demonstrar tão somente um mero ajuste ocasional de vontades.


Nesse sentido:

HABEAS CORPUS. TRÁFICO E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. CONDENAÇÃO CONFIRMADA EM GRAU DE APELAÇÃO. VIA INDEVIDAMENTE UTILIZADA EM SUBSTITUIÇÃO A RECURSO ESPECIAL. ILEGALIDADE MANIFESTA VERIFICADA APENAS EM PARTE. NÃO CONHECIMENTO. CONCESSÃO PARCIAL DA ORDEM EX OFFICIO. DOSIMETRIA. EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE E NÃO APLICAÇÃO DA CAUSA ESPECIAL DE DIMINUIÇÃO. VARIEDADE E GRANDE QUANTIDADE DE DROGAS (HAXIXE, MACONHA, COCAÍNA E CRACK). MAIS DE 27 QUILOS NO TOTAL. MANUTENÇÃO DA PENA DO CRIME DE TRÁFICO. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. INEXISTÊNCIA DE ÂNIMO ASSOCIATIVO PERMANENTE. RECONHECIMENTO DISSO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. DIVERGÊNCIA COM O ENTENDIMENTO DESTA CORTE SOBRE O TEMA.
1. Mostra-se inadequado e descabido o manejo de habeas corpus em substituição ao recurso especial cabível.
2. É imperiosa a necessidade de racionalização do writ, a bem de se prestigiar a lógica do sistema recursal, devendo ser observada sua função constitucional, de sanar ilegalidade ou abuso de poder que resulte em coação ou ameaça à liberdade de locomoção.
3. "O habeas corpus é garantia fundamental que não pode ser vulgarizada, sob pena de sua descaracterização como remédio heróico, e seu emprego não pode servir a escamotear o instituto recursal previsto no texto da Constituição" (STF, HC 104.045/RJ).
4. Hipótese em que há, quanto a um fundamento, flagrante ilegalidade a ser reconhecida.
5. Apreendidos mais de 27 quilos de diversas drogas (haxixe, maconha, cocaína e crack), não há falar em alteração da pena-base, em sede de habeas corpus e nem de ilegalidade pela não aplicação da causa especial de diminuição para o tráfico.
6. Reconhecido pelo acórdão atacado que não há ânimo associativo permanente (duradouro), mas apenas esporádico (eventual), a condenação ratificada no Tribunal de origem, quanto ao crime do art. 35 da Lei nº 11.343/2006, é ilegal, ante a atipicidade da conduta.
7. Habeas corpus não conhecido, mas concedida a ordem, ex officio, apenas para cassar a condenação pelo delito de associação para o tráfico.
(HC 139942/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 19/11/2012, DJe 26/11/2012)
HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. ABSOLVIÇÃO. DESCONSTITUIÇÃO DO ÉDITO REPRESSIVO. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO APROFUNDADO DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE NA VIA ESTREITA DO WRIT. CONDENAÇÃO FUNDAMENTADA NO DEPOIMENTO DE POLICIAIS MILITARES. MEIO DE PROVA IDÔNEO. FRAGILIDADE DO CONJUNTO PROBATÓRIO NÃO DEMONSTRADA.
1. Para se desconstituir o édito repressivo quanto ao delito de tráfico ilícito de entorpecentes, como pretendido no writ, seria necessário o exame aprofundado de provas, providência inadmissível na via estreita do habeas corpus, mormente pelo fato de que vigora no processo penal brasileiro o princípio do livre convencimento, em que o julgador pode decidir pela condenação, desde que fundamentadamente.
2. Conforme entendimento desta Corte, o depoimento de policiais responsáveis pela prisão em flagrante do acusado constitui meio de prova idôneo a embasar o édito condenatório, mormente quando corroborado em Juízo, no âmbito do devido processo legal.
ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA ESTABILIDADE OU PERMANÊNCIA PARA SUA CARACTERIZAÇÃO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA.
1. Para a caracterização do crime de associação para o tráfico, é imprescindível o dolo de se associar com estabilidade e permanência, sendo que a reunião ocasional de duas ou mais pessoas não se subsume ao tipo do artigo 35 da Lei n.º 11.343/2006. Doutrina. Precedentes.
2. O Tribunal a quo não aponta qualquer fato concreto apto a caracterizar que a associação entre o paciente, o corréu e os menores inimputáveis para a prática do tráfico de entorpecentes seria permanente.
3. Não havendo qualquer registro, na sentença condenatória ou no aresto objurgado, de que a associação do paciente com o corréu e os menores inimputáveis teria alguma estabilidade ou caráter permanente, inviável a condenação pelo delito de associação para o tráfico, estando-se diante de mero concurso de pessoas.
4. Ordem parcialmente concedida para trancar a Ação Penal n.º 294.01.2007.004725-1 (Controle n.º 414/07) no que diz respeito ao delito de associação para o tráfico quanto ao paciente DANIEL LIBANORI.
(HC 166979/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 02/08/2012, DJe 15/08/2012)

Não há dúvidas em relação às autorias delitivas, conforme bem analisadas pela I. Relatora, uma vez que restaram provadas pelo próprio auto de prisão em flagrante, devidamente corroborado pelos depoimentos testemunhais colhidos na fase judicial, os quais não deixam dúvidas a respeito dos acusados estarem transportando 78 kg (setenta e oito quilos) de maconha dentro das malas de propriedade dos acusados e encontradas no compartimento de bagagem de ônibus, estando eles acompanhados da menor Letícia Souza da Silva


Os próprios réus confessaram que viajaram até a cidade de Pedro Juan Caballero no Paraguai para adquirir e importar maconha que seria transportada até a cidade de Rio Branco/AC.


Aliás, a defesa sequer se insurge quanto à condenação pela prática do crime de tráfico de drogas, requerendo, todavia, a absolvição do crime de corrupção de menores, alegando que os acusados desconheciam o fato de Letícia ser menor de idade.


Conforme bem observado no voto proferido pela I. Relatora, ao não demonstrarem interesse em saber a exata idade de Letícia Souza da Silva, os denunciados incorreram no dolo eventual, uma vez que sequer perseguiram nas prováveis conseqüências resultantes da conduta de transportar droga na companhia de alguém de idade desconhecida por eles, tendo sido plenamente possível prever a ocorrência do crime corrupção de menor.

Ademais, a própria Letícia Souza da Silva, ouvida em Juízo como informante, afirmou que conhecia os réus desde a época em que morava com sua avó, pois eram amigos de seus primos, tendo ela afirmado que viajou em companhia deles, pois queriam se favorecer de sua presença, já que era menor de idade à época dos fatos (mídia à fl. 185).


Em relação ainda a esse crime, cabe destacar que se trata de delito formal, sendo desnecessária a efetiva corrupção ou idoneidade moral anterior do menor, bastando a demonstração de sua participação em crime na companhia de agentes imputáveis:


RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. 1. CORRUPÇÃO DE MENORES. 1. ART. 244-B DA LEI N. 8.069/1990 (ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE). NATUREZA FORMAL. 2. ROUBO COM EMPREGO DE ARMA DE FOGO. JULGADO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA EM CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. DESNECESSIDADE DE APREENSÃO E DE PERÍCIA DA ARMA PARA A COMPROVAÇÃO DA CAUSA DE AUMENTO DA PENA. CIRCUNSTÂNCIA QUE PODE SER EVIDENCIADA POR OUTROS MEIOS DE PROVA. PRECEDENTES. 1. O crime de corrupção de menores é formal, não havendo necessidade de prova efetiva da corrupção ou da idoneidade moral anterior da vítima, bastando indicativos do envolvimento de menor na companhia do agente imputável. Precedentes. 2. A decisão do Superior Tribunal de Justiça está em perfeita consonância com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. 3. São desnecessárias a apreensão e a perícia da arma de fogo empregada no roubo para comprovar a causa de aumento do art. 157, § 2º, inc. I, do Código Penal, pois o seu potencial lesivo pode ser demonstrado por outros meios de prova. Precedentes. 4. Recurso ao qual se nega provimento.(RHC 111434, Relator(a):  Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, julgado em 03/04/2012, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-074 DIVULG 16-04-2012 PUBLIC 17-04-2012)
RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. NATUREZA FORMAL DO DELITO DE CORRUPÇÃO DE MENORES. REDAÇÃO DO ART. 244-B DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. PROTEÇÃO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. FINALIDADE IMEDIATA DA NORMA PENAL. 1. Prevalece nesta Casa de Justiça o entendimento de que o crime em causa é de natureza formal, bastando a prova, portanto, da participação do menor em delito capitaneado por adulto. 2. A tese de que o delito do art. 244-B do Estatuto da Criança e do Adolescente exige prova da efetiva corrupção do menor implica, por via transversa, a aceitação do discurso de que nem todas as crianças e adolescentes merecem (ou podem receber) a proteção da norma penal. Conclusão inadmissível, se se tem em mente que a principal diretriz hermenêutica do cientista e operador do direito é conferir o máximo de eficácia à Constituição, mormente naqueles dispositivos que mais nitidamente revelem a identidade ou os traços fisionômicos dela própria, como é o tema dos direitos e garantias individuais. 3. Recurso ordinário em habeas corpus improvido.(RHC 108970, Relator(a):  Min. AYRES BRITTO, Segunda Turma, julgado em 09/08/2011, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-239 DIVULG 16-12-2011 PUBLIC 19-12-2011)

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PENAL. CORRUPÇÃO DE MENORES. ART. 244-B DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. CRIME FORMAL. PRESCINDIBILIDADE DA CORRUPÇÃO DO MENOR.
1. O STJ, no julgamento do recurso especial representativo de controvérsia n. 1.127.954/DF, consolidou entendimento de que o crime de corrupção de menores, previsto no art. 244-B da Lei n. 8.069/1990, possui natureza formal, não sendo necessária à sua configuração a prova da efetiva e posterior corrupção do adolescente, sendo suficiente a comprovação da participação do inimputável em prática delituosa na companhia de maior de 18 (dezoito) anos.
2. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no REsp 1371942/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 28/05/2013, DJe 11/06/2013)
PENAL. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO. AGRAVANTE QUE DEIXA DE INFIRMAR OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 182 DO STJ. CORRUPÇÃO DE MENORES. CRIME FORMAL.
1. Impõe-se a aplicação analógica da Súmula 182 deste Superior Tribunal de Justiça, tendo em vista que o agravante não infirmou os fundamentos da decisão agravada.
2. Não trazendo o agravante tese jurídica capaz de modificar o posicionamento anteriormente firmado, é de se manter a decisão agravada na íntegra, por seus próprios fundamentos.
3. O crime de corrupção de menores é de natureza formal, bastando a participação do menor para que se verifique a subsunção da conduta do réu imputável ao tipo descrito no art. 244-B da Lei n. 8.069/90.
4. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no AREsp 213.728/DF, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 28/05/2013, DJe 10/06/2013)

Demonstradas as materialidades e respectivas autorias delitivas, não havendo elementos aptos a ilidi-los, restando também evidentes os dolos nas condutas dos apelantes, pois agiram com consciência e vontade de importar droga em território nacional juntamente com menor de 18 (dezoito) anos, a manutenção de suas condenações pela prática dos crimes de tráfico transnacional de drogas e corrupção de menores é medida de rigor.


Passo à análise da dosimetria da pena.


As defesas pleiteiam a redução das penas-base do crime de tráfico de drogas, sustentando para tanto que os réus são primários e possuem bons antecedentes.


Porém, o MM Juiz a quo, na primeira fase de dosimetria da pena, já considerou como favoráveis as circunstâncias judiciais descritas no artigo 59, do Código Penal, tendo fixado as penas-base dos acusados acima do mínimo legal em razão da elevada quantidade de drogas apreendida com eles, a qual era suficiente para atingir muitos usuários caso chegasse a seu destino final, revelando o elevado grau de reprovabilidade dos agentes.


Assim, entendo que a sentença agiu com acerto ao fixar as penas-base dos acusados no patamar eleito, levando-se em consideração a expressiva quantidade da droga, restando atendidos os parâmetros expressamente previstos no artigo 42, da Lei nº 11.343/06, que configura norma especial em relação ao artigo 59, do Código Penal, orientando o magistrado a dar maior importância aos critérios relativos à quantidade e à natureza da droga.


De fato, não pode ser considerada de pequena monta a quantidade de drogas apreendida com os acusados, ainda mais quando comparada às quantidades normalmente portadas pelo criminoso no tráfico urbano de varejo, quando é vendida diretamente aos consumidores pelos pequenos traficantes.


Assim, ainda que os réus sejam primários e possuam bons antecedentes, tal fato não induz, necessariamente, à fixação da pena-base no patamar mínimo, pois subsistem ainda circunstâncias legais especiais previstas no artigo 42, da Lei nº 11.343/06 aptas para justificar a fixação da pena acima do mínimo legal como medida suficiente prevenção e repressão do crime.


Nesse sentido, os seguintes precedentes das Cortes Superiores e deste E. Tribunal:


