D.E. Publicado em 31/01/2013 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação ministerial para reformar a sentença e condenar o co-réu NEDILE às penas de 2 anos, 7 meses e 3 dias de reclusão, no regime inicial aberto, e 28 dias-multa, substituída a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
Trata-se de apelação criminal interposta pelo Ministério Público Federal em face da sentença proferida pelo MM. Juiz Federal da 2ª Vara Federal de Dourados - MS, que absolveu os réus NEDILE REGINATTO, com fundamento no artigo 386, VII, do Código de Processo Penal, ANA ZENI REGINATTO e FERNANDO PORTILHO LOPES, pelo artigo 386, V, do mesmo Diploma penal, todos acusados da prática do delito previsto no artigo 168, § 1º, III, do Código Penal.
Consta da denúncia (fls. 02/05) que NEDILE REGINATTO e ANA ZENI REGINATTO na qualidade de sócios e dirigentes da empresa ALVORADA ARMAZÉNS GERAIS LTDA celebraram com o Banco do Brasil S/A, em 30/01/1995, contrato de depósito para guarda e conservação de produtos vinculados a "Empréstimos do Governo Federal - EGF", assumindo o empregado FERNANDO PORTILHO LOPES o encargo de fiel depositário dos produtos. Em vistorias realizadas em 30/04/98 a CONAB constatou o desvio de "559.381 Kg de milho em grãos da safra 93/94" e, em desvio e perdas em armazenamento de "2.047.686 Kg de arroz em casca das safras de 92/95", conforme notificações referentes aos anos de 1996 a 1998.
A denúncia foi recebida em 27/01/2005 (fl. 42).
Os réus foram interrogados (fls. 245/248 e 278/279) e apresentaram defesa prévia (fls. 235 e 285/286).
As testemunhas arroladas pelo Ministério Público foram ouvidas às fls. 376/377, 424/425 e as de defesa às fls. 440, 482 e 487.
Em alegações finais o Ministério Público Federal pugnou pela condenação de NEDILE REGINATTO e pela absolvição dos demais réus, nos termos do artigo 386, VIII do Código de Processo Penal (fls. 485/491).
Os réus apresentaram suas alegações finais às fls. 509/511 (Nedile e Ana) e 525/528 (Fernando), pleiteando a absolvição.
A sentença absolutória foi proferida em 18/04/2012 (fls. 545/549).
Apela o Ministério Público Federal pugnando pela condenação do acusado NEDILE REGINATTO, pelas razões que seguem:
1. A materialidade delitiva restou comprovada pela documentação trazida nos autos pelo Banco Central do Brasil, em especial, os "Termos de Notificação e Vistoria".
2. A autoria em relação ao réu NEDILE REGINATTO restou patente pelo contrato social da empresa ALVORADA ARMAZÉNS GERAIS LTDA, o qual atesta que o acusado é responsável por todos os atos de gestão da empresa; pelos depoimentos prestados em sede policial e em Juízo, no qual tentou se justificar, alegando que não se apropriou dos produtos e que entrou em contato com a CONAB para informar que eles se deterioraram devido às condições de armazenamento, à céu aberto.
3. As condições de armazenamento não eram propícias para a conservação e guarda de cereais. Foram constatados desvios/perdas de 2.047.686 Kg de arroz em 6 vistorias, sendo 5 delas apurada a perda parcial dos grãos armazenados em quantia menor do que foi depositado originalmente. Em vistoria realizada pela CONAB em 04/02/97, verificou-se o desaparecimento total (100%) de 525.088 Kg da safra de arroz (94/95), vinculada as CDAs 55.4375.0006-0 e 55.4375.0001-0, e, do milho, do total de 1.974.139 Kg constatou-se o desaparecimento de 559.381 Kg, já descontada a margem de segurança tolerada pela CONAB (10%), sem explicação plausível, evidenciando-se que o acusado agiu com dolo, apropriando-se e, posteriormente, desviando/alienando os grãos, incorrendo na conduta prevista no artigo 168, § 1º, III, do Código Penal.
4. Pede ainda que na fixação da pena sejam sopesadas circunstâncias como maus antecedentes e a conduta social do acusado, que se apropriou da res publica, causando lesão a interesse de toda coletividade, o que merece um grau maior de reprovabilidade.
Com as contra-razões vieram os autos a esta Egrégia Corte, onde a Procuradoria Regional da República opinou pelo provimento do recurso, reformando-se a sentença, para condenar NEDILE REGINATTO como incurso no artigo 168, caput, do Código Penal (fls. 570/574).
O feito foi submetido à revisão, na forma regimental.
É O RELATÓRIO.
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VOTO
Recorre o Ministério Público contra a sentença que absolveu o acusado NEDILE REGINATTO da acusação do crime previsto no artigo 168, § 1º, inc. III, do Código Penal, por entender o D. Magistrado "a quo" que o acervo dos autos não era suficiente para demonstrar o crime de apropriação indébita.
A materialidade delitiva está evidenciada no conjunto probatório, especialmente nos autos das vistorias realizadas pela CONAB que comprovam a perda e o desvio de produtos agropecuários depositados em armazéns da empresa ALVORADA ARMAZÉNS GERAIS LTDA, da qual o co-réu NEDILE REGINATTO era sócio e responsável pela administração. As perdas e deteriorações dos produtos (arroz e milho) foram descritas na sentença de primeiro grau nos seguintes termos:
O Juízo de Primeiro Grau, no entanto, absolveu da acusação de apropriação indébita o sócio administrador da empresa ao fundamento de que não evidenciado o elemento subjetivo do tipo (animus rem sibi habendi), conforme se verifica dos trechos da sentença a seguir destacados:
Ao contrário do entendimento adotado pelo Juízo de Primeiro Grau, no entanto, estão configurados todos os elementos do tipo descrito no artigo 168 do Código Penal dado que não se trata apenas de deterioração dos produtos armazenados, mas sim de desaparecimento (desvio) de 525.088 kg (quinhentos e vinte e cinco mil e oitenta e oito quilogramas) de arroz com casca ensacado da safra de 94/95, vinculados às CDAs 55.4375.006-0 e 55.4375.0001-0 (fls. 64 a 66 dos autos do inquérito policial em apenso).
Com relação ao milho, verifica-se também o desvio (desaparecimento) de quantidade correspondente a 28,33% (já descontado o desvio técnico de 10% admitido pela CONAB), o que corresponde a 559.381 kg (quinhentos e cinqüenta e nove mil trezentos e oitenta e um gramas) de milho.
No interrogatório judicial o co-réu NEDILE REGINATTO negou a ocorrência do desvio, justificando que as perdas foram ocasionadas pelas condições precárias de armazenamento dos produtos. Segue a transcrição do depoimento:
As precárias condições de armazenamento não podem justificar a perda de mais de uma tonelada de produtos (arroz e milho), não se podendo imputar à fiscalização e tampouco ao órgão de acusação o ônus de provar o destino desses produtos, dado que desapareceram do armazém quando estavam sob custódia do co-réu NEDILE, sócio proprietário e administrador da empresa.
Com relação ao arroz com casca ensacado, conforme acima consignado, sequer se pode falar em deterioração visto que todo o produto desapareceu do armazém, o que corrobora a acusação do Ministério Público Federal no sentido de que esses produtos foram, efetivamente, desviados pelo depositário.
Deve ser consignado, ainda, que se a deterioração tivesse sido a causa do desaparecimento dos produtos - conforme sustentado pelo co-réu NEDILE - deveriam existir ao menos restos dos grãos apodrecidos ou embolorados, o que não ocorreu, conforme apontado pelo Ministério Público Federal nas razões recursais.
A autoria do crime também está comprovada. Embora o co-réu FERNANDO tenha assinado o contrato como fiel depositário, as provas testemunhais produzidas nos autos corroboram a tese da defesa no sentido de que FERNANDO era motorista do armazém e empregado do co-réu NEDILE, não tendo poderes de administração para zelar pelo armazenamento e conservação dos produtos que transportava, pelo que era de rigor sua absolvição, conforme postulado pelo Ministério Público Federal em suas razões finais.