HABEAS CORPUS. PENAL. TRÁFICO DE DROGAS. CAUSA ESPECIAL DE DIMINUIÇÃO PREVISTA NO § 4º DO ART. 33 DA LEI 11.343/2006. APLICAÇÃO EM GRAU INTERMEDIÁRIO (1/2). FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. OBRIGATORIEDADE DO REGIME INICIAL FECHADO. INCONSTITUCIONALIDADE DO § 1º DO ART. 2º DA LEI 8.072/1990 (REDAÇÃO CONFERIDA PELA LEI 11.464/2007). SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS. IMPOSSIBILIDADE. DECISÃO DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA. ORDEM CONCEDIDA EM PARTE. I - O juiz de primeiro grau, na primeira fase, estabeleceu a pena-base no mínimo legal e deixou para invocar a quantidade de droga apreendida somente na última etapa da dosimetria, aplicando a redução na fração de 1/2. II - Esta Segunda Turma construiu o entendimento de que a natureza e a quantidade da droga apreendida devem ser consideradas na primeira fase da dosimetria, em observância ao que dispõe o art. 42 da Lei 11.343/2006, segundo o qual "o juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a personalidade e a conduta social do agente". III - O Plenário desta Corte, no julgamento do HC 111.840/ES, Rel. Min. Dias Toffoli, declarou a inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei 8.072/1990 (redação dada pela Lei 11.464/2007), que determinava o cumprimento de pena dos crimes hediondos, de tortura, de tráfico ilícito de entorpecentes e de terrorismo no regime inicial fechado. IV - A vedação da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos foi devidamente fundamentada no caso concreto, em especial pela quantidade de entorpecente apreendido. Precedentes. V - Ordem concedida, em parte, para determinar ao juízo de primeiro grau que proceda a nova individualização da pena, respeitadas as diretrizes firmadas por esta Turma, ou seja, considerando a natureza e a quantidade do entorpecente apreendido em poder da paciente na primeira fase da individualização da reprimenda, bem como a quantidade de pena já fixada na sentença, sob pena de reformatio in pejus. O magistrado deverá, ainda, fixar, motivadamente, o regime inicial de cumprimento da pena afastando a regra do § 1º do art. 2º da Lei 8.072/1990, declarado inconstitucional pelo Plenário desta Corte.(HC 114413, Relator(a):  Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 07/05/2013, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-095 DIVULG 20-05-2013 PUBLIC 21-05-2013)
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PENAL TRÁFICO INTERNACIONAL DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. DECISÃO MONOCRÁTICA. POSSIBILIDADE.
AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE. MAJORAÇÃO DA PENA-BASE E FIXAÇÃO DA CAUSA ESPECIAL DE DIMINUIÇÃO DA PENA PREVISTA NO ART. 33, § 4.º, DA LEI 11.343/06. NATUREZA E QUANTIDADE DA DROGA APREENDIDA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. ART. 42 DA LEI DE DROGAS.
TRANSNACIONALIDADE. BIS IN IDEM EM RELAÇÃO AO TIPO PENAL DO TRÁFICO.
INOCORRÊNCIA. REGIME PRISIONAL. GRANDE QUANTIDADE DE COCAÍNA APREENDIDA. PENA-BASE FIXADA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. REGIME FECHADO QUE SE MOSTRA O MAIS ADEQUADO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
1. De acordo com o art. 557, § 1.º-A, do Código de Processo Civil, c.c. o art. 3.º do Código de Processo Penal, é possível ao Relator dar provimento ao recurso, com fundamento na jurisprudência dominante, de forma monocrática, não ofendendo, assim, o princípio da colegialidade.
2. O critério do art. 42 da Lei n.º 11.343/06, por certo, deve ser usado tanto para a fixação da pena-base quanto para aplicar a causa de diminuição de pena prevista no § 4.º do art. 33 da Lei de Drogas de modo adequado. Não se trata de violação ao princípio do ne bis in idem, mas apenas da utilização da mesma regra em finalidades e momentos distintos.
3. Os verbos "importar e exportar" inseridos no tipo significam, respectivamente, "trazer de fora" e "remeter para fora" (c.f.
Dicionário Houaiss) podendo indicar, por exemplo, o transporte de algo de um Estado ou Município para outro Estado ou Município dentro de um mesmo país. Já a causa de aumento referente à transnacionalidade do delito nada mais é que a forma "qualificada" do delito, o que implica em um agravamento da reprimenda a ser imposta ao Acusado.
4. In casu, a Ré foi presa em flagrante com 7.710,2g de cocaína, sendo que a pena-base foi fixada em patamar acima do mínimo legal.
Hipótese em a gravidade concreta do delito evidencia que o regime inicialmente fechado é o mais adequado.
5. Decisão que se mantém por seus próprios fundamentos.
6. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no REsp 1340676/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 18/06/2013, DJe 01/07/2013)
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PENAL E PROCESSO PENAL.
TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES. AFRONTA AO ART. 65, III, DO CP. DOSIMETRIA. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. MINORANTE DO ART. 33, § 4º, DA LEI N. 11.343/06. REEXAME FÁTICO E PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE.
1. O exame da insurgência, pautada na verificação das circunstâncias judiciais e análise da fixação da adequada pena base, demanda a incursão no conjunto probatório dos autos, medida vedada em sede de recurso especial.
2. Inexiste ilegalidade na fixação das reprimendas acima do mínimo legal, por se tratar de tráfico internacional de drogas em que foram apreendidos 2.382,8 g (dois mil, trezentos e oitenta e dois gramas, e oito decigramas) de cocaína, e as instâncias ordinárias consideraram desfavoráveis as circunstâncias do crime, em razão da natureza e da quantidade de droga.
3. O Superior Tribunal de Justiça tem entendido que para os delitos de tráfico de entorpecentes, considera-se adequada a majoração da pena-base acima do mínimo legal com base na quantidade de droga apreendida.
4. É inaplicável ao caso a minorante do art. 33, § 4º, da Lei n.
11.343/06, pois as instâncias ordinárias concluíram que as recorrentes se dedicam à organização criminosa. Concluir em sentido diverso demandaria revolvimento do acervo fático-probatório, providência descabida nesta Instância especial.
5. Verificando-se que as agravantes não trouxeram tese jurídica capaz de modificar o posicionamento anteriormente firmado, é de se manter na íntegra, por seus próprios fundamentos, a decisão agravada.
6. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no REsp 1162107/SP, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 11/06/2013, DJe 21/06/2013)
PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES. TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES. REGIME INICIAL SEMIABERTO. IMPOSSIBILIDADE. EXPRESSIVA QUANTIDADE DE DROGA. SAÚDE E VIDA HUMANA AMEÇADOS. EMBARGOS IMPROVIDOS
1. É cediço que no momento da fixação do regime inicial de cumprimento da pena deve o magistrado sopesar todas as circunstâncias judiciais, à luz dos artigos 33, § 3º e 59, ambos do Código Penal, e, no caso do crime de tráfico de drogas, a tais circunstâncias somam-se também, com preponderância, aquelas previstas no artigo 42 da Lei nº 11.343/2006 - quantidade e natureza da substância entorpecente objeto do tráfico.
2. No caso dos autos, trata-se de 3.135g (três mil , cento e trinta e cinco gramas) de cocaína, quantidade expressiva de droga (cocaína) com potencial de causar consequências gravíssimas a relevante número de pessoas e de famílias, de maneira que, ainda que primário o réu e com bons antecedentes, não poderia ser outro o regime inicial de cumprimento de pena senão o fechado, único compatível com a prática de crimes extremamente gravosos à sociedade, e que possibilita sejam cumpridos os escopos preventivo, repressivo e ressocializador da pena privativa de liberdade.
3. Embargos desprovidos.
(TRF 3ª Região, PRIMEIRA SEÇÃO, EIFNU 0005758-28.2011.4.03.6119, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ STEFANINI, julgado em 18/04/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:29/04/2013)

Portanto, as penas-base dos acusados devem ser mantidas em 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de reclusão e pagamento de 650 (seiscentos e cinqüenta) dias multa.


Na segunda fase, corretamente reconhecida a atenuante genérica da confissão espontânea e, inexistindo outras atenuantes e agravantes, as penas dos acusados foram devidamente reduzidas para 6 (seis) anos de reclusão e pagamento de 600 (seiscentos) dias multa.


Na terceira fase, igualmente correta a aplicação da causa de aumento de pena prevista no inciso I, do artigo 40, da Lei de Drogas, no patamar de 1/6 (um sexto), ante a comprovação da transnacionalidade do delito, já que a droga foi adquirida no Paraguai e introduzida em território nacional, o que resulta nas penas de 7 (sete) anos de reclusão e pagamento de 700 (setecentos) dias multa.


Contudo, não deve ser aplicada a causa especial de aumento de pena referente ao tráfico entre os Estados da Federação, prevista no inciso V, do artigo 40, da lei nº 11.343/06.


Entendo não estar caracterizado o tráfico interestadual de drogas, que apenas existiria caso a intenção dos réus fosse a de transportar a droga proveniente do exterior para o território de um ou mais Estados da Federação.


No caso, as provas dos autos demonstraram que o crime se iniciou no Paraguai, onde a droga foi adquirida, e que o objetivo dos réus não era interná-la no Estado de Mato Grosso do Sul, mas sim na cidade de Rio Branco/AC, de forma que apenas transitou pelo Estado do Mato Grosso do Sul, não havendo nos autos nenhum elemento comprovando que seu propósito fosse o de adentrar a esse Estado para ali disseminar o entorpecente.


Assim sendo, o trajeto percorrido pelo réu no curso da ação não é suficiente para caracterizar a causa de aumento derivada da interestadualidade do tráfico, já que a passagem pelo Estado do Mato Grosso do Sul foi apenas uma etapa do tráfico transnacional.


A propósito, confira-se:


PENAL - PROCESSUAL PENAL - TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES - ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO - LEI 11.343/2006 - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL - AUTORIA E MATERIALIDADE DO DELITO AMPLAMENTE COMPROVADAS - DOLO DEMONSTRADO - INTERNACIONALIDADE DEMONSTRADA - CONFISSÃO - INAPLICABILIDADE DA ATENUANTE - CIRCUNSTANCIAS DESFAVORÁVEIS - PENA BASE MAJORADA - ARTIGO 46, LEI 11.343/06 - PATAMAR MANTIDO - ARTIGO 40, INCISOS III, V E VII - INAPLICABILIDADE - RECURSOS DAS DEFESAS PARCIALMENTE PROVIDOS - RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PARCIALMENTE PROVIDO.
(...)
11. A causa de aumento referente à interestadualidade do delito só é aplicável quando a droga tenha origem em um Estado da Federação, e haja o intento último do agente de transportá-la para o território de um ou mais Estados diferentes, não incidindo a majorante quando o intuito é importá-la, ainda que, para tanto, seja necessário adentrar nos territórios de distintas unidades da Federação, até a chegada ao ponto de destino, como é a hipótese dos autos.
(...)"
(TRF 3, ACR 200860040001426, Relator(a) JUIZA RAMZA TARTUCE , QUINTA TURMA, DJF3 CJ1 DATA:13/12/2010 PÁGINA: 67).
PENAL. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO DE DROGA. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. TRÁFICO INTERESTADUAL. AFASTADO O INCISO V DO ART. 40 DA LEI N. 11.343/06.
(...)
2. Para caracterizar o tráfico entre Estados da Federação ou entre estes e o Distrito Federal (Lei n. 11.343/06, art. 40, V), é necessário que o delito se realize nesse espaço geográfico, isto é, que o ânimo do agente consista em internar em um Estado da Federação o entorpecente que se encontrava em outro. Mas se o dolo do agente é voltado para a exportação, ainda que para isso seja necessário ultrapassar fronteiras estaduais, não incide a causa de aumento.
3. . Apelação parcialmente provida."
(TRF 3 ACR 200760040010356, rel. Andre Nekatschalow, 5ª T, DJF 3 25.11.08, pg.1446)
PENAL - PROCESSO PENAL - RECURSO DE APELAÇÃO DA DEFESA - TRÁFICO INTERNACIONAL E INTERESTADUAL DE ENTORPECENTES E TRÁFICO INTERNACIONAL DE MUNIÇÃO - INDEFERIMENTO DE EXAME TOXICOLÓGICO - NULIDADE DO PROCESSO - INOCORRÊNCIA - DECISÃO FUNDAMENTADA - TRÁFICO INTERESTADUAL DE DROGAS - NÃO CARACTERIZAÇÃO - ART. 18, DA LEI 10.826/03 - DOLO GENÉRICO - QUANTIDADE E QUALIDADE DO ENTORPECENTE - CONFIGURAÇÃO DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS - PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO.
(...)
- A conduta de adquirir droga no exterior e transportá-la para apenas uma cidade brasileira, ainda que para tal seja necessário, por questões geográficas, passar por diversos Estados da Federação, sem que haja intenção do agente em internalizar a droga em mais de um Estado, configura o tráfico internacional, mas não o tráfico interestadual de entorpecentes.
(...)"
TRF 2, ACR 200750020013622, Rel. Maria Helena Cisne, 1ª T. Esp. DJU 27.7.08, pg. 124)

Ainda nesta fase, incide a causa especial de aumento de pena prevista no inciso III, do artigo 40, da Lei nº 11.343/06, tendo em vista que, consoante entendimento desta Corte, a mera utilização de transporte público para a circulação da substância entorpecente ilícita já é suficiente para aplicá-la.


Isso porque torna mais grave o perigo gerado pela conduta do agente e eleva a potencialidade lesiva do crime não apenas por ser cometido em local mais suscetível para a propagação do tóxico, mas também pela lesão a outros setores da segurança pública, no caso o serviço de transporte público, que apenas poderá ser prestado satisfatoriamente quando conduzir o usuário com segurança e no tempo previamente preestabelecido de um ponto para outro, além de dificultar a identificação dos responsáveis pela infração penal, em razão do aglomerado de pessoas, fato que prejudica também a fiscalização da polícia e a repressão do crime.


Nesse sentido:


AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE DROGAS EM TRANSPORTE COLETIVO. ART. 40, III, DA LEI N. 11.343/2006. CAUSA DE AUMENTO. INCIDÊNCIA.
1. O Superior Tribunal de Justiça firmou a compreensão de que a mera utilização do transporte público como meio para realizar o tráfico de entorpecentes é suficiente à incidência da causa de aumento pertinente, que também se destinaria à repressão da conduta de quem se vale da maior dificuldade da fiscalização em tais circunstâncias para melhor conduzir a substância ilícita.
2. A aplicação do art. 40, III, da Lei n. 11.343/06, portanto, não se limita às hipóteses em que o agente oferece o entorpecente às pessoas que estejam se utilizando do transporte público.
3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no REsp 1333564/PR, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 16/05/2013, DJe 23/05/2013)
HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. DESCABIMENTO. TRÁFICO ILÍCITO DE SUBSTÂNCIAS ENTORPECENTES. TRANSPORTE DE DROGAS EM ÔNIBUS PÚBLICO. CARACTERIZAÇÃO DA MAJORANTE DO ARTIGO 40, III, DA LEI DE DROGAS. CAUSA ESPECIAL DE DIMINUIÇÃO DE PENA (§ 4º DO ART. 33 DA LEI N. 11.343/2006) APLICADA EM PATAMAR DIVERSO DO MÁXIMO. REGIME INICIAL FECHADO. INVIABILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS. GRANDE QUANTIDADE DE DROGA.
FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. INEXISTÊNCIA DE ILEGALIDADE. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.
- Este Superior Tribunal de Justiça, na esteira do entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, tem amoldado o cabimento do remédio heróico, adotando orientação no sentido de não mais admitir habeas corpus substitutivo de recurso ordinário/especial. Contudo, a luz dos princípios constitucionais, sobretudo o do devido processo legal e da ampla defesa, tem-se analisado as questões suscitadas na exordial a fim de se verificar a existência de constrangimento ilegal para, se for o caso, deferir-se a ordem de ofício.
- Tendo sido encontrado no interior do bagageiro de ônibus coletivo uma mala contendo substâncias entorpecentes, não há se falar na exclusão da majorante do inciso III do art. 40 da Lei de Drogas, pois a simples utilização de transporte público para a circulação da substância entorpecente já é suficiente para sua aplicação.
Precedentes.
- Tendo em vista o disposto no art. 42 da Lei 11.343/2006, não há ilegalidade em decisão que aplica a causa de diminuição de pena do § 4º do art. 33 dessa Lei em patamar diverso do máximo, em razão da variedade e expressiva quantidade de droga apreendida em poder do paciente - 8,3kg (oito quilos e trezentos gramas). Precedentes.
- O Supremo Tribunal Federal, em 27.6.2012, por ocasião do julgamento do HC 111.840/ES, declarou a inconstitucionalidade da obrigatoriedade do regime inicial fechado para os condenados por crimes hediondos e os a ele equiparados. Assim, a identificação do regime inicial mais adequado à repressão e prevenção dos delitos deve observar os critérios do art. 33, §§ 2º e 3º do Código Penal, bem como do art. 42 da Lei 11.343/2006, quando se tratar de delitos previstos nessa Lei.
- No caso, apesar de a pena ter sido fixada em 3 (três) anos, 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão de reclusão, a gravidade concreta do delito, evidenciada pelas circunstâncias em que ocorreu, justificam a imposição do regime inicial fechado, bem como a não substituição da pena por restritiva de direitos, nos termos do art.
44, inciso III, do Código Penal.
Habeas corpus não conhecido.
(HC 249.597/PR, Rel. Ministra MARILZA MAYNARD (DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/SE), QUINTA TURMA, julgado em 11/04/2013, DJe 19/04/2013)

PENAL. TRÁFICO TRANSNACIONAL DE DROGAS. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. CIRCUNSTÂNCIAS ATENUANTE E AGRAVANTE. CONFISSÃO. REINCIDÊNCIA. TRÁFICO. INTERESTADUALIDADE. TRANSPORTES PÚBLICOS. INTERESTADUALIDADE AFASTADA. RECURSOS PARCIALMENTE DESPROVIDOS.
1. O art. 67 do Código Penal estabelece que, no concurso de agravantes e atenuantes, a pena deve aproximar-se do limite indicado pelas circunstâncias preponderantes, entendendo como tais, entre outras hipóteses, a reincidência. Sendo assim, esta prepondera sobre aquela (STF, HC n. 71094-SP Rel. Min. Francisco Rezek, unânime, DJ 04.08.95; STJ, 5ª Turma, REsp n. 960066-DF, Rel. Min. Felix Fischer, unânime, j. 18.12.07, DJ 14.04.08; STJ, 5ª Turma, HC n. 64012-RJ, Rel. Min. Laurita Vaz, unânime, j. 03.04.07, DJ 07.05.07).
2. Para caracterizar o tráfico entre Estados da Federação ou entre estes e o Distrito Federal (Lei n. 11.343/06, art. 40, V), é necessário que o delito se realize nesse espaço geográfico, isto é, que o ânimo do agente consista em internar em um Estado da Federação o entorpecente que se encontrava em outro. Mas se o dolo do agente é voltado para a exportação, ainda que para isso seja necessário ultrapassar fronteiras estaduais, não incide a causa de aumento (ACR n. 2007.60.05.000020-7, Rel. Des. Fed. Peixoto Júnior, unânime, j. 13.10.08).
3. Ressalvado meu entendimento pessoal no sentido de que para a incidência da causa de aumento relativa a transportes públicos (Lei n. 11.343/06, art. 40, III) é relevante o ânimo do agente, passando a acompanhar a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual a simples utilização de transporte público para a circulação da substância entorpecente enseja a majoração da pena, pois se trata de majorante objetiva (STF, 2ª Turma, HC n. 108523, Rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 14.02.12; 1ª Turma, HC n. 109411, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 11.10.11).
4. Apelações da defesa parcialmente providas. Apelação do Ministério Público Federal provida.
(TRF 3ª Região, QUINTA TURMA, ACR 0002340-07.2009.4.03.6005, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRÉ NEKATSCHALOW, julgado em 01/04/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/04/2013)

Sendo assim, as penas devem ser aumentas em ¼ (um quatro), resultando nas penas de 8 (oito) anos e 9 (nove) meses de reclusão e pagamento de 875 (oitocentos e setenta e cinco) dias multa.


Em seguida, as reprimendas devem sofrer redução em 1/6 (um sexto) ante o reconhecimento da causa de diminuição do §4º, do artigo 33, da Lei nº 11.343/06.


Nesse aspecto, ressalvo meu entendimento, assim como o de parte dos integrantes desta Turma, no sentido de que não deve ser aplicada às pessoas que transportam grandes quantidades de drogas, ainda que eventualmente.


No entanto, à míngua de recurso da acusação nesse sentido, entendo que agiu com acerto o MM Juiz sentenciante ao aplicar o benefício no patamar mínimo de 1/6 (um sexto), pois o patamar máximo deve ser reservado aos casos de tráfico eventual para usuários de pequenas quantidades de droga em que também forem totalmente favoráveis as circunstâncias judiciais do artigo 59, do Código Penal.


Isso porque o parâmetro para a graduação da redução deve ser extraído da razão que motivou a edição da lei e da causa de diminuição, ou seja, o recrudescimento do tratamento do tráfico em geral, aliado às disposições contidas nos artigos 42, da Lei nº 11.343/06 e 59, do Código Penal.


Deve-se considerar a quantidade da droga, elemento decisivo também para o estabelecimento do quantum da redução da pena, nos casos em que for aplicado o artigo 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006.


Assim, na hipótese dos autos, não caberia a redução no patamar máximo, tendo em vista que os acusados adquiriram grande quantidade de droga, que seria pulverizada entre vários vendedores no mercado de consumo, conduta esta que, se bem sucedida, possibilitaria o abastecimento de diversos pontos de venda de tóxicos distintos, sendo potencialmente mais gravosa que o mero abastecimento no mercado interno.


Portanto, concluo que foi razoável e suficiente, em termos de repressão e prevenção penal, a aplicação da causa de redução de pena prevista no §4º, do artigo 33, da Lei de Drogas no patamar de 1/6 (um sexto), razão pela qual as penas restam definitivamente fixadas em 7 (sete) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 730 (setecentos e trinta) dias multa.


Quanto ao crime previsto no artigo 244-B, da Lei nº 8.069/90, as penas-base foram fixadas no mínimo legal, em 1 (um) ano de reclusão, a qual devem ser tornadas definitivas, haja vista a inexistência de agravante ou atenuantes e causas de aumento ou diminuição.


Em decorrência do concurso material, as penas devem ser somadas, resultando nas sanções de 8 (oito) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 730 (setecentos e trinta) dias multa, cujo valor unitário do dia multa deve ser mantido em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, nos termos da sentença.


No tocante à fixação do regime inicial, o Plenário da Suprema Corte, em sessão realizada em 27.06.2012, ao analisar o HC 111.840/ES, de relatoria do Ministro Dias Toffoli, por maioria, declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do § 1º, do artigo 2º, da Lei nº 8.072/90, com a redação dada pela Lei 11.464/2007:


"Habeas corpus. Penal. Tráfico de entorpecentes. Crime praticado durante a vigência da Lei nº 11.464/07. Pena inferior a 8 anos de reclusão. Obrigatoriedade de imposição do regime inicial fechado.
Declaração incidental de inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei nº 8.072/90. Ofensa à garantia constitucional da individualização da pena (inciso XLVI do art. 5º da CF/88). Fundamentação necessária (CP, art. 33, § 3º, c/c o art. 59). Possibilidade de fixação, no caso em exame, do regime semiaberto para o início de cumprimento da pena privativa de liberdade. Ordem concedida.
1. Verifica-se que o delito foi praticado em 10/10/09, já na vigência da Lei nº 11.464/07, a qual instituiu a obrigatoriedade da imposição do regime inicialmente fechado aos crimes hediondos e assemelhados.
2. Se a Constituição Federal menciona que a lei regulará a individualização da pena, é natural que ela exista. Do mesmo modo, os critérios para a fixação do regime prisional inicial devem-se harmonizar com as garantias constitucionais, sendo necessário exigir-se sempre a fundamentação do regime imposto, ainda que se trate de crime hediondo ou equiparado.
3. Na situação em análise, em que o paciente, condenado a cumprir pena de seis (6) anos de reclusão, ostenta circunstâncias subjetivas favoráveis, o regime prisional, à luz do art. 33, § 2º, alínea b, deve ser o semiaberto.
4. Tais circunstâncias não elidem a possibilidade de o magistrado, em eventual apreciação das condições subjetivas desfavoráveis, vir a estabelecer regime prisional mais severo, desde que o faça em razão de elementos concretos e individualizados, aptos a demonstrar a necessidade de maior rigor da medida privativa de liberdade do indivíduo, nos termos do § 3º do art. 33, c/c o art. 59, do Código Penal.
5. Ordem concedida tão somente para remover o óbice constante do § 1º do art. 2º da Lei nº 8.072/90, com a redação dada pela Lei nº 11.464/07, o qual determina que "[a] pena por crime previsto neste artigo será cumprida inicialmente em regime fechado". Declaração incidental de inconstitucionalidade, com efeito ex nunc, da obrigatoriedade de fixação do regime fechado para início do cumprimento de pena decorrente da condenação por crime hediondo ou equiparado."

Desse modo, restou superada a obrigatoriedade de início do cumprimento de pena no regime fechado aos condenados por crimes hediondos ou equiparados.


Assim, o magistrado deve se valer, além do quantum de pena imposta, dos critérios previstos no artigo 59, do Código Penal para determinar o regime inicial de cumprimento da pena, conforme exegese do artigo 33, §3º, do mesmo Codex.


Em se tratando de crime de tráfico de drogas, as circunstâncias judiciais para fixação da pena-base incluem ainda a natureza e a quantidade da droga, nos termos do artigo 42, da Lei nº 11.343/2006.


Portanto, considerando a quantidade da droga transportada pelos acusados e a quantidade da pena superior a 8 (oito) anos de reclusão, mantenho o regime inicial fechado para início do cumprimento das penas, nos termos do artigo 33, §2º, "a", do Código Penal.


Quanto à substituição das penas privativas de liberdade por restritivas de direitos, o Pretório Excelso declarou, incidentalmente, por ocasião do julgamento do HC 97.256, a inconstitucionalidade de sua vedação prevista nos artigos 33, §4º e 44, da Lei nº 11.343/06, tendo sido suspensa a execução da expressão "vedada a conversão em penas restritivas de direitos" prevista naquele dispositivo legal pela Resolução nº 5/12, do Senado Federal.


Assim, para que o acusado faça jus ao benefício, devem ser observados os requisitos do artigo 44, do Código Penal, sendo que o critério objetivo consistente na quantidade da pena não restou preenchido, pois as penas privativas de liberdade superaram 4 (quatro) anos de reclusão, nos termos do inciso I, do artigo 44, do Código Penal.


Por esses motivos, deixo de substituir a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos.


Diante do exposto, nego provimento às apelações interpostas pelos réus Cleiton Araújo Rola e Alcione Ramos Machado e dou parcial provimento à apelação interposta pelo Ministério Público Federal para reconhecer a causa de aumento de pena descrita no artigo 40, inciso III, da Lei nº 11.343/06, no patamar de ¼ (um quarto), resultando na pena individual de 8 (oito) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 730 (setecentos e trinta) dias multa decorrente da prática dos crimes descritos nos artigos 33, caput, c/c artigo 40, incisos I e III, ambos da Lei nº 11.343/06 e 244-B, da Lei nº 8.069/90, mantida, no mais, a r. sentença.


É o voto.


Antonio Cedenho
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001710-77.2011.4.03.6005/MS
2011.60.05.001710-7/MS
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : CLEITON ARAUJO ROLA reu preso
ADVOGADO : LISSANDRO MIGUEL DE CAMPOS DUARTE e outro
APELANTE : ALCIONE RAMOS MACHADO reu preso
ADVOGADO : RODRIGO FABIAN FERNANDES DE CAMPOS (Int.Pessoal)
APELADO : OS MESMOS
No. ORIG. : 00017107720114036005 1 Vr PONTA PORA/MS

QUESTÃO DE ORDEM

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:


Submeto à apreciação desta C. Quinta Turma a presente questão de ordem, que suscito ex officio.


Na sessão realizada em 4 de fevereiro de 2013, as apelações criminais foram submetidas à julgamento pela Ilustre Relatora Juíza Federal Convocada Louise Filgueiras, que proferiu voto no sentido de negar provimento ao recurso da acusação e dar parcial provimento aos recursos dos réus para reduzir suas penas individuais definitivas, em razão da prática do crime descrito no artigo 33, caput, c/c artigo 40, inciso I, ambos da Lei nº 11.343/06 em concurso material com o crime previsto no artigo 244-B, da Lei nº 8.069/90, para 5 (cinco) anos e 1(um) mês de reclusão e pagamento de 408 (quatrocentos e oito) dias-multa. Em seguida, o Ilustre Revisor Desembargador Federal Luiz Stefanini proferiu voto no sentido de negar provimento às apelações defensivas e dar parcial provimento à apelação da acusação para fixar para cada réu a pena definitiva de 8 (oito) anos, 9 (nove) meses e 10 (dez) dias de reclusão e pagamento de 778 (setecentos e setenta e oito) dias-multa. Por fim, proferi voto médio em razão de ter negado provimento à apelação da defesa e ter dado parcial provimento à apelação do Parquet para aplicar a causa de aumento de pena prevista no inciso III, do artigo 40, da Lei nº 11.343/06 no patamar de ¼ (um quarto), fixando as sanções dos acusados em 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de reclusão e pagamento de 760 (setecentos e sessenta) dias-multa, razão pela qual este relator para acórdão ficou incumbido de proferir o voto condutor.


Contudo, constato a ocorrência de erro material no tocante à fixação das penas definitivas aos réus, pelas razões a seguir expostas.


Na primeira fase de dosimetria da pena quanto ao crime de tráfico transnacional de drogas, mantive a pena-base em 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 650 (seiscentos e cinquenta) dias-multa, que, ao final da segunda fase, resultou em 6 (seis) anos de reclusão e pagamento de 600 (seiscentos) dias-multa em face da atenuante da confissão, nos termos do artigo 65, inciso III, "d", do Código Penal.


Porém, na terceira fase, mantido o aumento da sanção em 1/6 (um sexto) em face da transnacionalidade do delito, conforme prevê o artigo 40, inciso I, da Lei nº 11.343/06, resultando na pena de 7 (sete) anos de reclusão e pagamento de 700 (setecentos) dias-multa, apliquei a causa de aumento prevista no artigo 40, inciso III, da supracitada lei, em ¼ (um quarto), tendo em vista que o crime foi cometido no interior de transporte público, o que resulta na pena de 8 (oito) anos e 9 (nove) meses de reclusão e pagamento de 875 (oitocentos e setenta e cinco) dias-multa. Finalmente, mantido o patamar de diminuição em 1/6 (um sexto), nos termos do §4º, do artigo 33, da Lei nº 11.343/06, a pena deste delito restou estabelecida em 7 (sete) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 730 (setecentos e trinta) dias-multa.


Tal sanção somada com a decorrente da prática do crime de corrupção de menores, previsto no artigo 244-B, da Lei nº 8.069/90, fixada em 1 (um) ano de reclusão, haja vista a ocorrência de concurso material de delitos, resultou na pena definitiva de 8 (oito) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 730 (setecentos e trinta) dias-multa para cada um dos acusados.


Portanto, a pena definitiva restou em 8 (oito) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 730 (setecentos e trinta) dias-multa para cada um dos acusados e não em 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de reclusão e pagamento de 760 (setecentos e sessenta) dias-multa, conforme constou na minuta de julgamento.


Diante do exposto, suscito a presente questão de ordem, com o fim de que seja retificado o voto por mim prolatado na sessão realizada em 4 de fevereiro de 2013, por ocasião do julgamento das apelações criminais interpostas pelo Ministério Público Federal e pelos réus Cleiton Araújo Rola e Alcione Ramos Machado, apenas para constar que a pena definitiva para cada um dos réus restou fixada em 8 (oito) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e pagamento de 730 (setecentos e trinta) dias-multa.


É o voto.


Antonio Cedenho
Relator


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Data e Hora: 04/07/2013 21:33:10



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001710-77.2011.4.03.6005/MS
2011.60.05.001710-7/MS
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : CLEITON ARAUJO ROLA reu preso
ADVOGADO : LISSANDRO MIGUEL DE CAMPOS DUARTE e outro
APELANTE : ALCIONE RAMOS MACHADO reu preso
ADVOGADO : RODRIGO FABIAN FERNANDES DE CAMPOS (Int.Pessoal)
APELADO : OS MESMOS
No. ORIG. : 00017107720114036005 1 Vr PONTA PORA/MS

RELATÓRIO

Trata-se de apelações criminais interpostas pelo Ministério Público Federal e pelas defesas dos acusados Cleiton Araújo Rola e Alcione Ramos Machado contra a sentença que os condenou a 6 (seis) anos e 10 (dez) meses de reclusão, no regime inicial fechado, e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa, no valor unitário mínimo legal, pela prática dos delitos do art. 33, caput, c. c. o art. 40, I, ambos da Lei n. 11.343/06, e do art. 244-B da Lei n. 8.069/90, na forma dos arts. 29 e 69, ambos do Código Penal, absolvendo-os da imputação relativa ao art. 35, caput, da Lei n. 11.343/06, com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal (fls. 315/330).

Apela o Ministério Público Federal com os seguintes argumentos:

a) é devida a incidência da causa de aumento da pena do art. 40, V, da Lei n. 11.343/06, demonstrada a intenção dos acusados de transportar a droga do Mato Grosso do Sul para o Acre;
b) não há que se falar em absorção da causa de aumento da interestadualidade pela causa de aumento da transnacionalidade do delito, tendo em vista que se referem a condutas distintas, com animus diversos, sendo cabível o concurso entre as majorantes;
c) caso se reconheça a absorção de uma causa de aumento pela outra, é devida a exasperação da pena em patamar superior a 1/6 (um sexto), preferencialmente em 1/4 (um quarto), em decorrência da transnacionalidade do delito;
d) é devida a incidência da causa de aumento do art. 40, III, da Lei n. 11.343/06, tendo em vista que os acusados foram flagrados transportando drogas no interior de transporte coletivo de passageiros;
e) a pena deve ser exasperada em 1/3 (um terço), na terceira fase da dosimetria;
f) o Superior Tribunal de Justiça vem adotando entendimento de que a natureza da causa de aumento do inciso III do art. 40 da Lei n. 11.343/06 é objetiva, sendo irrelevante para sua caracterização que o agente ofereça ou distribua substância entorpecente aos passageiros do coletivo, bastando o simples uso desse tipo de transporte, havendo posicionamento recente do Supremo Tribunal Federal no mesmo sentido;
g) é devida a condenação dos acusados pela prática do delito do art. 35 da Lei 11.343/06, uma vez evidenciada a existência de vínculo associativo estável e permanente entre eles;
h) a prática do delito do art. 33 da Lei n. 11.343/06 torna ainda mais evidente a presença do vínculo associativo;
i) a expressiva quantidade de droga apreendida, a internacionalidade e a interestadualidade do delito são circunstâncias relevantes na aferição da ocorrência do delito de associação para o tráfico de entorpecentes;
j) durante a conduta ilícita, os acusados estiveram em constante contato sobre o transporte da droga, o que é corroborado pelo depoimento da testemunha Letícia;
k) é incriminada a associação voltada à prática reiterada ou não do tráfico de entorpecentes, não importando a reiteração de condutas (fl. 345/362).