A absolvição da co-ré ANA ZENI REGINATTO também se impunha diante da comprovação de que, embora sócia da empresa de armazenagem com seu marido NEDILE, não participava das atividades da empresa sequer indiretamente, não podendo, pois, ser responsabilizada pelo desaparecimento dos produtos.
Comprovadas a autoria e a materialidade do delito de apropriação indébita, passo à dosimetria da pena.
Na primeira fase de dosimetria da pena, atenta às diretrizes do artigo 59 do Código Penal, verifico pelas informações criminais constantes dos autos que o acusado é tecnicamente primário e não possui antecedentes criminais a desfavorecê-lo.
Por outro lado, consoante se verifica dos Termos de Notificação/Vistoria, o desaparecimento de grande quantidade de grãos em poder do apelado, mais de duas toneladas de arroz e mais de meia tonelada de milho, há que se considerar as graves conseqüências que resultaram tanto para a coletividade como para o ente público que deixou de executar as políticas públicas para o abastecimento alimentar no país, denotando maior culpabilidade do agente, o que obriga a exasperação da pena base, para patamar acima do mínimo legal, de modo que fixo a pena-base em 1 (um) ano e 8 (oito) meses de reclusão, além do pagamento de 18 (dezoito) dias-multa.
Não há agravantes ou atenuantes a serem consideradas na segunda fase da dosimetria da pena.
Na terceira fase, considerando que o apelado recebeu os produtos em depósito em razão de sua atividade profissional, devido ao ramo específico de sua empresa, deve ser aplicada a causa de aumento do inciso III do § 1º do art. 168 do Código Penal. Nestes termos doutrina Guilherme de Souza Nucci:
Com isso, aplicado o aumento de 1/3, a pena resulta em 2 (dois) anos, 2 (dois) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, e 24 (vinte e quatro) dias-multa.
Ainda, verifico estarem presentes as condições estabelecidas no artigo 71 do Código Penal, vez que o delito foi cometido em continuidade delitiva averiguada com as diversas vistorias (30/10/96, 04/02/97, 24/07/97, 17/09/97, 03/12/1997 e 30/04/98) tendo persistido no mesmo "modus operandi", razão pela qual aplico a majorante relativa à continuidade delitiva à razão de 1/6, resultando a pena, em definitivo, de 2 (dois) anos, 7 (sete) meses e 3 (três) dias de reclusão e 28 (vinte e oito) dias-multa, arbitrados no valor unitário mínimo legal, vigente à época dos fatos.
O regime inicial de cumprimento de pena é o aberto, presentes os requisitos legais.
Por fim, observo que a pena corporal fixada é inferior a 4 (quatro) anos e o delito não foi cometido com utilização de violência ou grave ameaça, bem como o réu não é reincidente e as circunstâncias previstas no art. 44, inc. III, do Código Penal, indicam que a substituição da pena corporal por penas restritivas de direitos será suficiente a título de reprimenda.
Assim sendo, substituo a pena privativa de liberdade acima fixada por duas penas restritivas de direitos, quais sejam, uma pena de prestação de serviços à comunidade pelo mesmo prazo, e prestação pecuniária equivalente a 20 (vinte) salários mínimos, que reverterá em prol de entidade beneficente a ser indicada pelo juízo da execução penal, além de manter a pena de multa já arbitrada anteriormente.
Diante do exposto, dou provimento ao recurso ministerial para reformar a sentença e, assim, condenar o réu NEDILE REGINATTO pela prática do delito previsto no artigo 168, § 1º, inc. III, c.c. art. 71, todos do Código Penal, à pena de 2 (dois) anos, 7 (sete) meses e 3 (três) dias de reclusão e 28 (vinte e oito) dias-multa, substituída a pena restritiva de liberdade por restritivas de direitos, nos moldes acima consignados.
É COMO VOTO.
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