As defesas dos acusados Cleiton Araújo Rola e Alcione Ramos Machado ofereceram contrarrazões (fls. 383/392 e 405/417).

Recorreu Cleiton Araújo Rola com os seguintes argumentos:

a) é devida a incidência da atenuante da confissão, tendo em vista que o acusado Cleiton colaborou com a investigação criminal, com a redução da pena ao mínimo legal;
b) não é devida a aplicação da causa de aumento de pena do art. 40, I, da Lei n. 11.343/06, que não restou comprovada nos autos;
c) não é devida a condenação do acusado Cleiton pela prática do delito do art. 244-B da Lei n. 8.069/90, uma vez que não induziu, nem estimulou, de qualquer forma, que a menor Letícia Ramos Machado realizasse as condutas descritas na denúncia;
d) o acusado Cleiton desconhecia que Letícia era menor na data dos fatos;
e) o acusado Cleiton tem residência fixa, ocupação lícita e bons antecedentes criminais;
f) requer "seja imputado o Apelante a tipificação do Art. 33, parágrafo 4º da Lei nº 11.343/06, o chamado 'Tráfico Privilegiado', por ser considerado 'mula'" (fl. 382) (fls. 366/382).

Recorreu Alcione Ramos Machado com os seguintes argumentos:

a) a exasperação da pena-base em decorrência da quantidade de droga revela-se excessiva, considerando que 78 Kg (setenta e oito quilos) de maconha não representam grande quantidade de droga, em comparação com outras apreensões na região da fronteira;
b) a acusada Alcione faz jus à maior grau de redução de pena pela aplicação da atenuante do art. 65, III, d, do Código Penal;
c) não é devida a aplicação da causa de aumento de pena do art. 40, I, da Lei n. 11.343/06, que não restou comprovada nos autos;
d) não é devida a condenação da acusada Alcione pela prática do delito do art. 244-B da Lei n. 8.069/90, uma vez que não induziu, nem estimulou, de qualquer forma, que a menor Letícia Ramos Machado realizasse as condutas descritas na denúncia;
e) a acusada Alcione desconhecia que Letícia era menor na data dos fatos;
f) é devida a redução da pena ao mínimo legal (fls. 393/393/417).

O Ministério Público Federal ofereceu contrarrazões (fls. 419/433).

A Ilustre Procuradora Regional da República, Dra. Maria Iraneide Olinda S. Facchini, manifestou-se pelo desprovimento do recurso de apelação dos acusados e pelo parcial provimento do recurso do Ministério Público Federal (fls. 435/460).

Os autos foram encaminhados à revisão, nos termos regimentais.

É o relatório.


Louise Filgueiras
Juíza Federal Convocada


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001710-77.2011.4.03.6005/MS
2011.60.05.001710-7/MS
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : CLEITON ARAUJO ROLA reu preso
ADVOGADO : LISSANDRO MIGUEL DE CAMPOS DUARTE e outro
APELANTE : ALCIONE RAMOS MACHADO reu preso
ADVOGADO : RODRIGO FABIAN FERNANDES DE CAMPOS (Int.Pessoal)
APELADO : OS MESMOS
No. ORIG. : 00017107720114036005 1 Vr PONTA PORA/MS

VOTO

Imputação. Cleiton Araújo Rola e Alcione Ramos Machado foram denunciados pela prática dos delitos dos arts. 33, caput, e 35, ambos c. c. o art. 40, I, III, V e VI, todos da Lei n. 11.343/06, e art. 244-B da Lei n. 8.069/90, pelos seguintes fatos:


No dia 16 de março de 2011, por volta das 21:30h, na Rodovia BR 463, no Posto Fiscal Pacuri, em Ponta Porã/MS, num ônibus da Expresso Queiroz, CLEITON ARAÚJO e ALCIONE RAMOS MACHADO, de forma livre e consciente, em comunhão de vontades e unidade de desígnios, envolvendo a adolescente LETÍCIA, portavam, guardavam, transportavam e traziam consigo, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, aproximadamente, Cleiton, 30 tabletes que continham 26 Kg (vinte e seis quilos), e Alcione, 28 tabletes contendo 31 Kg (trinta e um quilo), todos da droga vulgarmente conhecida como "maconha", adquirida e importada da cidade paraguaia de Pedro Juan Caballero, sendo certo que estavam, a todo o tempo, acompanhados da menor LETICIA RAMOS MACHADO que, por sua vez, também guardava, transportava e trazia consigo 16 tabletes no total de 21 Kg (vinte e um quilos) de maconha.
Na data, hora e local acima mencionados, policiais do Departamento de Operações de Fronteira, realizavam fiscalização de rotina no Posto Fiscal Pacuri, quando abordaram ônibus da empresa Expresso Queiroz, o qual fazia o itinerário Ponta Porã/MS - Campo Grande/SP e, em revista, encontraram, com os ora denunciados e com a adolescente, duas bolsas e duas malas, devidamente etiquetadas, sendo certo que no interior destas havia 74 (setenta e quatro) tabletes contendo substancia com características de maconha, a qual totalizaram 78 Kg (setenta e oito quilos).
Aos policiais, no momento da abordagem, CLEITON ARAÚJO ROLA admitiu de imediato a propriedade de uma das bolsas que continha 25 Kg do entorpecente, e disse que saiu de Rio Branco/AC para vir buscar o entorpecente em Pedro Juan Caballero/PY, de uma pessoa desconhecida. Afirmou, também, que estava retornando para Rio Branco/AC, onde entregaria a droga para a pessoa que lhe contratou, e que receberia R$ 3.000,00 (três mil reais) pelo transporte da droga (fls. 06/07 do IPL).
Ao ser ouvida em sede policial, ALCIONE RAMOS MACHADO (fls. 12/13 do IPL), confirmou que teria vindo de Rio Branco/AC para buscar a droga em Ponta Porã, que conheceu a pessoa de Cleiton e a adolescente Letícia já na rodoviária da cidade, que ganharia pelo transporte de maconha R$ 3.000,00 (três mil reais), e que foi o namorado de Letícia, conhecido como "Curinga" e que se encontra preso em Rio Branco/AC, era o contratante.
A adolescente LETÍCIA SOUZA DA SILVA, por sua vez, confessou que ao encontrar com as pessoas de Cleiton e Alcione na rodoviária se deslocaram para o Hotel Acapulco, localizado no Paraguai, para esperarem, instante em que ela se deslocou até a casa de Rodrigo, também no Paraguai, onde lá recebeu duas bolsas com a maconha e ainda a informação de que receberia a quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) pelo transporte. Disse, ainda, que no dia 16/03/2011, teve que esperar por Cleiton e Alcione, pois os mesmos estavam prensando a maconha na casa de um paraguaio (fls. 18/19).
Assim, claro está que Cleiton e Alcione, associaram-se entre si à adolescente Letícia de modo livre e plenamente consciente, em data pouco anterior a 16 de março de 2011, com o fim de praticarem, reiteradamente ou não, o crime de tráfico internacional e interestadual de drogas, em transporte público.
Cleiton e Alcione com seus comportamentos e intenções, tendo plena consciência da ilicitude de seus atos e podendo agir de modo diverso, optaram por praticar a conduta insculpida no preceito primário do art. 33, caput, e do art. 35, ambos reforçados pelo art. 40, incisos I, III, V e VI, todos da Lei nº 11.343/06.
Da mesma forma, Cleiton e Alcione, um pouco antes de 16 de março de 2011, com vontade livre e consciente, corromperam ou facilitaram a corrupção da adolescente Letícia, com ela praticando crime ou induzindo-a a praticá-la, uma vez que, em sua companhia, adquiriram, importaram, guardaram e transportaram drogas de origem paraguaia e cujo destino seria o estado do Acre.
Destarte, Cleiton e Alcione incidiram também na conduta descrita no art. 244-B, da Lei nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente) ausentes, em tese, causas excludentes de antijuridicidade e/ou da punibilidade.
A justa causa necessária para o oferecimento da ação penal está consubstanciada nos indícios de autoria evidenciados tanto nos depoimentos dos policiais que efetuaram a prisão, quanto no interrogatório extrajudicial dos denunciados (vide fls. 02/05 e 12/19, respectivamente, do auto de prisão em flagrante), bem como nas provas de materialidade reveladas pelo boletim de ocorrências de fls. 21/25, pelo termo de exibição e apreensão de fl. 26, pelos laudos preliminares de constatação de fls. 34, 36 e 38 e, por fim, pelos laudos periciais de exame em aparelho de telefonia celular de fls. 59/76 onde restou evidenciado o envio/recebimento de várias mensagens de texto para pessoa nomeada "Curiga" (...) (sic, fls. 104/105)

Do Processo. Os acusados Cleiton Araújo Rola e Alcione Ramos Machado foram absolvidos da imputação da prática do delito do art. 35 da Lei n. 11.343/06, com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal (fl. 323v.).

Embora a denúncia narre a participação da menor Letícia Ramos Machado, sua identificação correta é Letícia Souza da Silva (fls. 18/20).

Materialidade. A materialidade do delito está comprovada por intermédio dos seguintes documentos:

a) Auto de prisão em flagrante dos acusados (fls. 2/19);
b) Termo de exibição e apreensão de:
- mala de viagem de cor preta, tamanho grande, com 30 (trinta) tabletes de "substância análoga ao entorpecente conhecido como maconha, totalizando 26 quilos (Cleiton Araujo Rola)" (fl. 26);
- mala de viagem de cor preta, tamanho médio, com 16 (dezesseis) tabletes de "substância análoga ao entorpecente conhecido como maconha, totalizando 21 quilos (Letícia Souza da Silva)" (fl. 26);
- 2 (duas) bolsas de viagem, de cor cinza, com 28 (vinte e oito) tabletes de "substância análoga ao entorpecente conhecido como maconha, totalizando 31 quilos (Alcione Ramos Machado)" (fl. 26);
- tiquetes de bagagem (via do passageiro) ns. 819307, 819308, 819309 e 819310;
- bilhete de passagem n. 055426, da Viação Expresso Queiroz, referente ao trajeto de Ponta Porã (MS) a Nova Alvorada do Sul (MS);
- identificação de passageiro bilhetes n. 055426 e 055424, em nome de Cleiton Araújo e Alcione Machado, respectivamente;
- valores em dinheiro e aparelhos celulares (fls. 26/32);
c) Laudos de exame de constatação, realizado nos tabletes da substância apreendida, com resultado positivo para maconha (fls. 34, 36 e 38);
d) Termo de apreensão dos bilhetes de passagem ns. 055026 e 055425, da Viação Expresso Queiroz, referente ao trajeto de Ponta Porã (MS) a Nova Alvorada do Sul (MS), encontrados junto com os objetos pessoais de Letícia Souza da Silva (fls. 47/49);
e) Laudo de exame toxicológico n. 27.574, realizado no material apreendido, com resultado positivo para maconha (fls. 126/129 e 150/153).

Foram também colacionados aos autos os Laudos de exame em aparelho de telefonia celular n. 6.024/11 e 6.025/11, com a transcrição dos contatos da agenda telefônica, das mensagens e ligações recebidas e efetuadas, além das imagens armazenadas (fls. 59/76).

Autoria. A autoria delitiva encontra-se satisfatoriamente comprovada.

Em Juízo, a menor Letícia Souza da Silva disse que estava viajando com os acusados Cleiton e Alcione, com destino ao Paraguai. Declarou que aceitou o convite para viajar com eles, a passeio, não sabendo que iriam transportar droga. Adicionou que foi entregue 1 (uma) mala com droga para ela transportar, e que ela tinha consciência do conteúdo trazido. Referiu que a droga lhe foi entregue por paraguaio conhecido dos demais acusados, em rodoviária do Paraguai. Aduziu que os acusados Cleiton e Alcione sabiam que estavam transportando droga e queriam favorecer-se com sua presença, por ser menor de idade. Afirmou que contava com 16 (dezesseis) anos na data dos fatos. Relatou que conheceu os acusados na época em que morava com sua avó, pois eram amigos dos seus primos, não sabendo declinar a profissão que eles exercem. Acrescentou que receberia R$ 5.000,00 (cinco mil reais) para transportar a droga de Pedro Juan Caballero (Paraguai) para Rio Branco (AC). Informou que a droga foi recebida no Hotel Acapulco, em Pedro Juan Caballero (Paraguai). Disse que foi a primeira vez que esteve envolvida com tráfico de entorpecentes (fls. 183/184 e mídia à fl. 185).

Na Polícia, Letícia aduziu que namorava Geovani, que estava cumprindo pena em regime semiaberto, por infração que acreditava estar relacionada à violência doméstica, e que este insistiu que concordasse em transportar entorpecente. Disse que recebeu telefonema de preso, desconhecido, que lhe ofereceu R$ 5.000,00 (cinco mil reais) para buscar maconha no Paraguai. Relatou que recebeu orientações de pessoa conhecida como "Coringa", que informou que os acusados Cleiton e Alcione a acompanhariam na viagem. Esclareceu que Alcione foi contratada por "Coringa" porque namorava detento da mesma unidade prisional, que havia cometido o delito de tráfico de entorpecentes, assim como Cleiton, também contratado por tal pessoa em razão de seu irmão encontrar-se preso na mesma unidade prisional, pela prática de tráfico de drogas. Adicionou que, ao chegarem em Ponta Porã (MS), foram orientados a seguir em táxi para o Hotel Acapulco, no Paraguai, onde ficaram hospedados, com as despesas pagas por paraguaio, identificado como sendo Rodrigo. Afirmou que foi Rodrigo quem lhe entregou 2 (duas) bolsas contendo maconha, colocando-a em táxi, rumo à rodoviária, e que, por medo, retornou ao referido hotel, sendo instruída a aguardar pelos acusados Cleiton e Alcione para realizar a viagem de regresso, os quais estariam na casa de paraguaio para prensar maconha. Referiu que, no momento da abordagem policial realizada no ônibus rodoviário em que viajavam, os acusados Cleiton e Alcione informaram que ela estava "só voltando" (fl. 19), e que policial teria se enganado ao declará-la como responsável pelo transporte de 20 Kg (vinte quilos) de maconha. Negou o transporte de entorpecente. Não soube esclarecer qual vantagem seria revertida em favor de Geovani. Aduziu que recebeu dinheiro para pagamento das despesas com a viagem da mulher de "Coringa", não sabendo precisar se foi ela quem forneceu numerário para os demais pagarem as despesas da viagem (fls. 18/19).

Interrogado em Juízo, o acusado Cleiton Araújo Rola declarou que reside em Rio Branco (AC) com sua mãe, e trabalha em empresa de fabricação de asfalto, auferindo R$ 600,00 (seiscentos reais) mensais. Aduziu que nunca foi preso ou processado anteriormente. Disse que a denúncia é parcialmente verdadeira. Alegou que desconhecia que Letícia era menor de idade na data dos fatos. Narrou que pessoa de presídio do Rio Branco (AC) ofereceu-lhe R$ 3.000,00 (três mil reais) para transportar maconha. Afirmou que realizou viagem com a acusada Alcione e a menor Letícia, as quais conheceu na rodoviária de Rio Branco (AC), não sabendo declinar se foram todos contratados pela mesma pessoa. Relatou que foram instruídos a se hospedar no Hotel Acapulco, no Paraguai. Informou que iriam transportar o total de 80 Kg (oitenta quilos) de maconha. Declarou que encontrou com pessoa brasileira no Paraguai, identificada apenas como "Tadeu", que fornecia informações sobre pagamento. Aduziu que encontrou na rodoviária outra pessoa, desconhecida, responsável pela entrega da droga, acondicionada no interior de 3 (três) malas, para os 3 (três) transportarem. Referiu que cada um iria transportar 1 (mala) e que a menor Letícia não quis transportar a dela, que identificou como sendo sua, ficando ele com 2 (duas) malas, e Alcione com outra. Negou tivesse colaborado na prensa da maconha. Disse que o paraguaio identificado como Rodrigo era o responsável pelo fornecimento de dinheiro para alimentação e para a viagem. Acrescentou que seu irmão também estava preso. Referiu que seu amigo Paulo, que esteve preso, não foi o responsável pela sua contratação. Esclareceu que não sabia que iria deslocar-se até o Paraguai, e que acreditava que a droga seria retirada em Ponta Porã (MS) para entrega em Rio Branco (AC). Informou que o dinheiro apreendido em seu poder lhe pertencia e correspondia a verbas trabalhistas recebidas, e que o celular que portava também lhe pertencia, não sabendo declinar o número. Declarou que não chegou a receber os R$ 3.000,00 ajustados para o transporte da droga e que a pessoa que o contratou e lhe telefonava não informava o nome ou apelido. Não soube declinar a relação da acusada Alcione e da menor Letícia com a pessoa que o contratou, tampouco soube informar o motivo da realização da viagem em 3 (três) pessoas. Declarou que Letícia afirmou que contava com 20 (vinte) anos e que iria receber pagamento pelo transporte da droga e que a acusada Alcione precisou que iria receber R$ 3.000,00 (três mil reais). Relatou que a porção da droga que transportava seria entregue para mulher, desconhecida, na rodoviária de Rio Branco (AC) e que cada um deles iria entregar a droga transportada para o respectivo destinatário. Afirmou que tinha avistado Letícia anteriormente, com quem já tinha conversado 2 (duas) vezes. Referiu que conversava com a pessoa que o contratou com o uso de outro chip de celular, que deixou no assento do ônibus. Adicionou que Letícia não aparentava ser menor de idade e que, embora tenha preenchido o ticket da bagagem dela em seu nome, ela também foi abordada porque trazia consigo bolsa de viagem do acusado, com as roupas dele em seu interior, tendo se autoincriminado no momento da apreensão (fl. 196 e mídia à fl. 197).

Na Polícia, o acusado Cleiton informou que seu vizinho, identificado apenas como Paulo, preso por tráfico de entorpecentes em Rio Branco (AC), avisou-o que um colega dele iria telefonar e que, em seguida, recebeu a proposta do transporte da droga, pelo valor de R$ 3.000,00 (três mil reais). Aduziu que concordou em retirar 80Kg (oitenta quilos) de maconha em Ponta Porã (MS), que seria entregue por taxista. Informou que recebeu dinheiro para pagamento das despesas com a viagem de mulher desconhecida, na rodoviária de Rio Branco (AC). Disse que encontrou a menor Letícia e a acusada Alcione na rodoviária, tendo telefonado para uma delas para marcar o encontro, no número informado pelo amigo de Paulo. Negou hospedagem em hotel na cidade paraguaia de Pedro Juan Caballero. Não soube declinar o nome do hotel em que permaneceu durante a empreitada criminosa. Afirmou que a droga teria sido entregue no Brasil, por brasileiro, em carro paraguaio, e que esteve no Paraguai a passeio, negando o recebimento do entorpecente em território estrangeiro. Adicionou que a menor Letícia Souza da Silva comentou que seu namorado estava preso, não sabendo informar seu nome ou o crime cometido. Disse que não foi o namorado de Letícia, nem Letícia, nem a acusada Alcione quem o contratou para o transporte do entorpecente, desconhecendo a pessoa denominada "Coringa". Acrescentou que reside em bairro distante da residência da menor Letícia e da acusada Alcione (fls. 6/7).

Interrogada em Juízo, a acusada Alcione Ramos Machado declarou que reside com sua mãe em Tancredo Neves (AC) e trabalha como secretária do lar, sendo que estava desempregada na data dos fatos. Disse que tem 3 (três) filhos, que são sustentados por sua mãe. Afirmou que está sendo processada pela prática do delito do art. 121 do Código Penal. Disse que a acusação é verdadeira. Negou tenha se ausentado do hotel para prensar maconha, tarefa executada por Letícia, na companhia do paraguaio Rodrigo. Referiu que foi contratada para o transporte da maconha, por intermédio de amiga, que já atuava no tráfico de entorpecentes. Narrou que, logo que recebeu telefonema de pessoa conhecida dessa sua amiga, foi contratada para realizar viagem, com o objetivo de retirar droga, em local desconhecido, por R$ 3.000,00 (três mil reais). Disse que foi informada que, chegando em Ponta Porã (MS), pessoa iria conduzí-la até hotel. Esclareceu que apenas na rodoviária de Rio Branco (AC) é que soube que seria acompanhada por mais 2 (duas) pessoas. Adicionou que não sabia que Letícia era menor de idade. Alegou que desconhecia o nome da pessoa que telefonava para dar as orientações da viagem, tendo-o apelidado de "Guia". Aduziu que, ao chegarem em Ponta Porã (MS), pegaram táxi e dirigiram-se ao Hotel Acapulco, não sabendo dizer se está localizado no Paraguai. Referiu que 1 (um) homem paraguaio, chamado Rodrigo, comparecia no hotel para o pagamento das despesas dos 3 (três). Disse que, enquanto esteve hospedada no hotel, não saía para passear, apenas dirigia-se ao restaurante e voltava. Aduziu que não conversou com Rodrigo. Não soube declinar o motivo pelo qual esperou por diversos dias a retirada da droga. Acrescentou que, no dia do retorno a Rio Branco (AC), o entorpecente foi entregue no hotel e que solicitou a Rodrigo que providenciasse mais malas para dividir o peso, o que foi efetuado. Informou que recebeu R$ 250,00 (duzentos e cinquenta reais) para a viagem de ida e R$ 450,00 (quatrocentos e cinquenta reais) para a viagem de volta, sendo as despesas de hotel e alimentação pagas por Rodrigo. Esclareceu que se deslocou até a rodoviária, comprou a própria passagem de retorno, colocou as malas no bagageiro do ônibus e, apenas após, o acusado Cleiton e a menor Letícia chegaram ao local. Relatou que Cleiton é que se responsabilizou pela mala que Letícia estava transportando, com a desistência manifestada por ela. Referiu que Letícia foi a primeira a ser abordada, depois Cleiton e, por último, ela, causando suspeita nos policiais o fato de todos residirem em Rio Branco (AC). Disse que não conhece pessoa identificada como "Coringa", sendo que ouviu Letícia falar a respeito dele, ou com ele, em conversa telefônica. Acrescentou que registrou o número do telefone de "Coringa" em seu aparelho celular, confirmando o envio de mensagem para ele quando estava deixando o Hotel Acapulco, no retorno para Rio Branco (AC). Informou que "Guia" e "Coringa" são a mesma pessoa e que os 3 (três) passaram a chamar tal pessoa de "Coringa". Negou tenha namorado preso pela prática do delito de tráfico de entorpecentes. Disse que já foi usuária de drogas. Afirmou que Cleiton e Letícia já se conheciam antes da viagem. Referiu que Letícia não aparentava ser menor de idade e que passava por moça de 18 (dezoito) ou 19 (dezenove) anos (fl. 195 e mídia à fl. 197).

Na Polícia, Alcione disse que localizou envelope com o dinheiro para pagamento das despesas com a viagem sobre lixeira na rodoviária e que tomou conhecimento que o transporte da droga seria realizado em conjunto com outras 2 (duas) pessoas apenas na rodoviária, tendo recebido telefonema do acusado Cleiton para que se encontrassem, e que acreditava que seu número de telefone havia sido informado a Cleiton pelo contratante, pois não o conhecia anteriomente. Referiu que foi Cleiton quem se apresentou para ela e localizou a menor Letícia na rodoviária, para acompanhá-los na viagem. Negou hospedagem no Paraguai. Disse que os 3 (três) se hospedaram em hotel próximo à rodoviária de Ponta Porã (MS). Relatou que a menor Letícia namora indivíduo preso em Rio Branco (AC), conhecido como "Coringa", que confirmou ser a pessoa que a contratou, de quem partiam diversos telefonemas para os 3 (três) para orientações. Disse que o entorpecente foi recebido no Brasil (fls. 12/13).

Na fase inquisitiva, o Policial Militar José Alencar Valério disse que, na abordagem de ônibus da Viação Expresso Queiroz, com itinerário de Ponta Porã (MS) a Campo Grande (MS), no Posto Fiscal Pacuri, foi vistoriado o bagageiro externo, sendo localizadas 2 (duas) bolsas e 2 (duas) malas contendo diversos tabletes de substância com odor e características análogas à maconha. Relatou que foram identificados os proprietários dessas bagagens pelas tarjetas de identificação, os acusados Cleiton e Alcione e a menor Letícia, os quais confirmaram a propriedade das malas. Narrou que os 3 (três) afirmaram que eram naturais do Estado do Acre e que foram contratados para buscar entorpecente em Pedro Juan Caballero, no Paraguai, e transportá-lo até Rio Branco (AC). Alegou que a acusada Alcione disse que não sabia quem a havia contratado, informando que receberia R$ 3.000,00 (três mil reais), enquanto o acusado Cleiton declarou que foi contratado pelo namorado de Letícia, que se encontrava preso em Rio Branco (AC), e que receberia R$ 3.000,00 (três mil reais), o que foi parcialmente confirmado por Letícia, que declarou que foi contratada por preso de Rio Branco (AC), conhecido como "Curinga", que não é seu namorado, e que receberia R$ 5.000,00 (cinco mil reais) pelo transporte da droga. Aduziu que o entorpecente foi apanhado no Paraguai (fl. 3).

Tais declarações foram corroboradas pelo depoimento extrajudicial do Policial Militar Luis Carlos Rebechi (fl. 5).

É inconteste, portanto, que os acusados Cleiton Araújo Rola e Alcione Ramos Machado, com consciência e livre vontade, aderiram ao transporte transnacional de 78Kg (setenta e oito quilos) de maconha, adquirida em Pedro Juan Caballero (Paraguai), para introdução e disseminação em Rio Branco (AC), mediante o pagamento de R$ 3.000,00 (três mil reais) para cada.

Não obstante os acusados Cleiton e Alcione tenham declarado, na Polícia, que não se hospedaram no Paraguai e que teriam recebido o entorpecente em Ponta Porã (MS), tal versão foi modificada em Juízo e confirmada pelos policiais militares e pela menor Letícia, cujos depoimentos foram todos convergentes quanto ao deslocamento e hospedagem dos acusados em Pedro Juan Caballero (Paraguai), para obtenção da maconha, o que demonstra satisfatoriamente a transnacionalidade do delito.

Comprovada a materialidade, a autoria e o dolo, bem como a transnacionalidade do delito, a condenação dos acusados Cleiton Araújo Rola e Alcione Ramos Machado pela prática do delito do art. 33, caput, c. c. o art. 40, I, ambos da Lei n. 11.343/06 deve ser mantida.

Associação para o tráfico de entorpecentes. Pugna o Ministério Público Federal pela condenação dos acusados pela prática do delito do art. 35 da Lei 11.343/06, uma vez evidenciada a existência de vínculo associativo estável e permanente entre eles. Sustenta que a prática do delito do art. 33 da Lei n. 11.343/06 torna ainda mais evidente a presença do vínculo associativo, e que a expressiva quantidade de droga apreendida, a internacionalidade e a interestadualidade do delito são circunstâncias relevantes na aferição da ocorrência do delito de associação para o tráfico de entorpecentes. Pondera que, durante a conduta ilícita, os acusados estiveram em constante contato sobre o transporte da droga. Aduz também que é incriminada a associação voltada à prática reiterada ou não do tráfico de entorpecentes, não importando a reiteração de condutas.

Tal irresignação não merece prosperar.

Não foram produzidas provas robustas da existência de vínculo associativo estável e permanente entre os acusados.

Consta dos autos que Cleiton e Alcione foram arregimentados para a prática do tráfico de entorpecentes separadamente e que eram desconhecidos até o momento do ingresso em ônibus na rodoviária de Rio Branco (AC), com o objetivo comum de retirada da droga.

A teor dos depoimentos judiciais dos acusados, eles supuseram que foram contratados pela mesma pessoa, identificada como "Coringa", no decorrer da empreitada criminosa, sendo que acreditavam que a droga transportada por cada um deles seria entregue a destinatário diferente, quando do retorno a Rio Branco (AC). Tampouco puderam esclarecer se foi a mesma pessoa que lhes entregou dinheiro para o pagamento das despesas com a viagem.

Extrai-se, portanto, a ocorrência de reunião meramente eventual entre os acusados Cleiton e Alcione, ao menos não há elementos de prova que autorizem inferir-se pela existência de ajuste prévio entre eles, pelo que entendo deva ser mantida a absolvição de ambos quanto à prática do delito de associação para o tráfico.

Nesse sentido, manifestou-se a Ilustre Procuradora Regional da República:


(...) verifica-se que o crime previsto no art. 35, caput, da Lei nº 11.343/2006 exige a permanência e a estabilidade do vínculo para sua configuração, havendo a necessidade da existência de um animus associativo, sob pena de caracterizar apenas o concurso de agentes e não um crime autônomo.
(...)
No caso vertente, constata-se que os réus Cleiton e Alcione, traziam consigo 78 Kg de cocaína, provenientes do Paraguai, com o intuito de distribuir a droga em Rio Branco/AC. O entorpecente teria sido adquirido na fronteira do Paraguai com o Mato Grosso do Sul, pelos acusados. Assim, os réus Cleiton Araújo Rola e Alcione Ramos Machado praticaram o crime de tráfico internacional de entorpecentes. Contudo, de tais fatos resulta uma reunião apenas eventual entre os agentes, o que não é suficiente para caracterizar o crime de associação para o tráfico de drogas.
Em outras palavras, restou evidente a prática do crime de tráfico internacional de entorpecentes, mediante concurso de agentes, mas não há provas suficientes a indicar que o vínculo entre os acusados fosse estável e permanente.
(...)
No caso dos autos, verifica-se que a quantidade de droga (78 Kg de maconha) e a forma como foi transportada (tabletes de maconha ocultos nas bagagens dos réus) demonstra a atuação de mulas do tráfico, mas não, necessariamente, de uma associação voltada ao tráfico de drogas.
Ademais, não há indícios de que os acusados Cleiton e Alcione se uniam para praticar delitos, especialmente crimes de tráfico de drogas.
Como é sabido, os delitos de associação criminosa, quadrilha ou bando apresentam bastante dificuldade na obtenção de prova, sendo certo que nos casos em que se verifica a adequada condenação, há elementos probatórios originados em amplas investigações algumas vezes até com interceptações telefônicas e telemáticas, buscas e apreensões e assim por diante.
O caso em tela, por sua vez, veio a lume em decorrência de auto de prisão em flagrante e não trouxe qualquer descrição fática ou prova consistente que revelasse a existência de uma associação criminosa entre os denunciados.
Dessa forma, as provas produzidas indicam apenas o cometimento de um delito de tráfico internacional de drogas, em que cada agente exercia um papel na empreitada criminosa, o que caracteriza o concurso de pessoas e não o delito autônomo de associação para o tráfico (...) (destaques originais, fls.455/457)

Corrupção de menores. Crime formal. Tipicidade. O delito de corrupção de menores é de natureza formal, caracterizando-se ainda que o menor tenha anterior envolvimento em prática delitiva:


RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. PENAL. CORRUPÇÃO DE MENORES. PROVA DA EFETIVA CORRUPÇÃO DO INIMPUTÁVEL. DESNECESSIDADE. DELITO FORMAL. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA DECLARADA DE OFÍCIO, NOS TERMOS DO ARTIGO 61 DO CPP.
1. Para a configuração do crime de corrupção de menores, atual artigo 244-B do Estatuto da Criança e do Adolescente, não se faz necessária a prova da efetiva corrupção do menor, uma vez que se trata de delito formal, cujo bem jurídico tutelado pela norma visa, sobretudo, a impedir que o maior imputável induza ou facilite a inserção ou a manutenção do menor na esfera criminal.
2. Recurso especial provido para firmar o entendimento no sentido de que, para a configuração do crime de corrupção de menores (art. 244-B do ECA), não se faz necessária a prova da efetiva corrupção do menor, uma vez que se trata de delito formal; e, com fundamento no artigo 61 do CPP, declarar extinta a punibilidade dos recorridos Célio Adriano de Oliveira e Anderson Luiz de Oliveira Rocha, tão somente no que concerne à pena aplicada ao crime de corrupção de menores.
(STJ, REsp n. 1127954, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 14.12.11)
HABEAS CORPUS. ROUBO CIRCUNSTANCIADO. CONCURSO DE AGENTES. DELITO PRATICADO NA COMPANHIA DE INIMPUTÁVEL. INCIDÊNCIA DA CAUSA DE AUMENTO. CORRUPÇÃO DE MENORES. ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. CRIME FORMAL. PRESCINDIBILIDADE DE PROVA DA EFETIVA CORRUPÇÃO DO MENOR.
(...)
2. O Superior Tribunal de Justiça firmou compreensão no sentido de que o crime de corrupção de menores é de natureza formal, bastando a participação do menor de dezoito anos para que se verifique a subsunção da conduta do réu imputável ao tipo descrito no art. 1º da Lei nº 2.252/54. Precedentes.
3. Ordem denegada.
(STJ, HC n. 86185, Rel. Min. Og Fernandes, j. 10.06.10)
PENAL. RECURSO ESPECIAL. CORRUPÇÃO DE MENORES. CRIME FORMAL. PRÉVIA CORRUPÇÃO DO ADOLESCENTE. CRIAÇÃO DE NOVO RISCO AO BEM JURÍDICO TUTELADO. INTERPRETAÇÃO SISTÊMICA E TELEOLÓGICA DA NORMA PENAL INCRIMINADORA. TIPICIDADE DA CONDUTA RECONHECIDA. RECURSO PROVIDO. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE.
1. É firme a orientação do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o crime tipificado no art. 1º da Lei 2.252/54 é formal, ou seja, a sua caracterização independe de prova da efetiva e posterior corrupção do menor, sendo suficiente a comprovação da participação do inimputável em prática delituosa na companhia de maior de 18 anos.
2. O art. 1º da Lei 2.252/54, que tem como objetivo primário a proteção do menor, não pode, atualmente, ser interpretado de forma isolada, tendo em vista os supervenientes direitos e garantias menoristas inseridos na Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente.
3. O fim a que se destina a tipificação do delito de corrupção de menores é impedir o estímulo tanto do ingresso como da permanência do menor no universo criminoso. O bem jurídico tutelado pela citada norma incriminadora não se restringe à inocência moral do menor, mas abrange a formação moral da criança e do adolescente, no que se refere à necessidade de abstenção da prática de infrações penais.
4. Considerar inexistente o crime de corrupção de menores pelo simples fato de ter o adolescente ingressado na seara infracional equivale a qualificar como irrecuperável o caráter do inimputável - pois não pode ser mais corrompido - em virtude da prática de atos infracionais.
5. A Lei 12.015/09 revogou expressamente o art. 1º da Lei 2.252/54, contudo, não há falar em descriminalização da conduta de corrupção de menores uma vez que esta passou a figurar no art. 244-B do Estatuto da Criança e do Adolescente.
6. Condenação do recorrido à pena de 1 ano de reclusão, em regime aberto, pela prática do delito previsto no art. 244-B do ECA.
7. Nos termos do que estabelece o art. 109, V, do Código Penal, o prazo prescricional, na espécie, é de 4 anos. Decorridos mais de 4 anos entre a data do fato, ocorrida em 26/4/04 (fl. 6), e a presente data, impõe-se o reconhecimento da extinção da punibilidade pela prescrição superveniente.
8. Recurso especial conhecido e provido para condenar FÁBIO
RODRIGUES DE ALMEIDA pela prática do delito previsto no art. 244-B do ECA. Reconhecimento a prescrição da pretensão punitiva, declarando-se a extinção da punibilidade.
(STJ, REsp n. 1160429, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 02.03.10)

Do caso dos autos. A defesa dos acusados Cleiton e Alcione pleiteia a absolvição à prática do delito do art. 244-B da Lei n. 8.069/90, uma vez que não induziram, nem estimularam, de qualquer forma, que a menor Letícia Ramos Machado realizasse as condutas descritas na denúncia. Alega que os acusados desconheciam que Letícia era menor na data dos fatos.

Tal argumentação não merece prosperar.

Não obstante os acusados tenham negado conhecimento sobre a menoridade de Letícia Souza da Silva, ao tempo dos fatos, é certo que o delito de corrupção de menores é formal, sua caracterização independe de prova da efetiva e posterior corrupção do menor, sendo suficiente a comprovação da participação do inimputável em prática delituosa na companhia de imputável.

Além disso, ao não se interessarem sobre a idade exata de Letícia, os acusados assumiram o risco de praticar a conduta, o que configura dolo eventual.

Mantenho, por conseguinte, a condenação dos acusados pela prática do delito do art. 244-B da Lei n. 8.069/90.

Dosimetria. Cleiton Araújo Rola e Alcione Ramos Machado.

Tráfico transnacional de entorpecentes. Considerados os critérios dos arts. 42 da Lei n. 11.343/06 e 59 do Código Penal, o MM. Magistrado a quo fixou as penas-base acima do mínimo legal, em 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 650 (seiscentos e cinquenta) dias-multa.

Sem circunstâncias agravantes.

Reconheceu a incidência da atenuante da confissão, reduzindo as penas para 6 (seis) anos de reclusão e 600 (seiscentos) dias-multa.

Elevou as penas em 1/6 (um sexto), em decorrência da causa de aumento da transnacionalidade do delito, perfazendo 7 (sete) anos de reclusão e 700 (setecentos) dias-multa.

Sem outras causas de aumento, reduziu as penas em 1/6 (um sexto), em razão da causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06, tornando-as definitivas em 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa.

Corrupção de menores. Considerados os critérios do art. 59 do Código Penal, o MM. Magistrado a quo fixou as penas-base no mínimo legal, em 1 (um) ano de reclusão, quantum que tornou definitivo, à míngua de circunstâncias agravantes, atenuantes, causas de aumento, ou de diminuição de pena.

Nos termos do art. 69 do Código Penal, somou as penas aplicadas pelos 2 (dois) delitos, perfazendo 6 (seis) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa.

Arbitrou o valor do dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo do crime, com atualização monetária.

Estabeleceu o regime inicial fechado.

Denegou a substituição da pena privativa por restritivas de direitos, por ausência de requisitos legais.

Manteve a prisão dos acusados, tendo em vista a presença dos elementos autorizadores da prisão preventiva.

Recorre o Ministério Público Federal, objetivando:

a) a incidência da causa de aumento da pena do art. 40, V, da Lei n. 11.343/06, demonstrada a intenção dos acusados de transportar a droga do Mato Grosso do Sul para o Acre;
b) caso se reconheça a absorção da causa de aumento da interestadualidade pela causa de aumento da transnacionalidade do delito, a exasperação da pena em patamar superior a 1/6 (um sexto), preferencialmente em 1/4 (um quarto), em decorrência da transnacionalidade do delito;
c) a incidência da causa de aumento do art. 40, III, da Lei n. 11.343/06, tendo em vista que os acusados foram flagrados transportando drogas no interior de transporte coletivo de passageiros, com a exasperação da pena em 1/3 (um terço), na terceira fase da dosimetria.

Recorre a defesa do acusado Cleiton, objetivando:

a) a incidência da atenuante da confissão, tendo em vista que Cleiton colaborou com a investigação criminal, com a redução da pena ao mínimo legal;
b) a não incidência da causa de aumento de pena do art. 40, I, da Lei n. 11.343/06, que não restou comprovada nos autos;
c) "seja imputado o Apelante a tipificação do Art. 33, parágrafo 4º da Lei nº 11.343/06, o chamado 'Tráfico Privilegiado', por ser considerado 'mula'" (fl. 382).

Recorre a defesa de Alcione Ramos Machado, objetivando:

a) a redução da pena-base em decorrência da quantidade de droga, fixada em patamar muito elevado, considerada a quantidade pouco expressiva de droga, em comparação com outras apreensões na região da fronteira;
b) maior grau de redução de pena pela aplicação da atenuante do art. 65, III, d, do Código Penal;
c) não incidência da causa de aumento de pena do art. 40, I, da Lei n. 11.343/06, que não restou comprovada nos autos;
d) a redução da pena ao mínimo legal.

O recurso do Ministério Público Federal merece desprovimento e o recurso da defesa, parcial provimento.

Tráfico transnacional de entorpecentes. Nos termos do art. 42 da Lei n. 11.343/06, a natureza (maconha) e a quantidade da droga apreendida na posse do acusado (78Kg) são circunstâncias preponderantes na graduação da pena-base. As demais circunstâncias não são desfavoráveis (Apenso), mas é preciso aquilatar o maior desvalor desta conduta em função da quantidade e qualidade do entorpecente, nesta fase, pois diz com as consequências potenciais do crime, com os motivos, pois demonstra maior ganância do agente que visa ao lucro com sua conduta, circunstâncias essas próprias da graduação da pena-base, nos termos do art. 59 do Código Penal e do citado art. 42 da Lei n. 11.343/06.

No presente caso, o transporte de 78Kg (setenta e oito quilos) de maconha enseja maior aumento da pena-base. Porém, não houve recurso do Ministério Público Federal nesse aspecto, sendo proibida a reformatio in pejus.

Assim, mantenho a pena-base fixada na sentença em 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 650 (seiscentos e cinquenta) dias-multa.

Sem circunstâncias agravantes.

Acertado o reconhecimento da atenuante da confissão, bem como a conservação do quantum fixado, o que resulta as penas de 6 (seis) anos de reclusão e 600 (seiscentos) dias-multa.

Sem outras circunstâncias atenuantes.

Mantenho a incidência da causa de aumento de pena do art. 40, I, da Lei n. 11.343/06, tendo em vista a comprovação nos autos do recebimento do entorpecente pelos acusados na cidade paraguaia de Pedro Juan Caballero para internação em território nacional. Mantenho a proporção de elevação estabelecida na sentença, em 1/6 (um sexto), perfazendo as penas de 7 (sete) anos de reclusão e 700 (setecentos) dias-multa.

Correto o entendimento do MM. Magistrado a quo quanto à não incidência da causa de aumento do art. 40, III, da Lei n. 11.343/06, destinada aos casos em que o ânimo do agente estiver voltado à mercancia do entorpecente no interior do transporte público, bem como quanto à não incidência da causa de aumento do art. 40, V, da mesma Lei, destinada aos casos em que o tráfico é praticado entre Estados da Federação, não àqueles em que o dolo do agente estiver voltado à importação/exportação, ainda que para isso seja necessário ultrapassar fronteiras estaduais.

Sem outras causas de aumento de pena.

Mantenho a incidência da causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06. Os acusados não possuem maus antecedentes, são primários e não foram produzidas provas de que se dedicassem a atividades criminosas ou integrassem organização criminosa voltada ao tráfico de drogas. Contudo, reformo a proporção de diminuição estabelecida na sentença.

Ao tratar da causa de diminuição do § 4º do art. 33, o legislador não se utilizou da mesma técnica e estabeleceu tão somente a possibilidade de graduação entre o mínimo de 1/6 (um sexto) e o máximo de 2/3 (dois terços) de diminuição, verbis:


(...)
§ 4o  Nos delitos definidos no caput e no § 1o deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa.

Fixou requisitos cumulativos que, se preenchidos, dão direito à diminuição, naqueles termos.

No presente caso, não há qualquer prova de envolvimento do acusado com organização criminosa. Não é dado presumir-se em desfavor do direito de liberdade, destarte, entendo deva ficar provado, ainda que por um conjunto indiciário, que a ré pertencia, integrava um grupo voltado para a prática de crimes, com um mínimo de estabilidade, para negar-se a diminuição, o que implica dizer que o julgador deve poder concluir da prova dos autos que houve ação prévia junto ao grupo, não sendo possível presumi-lo do fato isolado do transporte aqui julgado, ainda que isso viesse a trazer um benefício a suposto grupo organizado.

Devida a diminuição, passo ao problema de sua graduação.

Segundo o critério trifásico de aplicação da pena, encampado pelo Código Penal Brasileiro em seu art. 68, verbis:


Art. 68 - A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
Parágrafo único - No concurso de causas de aumento ou de diminuição previstas na parte especial, pode o juiz limitar-se a um só aumento ou a uma só diminuição, prevalecendo, todavia, a causa que mais aumente ou diminua.(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

A quantidade da droga, por sua vez, é critério aferível no momento de se avaliar as circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, dizendo a lei textualmente que:


Art. 42.  O juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a personalidade e a conduta social do agente.

Refere-se, portanto, claramente às circunstâncias do art. 59, indicando ao intérprete, quais as de maior dentre aquelas ali previstas, portanto, nos termos do art. 68 do Código Penal - dentre aquelas aplicáveis na dosagem da pena base.

O art. 59 do Código Penal diz, por sua vez que:


Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
I - as penas aplicáveis dentre as cominadas;(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
II - a quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos;(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
III - o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade;(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
IV - a substituição da pena privativa da liberdade aplicada, por outra espécie de pena, se cabível. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

Portanto, o legislador ao inserir o art. 42 na Lei n. 11.343/06, nada mais fez que ressaltar que a quantidade da droga deveria ser levada em consideração na graduação da pena base, ressaltar, por que a título de conseqüência do crime e de motivos - considerando que quanto mais droga, maior o lucro visado - tais circunstâncias já constavam do rol do art. 59, e mesmo antes da lei poderiam, e deveriam ser avaliadas nesta fase.

Preocupou-se, quiçá, em evitar o costume de fixação de pena mínima mesmo diante da maior reprovabilidade da conduta e nesse passo, vê-se que também a quantidade se relaciona com a culpabilidade, circunstância judicial, a ser avaliada na primeira fase da dosimetria, na forma do art. 68 do Código Penal.

Portanto, dosar a diminuição entre mínimo e máximo levando em consideração quaisquer das circunstâncias judiciais seria evidente bis in idem. Diminuir menos é agravar, tanto assim é que é preciso fundamentar, motivar explicar porque não se defere a diminuição máxima prevista na lei. Se o agente não tiver nada de negativo que possa ser considerado nessa fase, faria jus à máxima diminuição.

Vale aqui me socorrer dos ensinamentos dos renomados professores Ada Pelegrini Grinover, Antonio Scarance Fernandes e Antonio de Magalhães Gomes Filho em sua notória obra "As Nulidades do Processo Penal", Malheiros 2ª ed., pg 163/164:


A individualização da pena opera em dois planos: o legal e o judicial. Representa, em qualquer deles, a aceitaçao do princípioda isonomia, na justiça distributiva, segundo o qual devem os homens ser tratados desigualmente na justa medida de suas desigualdades, ou seja, segundo uma igualdade proporcional.
Cabe ao legislador, no plano abstrato, estabelecer margens mínimas e máximas de penas aos diversos crimes e permitir agravamentos ou atenuações quando acompanhados, na as concretização de determinadas circunstâncias, ao juiz incumbe, no caso concreto, buscar a reprimenda adequada, dentro dos limites previamente estabelecidos para cada crime e em face das agravantes e atenuantes genéricas ou especiais existentes.
A Constituição dirige-se ao legisladora ao juiz. Ao legislador diz que deverá realizar a individualização da pena (art. 5º. XLVI) e ao juiz impõe a necessidade de motivar todas as suas decisões, incluídas aí as decisões sobre a pena (art. 95, IX)
(...)
O Código Penal, na reforma de 1984, adotou o critério trifásico de Nélson Hungria (art. 68 do Código Penal) Em Relação à aplicação da pena privativa de liberdade.
O STF vem anulando sentenças que não seguiram o critério trifásico da lei (RTJ 117/589, 118/483, RT 606/420, 606/396, Lex Jur STF 91/360. mesma orientação encontra-se também no Tribunal de justiça de são Paulo RJTJSP, Lex v. 109/402, 117/455, 118/526.
Na primeira fase, será fixada a pena base, com fundamento nas circunstâncias do artigo 59, caput.
Serão consideradas na segunda etapa, as circunstâncias atenuantes e agravantes dos arts 61 a 67 do Código Penal.
(...)
Sob pena de nulidade, não pode uma circunstância, que serviu como qualificadora ou possibilitou a desclassificação para um tipo privilegiado ser usada também para agravar ou atenuar a pena. Seria ela utilizada duas vezes.

Note-se que os autores afirmam a impossibilidade de avaliação dupla de circunstância própria de fases distintas, tanto para agravar como para atenuar a pena, e logo de início, nos alertam de que o princípio da individualização da pena decorre do princípio da isonomia.

Portanto, não é demasiado concluir que a preservação do critério trifásico e a vedação ao bis in idem pretende garantir que indivíduos em situação semelhante não venham a ser tratados diferentemente, ou que indivíduos em situação desigual sejam tratados da mesma forma, em função da apreciação subjetiva de circunstâncias por parte do judiciário. O subjetivismo decorrente disso é também evitado por meio do princípio da reserva legal.

Sobre a vedação ao bis in idem na aplicação da pena, colaciono alguma jurisprudência:


EMENTA: EXECUÇÃO PENAL. Pena privativa de liberdade. Prisão. Cálculo. Delito de latrocínio (art. 157, § 3º, do CP). Causas de aumento por concurso de pessoas e emprego de arma de fogo (art. 157, § 2º, I e II). Aplicação. Inadmissibilidade. Bis in idem. Maior gravidade já considerada na cominação da pena base. HC não conhecido. Ordem concedida de ofício. Precedentes. Não se aplicam as majorantes previstas no § 2º do art. 157 do Código Penal à pena base pelo delito tipificado no § 3º.
Supremo Tribunal Federal, HC 94994, Rel. Min. CEZAR PELUSO
EMENTA: PENAL. HABEAS CORPUS. CRIMES DE ROUBO. REINCIDÊNCIA. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS E CAUSA AGRAVANTE GENÉRICA OBRIGATÓRIA. BIS IN IDEM NÃO CONFIGURADO. ORDEM DENEGADA. I - As circunstâncias judiciais são colhidas dos elementos fáticos trazidos pelo processo para a fixação da pena-base, sobre a qual são aplicadas as agravantes e atenuantes e, após, as causas de aumento e diminuição. II - O aumento da pena, em função da reincidência, expressamente prevista no art. 61, I, do Código Penal, não constitui bis in idem quando não utilizada como circunstância judicial para a fixação da pena-base. III - Ordem denegada
Supremo Tribunal Federal, HC 94846, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI
EMENTA: HABEAS CORPUS. PENAL. PENA-BASE. EXASPERAÇÃO, NA FASE DO ARTIGO 59, COM FUNDAMENTO NA CONDIÇÃO DO CARGO DE DELEGADO DO PACIENTE. BIS IN IDEM. CRIMES TIPIFICADOS NOS ARTIGOS 312 E 316 DO CÓDIGO PENAL. DELITOS DE MÃO PRÓPRIA APENADOS COM MAIOR RIGOR, CONSIDERADOS OS CRIMES CONGÊNERES PRATICADOS POR PARTICULARES. PRECEDENTE. Peculato e concussão. Exasperação da pena-base em virtude do cargo de delegado exercido pelo paciente. Os crimes descritos nos artigos 312 e 316 do Código Penal são delitos de mão própria; só podem ser praticados por funcionário público. O legislador foi mais severo, relativamente aos crimes patrimoniais, ao cominar pena em abstrato de 2 (dois) a 12 (doze) anos para o crime de peculato, considerada a pena de 1 (um) a 4 (quatro) anos para o crime congênere de furto. Daí que o acréscimo da pena-base, com fundamento no cargo exercido pelo paciente, configura bis in idem. A Primeira Turma desta Corte, no julgamento do HC n. 83.510, Rel. o Ministro Carlos Britto, fixou o entendimento de que a condição de Prefeito Municipal não pode ser considerada como circunstância judicial para elevar a pena-base. Substituindo o cargo de prefeito pelo de delegado, a hipótese destes autos é a mesma. Ordem concedida.
Supremo Tribunal Federal, HC 88545, Rel. Min. EROS GRAU
E M E N T A: HABEAS CORPUS - MENORIDADE DO RÉU - PENA ABAIXO DO MINIMO LEGAL - INADMISSIBILIDADE - NECESSIDADE DE FUNDAMENTAÇÃO DO ATO DECISORIO - EXIGÊNCIA CONSTITUCIONAL SATISFEITA - REINCIDENCIA - DUPLA VALORAÇÃO - INOCORRENCIA - PEDIDO INDEFERIDO. - Os juízes e Tribunais, mesmo reconhecendo a ocorrência da circunstancia atenuante obrigatória da menoridade, não podem reduzir a pena a limite que se situe abaixo da sanção minima cominada em lei. - A motivação dos atos decisórios do Poder Judiciário constitui pressuposto de validade, de eficácia e de legitimidade dos pronunciamentos jurisdicionais. Decisões imotivadas são decisões nulas. Ocorrência, no caso, de ato judicial plenamente fundamentado. - A reincidência do condenado somente legitima a exasperação da pena na hipótese única de seu reconhecimento como circunstancia agravante genérica. Essa pessoal condição jurídica do sentenciado, que influi na definição do seu status poenalis, não pode ser também considerada na fixação da pena-base. A dupla valoração da reincidência - enquanto circunstancia judicial e enquanto circunstancia legal - não deve ser admitida, sob pena de inaceitável bis in idem.
Supremo Tribunal Federal, HC 70483, Rel. Min. CELSO DE MELLO

O princípio do ne bis in idem decorre também, logicamente do princípio da reserva legal, pois realiza a sua aplicação nas diversas fases da dosimetria da pena, exigindo do julgador que puna mais, ou puna menos, pela circunstância fática prevista previamente em lei, de acordo com a sanção previamente estatuída para aquele fato, o que não ocorrerá se for aplicada a sanção duplamente, pelo mesmo fato.

Sobre o princípio da reserva legal, vale uma incursão nas palavras sempre atuais de Aníbal Bruno:


(...) Traçando o círculo fechado do ilícito penal, dentro do qual, em princípio, ninguém pode penetrar sem incorrer em pena e fora do qual ninguém pode sofrer a imposição penal, a lei punitiva não só promove a defesa pela proteção que confere, por meio dos rigores de sua sanção, às condições existencias da sociedade, nos termos emque ela se acha constituída, mas assegura e delimita o campo de ação do Estado na repressão e prevenção direta da delinqüência, e com essa delimitação garante as liberdades individuais em geral e os direitos fundamentais que subsistem no próprio delinquente
O princípio nullum crimen, nulla poena sine lege
O rigor dessa limitação e a força dessas garantias estão no princípio que faz da lei penal a fonte exclusiva de declaração dos crimes e das penas, o princípio da absoluta legalidade do direito punitivo, que exige a anterioridade de uma lei penal, para que determinado fato, por ela definido e sancionado, seja julgado e punido como crime. Esse princípio, tradicionalmente expresso na regra nullum crimen, nulla poena sine lege e geralmente consagrado nos dispositivos de abertura dos Códigos penais modernos, tem raízes na Magna carta, da Inglaterra (1215), e nas Petition os Rights, norte-americanas, mas foi formulado em termos precisos na Declaração dos Direitos do Homem, na Revolução Frencesa: ninguém pode ser punido senão em virtude de uma lei estabelecida e promulgada anteriormente ao delito e legalmente aplicada (art. 8º)
Na doutrina, encontram-se antecedentes em Montesquieu e Beccaria, mas quem forneceu os próprios termos da regra latina em que hoje é enunciado foi Feuerbach. No nosso Código está consagrado no artigo 7º "não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal" e Além disso, é um dispositivo da nossa Constituição, onde aliás, continua uma tradição constante em todas as cartas constitucionais.
No decurso de sua evolução, a partir da Magna Carta, dos documentos norte americanos e da Revolução Francesa, o princípio da legalidade foi dissociando do seu contexto as várias funções de garantia que hoje apresenta: não há crime nem pena sem lei anterior, e então o princípio se opõe á retroatividade da norma penal incriminadora, trazendo a necessária precisão e segurança ao direito; não há crime nem pena sem lei escrita, o que importa negar ao direito costumeiro função criadora ou agravante de tipos ou sanções penais; não há crime nem pena sem lei estrita, com que se impõe uma limitação à aplicação da lei e se torna defeso, do domínio das normas incriminadoras, o emprego da analogia.
Esse princípio, que é uma das características dos regimes democráticos nascidos das idéias liberais do século XVIII, do liberalismo e do individualismo das correntes filosóficas e políticas que então se desenvolveram, tem sido posto modernamente em discussão e vem sendo abolido mesmo em algumas legislações, ou como expressão de um regime de hipertrofia estatal, em que a defesa de um sistema político, de um partido, de uma classe social, exige uma ordem penal que se tem chamado autoritária, em condição de atuar sem a limitação daquele princípio liberal, ou como forma de transição entre um direito penal de normas incriminadoras tipificadas e em direito penal sem parte Especial e sem dosimetria das penas. São, em geral, sinais e exigências da crise social e política do nosso tempo. Note-se que já era assim na Roma do império com os seus juízes decidindo ad exemplum legis. Modernamente, a Rússia excluiu este princípio do seu sistema jurídico-penal, designando o crime pelo conceito elástico de ação socialmente perigosa (refere-se o autor ao Código Penal soviético, como explica em nota de rodapé). Do mesmo modo a Alemanha do Nacional -socialismo, correndo ao "são sentimento do povo" desembaraçou-se do princípio legalista. Outras vezes razões de doutrina ou de técnica, ou simplesmente de tradição legislativa têm influído para o abandono do princípio da legalidade. Um exemplo é o Código Penal da Dinamamrca. Não são modelos que mereçam ser seguidos. O caráter punitivo da sanção anticriminal, com a grave restrição de bens jurídicos fundamentais imposta ao criminoso, como ainda hoje se apresenta, o seu sentido retributivo-expiatório, eleva aquela máxima à posição de garantia imprescindível á liberdade do homem." (grifei) (Aníbal Bruno, Direito Penal, pg 206/207, 1978)

Nesse sentido ainda, a doutrina de Assis Toledo:


Função de garantia da lei penal. Princípio da legalidade ou da reserva legal. Estudada a técnica da elaboração dos tipos, resta ver-se como esta se projeta no plano político e constitucional para erigir-se em um dos mais importantes princípios do direito penal dos últimos tempos. Uma breve digressão histórica contribuirá para demonstrar essa afirmação.
Em 1935, no auge do regime nazista, Dahm, percebendo nos tipos legais de crime uma incômoda limitação ao poder estatal, proclamou a necessidade de atenuação ou de aniquilamento de um velho princípio - o nullum crimen, nulla poena sine lege - afirmando que os crimes mais graves, principalmente políticos, não se deixam conter em tipos legais nem se deixam circunscrever por meio de normas abstratas (National sozialistisches um faschistisches Strafrechts, Berlin, 1935). Daí a necessidade de superar-se, ao ver do autor citado, esse princípio, que se constituía em verdadeiro obstáculo à atuação do juiz, na aplicação da pena criminal a fatos danosos não totalmente ajustados às previsões legais.
A novidade criticável dessa doutrina está na conclusão que adota, não na constatação, realmente correta, de que os tipos legais de crime, à luz do princípio da legalidade que iremos examinar, constituem concreta limitação ao poder estatal. Franz Von Liszt percebera isso, muito antes, quando em 1905, com propósitos diferentes, afirmava ser o código penal a magna carta do delinqüente, isto é, a garantia, para os que se rebelam contra o Estado e a sociedade, de uma punição segundo certos pressupostos e dentro de precisos limites legais. E aqui se revela um dúplice aspecto do ordenamento jurídico penal, enfatizado por Roxin serve, simultaneamente, para limitar o poder de intervenção estatal na esfera dos direitos individuais e também para combater o crime. Protege tanto o indivíduo contra os abusos da autoridade quanto a sociedade e seus membros contra os abusos dos indivíduos'
Somente pois, em um Estado de direito, muito diferente daquele a que servia Dahm, será possível identificar-se, em toda a sua inteireza, o princípio da legalidade e dele extraírem-se lógicas conseqüências. É que este princípio deita raízes longínquas no liberalismo, com suas idéias jus naturalistas e contratualistas incompatíveis com as que orientam um estado totalitário'
(...)
O nullum crimen, nulla poena sine lege tem sua longa história, por vezes acidentada, com fluxos e refluxos. Por isso já foi objeto de muitas interpretações, conforme acentua Maurach, cada uma delas desempenhando papel político de realce, antes que se chegasse à concepção atual, mais ou menos cristalizada na doutrina. Presentemente, essa concepção é obtida na no quadro da denominada "função de garantia da lei penal".. e para a atuação da justiça criminal em um estado de direito, essa função de garantia provoca o desdobramento do princípio em exame em quatro ouros princípios, a saber:
a) nullum crimen, nulla poena sine lege PRAEVIA;
b) nullum crimen, nulla poena sine lege SCRIPTA;
c) nullum crimen, nulla poena sine lege STRICTA;
d) nullum crimen, nulla poena sine lege CERTA.
Lex praevia significa proibição de leis retroativas que fundamentem ou agravem a punibilidade. Lex scripta, a proibição da fundamentação ou do agravamento da punibilidade pelo direito consuetudinário. Lex stricta, a proibição da fundamentação ou do agravamento da punibilidade pela analogia (analogia in malam partem) . Lex certa, a proibição de leis penais indeterminadas (grifei).

Trouxe essa doutrina para demonstrar que o § 4º do art. 33 da Lei de drogas traz possibilidade de agravamento incerto, a critério do julgador, e só por isso incide em violação ao princípio da reserva legal, pois não traça nenhum critério para a graduação da benesse.

Ainda que se pudesse criar meios de graduação, violando-se o princípio da lei estrita, ao dosá-la utilizando-se das circunstâncias do crime, motivos, quantidade e qualidade da droga, conduta social, internacionalidade, ou outras, já previstas em lei, a decisão incidirá em bis in idem vedado.

Não é possível negar a diminuição da lei a quem faz jus, mas também não é possível aplicar o parágrafo como está sem incidir em bis in idem, concluo.

Nesse sentido, ao tratar da dupla consideração do critério quantidade e qualidade, já se pronunciou o E. Supremo Tribunal Federal, pela existência de bis in idem, confira-se:


HC 108523 / MS - MATO GROSSO DO SUL HABEAS CORPUS
Relator(a):  Min. JOAQUIM BARBOSA
Julgamento:  14/02/2012 
Órgão Julgador:  Segunda Turma
Publicação 14/03/2012
Habeas Corpus. Tráfico de drogas. Utilização de transporte público. Incidência da causa de aumento prevista no art. 40, inc. III, da Lei nº 11.343/06. Fixação do quantum relativo à causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º da Lei nº 11.343/06. Necessidade de fundamentação idônea. Inocorrência. Ordem parcialmente concedida.
A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que a simples utilização de transporte público para a circulação da substância entorpecente ilícita já é motivo suficiente para a aplicação da causa de aumento de pena prevista no art. 40, inc. III, da Lei nº 11.343/2006 (dentre outros, HC 107.274/MS, rel. min. Ricardo Lewandowski, DJe-075 de 25.04.2011). O magistrado não está obrigado a aplicar a causa de diminuição prevista no § 4° do art. 33 da Lei nº 11.343/06 em seu patamar máximo quando presentes os requisitos para a concessão de tal benefício, tendo plena autonomia para aplicar a redução no 'quantum' reputado adequado de acordo com as peculiaridades do caso concreto" (HC 99.440/SP, da minha relatoria, DJe-090 de 16.05.2011). Contudo, a fixação do quantum de redução deve ser suficientemente fundamentada e não pode utilizar os mesmos argumentos adotados em outras fases da dosimetria da pena. Como se sabe, "a quantidade e a qualidade de droga apreendida são circunstâncias que devem ser sopesadas na primeira fase de individualização da pena, nos termos do art. 42 da Lei 11.343/2006, sendo impróprio invocá-las por ocasião de escolha do fator de redução previsto no § 4º do art. 33, sob pena de bis in idem" (HC 108.513/RS, rel. min. Gilmar Mendes, DJe nº 171, publicado em 06.09.2011). Ordem parcialmente concedida para determinar ao TRF da 3ª Região que realize nova dosimetria da pena, reaprecie o regime inicial de cumprimento de pena segundo os critérios previstos no art. 33, §§ 2º e 3º, do Código Penal, e avalie a possibilidade de conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direito conforme os requisitos previstos no art. 44 do CP.
Decisão
Ordem parcialmente concedida para determinar ao Tribunal
Regional Federal da 3ª Região que proceda a nova individualização da pena observando-se a adequada motivação do quantum de redução da pena previsto no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006.Determinado ainda, de ofício, que, fixada a pena definitiva, o TRF da 3ª Região delibere sobre o regime inicial de cumprimento da pena segundo os critérios previstos no art. 33, §§ 2º e 3º, do Código Penal, bem como sobre a possibilidade de conversão dapena privativa de liberdade em restritiva de direito conforme os requisitos dispostos no art. 44 do CP, nos termos do voto do Relator. Decisão unânime. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Celso de Mello. 2ª Turma, 14.02.2012.

Porém, em que pese a Suprema Corte ter declarado que "O magistrado não está obrigado a aplicar a causa de diminuição prevista no § 4° do art. 33 da Lei nº 11.343/06 em seu patamar máximo quando presentes os requisitos para a concessão de tal benefício, tendo plena autonomia para aplicar a redução no 'quantum' reputado adequado de acordo com as peculiaridades do caso concreto" (HC 99.440/SP, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe-090 de 16.05.2011)", resta saber que critério seria esse, que já não tenha sido avaliado, ou que já não devesse ter sido avaliado nas operações anteriores e possa, portanto, ser utilizado pelo juiz nesta fase.

Ora nesse cenário, desde que devida a redução, só será cabível no patamar máximo de 2/3 (dois terços), pois a única consentânea com o princípio da reserva legal e presunção de inocência, que indicam que na dúvida, no impasse, a solução deve ser em favor do direito de liberdade.

Esse foi o meu posicionamento por algum tempo.

Porém, o estou revendo agora, pois é inegável que essa solução também deixa a desejar.

Ocorre que na prática, a solução acaba por provocar um excesso em favor do réu que aniquila o intuito punitivo da norma, e torna a pena aplicável, incompatível com a gravidade da conduta que é tida por hedionda pela Constituição Federal, o que torna a essa solução também contrária ao Direito.

O afastamento da graduação com aplicação em 2/3 (dois terços) da diminuição faz resultar evidentemente desproporcional a pena, e obriga o juiz a praticar excesso em favor do réu, ao solapar, por exemplo, uma grave pena de 6 (seis) anos de reclusão a apenas 2 (dois), muitas vezes, pena inferior à que resulta de muitos crimes de gravidade infinitamente menor que o tráfico.

O legislador quis privilegiar a primariedade, em senso lato, sem dúvida. Porém, não a ponto de tornar impune aquele que pratica a conduta pela primeira vez, sem vínculo com grupo criminoso organizado.

Reconheço que desconsiderar a gravidade da conduta já fixada com a pena-base e nas fases seguintes da dosimetria em nome da primariedade solapando a punição pela redução de 2/3 (dois terços) é de fato praticar o excesso, em favor do réu, o que a lei não poderia fazer, nem pretendeu fazer, pois fixou um redutor variável.

Portanto, a interpretação conforme a Constituição, ao princípio da isonomia que norteia o sistema e aos demais princípios de direito penal, como a individualização da pena e reserva legal deve afastar também o excesso em favor do réu, privilegiando o princípio da proporcionalidade razoável na aplicação da pena, que decorre da equidade e proibição do excesso, que norteia o legislador e o juiz, seja em favor da sociedade, seja em favor do réu.

Note-se que aqui não se trata de criar reprimenda onde não existe lei para punir, com base no excesso em favor do direito de liberdade, não se trata de legislar, criar preceito, mas adequar uma reprimenda existente a limites proporcionais.

No sentido da proibição do excesso no exercício do poder legislativo, já discorremos ao tratar do art. 273 do Código Penal, porém neste caso, apontamos excesso em desfavor do direito de liberdade:


É certo que o judiciário não deve se imiscuir na função legislativa, o que seria afronta ao princípio da tripartição dos poderes. Cabe-lhe interpretar a norma jurídica e aplicá-la no caso concreto. Porém cabe-lhe a interpretação harmônica do sistema, e dentro dessa função está a de controlar a constitucionalidade das normas jurídicas, devendo nesse passo deixar de aplicar preceitos que se encontrem em confronto com as normas e princípios constitucionais, isto é, que não encontram fundamento de validade na Lei Maior.
E o princípio da proibição do excesso, da proporcionalidade razoável está previsto em nossa Constituição e rege a atividade discricionária, quer do administrador público, quer do legislador positivo. Decorre do princípio do devido processo legal em seu aspecto material e do princípio da individualização da pena, expressos na Constituição.
Significa que no exercício de sua discricionariedade regrada o poder público, por meio de seus agentes não está autorizado pela Constituição Federal, a agir com excesso ao restringir direitos individuais em prol do interesse público, além do suficiente e necessário para a defesa dos interesses públicos. O excesso torna ilegal a atividade administrativa, ainda que a pretexto do exercício do poder discricionário e da mesma maneira torna inconstitucional a atividade legislativa, pois evidencia o desbordar dos limites da discricionariedade conferida a esses agentes pela Lei e pela Constituição.
Cito em meu subsídio o renomado professor José Joaquim Gomes Canotilho, em sua obra Direito Constitucional, pg 617/618:
2.5. O princípio da proibição do excesso (art. 18, o/2)
Este princípio, atrás considerado como um subprincípio densificador do Estado de direito democrático (cfr. supra, Parte IV, Cap. 1, A). significa, no âmbito específico das leis restritivas de direitos, liberdades e garantias, que qualquer limitação, feita por lei ou com base na lei, deve ser adequada (apropriada), necessária (exigível) e proporcional (com justa medida). A exigência da adequação aponta para a necessidade de a medida restritiva ser apropriada para a prossecução dos fins invocados pela lei (conformidade com os fins). A exigência da necessidade pretende evitar a adopção de medidas restritivas de direitos, liberdades e garantias que, embora adequadas, não são necessárias para se obterem os fins de protecção visados pela Constituição ou a lei. Uma medida será então exigível ou necessária quando não for possível escolher outro meio igualmente eficaz, mas menos , relativamente aos direitos restringidos. O princípio da proporcionalidade em sentido restrito ( = princípio da ) significa que uma lei restritiva, mesmo adequada e necessária, pode ser inconstitucional, quando adopte cargas coactivas de direitos, liberdades e garantias , , ou em relação aos resultados obtidos.
O princípio da proibição do excesso (ou da proporcionalidade em sentido amplo), consagrado na parte final do art. 18. o/2, constitui um limite constitucional à liberdade de conformação do legislador. A Constituição, ao autorizar a lei a restringir direitos, liberdades e garantias, de forma a permitir ao legislador a realização de uma tarefa de concordância prática justificada pela defesa de outros bens ou direitos constitucionalmente protegidos, impõe uma clara vinculação ao exercício dos poderes discricionários do legislador. Em primeiro lugar, entre o fim da autorização constitucional para uma emanação de leis restritivas e o exercício do poder discricionário por parte do legislador ao realizar esse fim deve existir uma inequívoca conexão material de meios e fins. Em segundo lugar, no exercício do seu poder ou liberdade de conformação dos pressupostos das restrições de direitos, liberdades e garantias, o legislador está vinculado ao princípio material da proibição do excesso.
A questão, como se intui, coloca problemas complexos em sede de controlo concreto da constitucionalidade, se se interpretar a , a e a da medida legal restritiva como uma questão de situada no âmbito de liberdade de conformação do legislador. Deve apurar-se um de liberdade de conformação, pois: (1) há casos em que o legislador está estritamente vinculado, podendo afirmar-se que ele apenas possui uma competência de concretização legislativa (ex.: na definição do direito à liberdade e integridade física, o legislador só pode concretizar a defesa de nos precisos e estritos termos definidos pela CRP); (2) noutros casos, a competência de qualificação dos interesses públicos é já mais livre, mas, ainda assim, positivamente vinculada impedindo o legislador de limitar direitos em nome de interesses públicos não constitucionalmente protegidos (ex.: será inconstitucional a relativização do direito ao despedimento sem justa causa dos trabalhadores com base no interesse da produtividade das empresas, pois este não é um bem superior ou prevalente constitucionalmente protegido).
A liberdade de conformação do legislador exige das entidades judiciais de controlo uma relativa prudência quanto à aplicação do princípio da proibição do excesso, mas elas não poderão abdicar de dar uma específica aplicação a este princípio, sobretudo quando está em jogo a apreciação de medidas especialmente restritivas (ex.: do exercício dos direitos de expressão, reunião, manifestação, associação, petição colectiva e a capacidade eleitoral nos termos do art. 270.). O princípio da proporcionalidade terá ainda interesse para o eventual controlo preventivo da constitucionalidade da lei geral restritiva.
A relevância prática do princípio da proibição do excesso pode ser ilustrada através de alguns casos decididos pelo TC (Ver Acs TC 4/84, 703/84, 23/84, 225/88, 282/86).

Vê-se do exposto, que nada impede que a doutrina acima se aplique também em favor da sociedade, quando se afirma que as punições devem ser proporcionais e razoáveis.

Na verdade, o Estado é titular do direito de punir, limitado pela lei, porém esse direito se traduz também num dever, o dever de punir as condutas contrárias a ordem vigente. Não se olvida que o Estado Brasileiro se propôs a punir efetivamente o tráfico de drogas, já que consta da lei maior que "XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem."

Portanto, é dever do legislador punir adequadamente o tráfico.

Nesse sentido, Manuel Pedro Pimentel, verbis:


Estamos convencidos de que o Estado não é titular de um direito subjetivo de punir. Segundo se extrao dos ensinamentos de Santi Romano, o que existe realmente, é um poder dever de punir. O Estado tem o poder de punir, que é atributo de sua soberania, mas ao mesmo tempo, tem o dever de punir, imposto pela exigência de realização de uma das suas finalidades. Não há, portanto, o direito de punir (jus puniendi), mas um poder-dever de punir, que mais convém ao caráter público do Direito Penal.
(...) (Direito Penal Econômico, pg 88, RT, 1973)

Reconheço, por essas razões, que é preciso realizar o intento da norma, que é efetivamente punir o delinquente, o que não ocorrerá se a pena fracassar em quaisquer de suas funções, repressivas, intimidatórias ou de reinserção social e prevenção, pois a pena deve funcionar como instrumento de prevenção geral e especial, e assim a resposta penal precisa ser adequada ao delito praticado.

Desbordaria os limites da discricionariedade do legislador abrandar de tal maneira o tratamento de um delito hediondo, assim considerado pela Constituição de modo que a pena reste inócua para os fins a que se destina, assim como não poderá agravar de forma evidentemente excessiva a reprimenda de delito de gravidade notadamente inferior.

Portanto, após muito desassossego com esse assunto, pois a solução que encontrei para não incidir em bis in idem, aplicar o redutor sempre em 2/3 (dois terços) nunca me pareceu plenamente satisfatória - ainda que a aplicasse por tratar-se da solução em prol do direito de liberdade, com base na presunção de inocência - reconheço que é preciso coibir excessos também em favor desse direito, sob pena de sacrificar-se a ordem constitucional vigente e os objetivos de pacificação social do Direito.

Na verdade, a falta de técnica do legislador, ao prever diminuição em patamar elástico e sem critérios para o seu estabelecimento, não deve levar o julgador a resultado evidentemente desproporcional em face da conduta já dosada nas fases anteriores e do sistema repressivo como um todo.

Portanto, uma interpretação conforme a Constituição Federal desse inquietante § 4º da Lei n. 11.343/06 DEVE AFASTAR A IMPOSSÍVEL GRADUAÇÃO, EVITANDO-SE O BIS IN IDEM, E POR ISSO ESTIPULAR O REDUTOR EM PATAMAR FIXO, SEMPRE QUE PRESENTES OS REQUISITOS CUMULATIVOS DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO , sob pena de negar-se vigência ao dispositivo, que não é de ser declarado inconstitucional por esse defeito, mas interpretado conforme os princípios constitucionais.

O patamar, pelo exposto, não deve ser o máximo. Entendo que, para atender, dentro da medida do possível a mens legis, procurando situar o julgamento mais proximamente à vontade do legislador (punir o tráfico adequadamente), sem incidir em bis in idem, nem em excesso permissivo, revejo entendimento e passo a fixar a diminuição, quando devida, sempre no patamar fixo correspondente à MÉDIA do intervalo pela lei estabelecido que vem a ser "5/12" (cinco doze avos) (fração média entre 1/6 e 2/3 fixada pelo legislador).

Concluo que, aplicada a diminuição em 5/12 (cinco doze avos), as restam definitivamente fixadas em 4 (quatro) anos e 1 (um) mês de reclusão e 408 (quatrocentos e oito) dias-multa.

Corrupção de menores. Considerados os critérios do art. 59 do Código Penal, mantenho as penas-base fixadas pelo MM. Magistrado a quo no mínimo legal de 1 (um) ano de reclusão, quantum que torno definitivo, à míngua de circunstâncias agravantes, atenuantes, causas de aumento, ou de diminuição de pena.

Nos termos do art. 69 do Código Penal, somo as penas aplicadas pelos 2 (dois) delitos, perfazendo 5 (cinco) anos e 1 (um) mês de reclusão e 408 (quatrocentos e oito) dias-multa.

Mantenho os demais termos da sentença.

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso de apelação do Ministério Público Federal e DOU PARCIAL PROVIMENTO aos recursos de apelação dos acusados Cleiton Araújo Rola e Alcione Ramos Machado, reduzidas as penas finais a eles cominadas, pela prática dos delitos do art. 33, caput, c c. o art. 40, I, ambos da Lei n.11.343/06 e do art. 244-B da Lei n. 8.069/90, para 5 (cinco) anos e 1 (um) mês de reclusão e 408 (quatrocentos e oito) dias-multa, mantidos os demais termos da sentença.

É o voto.



Louise Filgueiras
Juíza Federal Convocada


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